Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 41 nº 1 - Jan. / Fev.  of 2008

QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?
Print 

Page(s) IX to XI



Qual o seu diagnóstico?

Autho(rs): Daniella Ferraro Fernandes Costa, Luiz Tenório de Brito Siqueira, Marcelo Bordalo-Rodrigues

PDF Português      

PDF English

Texto em Português English Text

Paciente do sexo masculino, três anos de idade, com queixa de dor no membro inferior esquerdo há um mês, sem outros sintomas associados.

Descrição das imagens

Figura 1. Lesão lítica de contornos parcialmente bem definidos, de localização central no terço proximal/médio da diáfise femoral. Observa-se reação periosteal lamelar em "casca de cebola".

 

 

Figura 2. Lesão diafisária com hipossinal na ponderação em T1 e hipersinal na seqüência T2 com saturação de gordura. Observa-se hipersinal da região medular proximal adjacente à lesão. Nota-se também a reação periosteal lamelar. Observa-se, ainda, área de hipersinal nas partes moles ao redor da lesão, que corresponde a edema.

 

 

Figura 3. Lesão com hipossinal em T1, hipersinal em T2, notando-se erosão da cortical óssea posterior. Observam-se a reação periosteal lamelar e o edema de partes moles. Após a injeção do meio de contraste paramagnético observa-se intenso realce da lesão, periosteal e de partes moles.

 

 

Diagnóstico: Histiocitose de células de Langerhans.

 

COMENTÁRIOS

A histiocitose de células de Langerhans abrange um espectro de doenças caracterizado pela proliferação idiopática de histiócitos atípicos e formação de granulomas, resultando em manifestações focais ou sistêmicas(1).

O granuloma eosinofílico, também conhecido como a forma localizada da doença, apresenta acometimento restrito aos ossos ou pulmões. Corresponde a 70% dos casos de histiocitose das células de Langerhans e é a expressão mais benigna e favorável da doença(2,3).

Nesses casos, a histiocitose de células de Langerhans pode acometer qualquer osso, porém existe predileção pelos ossos chatos. As lesões ósseas do granuloma eosinofílico apresentam-se, mais da metade das vezes, como uma lesão lítica, com componente destrutivo. A reação periosteal e o padrão permeativo podem estar presentes, porém são menos freqüentes(4–6). A região mais acometida é o crânio, sendo que a calvária, preferencialmente na região parietal, é mais afetada que a base do crânio. A mandíbula também é local de envolvimento freqüente, assim como os arcos costais e a pelve(5).

Aproximadamente 25%–35% das lesões monostóticas acometem os ossos longos, principalmente o fêmur, o úmero e a tíbia, com maior freqüência na região diafisária (58%), seguida pela região metafisária (28%), metadiafisária (12%) e raramente epifisária (2%)(4,5,7).

A maior parte dos pacientes é assintomática, podendo ocorrer dor no local da lesão, edema e raramente fratura patológica(4). Febre e leucocitose também podem estar presentes. A histiocitose de células de Langerhans pode acometer pacientes de qualquer idade, porém é mais comum abaixo dos 15 anos, com leve predileção pelo sexo masculino(8).

Existem ainda duas outras síndromes clínicas que fazem parte do espectro da histiocitose de células de Langerhans: a doença de Hand-Schüller-Christian, forma crônica recorrente, corresponde a 15%–20% dos casos, acomete múltiplos ossos (predominantemente o crânio) e o sistema reticuloendotelial, e é habitualmente encontrada em crianças de um a cinco anos de idade, com predominância do sexo masculino. A forma fulminante da histiocitose de células de Langerhans, também conhecida como doença de Letterer-Siwe, corresponde a 10% dos casos e acomete crianças de até dois anos de idade, sem predileção por sexo. Há acometimento ósseo sistêmico e do sistema reticuloendotelial, com evolução rápida para disfunção de múltiplos órgãos(5,9,10).

Histologicamente, as três síndromes clínicas se caracterizam pela proliferação de células de Langerhans atípicas que, associadas a células polimorfonucleares, linfócitos e principalmente eosinófilos, levam à formação de granulomas. Na fase inicial da doença, encontram-se células de Langerhans agregadas, freqüentemente associadas a eosinófilos, porém estes não precisam estar presentes para o diagnóstico. Na fase crônica, os achados são de lesões com poucas células de Langerhans, com grande quantidade de fibrose, e os eosinófilos podem ou não estar presentes(11,12). A microscopia eletrônica mostra grânulos de Birbeck, que são estruturas citoplasmáticas exclusivas das células de Langerhans, e o diagnóstico definitivo é feito atualmente pela imuno-histoquímica, pela presença dos marcadores CD-1 e S-100(10,13).

Os achados de imagem óssea da histiocitose das células de Langerhans são bastante variáveis, podendo se manifestar com qualquer aparência radiográfica, às vezes mimetizando doenças malignas.

O método inicial de avaliação é a radiografia simples e a lesão mais característica é lítica, com margens bem ou mal definidas e destruição óssea, geralmente central, nos ossos planos ou na região diafisária dos ossos longos. A lesão pode destruir ou expandir a cortical e a reação periosteal geralmente é compacta, mas pode ser laminada nas crianças jovens.

A análise pela tomografia computadorizada permite a confirmação da lesão, determina a extensão da destruição cortical e o grau de envolvimento de partes moles. Além disso, é útil nos casos de lesões ósseas localizadas em regiões de anatomia complexa, como na mastóide, na articulação atlanto-axial e nos elementos posteriores dos corpos vertebrais(6,10).

