CARTAS AO EDITOR
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Autho(rs): Lívia de Oliveira Antunes1; Rafael da Silveira Borges1; Wania Vasconcelos de Freitas1; Simone Rachid de Souza2; Diogo Goulart Corrêa3 |
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Sr. Editor,
Mulher, 76 anos, diabética e hipertensa em tratamento irregular, submetida a extração dentária, evoluindo com dor local e febre baixa persistente, mesmo em curso de antibioticoterapia oral, e nos meses seguintes com perdas dentárias contíguas ao local da extração. Tomografia computadorizada para pesquisa de acometimento ósseo mostrou tecido com densidade de partes moles, mal-delimitado, determinando erosões ósseas na maxila à esquerda, com extensão ao seio maxilar e fistulização para a região do palato. Biópsia da lesão demonstrou infiltrado inflamatório misto, com tecido de granulação, pela coloração por hematoxilina-eosina, e visualização de colônias de actinomicetos de permeio ao tecido ósseo, pelo método de Grocott, permitindo o diagnóstico de osteomielite por Actinomyces sp. (Figura 1). Figura 1. Tomografia computadorizada dos seios da face com janela de parte moles (A) e com janela óssea (B), reconstruídas no plano coronal, mostrando lesão com densidade de partes moles erodindo a maxila, o assoalho do seio maxilar e o palato à esquerda, formando fístula da cavidade oral com a cavidade nasal e com o seio maxilar esquerdo. Reconstrução tridimensional da tomografia computadorizada (C) mostrando a erosão óssea no maxilar e palato à esquerda. Método de Grocott (D) demonstrando colônias de bactérias filamentosas de Actinomyces em meio a tecido ósseo (aumento: 400×). Actinomicose é uma infecção supurativa, crônica, causada pelo bacilo Gram-positivo Actinomyces, sendo a espécie Actinomyces israellii o agente mais comum em humanos, membro da flora endógena frequentemente encontrada nos dentes, orofaringe, trato gastrintestinal e trato genital feminino(1). O local mais comumente acometido é a região cervicofacial (50-65%), seguida pelo envolvimento torácico (15-30%) e abdominopélvico (20%). Entretanto, na região cervicofacial, a maxila é o local menos comum, ocorrendo em 0,5-9% dos casos na cabeça e pescoço. O envolvimento ósseo é ainda mais raro, podendo a osteomielite ser esporádica e/ou secundária a infecção dos sítios primários(2-4). Os fatores de risco para envolvimento cervicofacial compreendem higiene bucal inadequada, trauma da mucosa oral, amigdalite crônica, otites, mastoidites e osteonecrose induzida por radioterapia ou bifosfonados. É interessante salientar que, ao contrário do restante dos locais acometidos, as infecções cervicofaciais por Actinomyces sp. ocorrem mais comumente em pacientes com sistema imune íntegro(2,3). A doença costuma se apresentar com edema de partes moles e formação de massas e abscessos, na forma aguda, evoluindo, cronicamente, com disseminação da infecção para as partes moles adjacentes, sem respeitar os planos fasciais, exteriorizando-se por fístulas com a pele e seios paranasais. Entretanto, sua associação com osteomielite não é comumente observada(3). Radiologicamente, a doença apresenta-se, na tomografia computadorizada, como massa de limites imprecisos, com densidade de partes moles e realce pelo meio de contraste, associada a coleções e fístulas. O diagnóstico diferencial inclui úlcera por fungos, carcinoma, granuloma idiopático da linha média e osteomielite da maxila por outros germes(5). No exame histopatológico é caracterizada, na coloração por hematoxilina-eosina, por abscesso crônico com leucócitos polimorfonucleares, tecido de granulação e fibrose, e pelo método de Grocott, pelo achado de colônias de bacilos, formando “grânulos de enxofre”, que representam filamentos emaranhados de Actinomyces, presentes nos abscessos, exsudatos do trato sinusal ou tecidos infiltrados pelas lesões(3,6). A droga de escolha para o tratamento é a penicilina G, sendo necessário longos cursos de antibioticoterapia. Reserva-se o manejo cirúrgico para drenagem de abscessos volumosos, marsupialização de tratos sinusais crônicos, excisão de lesão fibrótica e/ou desbridamento de tecido ósseo necrótico(2). Portanto, apesar da raridade, é importante ter em mente como diagnóstico diferencial a actinomicose na maxila, principalmente frente a lesões agressivas na boca, relacionadas aos fatores predisponentes supracitados. REFERÊNCIAS 1. Crossman T, Herold J. Actinomycosis of the maxilla - a case report of a rare oral infection presenting in general dental practice. Br Dental J. 2009;206:201-2. 2. Valour F, Sénéchal A, Dupieux C, et al. Actinomycosis: etiology, clinical features, diagnosis, treatment, and management. Infect Drug Resist. 2014;7:183-97. 3. Heo SH, Shin SS, Kim JW, et al. Imaging of actinomycosis in various organs: a comprehensive review. Radiographics. 2014;34:19-33. 4. Sezer B, Akdeniz BG, Günbay S, et al. Actinomycosis osteomyelitis of the jaws: report of four cases and a review of the literature. Journal of Dental Sciences. 2017;12:301-7. 5. Meethal AC, Pattamparambath M, Balan A, et al. Actinomycotic osteomyelitis of the maxilla - a delusive presentation. J Clin Diagn Res. 2016;10:ZJ01-3. 6. Elder DE, Elenitsas R, Johnson BL Jr, et al. Lever''s histopathology of the skin. 10th ed. Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2009. 1. Hospital Casa de Portugal, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 2. Hospital Federal do Andaraí, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 3. Hospital Casa de Portugal e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil Correspondência: Dra. Lívia de Oliveira Antunes Rua Gustavo Sampaio, 88, ap. 902, Leme Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 22010-010 E-mail: li_antunes@hotmail.com |