Denise Joffily Pereira da Costa Pinheiro1; Simone Elias2; Afonso Celso Pinto Nazário3
RESUMO
O estadiamento axilar nas pacientes portadoras de câncer de mama inicial é fator essencial no planejamento terapêutico. Atualmente este é realizado durante o tratamento cirúrgico, mas há uma tendência em buscar técnicas pré-operatórias e de menor morbidade para avaliação dos linfonodos axilares. A ultrassonografia é um exame amplamente usado para esta finalidade e muitas vezes associado a punção aspirativa por agulha fina ou por agulha grossa. Entretanto, os critérios ultrassonográficos de suspeição para linfonodos axilares não apresentam valores preditivos significativos, gerando resultados discrepantes em estudos sobre sensibilidade e especificidade do método. O objetivo deste trabalho é realizar uma revisão na literatura médica sobre a ultrassonografia no estadiamento axilar e as principais alterações morfológicas do linfonodo metastático.
Palavras-chave: Câncer de mama; Linfonodos axilares; Ultrassonografia; Aspectos morfológicos.
ABSTRACT
Axillary staging of patients with early-stage breast cancer is essential in the treatment planning. Currently such staging is intraoperatively performed, but there is a tendency to seek a preoperative and less invasive technique to detect lymph node metastasis. Ultrasonography is widely utilized for this purpose, many times in association with fine-needle aspiration biopsy or core needle biopsy. However, the sonographic criteria for determining malignancy in axillary lymph nodes do not present significant predictive values, producing discrepant results in studies evaluating the sensitivity and specificity of this method. The present study was aimed at reviewing the literature approaching the utilization of ultrasonography in the axillary staging as well as the main morphological features of metastatic lymph nodes.
Keywords: Breast cancer; Axillary lymph nodes; Axillary ultrasonography; Morphological features.
INTRODUÇÃO
A presença ou não de doença metastática nos linfonodos da cadeia regional é informação fundamental para definir estadiamento, tratamento e prognóstico do câncer de mama. O método padrão ouro para avaliação desses linfonodos ainda é a linfonodectomia axilar com análise histológica, entretanto, este método se associa a morbidade relevante. Com os avanços no diagnóstico da imaginologia mamária e o consequente aumento da incidência de casos em estágios iniciais, a presença de metástase em linfonodos axilares declinou, fazendo-se necessária uma alternativa menos agressiva.
A técnica de biópsia do linfonodo sentinela (BLS), praticada inicialmente por Krag em 1993(1), surgiu como um grande avanço no tratamento de pacientes com axila clinicamente negativa, obtendo atualmente menos de 1% de recorrência axilar em pacientes com BLS negativa(2). Na metanálise de Kell et al., a BLS mostrou-se equivalente ao esvaziamento axilar na detecção de metástases em linfonodos regionais e com até 75% menos morbidade nas pacientes em estádio inicial(3).
O esvaziamento axilar seguido do resultado positivo para metástase na BLS apresentou, segundo estudos, de 38% a 67% de ausência de metástase nos demais linfonodos(4). Este dado levantou a questão sobre qual seria o verdadeiro benefício da dissecção ampla de linfonodos quando o sentinela se apresenta comprometido. Esse benefício é particularmente desconhecido nos casos de micrometástases e células tumorais isoladas, de significado clínico ainda indeterminado. Os estudos a respeito ainda são controversos, e no momento a maioria dos serviços mantém a abordagem axilar ampla mesmo em casos de mínimo comprometimento do linfonodo sentinela(5). A identificação de novos marcadores prognósticos, a melhor compreensão do comportamento tumoral e o avanço tecnológico na área da imagem guardam grande potencial para modificar a conduta axilar no futuro, selecionando pacientes candidatas a intervenção menos agressiva. Recentemente, o estudo ACOSOG Z0011 estabeleceu o perfil de um grupo de pacientes candidatas a não dissecção da cadeia axilar após uma BLS positiva(6). Esse protocolo é adotado pela Disciplina de Mastologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo desde novembro de 2012.
Exame clínico e mamografia comprovadamente não apresentam acurácia adequada na identificação de metástases em linfonodos axilares(7), e diversos estudos abordam outras técnicas de imagem, entre elas: ultrassonografia isolada ou associada a dopplerfluxometria; punção aspirativa por agulha fina (PAAF) ou por agulha grossa (core biópsia); tomografia computadorizada; tomografia por emissão de pósitrons; ressonância magnética; elastografia.
Atualmente, nenhum exame de imagem possui valor preditivo negativo suficiente para evitar abordagem cirúrgica da axila quando nenhum linfonodo alterado é identificado(8), todavia, cada vez mais estudos incluem esses métodos como parte do planejamento terapêutico. No Instituto Europeu de Oncologia está em andamento um estudo que compara a BLS versus apenas observação, quando a ultrassonografia axilar não apresenta alterações, em pacientes com estádio clínico inicial e candidatas a cirurgia conservadora da mama(9).
A ultrassonografia axilar possui papel de destaque no estadiamento e seguimento dos linfonodos regionais. É um exame não invasivo, de fácil acesso e que ainda auxilia a captação de material para citologia e histologia.
