Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 41 nº 3 - Maio / Jun.  of 2008

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 155 to 158



Medida do comprimento do osso nasal entre 11 e 15 semanas de gestação em uma população brasileira: estudo preliminar

Autho(rs): Paulo Sérgio Cossi, Edward Araujo Júnior, Luiz Cláudio de Silva Bussamra, Hélio Antonio Guimarães Filho, Luciano Marcondes Machado Nardozza, Antonio Fernandes Moron

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Texto em Português English Text

Descritores: Biometria fetal, Osso nasal, Curva de normalidade, Ultra-som

Keywords: Fetal biometry, Nasal bone, Normality range, Ultrasound

Resumo:
OBJETIVO: Determinar valores de referência para o comprimento do osso nasal entre 11 e 15 semanas de gestação em uma população brasileira. MATERIAIS E MÉTODOS: Realizou-se estudo de corte transversal com 171 gestantes normais entre 11 e 15 semanas completas. O osso nasal foi medido por via transabdominal em todos os casos. Foram calculados os percentis 5 a 95 para o comprimento do osso nasal pela fórmula: média ± 1,645 desvio-padrão. Para avaliar a correlação do comprimento do osso nasal com parâmetros antropométricos fetais utilizou-se o coeficiente de correlação de Spearman, com intervalo de confiança de 95%. RESULTADOS: O osso nasal foi mensurado em todos os casos, sendo que o comprimento médio variou de 1,69 mm a 2,94 mm. O comprimento do osso nasal mostrou-se fortemente correlacionado com todos os parâmetros antropométricos fetais (p < 0,001) e com a idade gestacional (R² = 0,59). CONCLUSÃO: Apesar de ser um estudo preliminar, a curva de referência do comprimento do osso nasal foi estabelecida.

Abstract:
OBJECTIVE: To establish reference values for fetal nasal bone length measurements between 11 and 15 gestational weeks in a Brazilian population. MATERIALS AND METHODS: A cross-sectional study was developed with 171 normal pregnant women between their 11th and 15th gestational weeks. The fetal nasal bone was measured by means of transabdominal ultrasound in all of the cases. The 5th and 95th percentiles for the nasal bone length were calculated by the formula: mean ± 1.645 standard deviation. The Spearman correlation coefficient with 95% confidence interval was utilized to correlate the nasal bone length with fetal anthropometric parameters. RESULTS: The nasal bone could be measured in all of the cases with the mean length ranging between 1.69 mm and 2.94 mm. Nasal bone length demonstrated to be strongly correlated with all of the fetal anthropometric parameters (p < 0.001) and with the gestational age (R² = 0.59). CONCLUSION: Despite the preliminary character of the present study, a reference range of fetal nasal bone length was established.

VDoutor, Professor Adjunto do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), São Paulo, SP, Brasil
VILivre-Docente, Professor Titular do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência

 

 

INTRODUÇÃO

O característico nariz pequeno em pacientes com síndrome de Down foi primeiramente reportado por Langdon Down em 1866(1). Em estudo radiológico post mortem com 31 fetos com trissomia 21 abortados entre 12 e 24 semanas de gestação, houve ausência de ossificação do osso nasal em oito casos (25,8%)(2). Em estudo pioneiro, Cicero et al.(3) comprovaram que o osso nasal esteve ausente em 43 de 59 (73%) fetos com trissomia 21 e em 3 de 603 (0,5%) fetos cromossomicamente normais entre 11 e 14 semanas de gestação. Em estudo recente, a inclusão da avaliação do osso nasal à medida da translucência nucal (TN) e ao teste sérico bioquímico materno manteve a taxa de detecção de trissomia 21 em 90%, entretanto, reduziu o falso-positivo de 5 para 2,5(4).

Deve-se referir que a visualização e/ou a medida do comprimento do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação sofre influência da origem étnica e racial(5-7). Portanto, deve-se ajustar o fator étnico para a utilização do comprimento do osso nasal no screening para pesquisa da trissomia 21 no primeiro trimestre de gestação(7).

Há diversos estudos determinando valores de referência do comprimento do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação em diferentes populações(8,9), bem como em diferentes grupos étnicos(5). Não há estudos determinando valores de referência do comprimento do osso nasal no primeiro trimestre de gestação para a população brasileira, havendo um único estudo no segundo trimestre de gestação(10).

