Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 46 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2013

ENSAIO ICONOGRÁFICO
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Page(s) 372 to 375



Apresentações típicas e atípicas de mucocele dos seios paranasais na tomografia computadorizada

Autho(rs): Bruna Vilaça de Carvalho1; Izabella de Campos Carvalho Lopes1; James de Brito Corrêa1; Laura Filgueiras Mourão Ramos2; Emília Guerra Pinto Coelho Motta2; Renata Lopes Furletti Caldeira Diniz2

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Texto em Português English Text

Descritores: Seios paranasais; Mucocele; Apresentação; Atípica.

Keywords: Paranasal sinuses; Mucocele; Presentation; Atypical.

Resumo:
As mucoceles são formações císticas que podem afetar os seios paranasais. Ocorrem quando há obstrução na drenagem de um seio, com resultante acúmulo de secreção. Os seios frontal e etmoidal são os mais acometidos. A apresentação clínica normalmente tem sintomas insidiosos que variam com a extensão da região acometida. O tratamento é cirúrgico, sendo a cirurgia endoscópica o método de escolha na maioria dos casos. O objetivo do nosso estudo é descrever as principais características das mucoceles dos seios paranasais, bem como demonstrar e ilustrar uma série de apresentações atípicas, com ênfase nos achados de imagem.

Abstract:
Mucoceles are cystic masses that generally affect the sinuses. It occurs as a result from obstruction of the ostium of a sinus and consequential accumulation of mucus. Frontal and ethmoid sinuses are mostly affected. Usually, the clinical symptoms are insidious, varying with the extent of the affected region. The treatment is surgical and endoscopic surgery is the method of choice in most cases. The present study is aimed at describing the main characteristics of paranasal sinuses mucoceles, demonstrating and illustrating a series of atypical presentations with emphasis on imaging findings.

INTRODUÇÃO

As mucoceles dos seios paranasais são formações císticas benignas, expansivas, revestidas de epitélio do tipo respiratório, resultantes do acúmulo e retenção de secreção mucosa, ocorrendo quando a drenagem do seio é obstruída(1,2). São lesões raras dos seios paranasais, porém, constituem a mais comum afecção expansiva desses seios(2).

Apesar de benigna, o caráter expansivo da mucocele poderá ocasionar erosão dos limites ósseos dos seios paranasais(3) por compressão e consequente reabsorção óssea, levando ao comprometimento de estruturas adjacentes, sendo de grande importância o diagnóstico precoce(1). Sua incidência é maior entre a terceira e quarta décadas de vida, podendo ocorrer em qualquer faixa etária. Não se observa predominância entre os sexos. São raramente observadas na população pediátrica, exceto em pacientes que apresentam fatores predisponentes para obstrução como trauma, cirurgia, lesão expansiva, sinusite crônica, alergia ou fibrose cística(1-3).

As mucoceles ocorrem primariamente nos seios frontais (60% a 65%)(2), mas também são encontradas nos seios etmoidais (20% a 25%), maxilares (10%) e esfenoidais (1% a 2%)(1,3,4). Por vezes, não se pode determinar o sítio primário da mucocele por causa da progressiva osteólise das paredes ósseas adjacentes, com destruição de importantes parâmetros anatômicos, além de velamento em outros seios por obstrução da drenagem destes(3).

Este ensaio iconográfico tem por objetivo descrever as principais características das mucoceles dos seios paranasais, bem como demonstrar e ilustrar uma série de apresentações atípicas, com ênfase nos achados de imagem.


PATOGÊNESE

A etiologia exata e a patogênese das mucoceles permanecem incertas. Elas podem se desenvolver quando a comunicação entre os seios e a cavidade nasal está obstruída(3,5).

Usualmente, as mucoceles são complicações pós-inflamatórias (alergia, infecção crônica, estado inflamatório crônico, disfunção mucociliar), mas menos comumente podem ser secundárias a obstrução neoplásica (osteoma, nasoangiofibroma juvenil, carcinoma), processos pós-operatórios (procedimento de Caldwell-Luc) e póstraumáticos (iatrogênicos, acidentes), geralmente com longa evolução(2,4).


QUADRO CLÍNICO

O quadro clínico varia conforme a região envolvida, normalmente com sintomas insidiosos e curso lento, podendo causar dor facial, cefaleia, pressão facial, obstrução nasal, dor dental, alterações oftalmológicas e dacriocistite. Quando a mucocele se torna infectada, denomina-se mucopiocele, podendo cursar com sinusite, celulite orbitária, eritema, febre e dor. Em raros casos, pode existir extensão intracraniana com meningite, abscesso subdural ou cerebral, pneumoencéfalo ou fístula liquórica(2).


ASPECTOS DE IMAGENS

As mucoceles podem ser diagnosticadas por meio de tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) e sugeridas por radiografia de seios da face.