A ressonância magnética possui alta sensibilidade, porém é pouco específica. As lesões ósseas do granuloma eosinofílico se apresentam com iso/hipossinal nas imagens ponderadas em T1 e hipersinal nas imagens ponderadas em T2, podendo haver realce após a injeção do meio de contraste. A ressonância também é útil para determinar a extensão do envolvimento da medula óssea e de partes moles(13,14).

Os fatores prognósticos mais importantes nesses casos são a idade de apresentação e a extensão da lesão, sendo pior o prognóstico nos pacientes menores que dois anos e nas lesões de grandes dimensões(15,16). A resolução espontânea da doença localizada óssea pode ocorrer em alguns casos.

O tratamento das lesões ósseas solitárias de ossos longos do granuloma eosinofílico é feito pela curetagem do local acometido e implantação de enxerto ósseo ou de polimetilmetacrilato ou injeção de corticóide(17).

Os diagnósticos diferenciais mais importantes em relação ao caso aqui apresentado são a osteomielite aguda e o sarcoma de Ewing(10,18).

A osteomielite apresenta alterações radiológicas a partir de 10 a 12 dias da instalação da doença e se manifesta, inicialmente, com edema de partes moles. Após 10 a 14 dias, observa-se área focal de rarefação mal definida na metáfise, com aspecto de saca-bocado da medular, que progride para destruição lítica e reação periosteal focal associada.

O sarcoma de Ewing acomete ossos planos e longos, é um tumor metadiafisário e a lesão característica é lítica, possui limites mal definidos, com invasão da cortical e reação periosteal que pode ser laminar, interrompida ou ter triângulo de Codman. Pode haver lesão esclerótica em 25% dos casos.

A diferenciação, nesses casos, é feita pela biópsia da lesão.

 

REFERÊNCIAS

1. Egeler RM, D'Angio GJ. Langerhans cell histiocytosis. J Pediatr. 1995;127:1–11.        [  ]

2. Mirra JM. Histiocytoses. In: Mirra JM, Picci P, Gold RH, editors. Bone tumors: clinical, radiologic, and pathologic correlations. Philadelphia: Lea & Febiger; 1989: p.1021–60.        [  ]

3. Mickelson MR, Bonfiglio M. Eosinophilic granuloma and its variations. Orthop Clin North Am. 1977;8:933–45.        [  ]

4. David R, Oria RA, Kumar R, et al. Radiologic features of eosinophilic granuloma of bone. AJR Am J Roentgenol. 1989;153:1021–6.        [  ]

5. Stull MA, Kransdorf MJ, Devaney KO. Langerhans cell histiocytosis of bone. RadioGraphics. 1992;12:801–23.        [  ]

6. Kilborn TN, Teh J, Goodman TR. Pediatric manifestations of Langerhans cell histiocytosis: a review of the clinical and radiological findings. Clin Radiol. 2003;58:269–78.        [  ]

7. Fowles JV, Bobechko WP. Solitary eosinophilic granuloma in bone. J Bone Joint Surg Br. 1970; 52:238–43.        [  ]

8. Broadbent V, Egeler RM, Nesbit ME Jr. Langerhans cell histiocytosis – clinical and epidemiological aspects. Br J Cancer Suppl. 1994;70:S11–6.        [  ]

9. Favara BE, Feller AC, Pauli M, et al. Contemporary classification of histiocytic disorders. The WHO Committee on Histiocytic Reticulum Cell Proliferations. Reclassification Working Group of the Histiocyte Society. Med Pediatr Oncol. 1997; 29:157–66.        [  ]

10. Azouz EM, Saigal G, Rodriguez MM, et al. Langerhans' cell histiocytosis: pathology, imaging and treatment of skeletal involvement. Pediatr Radiol. 2005;35:103–15.        [  ]

11. Basset F, Soler P, Hance AJ. The Langerhans' cell in human pathology. Ann NY Acad Sci. 1986;465: 324–39.        [  ]

12. Leonidas JC. Langerhans' cell histiocytosis. In: Taveras JM, Ferrucci JM, editors. Radiology: diagnosis, imaging, intervention. Philadelphia: Lippincott; 1990. p.1–9.        [  ]

13. Birbeck M, Breathnack A, Everall J. An electron microscope study of basal melanocytes and high-level clear cells (Langerhans cells) in vitiligo. J Invest Dermatol. 1961;37:51–63.        [  ]

14. Beltran J, Aparisi F, Bonmati LM, et al. Eosinophilic granuloma: MRI manifestations. Skeletal Radiol. 1993;22:157–61.        [  ]

15. Berry DH, Gresik MV, Humphrey GB, et al. Natural history of histiocytosis X: a Pediatric Oncology Group Study. Med Pediatr Oncol. 1986;14:1–5.        [  ]

16. Meyer JS, Harty MP, Mahboubi S, et al. Langerhans cell histiocytosis: presentation and evolution of radiologic findings with clinical correlation. RadioGraphics. 1995;15:1135–46.        [  ]

17. Hoover KB, Rosenthal DI, Mankin H. Langerhans cell histiocytosis. Skeletal Radiol. 2007;36: 95–104.        [  ]

18. Woertler K. Benign bone tumors and tumor-like lesions: value of cross sectional imaging. Eur Radiol. 2003;13:1820–35.        [  ]

 

 

Endereço para correspondência:
Dr. Marcelo Bordalo Rodrigues.
Avenida Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255.
São Paulo, SP, Brasil,05403-001.
E-mail: mbordalo@uol.com.br

 

 

* Trabalho realizado no Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InRad/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil.


 
RB RB RB
GN1© Copyright 2024 - All rights reserved to Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Av. Paulista, 37 - 7° andar - Conj. 71 - CEP 01311-902 - São Paulo - SP - Brazil - Phone: (11) 3372-4544 - Fax: (11) 3372-4554