ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Priscila Silveira Salvadori1; Danilo Manuel Cerqueira Costa2; Ricardo Francisco Tavares Romano2; Breno Vitor Tomaz Galvão2; Rodrigo da Fonseca Monjardim2; Elisa Almeida Sathler Bretas3; Lucas Torres Rios3; David Carlos Shigueoka4; Rogerio Pedreschi Caldana5; Giuseppe D'Ippolito6 |
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Descritores: Tomografia computadorizada por raio X; Radiação ionizante; Estadiamento de neoplasias; Abdome agudo. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
O número de exames de tomografia computadorizada (TC) realizados anualmente tem apresentado crescimento contínuo desde o início da utilização deste método na prática clínica, principalmente pelo aumento no número de indicações para a sua realização(1). Esse crescimento vem determinando importante aumento da dose de radiação média individual por ano nos Estados Unidos(2). Recentemente, foi demonstrado que a dose de radiação média recebida por indivíduo por ano, secundària a cuidados médicos, e principalmente decorrente do uso da TC, ultrapassou a dose recebida decorrente de fatores ambientais(3). Em decorrência destes fatos, existe uma preocupação crescente da comunidade médica, dos pacientes e mesmo das empresas produtoras de equipamentos em relação ao controle da dose de radiação proveniente do uso dos diversos exames radiológicos(3,4). Nesse contexto, vêm sendo estudadas diversas formas de se reduzir a dose de radiação em exames tomográficos, e entre elas, a redução do numero de fases de aquisição da imagem(5). Essas estratégias, quando aplicadas em conjunto, determinam expressiva redução da dose de radiação à qual o paciente é exposto, limitando assim a potencial ocorrência de efeitos deletérios relacionados à radiação ionizante(6). Diversos estudos foram realizados para avaliar a redução da dose por meio da diminuição da quantidade de fases de aquisição de imagens na TC de abdome e pelve(7-11), procurando não interferir na sua acurácia diagnóstica. Entre as fases que poderiam ser suprimidas está a fase de equilíbrio(8-10), que é adquirida cerca de três a cinco minutos após a injeção do meio de contraste e representa o período de tempo aproximado que a concentração do meio de contraste do plasma se assemelha ou se iguala à do interstício(12). Existem alguns estudos que estabelecem indicações específicas para a realização da fase de equilíbrio(13,14), porém, frequentemente tem-se utilizado a fase de equilíbrio de maneira indiscriminada, na rotina da maioria dos exames contrastados de abdome(15,16). O uso destes protocolos de exame tem implicações relacionadas não somente à dose de radiação, mas também ao tempo de exame e ao consumo do tubo de raios X(17), e somente seria justificado se agregasse informações complementares para se estabelecer um diagnóstico preciso. Diante das considerações supracitadas, desenvolvemos esta pesquisa com o objetivo de avaliar a necessidade da realização da fase de equilíbrio em diversas indicações e em quais destas ela pode ser suprimida nos protocolos de TC de abdome e pelve. MATERIAIS E MÉTODOS Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição, sendo dispensada a aplicação do termo de consentimento livre e esclarecido. Foi realizado estudo retrospectivo, transversal e observacional, avaliando-se 219 exames consecutivos de TC de abdome e pelve realizados entre agosto e outubro de 2011, em um hospital universitário. Os critérios de inclusão foram: pacientes maiores de 18 anos com indicação médica para a realização de TC de abdome e pelve com o uso do meio de contraste por via intravenosa. Os critérios de exclusão foram: a) contraindicação ao meio de contraste iodado; b) exames com injeção inadequada do meio de contraste ou com artefatos que impedissem a sua interpretação; c) exames cujo protocolo de estudo não inclui de rotina as fases com o uso intravenoso do meio de contraste (ex.: pesquisa de urolitíase); d) angiografia por TC dos vasos abdominais. Além disso, foram excluídos do trabalho pacientes cuja indicação para realização do exame era pesquisa de carcinoma hepatocelular, avaliação de nódulo de adrenal e urografia por TC, por entendermos que para estas indicações a fase de equilíbrio ainda está bem estabelecida e