Em razão da grande miscigenação étnica, torna-se necessária a determinação de um nomograma do comprimento do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação na população brasileira, de modo a se utilizar esses parâmetro no screening de pesquisa de trissomia 21 no primeiro trimestre de gestação. Portanto, o objetivo deste estudo preliminar foi determinar valores de referência do comprimento do osso nasal entre 11 e 15 semanas de gestação em uma amostra não-selecionada da população brasileira.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Realizou-se estudo de corte transversal, entre janeiro de 2004 e março de 2005, no Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), com o objetivo de avaliar a medida do osso nasal entre 11 e 15 semanas de gestação. Foram avaliadas 171 gestantes que apresentavam exame de rastreamento ultra-sonográfico de cromossomopatias de primeiro trimestre de gestação considerado de baixo risco (1:300 ou menos). Os critérios de inclusão neste estudo foram: gestação única, idade gestacional baseada na data da última menstruação e confirmada por exame ultra-sonográfico de primeiro trimestre variando de 11 a 14 semanas e 6 dias, ausência de malformações detectadas durante o seguimento ultra-sonográfico ou após o nascimento. Os critérios de exclusão foram: aborto ou óbito fetal durante o seguimento pré-natal. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp/EPM, e as pacientes que consentiram na participação voluntária assinaram termo de consentimento.

Para a obtenção da imagem do perfil fetal para a mensuração do osso nasal utilizou-se corte sagital, com ângulo do transdutor entre 45° e 135° em relação ao plano facial. Utilizou-se magnificação da imagem, de forma que a cabeça e a porção superior do tórax ocupassem 75% da tela. Identificaram-se o osso nasal e a sinostose frontonasal, que aparece como uma área anecóica na região da glabela, além de duas outras imagens lineares, paralelas e ecogênicas, que correspondem às interfaces da pele, logo acima do osso nasal. O caliper foi ajustado de tal forma que, a cada movimento, ele mudasse em 0,1 mm. Após a identificação do plano apropriado, foi realizada a primeira medida do osso nasal (Figura 1). Em seguida, nova imagem foi confeccionada, sendo obtida nova medida do osso nasal. A medida final foi obtida pela média aritmética das duas medidas.

 

 

Todos os exames foram realizados por três ultra-sonografistas experientes na avaliação morfológica fetal de primeiro trimestre de gestação, os quais possuíam certificação pela Fetal Medicine Foundation. Os exames foram realizados em aparelho Toshiba Powervision 6000 (Toshiba; Tóquio, Japão) equipado com transdutor convexo de 3,5 MHz a 5,0 MHz, sendo todas as medidas realizadas por via transabdominal.

Para a análise estatística, utilizou-se o programa SPSS for Windows versão 12.0 (Chigago, IL, EUA). Realizou-se análise de regressão polinomial para se identificar as curvas que melhor se ajustavam à média e desvio-padrão em função da idade gestacional. O ajuste do modelo foi avaliado por meio da análise de resíduos.

Os percentis 5 e 95 para a medida do osso nasal no intervalo de gestação avaliado foram obtidos utilizando-se a fórmula: média ± 1,645 desvio-padrão.

Para se avaliar a correlação da medida do osso nasal com parâmetros antropométricos fetais — diâmetro biparietal (DBP), circunferência craniana (CC), circunferência abdominal (CA), comprimento do fêmur (CF), comprimento do úmero (CU) e comprimento cabeça-nádega (CCN) — utilizou-se o coeficiente de correlação de Spearman, com intervalo de confiança de 95% (IC 95%).

Em todas as análises estatísticas utilizou-se nível de significância de 5%, ou seja, níveis descritivos que apresentaram p < 0,05 foram considerados significantes.

 

RESULTADOS

Todas as 171 gestantes selecionadas preencheram os critérios de inclusão e exclusão, sendo alocadas na análise estatística final. O osso nasal foi visualizado e medido nos 171 fetos analisados (100%). As idades das gestantes variaram de 17 a 42 anos, com média de 30 anos (desvio-padrão = 6 anos). A Tabela 1 apresenta as médias e seus respectivos desvios-padrão para a medida do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação; observa-se que a média do comprimento do osso nasal aumentou com o avançar da idade gestacional. Na Figura 2 pode-se observar o comportamento da medida do osso nasal em função da idade gestacional.

 

 

 

 

No período da avaliação — 11 a 14 semanas e 6 dias de gestação — observou-se que a medida do osso nasal aumentou 0,404 ± 0,026 mm (p < 0,001) entre as sucessivas semanas.

A Tabela 2 mostra que a medida do osso nasal mostrou-se estatisticamente correlacionada com todos os parâmetros antropométricos fetais (DPB, CC, CA, CF, CU e CCN) (p < 0,001). O CCN e o DBP foram os parâmetros que mostraram, respectivamente, a maior e a menor correlação com o osso nasal.

 

 

As medidas de referência do osso nasal nos percentis 2,5, 5, 50, 95 e 97,5 são apresentadas na Tabela 3. A Figura 3 mostra as medidas do osso nasal e os ajustes dos percentis 5, 50 e 95 para a idade gestacional. Conforme a Figura 3, observou-se crescimento linear da medida do osso nasal em função da idade gestacional, sendo que o ajuste linear obtido produziu coeficiente de explicação (R2) igual a 59,4% (p < 0,001).