A TC proporciona informação bem detalhada sobre a estrutura óssea, sendo considerada o método complementar de escolha(2,4). A mucocele aparece, usualmente, como uma opacidade do seio, isodensa/discretamente hiperdensa em relação ao tecido cerebral (Figura 1), mas se houver infecção aguda, ela pode aparecer mais densa e com realce periférico pelo contraste(3). Assim, é possível fazer o diagnóstico diferencial com neoplasias, já que a mucocele não sofre nenhum realce(1). O arcabouço ósseo adjacente encontra-se remodelado com áreas de espessamento e erosão(3). Pode-se notar, ainda, sua herniação para estruturas próximas, nos pontos de maior fragilidade(4).


Figura 1. TC com reconstrução coronal mostrando conteúdo ligeiramente hiperdenso em relação ao tecido cerebral, no interior do seio frontal esquerdo, com herniação para a cavidade orbitária.



A RM auxilia na identificação da relação da mucocele com o tecido cerebral, órbita e partes moles (Figura 2)(5). Apesar de não oferecer muitos detalhes ósseos, é útil para descartar neoplasias em casos de grandes mucoceles. Seu uso não é rotineiro, sendo recomendada nas seguintes situações: TC mostrando presença de erosão óssea, mucocele estendendo-se para fora do seio e perda parcial ou total da visão(1).


Figura 2. RM em imagem coronal mostrando lesão expansiva ocupando o seio frontal esquerdo com extensão para a cavidade orbitária.



A interpretação da RM em relação à aparência radiológica da mucocele depende do tempo de evolução. Inicialmente, o conteúdo será predominantemente aquoso, de modo que a imagem será hipointensa em T1 e hiperintensa em T2. Com o decorrer do tempo, pode aumentar o teor de proteína, resultando em imagens hiperintensas tanto em T1 quanto em T2.

O diagnóstico diferencial das mucoceles é feito com inúmeras condições inflamatórias, congênitas, císticas e neoplásicas, tais como cisto de Rathke, cisticercose, cisto dermoide, adenoma hipofisário, craniofaringioma, glioma óptico, além de lesões neoplásicas da base do crânio, seios da face e nasofaringe(1). Vale ressaltar a diferenciação entre mucocele e cisto de retenção: a primeira se desenvolve a partir da obstrução de um óstio do seio, sendo a cavidade completamente preenchida e com parede composta pela mucosa sinusal, e o segundo não preenche completamente a cavidade e tem em sua formação o epitélio do ducto e a cápsula da glândula.


APRESENTAÇÕES ATÍPICAS

As mucoceles dos seios paranasais podem se manifestar em localizações atípicas, como no ducto lacrimonasal, na célula intersinus, nas conchas nasais, em associação com osteoma e hematoma, entre outras.

O acometimento do ducto lacrimonasal é uma localização incomum encontrada principalmente na população pediátrica e é causa incomum de obstrução nasal e desconforto respiratório. A mucocele do ducto lacrimonasal ocorre quando este se encontra obstruído, impedindo o fluxo normal de lágrimas, resultando em massa no canto medial da órbita (Figuras 3 a 6). Pacientes com mucocele do ducto lacrimonasal tipicamente apresentam a seguinte tríade imaginológica: a) massa no canto medial que representa um saco lacrimal alargado; b) canal ósseo lacrimonasal alargado secundário a tecidos moles que alargam o ducto lacrimonasal; c) massa intranasal que representa a extensão inferior da mucocele(6).


Figura 3. TC com reconstrução coronal identificando massa no canto medial à esquerda com erosão da parede da órbita ipsilateral. Observa-se ainda obstrução parcial da fossa nasal inferior por tecido mole, que pode representar a extensão inferior da mucocele.


Figura 4. TC com corte axial demonstrando lesão expansiva na localização do ducto lacrimonasal esquerdo.


Figura 5. TC com reconstrução sagital mostrando lesão expansiva na localização do ducto lacrimonasal esquerdo.


Figura 6. TC com reconstrução coronal não revelando realce significativo da lesão do ducto lacrimonasal esquerdo.



A sua forma associada ao osteoma é uma raridade, tendo sido relatados apenas 21 casos quando há extensão intracraniana. O osteoma é considerado a lesão primária e a mucocele, secundária. O diagnóstico, na maioria dos casos, é baseado em sintomas clínicos associados a extensão intraorbital ou intracraniana (Figuras 7 e 8)(7).


Figura 7. TC com reconstrução coronal para estruturas ósseas demonstrando osteoma em seio frontal esquerdo e descontinuidade da parede superolateral da órbita.


Figura 8. TC com reconstrução coronal para partes moles. Lesão no interior do seio frontal esquerdo com extensão para a cavidade orbitária.



