Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 48 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2015

QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?
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Page(s) XI to XIII



Qual o seu diagnóstico?

Autho(rs): Ricardo Schwingel1; Stenio Bruno Leal Duarte1; Mariana Mari Oshima1; João Vitor do Amaral Mesquita1; Fabiano Reis2

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Paciente do sexo feminino, 23 anos de idade, com quadro clínico de cefaleia e vômitos incoercíveis há quatro meses. Foi realizada ressonância magnética do encéfalo e da medula espinhal (Figura 1).


Figura 1. (A-D): Ressonância magnética do encéfalo, imagens coronal ponderada em T1 com saturação de gordura, após a administração intravenosa do agente de contraste paramagnético (gadolínio) (A), coronal ponderada em T2 (B), axial DWI/difusão (C), axial mapa de ADC (D). E,F: Ressonância magnética da medula espinal, imagens sagital ponderada em T2 (E) e sagital ponderada em T1 com saturação de gordura, após a administração de contraste (F).



Descrição das imagens

Figura 1. A-D: Ressonância magnética do encéfalo. Imagem coronal ponderada em T1 após contraste (A) mostra duas lesões cerebelares (a maior no vérmis e a menor na região hemisférica superior direita), com realce nodular difuso após contraste da lesão menor e no componente sólido excêntrico da lesão maior, isointenso em T2 (B). O componente cístico da lesão maior apresenta crescimento para a porção inferior do quarto ventrículo. Há foco de facilitação à difusão, caracterizado por hipossinal na difusão (C) e hipersinal no mapa de ADC (D). E,F: Ressonância magnética de medula espinal. As imagens sagitais ponderadas em T2 (E) e em T1 após o contraste (F) mostram duas lesões ovaladas na região da medula cervical, com hipersinal em T2 e com realce após contraste na altura de C4 e C6.

Diagnóstico: Hemangioblastomas múltiplos, associação com a síndrome de von Hippel-Lindau.


COMENTÁRIOS

A avaliação do sistema nervoso central por métodos de imagem, especialmente a ressonância magnética, tem sido motivo de uma série de publicações recentes na literatura radiológica nacional(1-9).

Os principais diagnósticos diferenciais de lesões cerebelares com as características radiológicas deste caso incluem hemangioblastomas, metástases e o astrocitoma pilocítico. A multiplicidade das lesões favorece as duas primeiras hipóteses. A faixa etária da paciente é compatível com hemangioblastoma, considerando que o astrocitoma pilocítico acomete pacientes pediátricos e as metástases seriam esperadas em pacientes mais velhos. Além disso, a falta de lesões supratentoriais favorece a hipótese de hemangioblastomas em relação às metástases, principalmente no caso de lesões múltiplas, considerando que a disseminação neoplásica hematogênica menos provavelmente acometeria apenas a região infratentorial por causa do maior fluxo sanguíneo para a região supratentorial(10).

A hipótese de hemangioblastomas múltiplos deve levar à consideração de associação com a síndrome de von Hippel-Lindau, que é uma rara síndrome autossômica dominante de câncer familiar, relacionada à inativação de um gene supressor tumoral localizado no cromossomo 3p(11,12).

Sua incidência é estimada em 1:36.000 indivíduos, com penetrância superior a 90% após os 65 anos. Os tumores característicos da síndrome incluem hemangioblastomas do sistema nervoso central e retina, carcinoma renal de células claras, feocromocitoma, tumor do saco endolinfático, cistos pancreáticos, cistadenomas papilares do epidídimo e do ligamento largo(11).

Os critérios diagnósticos incluem: 1) mais de um hemangioblastoma do sistema nervoso central; 2) um hemangioblastoma do sistema nervoso central e uma manifestação visceral da síndrome de von Hippel-Lindau; 3) qualquer manifestação relacionada associada a história familiar de síndrome de von Hippel-Lindau.

O hemangioblastoma é o tumor mais frequente nesta síndrome, afetando 60% a 80% dos portadores. A idade média de apresentação é de 33 anos. Os sintomas variam conforme a localização da lesão, mas podem manifestar-se cefaleia, emese, hiperreflexia, ataxia, vertigem, dismetria e perda de força muscular(11,12). Pode haver policitemia associada, pois uma parcela dos hemangioblastomas produz eritropoetina(10,11).