O objetivo deste artigo é discutir o uso da ultrassonografia no estadiamento axilar, com ênfase nas principais alterações morfológicas dos linfonodos metastáticos neste exame.
MÉTODO
O método adotado foi a pesquisa bibliográfica sistematizada para a produção de um artigo de revisão, de modo a responder ao objetivo proposto. Foi utilizada a busca ativa de artigos contendo o tema proposto, por meio de browser científico (Google Scholar), portais (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e Conselho Federal de Medicina), bancos de dados bibliográficos virtuais (Medline, Lilacs, Cochrane, SciELO, High Wire, Ovid), utilizando como palavras-chave: linfonodos axilares, ultrassonografia, aspectos morfológicos. A busca foi realizada no período de janeiro a agosto de 2012. Foram utilizadas, neste artigo, 22 referências, as quais contemplavam melhor o tema proposto.
REVISÃO
A ultrassonografia é amplamente disponível e, quando combinada a PAAF ou core biópsia, torna-se o método mais significativo na avaliação pré-operatória de linfonodos axilares(10). Frente a um resultado citológico ou histológico negativo para metástase axilar, aumentamos o valor preditivo negativo da BLS; por outro lado, se o resultado for positivo, reduzimos o tempo cirúrgico, dispensando a biópsia.
Outro benefício deste método seria reduzir a incidência de mapeamento linfático inadequado ao se identificar previamente, pela ultrassonografia, linfonodos com depósitos tumorais, os quais aumentam a pressão linfática, reduzindo a captação do coloide radioativo(11).
O linfonodo sentinela positivo, como citado anteriormente, em muitos casos é o único acometido, não sendo sua biópsia um modo adequado de avaliar a extensão do envolvimento axilar(2,6). Já o uso da ultrassonografia associada a PAAF, no estudo de Moore et al. demonstrou alta probabilidade de acometimento axilar extenso (mais de quatro linfonodos) quando presentes alterações morfológicas como ausência de hilo e/ou extensão extracapsular e confirmação citológica de malignidade(12).
Apesar de apresentar, em muitos estudos, elevada acurácia, os critérios diagnósticos de malignidade e a indicação do exame ainda são controversos(4).
CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS
Comumente, um linfonodo benigno apresenta-se ovalado, com córtex hipoecogênico, extremamente fino ou até invisível à ultrassonografia, e com hilo hiperecogênico por conter trabéculas de tecido conjuntivo, cordões de tecido linfático e sinusoides medulares. Alterações como espessamento do córtex, diminuição ou ausência do hilo, mudanças no formato ou no padrão vascular são consideradas suspeitas.
Atualmente, muitos estudos usam como critérios de definição de risco de metástase o espessamento cortical e a ausência de hilo(11,12–16). A ausência do hilo, tornando o linfonodo completamente hipoecogênico, é a alteração mais específica para doença metastática(13,16), porém, este achado apresenta-se apenas em casos avançados. O grande desafio no diagnóstico ultrassonográfico está na avaliação de linfonodos nos quais se observam córtex e hilo em variadas formas, correspondendo a estádios iniciais de doença metastática, casos estes responsáveis pela maior proporção de falso-negativos(11–13,16).
Células metastáticas na linfa chegam ao linfonodo por vasos linfáticos aferentes na face convexa do órgão. A linfa é então filtrada, passando através do córtex, paracórtex e, finalmente, hilo(17). Depósitos metastáticos são represados na periferia do linfonodo, causando alargamento do córtex, habitualmente focal, quando em um estágio inicial, ou uniforme. Acometimento mínimo do linfonodo, com depósitos entre 0,2 mm e 2 mm (micrometástases) e menor que 0,2 mm (células tumorais isoladas) não se relacionam com alterações morfológicas significativas do linfonodo, limitando a utilidade da ultrassonografia nestes casos e sendo o diagnóstico feito por histologia e imuno-histoquímica.
Com o objetivo de estimar a suspeição baseada na imagem, muitos autores elaboraram classificações envolvendo a espessura do córtex. Cho et al.(11), por exemplo, categorizaram as imagens em cinco graus: grau 1, linfonodos com córtex < 1,5 mm; grau 2, córtex > 1,5 e < 2,5 mm; grau 3, córtex > 2,5 mm e < 3,5 mm; grau 4, córtex > 3,5 mm e hilo intacto; grau 5, córtex > 3,5 mm e ausência de hilo. Concluíram que esta classificação é eficaz na pesquisa de metástase, sendo que a espessura do córtex acima de 2,5 mm indica estudo citológico ou histológico.
Bedi et al.(13) formularam uma classificação semelhante, dividindo as imagens em seis tipos: tipo 1, sem córtex visível; tipo 2, córtex < 3 mm; tipo 3, córtex > 3 mm; tipo 4, córtex inteiramente lobulado; tipo 5, córtex com lobulação focal; tipo 6, linfonodo completamente hipoecogênico, sem hilo. Consideraram suspeitos e com indicação de biópsia os linfonodos tipos 5 e 6, as alterações reacionais foram frequentes no tipo 3, enquanto o tipo 4 foi denominado provavelmente benigno, pois englobou a maior parte dos resultados falso-negativos (Figuras 1 a 7).