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Diversos estudos têm mostrado a associação da ausência do osso nasal entre 11 e 13 semanas e 6 dias de gestação com a trissomia 21(3,11,12), bem como com outras anormalidades cromossômicas(13).

Deve-se referir que a origem étnica materna influencia na incidência de ausência do osso nasal. Prefumo et al.(6) avaliaram, prospectivamente, 3.992 fetos e observaram que a prevalência de ausência do osso nasal em mães de origem africana foi de 5,8%, em mães de origem asiática foi de 3,4%, e em mães de origem branca, de apenas 2,6%. Os autores sugerem a necessidade de correção pelo fator racial para o uso do osso nasal no screening de trissomia 21 no primeiro trimestre de gestação.

No presente estudo, o osso nasal foi visualizado e medido em 100% dos casos. A maioria dos estudos mostra altas taxas de avaliação do osso nasal no primeiro trimestre. No estudo pioneiro realizado por Cicero et al.(3), a visualização do perfil fetal foi possível nos 701 fetos analisados (100% de sucesso). Em estudo recente envolvendo 21.074 fetos entre 11 e 13 semanas e 6 dias de gestação, a obtenção do perfil fetal não foi possível em apenas 243 casos (98,8% de sucesso)(4). A alta taxa de sucesso na obtenção do perfil fetal obtido em nosso estudo se deve, em parte, ao relativo pequeno número de gestantes avaliadas.

Em nosso estudo observou-se que a média do comprimento do osso nasal aumentou em função da idade gestacional, variando de 1,69 mm a 2,94 mm. Em nomograma determinado para a população coreana, Moon et al.(9) obtiveram variação média de 1,5 mm a 2,1 mm no comprimento do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação. Em estudo multicêntrico conduzido por Orlandi et al.(14), o comprimento do osso nasal variou de 2,48 mm, com CCN de 45 mm, para 3,12 mm, com CCN de 84 mm. Em relação aos percentis, observou-se que o comprimento do osso nasal variou de 1,0 mm (percentil 2,5%) a 3,7 mm (percentil 97,5%) entre 11 e 14 semanas de gestação. No estudo realizado por Sonek et al.(5), com 3.537 gestantes de diferentes grupos raciais, o comprimento do osso nasal variou de 1,3 mm (percentil 2,5%) a 5,7 mm (percentil 97,5%) no mesmo período de idade gestacional. Esses resultados levam à conclusão de que os fatores étnicos e raciais são muito importantes na avaliação do osso nasal, de modo que há a necessidade de se controlar esses fatores quando da inclusão da avaliação do osso nasal no screening de trissomia 21 no primeiro trimestre de gestação.

Observou-se também, no nosso estudo, que houve crescimento linear do comprimento do osso nasal em função da idade gestacional, resultado semelhante aos obtidos por Moon et al.(9) e Chen et al.(8) nas populações coreana e chinesa, respectivamente. No estudo realizado por Sonek et al.(5), estes autores obtiveram uma regressão polinomial de segunda ordem (R² = 0,77) como melhor correlação entre o comprimento do osso nasal e a idade gestacional, entretanto, eles avaliaram o comprimento do osso nasal entre 11 e 40 semanas, e não somente entre 11 e 14 semanas.

O comprimento do osso nasal foi fortemente correlacionado com todos os parâmetros antropométricos fetais, principalmente com o CCN. Os nomogramas do comprimento do osso nasal entre 11 e 14 semanas de gestação publicados até o momento também mostram essa forte correlação(8,9). Este achado comprova ser o comprimento do osso nasal um parâmetro de avaliação do crescimento fetal.

 

CONCLUSÕES

Apesar de ser um estudo preliminar, acreditamos que este tenha sido de grande importância por ser pioneiro na avaliação do osso nasal entre 11 e 15 semanas de gestação na população brasileira.

Nossos resultados preliminares mostraram que as medidas do comprimento do osso nasal foram muito diferentes de outros grupos étnicos, e ao mesmo tempo, sabe-se que a população brasileira apresenta grande diversidade étnica e racial.

Portanto, tornam-se necessários novos estudos multicêntricos com maiores casuísticas para que se possa incluir o comprimento do osso nasal no screening da trissomia 21.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
Dr. Edward Araujo Júnior
Rua Carlos Weber, 950, ap. 113 Visage, Alto da Lapa
São Paulo, SP, Brasil, 05303-000
E-mail: araujojred@terra.com.br

Recebido para publicação em 14/6/2007. Aceito, após revisão, em 24/7/2007.

 

 

* Trabalho realizado no Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), São Paulo, SP, Brasil.


 
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