Pode ainda ocorrer após eventos traumáticos, sendo importante a sua diferenciação quando coexiste com um hematoma. Nesses casos, pode-se observar densidade maior do hematoma em relação à mucocele (Figura 9).


Figura 9. TC com corte axial. Nota-se maior densidade no hematoma posterior quando comparado à mucocele intraorbitária anterior à esquerda.



A célula intersinus é definida como uma pneumatização dentro da linha mediana ou lamela óssea (septo) paramediana entre os seios frontais. Pode ser formada uma mucocele suficientemente grande em seu interior para bloquear unilateralmente o fluxo de saída do seio frontal, ou pode aumentar e formar uma mucocele gigante envolvendo ambos os seios frontais. Tal mucocele geralmente corrói as tábuas anterior e/ou posterior dos seios (Figura 10)(8).


Figura 10. TC com reconstrução coronal. Tecido mole no interior da célula intersinus.



A pneumatização da concha média se dá como um prolongamento das células etmoidais, que se estendem pela via superior ou através do recesso frontal. O interior da concha bullosa é forrado pelo epitélio respiratório e geralmente drena para o meato médio. Em caso de obstrução de sua drenagem, pode evoluir com infecção ou formação de mucocele (Figuras 11 a 14)(9).


Figura 11. TC com reconstrução coronal para estruturas ósseas. Aumento volumétrico da concha nasal média direita secundário à presença de mucocele no interior da pneumatização da concha.


Figura 12. TC com reconstrução sagital. Aumento volumétrico da concha nasal média direita secundário à presença de mucocele no interior da pneumatização da concha.


Figura 13. TC com corte axial. Aumento volumétrico da concha nasal média direita secundário à presença de mucocele no interior da pneumatização da concha.


Figura 14. TC com reconstrução coronal para partes moles. Aumento volumétrico da concha nasal média direita secundário à presença de mucocele no interior da pneumatização da concha.



TRATAMENTO

O tratamento das mucoceles é cirúrgico, visando o restabelecimento da drenagem do seio, sendo que a via de acesso pode ser por métodos convencionais (transcraniana e transeptal) ou por endoscopia nasal(1,2). A cirurgia endoscópica é considerada, atualmente, o tratamento de escolha das mucoceles de seios paranasais(2). Seu principal objetivo consiste na completa remoção da lesão e da mucosa sinusal, prevenindo, assim, a recorrência. A TC ou a RM podem ser necessárias, somente se houver suspeita de recorrência(1).


CONCLUSÃO

É importante conhecer as características comuns e as formas atípicas da apresentação da mucocele para o correto diagnóstico e tratamento das lesões sinusais e extrassinusais e assim evitar eventuais complicações clínicas, per e pós-operatórias.


REFERÊNCIAS

1. Tinoco P, Pereira JC, Lourenço Filho RC, et al. Tratamento nasoendoscópico da mucocele de seio esfenoidal. Arq Int Otorrinolaringol. 2009;13:336-9.

2. Marambaia O, Gomes AM, Marambaia PP, et al. Tratamento endoscópico das mucoceles frontoetmoidais. Rev Bras Otorrinoloaringol. 2008;74(Supl).

3. Price HI, Batnitzky S, Karlin CA, et al. Computed tomography of benign disease of the paranasal sinuses. Radiographics. 1983;3:107-40.

4. Towbin R, Dunbar JS. The paranasal sinuses in childhood. Radiographics. 1982;2:253-79.

5. Cavazza S, Bocciolini C, Laudadio P, et al. Two anomalous localizations of mucocele: clinical presentation and retrospective review. Acta Otorhinolaryngol Ital. 2007;27:208-11.

6. Koch BL. Case 73: Nasolacrimal duct mucocele. Radiology. 2004;232:370-2.

7. Sakamoto H, Tanaka T, Kato N, et al. Frontal sinus mucocele with intracranial extension associated with osteoma in the anterior cranial fossa. Neurol Med Chir. 2011;51:600-3.

8. Som PM, Lawson W. Interfrontal sinus septal cell: a cause of obstructing inflammation and mucoceles. AJNR Am J Neuroradiol. 2008;29:1369-71.

9. Sala CR, Fuster MA, Molina JV, et al. Mucocele de concha bullosa con afectación orbitaria. Acta Otorrinolaringol Esp. 2002;53:46-9.










1. Médicos Residentes do Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Médicas Radiologistas do Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Bruna Vilaça de Carvalho
Rua Pernambuco, 753, Savassi
Belo Horizonte, MG, Brasil, 30130-151
E-mail: brunavilaca@gmail.com

Recebido para publicação em 23/11/2012.
Aceito, após revisão, em 5/4/2013.

Trabalho realizado no Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais / Hospital Mater Dei, Belo Horizonte, MG, Brasil.
 
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