justificada(18-21). Dos 219 pacientes avaliados, 101 (46,1%) eram do sexo masculino e 118 (53,9%), do sexo feminino. A média de idade foi 55,5 anos, variando entre 18 e 88 anos. Do total, 37,0% dos exames eram de pacientes encaminhados de pronto-socorro, 24,7% de pacientes internados e 38,3% de pacientes ambulatoriais. Todos os exames foram realizados em aparelho de TC modelo Brilliance 64®(Philips Medical Systems; Best, Holanda), seguindo-se protocolos de estudo que constam do manual de rotina de procedimentos do Serviço de Tomografia Computadorizada do Departamento de Diagnóstico por Imagem. Os exames foram realizados do diafragma até a sínfise púbica, antes e após a injeção intravenosa do meio de contraste iodado hidrossolúvel. A injeção foi feita utilizando-se bomba injetora automática, na velocidade de 3-4 ml/s, em volume de 1-2 ml/kg de peso, com volume máximo de 150 ml, e detecção da fase arterial e/ou portal mediante rastreamento automático sustentado (Bolus Traking - ScanTools Pro®). Os parâmetros técnicos incluíam colimação de 64 x 0,625 mm, voltagem de 120 kVp, pitch de 0,891, espessura de reconstrução de 3,0 mm. A dose de radiação foi controlada mediante modulação automática da dose absorvida, disponível no equipamento de TC, tendo sido transcrita para a base de dados do relatório gerado pelo próprio aparelho no final de cada exame. Os valores são expressos em DLP (dose length product), que representa a dose de radiação de um corte de TC multiplicada pela extensão do estudo(22). A dose de radiação efetiva (estima o risco total de indução de efeitos estocásticos decorrentes da exposição à radiação em um órgão irradiado) pode ser estimada multiplicando-se o DLP por um fator de correção em função da região anatômica estudada. O fator de correção utilizado para cálculo da dose efetiva (expressa em mSv) em estudos tomográficos da região abdominal varia de 0,015 a 0,018, de acordo com diversos autores(22,23). No presente estudo utilizamos um fator de correção de 0,016 para estimar a dose de radiação efetiva. Em função da indicação clínica e do protocolo de estudo adotado, as imagens foram adquiridas antes da injeção intravenosa do meio de contraste, correspondendo à fase sem contraste e após a injeção do meio de contraste, nas fases de contrastação arterial (15-30 segundos após o início da administração do meio de contraste), fase portal (60-80 segundos após o início da administração do meio de contraste) e fase de equilíbrio (3-5 minutos após o início da administração do meio de contraste). O meio de contraste administrado por via oral ou por via retal foi utilizado quando indicado pelo protocolo institucional. Por exemplo, em casos de apendicite e diverticulite o exame inicia-se com contraste introduzido por via retal e apenas com uma fase sem contraste (nestas circunstâncias os exames não foram incluídos no estudo); apenas quando esta fase do exame é inconclusiva, acrescentamos as fases portal e de equilíbrio (nestes casos, os exames foram incluídos no estudo). A interpretação dos exames e a coleta dos dados foram organizadas e registradas em planilha do Microsoft® Office Excel 2003. Todos os exames foram interpretados de maneira digital em estação de trabalho Synapse® PACS/3D (FujiFilm; EUA) por um radiologista dentre os cinco que compunham a equipe, com experiência de 3 a 21 anos em radiologia do abdome, que emitiram parecer baseado, inicialmente, apenas na fase sem contraste e nas fases iniciais após a injeção do meio de contraste (fase arterial e/ou fase portal), sem avaliar a fase de equilíbrio. Essa análise foi denominada "primeira análise". Em seguida, foi feita nova leitura combinando os achados de todas as fases realizadas, agregando-se na análise a fase de equilíbrio. Essa leitura foi denominada de "segunda análise". Para fins de análise dos resultados, dividimos os achados dos exames em dois grupos: o dos diagnósticos principais, isto é, os diretamente relacionados à indicação clínica do exame; e o dos diagnósticos secundários, ou seja, os não relacionados a indicação clínica e/ou achados incidentais. Os critérios de inserção no grupo dos diagnósticos secundários foram estabelecidos por consenso entre os observadores e com base em dados da literatura(24). Ao final da cada avaliação, foi