A expectativa de vida média é de 49 anos(12). As causas mais frequentes de óbito são o carcinoma renal de células claras e complicações neurológicas de hemangioblastomas cerebelares, de forma que diversas instituições preconizam, com protocolos variados, rastreamentos periódicos com exames de imagem para pacientes assintomáticos com a síndrome de von Hippel-Lindau(11,12).

Hemangioblastomas são lesões altamente vascularizadas, frequentemente císticas, com um nódulo mural. Comumente são benignos, multifocais e associados a edema ou cistos ao longo do neuroeixo, que são formados a partir da transudação do componente sólido da lesão, com conteúdo altamente proteico e por isso levemente mais hiperintenso que o líquor normal e bastante hiperintenso em T2(10). Geralmente mostram hipo/isossinal nas imagens ponderadas em T1 e hipersinal nas imagens ponderadas em T2, com realce da porção sólida após o contraste em T1, podendo apresentar áreas tubulares de flow void, quando nutridos ou drenados por vasos calibrosos. São tipicamente infratentoriais.

Apenas 5% a 30% dos hemangioblastomas cerebelares são atribuídos à síndrome de von Hippel-Lindau, enquanto 80% dos hemangioblastomas medulares estão associados a essa síndrome. Nestes casos, ocorrem em idade mais precoce e têm pior prognóstico(12).

Na difusão, pode ocorrer facilitação à difusão (hipossinal em DWI e hipersinal no mapa de ADC), o que, em uma lesão infratentorial, é bastante sugestivo do diagnóstico de hemangioblastoma(13).

A paciente foi reconvocada para prosseguimento da investigação e foram encontrados múltiplos cistos pancreáticos na tomografia de abdome.


REFERÊNCIAS

1. Ono SE, Carvalho Neto A, Gasparetto EL, et al. Adrenoleucodistrofia ligada ao X: correlação entre o escore de Loes e parâmetros do tensor de difusão. Radiol Bras. 2014;47:342-9.

2. Santana PC, Mourão AP, Oliveira PMC, et al. Dosimetria de pacientes submetidos a exames de PET/CT cerebral para diagnóstico de comprometimento cognitivo leve. Radiol Bras. 2014;47:350-4.

3. Castro FD, Reis F, Guerra JGG. Lesões expansivas intraventriculares à ressonância magnética: ensaio iconográfico - parte 1. Radiol Bras. 2014;47:176-81.

4. Castro FD, Reis F, Guerra JGG. Lesões expansivas intraventriculares à ressonância magnética: ensaio iconográfico - parte 2. Radiol Bras. 2014;47:245-50.

5. Carneiro Filho O, Vilela Filho O, Ragazzo PC, et al. Um novo método para a localização intraoperatória de foco de epilepsia mediante utilização de gamaprobe. Radiol Bras. 2014;47:23-7.

6. Carvalho GBS, Sandim GB, Tibana LAT, et al. Diagnóstico diferencial das lesões inflamatórias e infecciosas do cone medular utilizando a ressonância magnética. Radiol Bras. 2013;46:51-5.

7. Fiore L, Silva Junior NA, Bertanha R, et al. Fístula arteriovenosa dural intracraniana. Radiol Bras. 2013;46(4):xi-xii.

8. Reis F, Schwingel R, Nascimento FBP. Linfoma do sistema nervoso central: ensaio iconográfico. Radiol Bras. 2013;46:110-6.

9. Brandão LA. Linfoma primário e secundário do sistema nervoso central. Aspectos de imagem na ressonância magnética convencional e funcional. Radiol Bras. 2013;46(2):ix-x.

10. Ho VB, Smirniotopoulos JG, Murphy FM, et al. Radiologic-pathologic correlation: hemangioblastoma. AJNR Am J Neuroradiol. 1992;13:1343-52.

11. Kim JJ, Rini BI, Hansel DE. Von Hippel Lindau syndrome. Adv Exp Med Biol. 2010;685:228-49.

12. Leung RS, Biswas SV, Duncan M, et al. Imaging features of von Hippel-Lindau disease. Radiographics. 2008;28:65-79.

13. Quadery FA, Okamoto K. Diffusion-weighted MRI of haemangioblastomas and other cerebellar tumours. Neuroradiology. 2003;45:212-9.










1. Médicos Residentes do Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCMUnicamp), Campinas, SP, Brasil
2. Doutor, Docente Responsável pelo Setor de Neurorradiologia, Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Fabiano Reis
Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (HC-Unicamp)
Rua Vital Brasil, 251, Cidade Universitária Zeferino Vaz
Campinas, SP, Brasil, 13083-888
E-mail: fabianoreis2@gmail.com
 
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