Juan Antonio Herrero Lara1; Daniela de Araújo Martins-Romêo1; Carlos Caparrós Escudero1; Rosa María Lepe Vázquez2; María del Carmen Prieto Falcón3; Vinicius Bianchi Batista3
RESUMO
A úlcera aórtica penetrante é uma entidade rara e de prognóstico desfavorável dentro da síndrome aórtica aguda. Mais raros ainda, na literatura, são os casos como o aqui relatado, localizado no arco aórtico, que começa com dor torácica e evolui com disfonia. O presente caso enfatiza o papel da tomografia computadorizada no diagnóstico da úlcera aórtica penetrante e na sua diferenciação de outras entidades dentro da síndrome aórtica aguda. Apresenta também um avanço terapêutico nessa doença, constituído por tratamento híbrido endovascular e cirúrgico.
Palavras-chave: Tomografia computadorizada; Aorta torácica; Doenças da aorta; Aterosclerose; Procedimentos cirúrgicos cardiovasculares.
ABSTRACT
Penetrating atherosclerotic aortic ulcer is a rare entity with poor prognosis in the setting of acute aortic syndrome. In the literature, cases like the present one, located in the aortic arch, starting with chest pain and evolving with dysphonia, are even rarer. The present report emphasizes the role played by computed tomography in the diagnosis of penetrating atherosclerotic ulcer as well as in the differentiation of this condition from other acute aortic syndromes. Additionally, the authors describe a new therapeutic approach represented by a hybrid endovascular surgical procedure for treatment of the disease.
Keywords: Computed tomography; Thoracic aorta; Aortic diseases; Atherosclerosis; Cardiovascular surgery.
INTRODUÇÃO A úlcera aórtica penetrante (UAP) constitui uma complicação de uma placa aterosclerótica que provoca lesão da parede aórtica, com um quadro clínico de dor torácica. Situa-se dentro da síndrome aórtica aguda e supõe uma emergência médica com potenciais complicações que podem inclusive derivar em rotura aórtica(1,2). O papel do radiologista é fundamental, dado que esta doença é pouco frequente e habitualmente não suspeitada clinicamente, de maneira que um diagnóstico errôneo ou tardio pode levar a altas taxas de morbidade e mortalidade. Neste contexto, a tomografia computadorizada (TC) constitui o exame de imagem de eleição para o diagnóstico. Relata-se caso de UAP de localização pouco habitual, no arco aórtico, que se iniciou com dor torácica e evoluiu com disfonia, sendo o paciente submetido a tratamento híbrido de recente implantação, endovascular e cirúrgico. RELATO DO CASO Paciente do sexo masculino, 65 anos de idade, ex-fumante, obeso, com doença pulmonar obstrutiva crônica em estádio GOLD IV (grave redução do fluxo do ar com risco de vida para o paciente em caso de piora clínica temporária), com história de cardiopatia hipertensiva e isquêmica. Iniciou o quadro clínico com dor precordial lancinante, irradiada ao braço esquerdo e dificuldade respiratória. As enzimas cardíacas foram normais e o eletrocardiograma não demonstrou alteração na repolarização ventricular. O cateterismo cardíaco não apresentou lesões importantes. Evoluiu com disfonia de apresentação brusca e broncoespasmo. A TC de tórax estabeleceu o diagnóstico de UAP no arco aórtico. Foi encaminhado a tratamento urgente, cirúrgico e endovascular, com êxito. DISCUSSÃO O sexo masculino, a idade avançada e a hipertensão constituem os principais fatores de risco relacionados à síndrome aórtica aguda(2,3), que somente em 5% dos casos está justificada por uma UAP, enfermidade pouco habitual e subdiagnosticada, o que dificulta o trabalho do radiologista. A UAP é uma ulceração de uma placa ateromatosa, que penetra profundamente através da íntima até a camada média da aorta, onde ocasiona uma hemorragia(4). Sua evolução é variável: em ocasiões, se limita à camada média devido ao componente fibrótico da placa de ateroma, com a formação de uma pequena área de dissecção ou ulceração circunscrita; em outros casos, se estende até um ponto distal de reentrada da luz aórtica e ocasiona uma dissecção. Outra possibilidade é que alcance a adventícia e que provoque um pseudoaneurisma. Em casos mais extremos, pode atravessar toda a parede, com rotura aórtica(1,4). A localização da UAP no arco aórtico é menos frequente que na aorta descendente, pela estreita relação dessa entidade com a aterosclerose, mais prevalente na aorta descendente, e pelo fluxo sanguíneo rápido, que se torna fator protetor na aorta ascendente e no arco aórtico(4). A TC é a técnica de eleição na avaliação das síndromes aórticas agudas, pela sua acessibilidade, rapidez, reprodutibilidade, alta sensibilidade e especificidade. Recomenda-se primeiro um estudo sem contraste intravenoso, para determinar possíveis hematomas associados e disposição das calcificações parietais, seguido de uma aquisição na fase arterial depois da administração de contraste iodado. Com o contraste detecta-se uma alteração focal no contorno aórtico, a úlcera, que pode se acompanhar de hematoma mural e de realce parietal por inflamação e hiperemia (Figuras 1 e 2). O hematoma ajuda a diferenciar uma UAP de uma úlcera comum ou não complicada. Contudo, é indispensável a presença de um quadro clínico de dor pela alta incidência de irregularidades parietais nos pacientes de idade avançada, que podem mostrar uma aparência radiológica similar (Figura 3). Em alguns casos, como o relatado, podem surgir sintomas decorrentes da compressão do nervo laríngeo recorrente pelo hematoma, como disfonia, disfagia ou síndrome da veia cava superior.