estabelecido se houve mudança nos diagnósticos principais e secundários, da primeira em relação à segunda análise. Mediu-se a frequência de mudança dos diagnósticos principais e secundários, de acordo com a indicação clínica, quando comparadas à primeira e à segunda análise. Foi utilizada a extensão do teste exato de Fisher para avaliar a modificação dos diagnósticos principais, considerando-se resultados com p < 0,05 como significantes. Quanto aos diagnósticos secundários, foi feita uma porcentagem proporcional em relação ao número total de exames. RESULTADOS As principais indicações clínicas para os exames revisados foram: 1) oncológica, englobando estadiamento, reestadiamento e pesquisa de neoplasia primária, correspondendo a 126 exames (57,5%); 2) abdome agudo, englobando inflamatório (28/49), obstrutivo (8/49), perfurativo (2/49), vascular (4/49), além de 7 casos de abdome agudo a esclarecer, totalizando 49 exames (22,4%); 3) pesquisa e controle de coleção intra-abdominal, correspondendo a 31 exames (14,2%); 4) outras, correspondendo a 13 exames (5,9%), cujas indicações foram trauma abdominal fechado, pesquisa de corpo estranho, avaliação/controle pós-operatório, entre outras. Em cinco pacientes com suspeita de apendicite aguda e em dois com suspeita de diverticulite aguda foram realizadas as fases com o meio de contraste, uma vez que apenas a fase sem contraste não permitiu estabelecer o diagnóstico, sendo, portanto, estes casos inseridos na nossa casuística. Em relação à dose de radiação a que o paciente foi exposto, a média estimada por exame foi 2.755 mGy*cm (DLP), ou cerca de 835 mGy*cm por fase, correspondendo a uma dose efetiva média estimada em 12,5 mSv por fase (mínimo = 9 mSv; máximo = 24 mSv). Estes cálculos foram decorrentes de 64 pacientes (29%) nos quais foram realizadas quatro fases de aquisição (sem contraste, arterial, portal e equilíbrio), em razão de diversas indicações clínicas e protocolo de exame adotado pela instituição, e em 155 pacientes (71%) nos quais foram realizadas três fases de aquisição (sem contraste, portal e equilíbrio). A dose de radiação medida foi semelhante nas diversas fases do estudo por paciente (sem contraste, arterial, portal e equilíbrio) na amostra analisada. De todos os casos avaliados, apenas um paciente teve mudança no diagnóstico principal após a segunda análise (0,46%; p > 0,999; não significativo). Tratava-se de paciente em reestadiamento de neoplasia de cólon, sem exames anteriores disponíveis, com nódulo indeterminado na adrenal direita avaliado na fase sem contraste e fase portal. Após a avaliação da fase de equilíbrio notou-se que o nódulo apresentou washout superior a 50%, caracterizando-o como adenoma (Figura 1). As demais indicações clínicas não apresentaram nenhuma mudança no diagnóstico principal. Figura 1. Nódulo na adrenal direita, num paciente em reestadiamento de neoplasia de colón, com densidade de 18 UH, 103 UH e 59 UH, respectivamente, na fase sem contraste (A), fase portal (B) e fase de equilíbrio (C). O cálculo de washout absoluto foi 52%. Com relação aos diagnósticos secundários, obtivemos cinco exames com modificação após a segunda análise. As dúvidas diagnósticas recaíram sobre caracterização de retardo bilateral na excreção renal (em um caso de abdome agudo e um caso para pesquisa de coleção intracavitária), confirmados na fase de equilíbrio, e diferenciação entre caliectasia focal e cisto parapiélico, confirmados na fase de equilíbrio (em um caso de abdome agudo, um caso para pesquisa de coleção intracavitária e um caso de trauma abdominal), correspondendo a um total de 2,3% de mudança no diagnóstico secundário. DISCUSSÃO Atualmente, há uma preocupação crescente com o controle da dose de radiação recebida pelo paciente em exames de TC, tendo-se estudado diversas formas de reduzi-la(3,4), como, por exemplo, modulação da corrente do tubo, controle automático de exposição, redução da área de escaneamento, otimização do pico de quilovoltagem, filtros especiais para a redução de dose na pele, pós-processamento da imagem para aumentar a relação sinal/ruído(5), entre outras. Essas estratégias, quando aplicadas em conjunto, determinam significativa redução da dose de radiação à qual o paciente é exposto(6), chegando-se ao ponto de, em alguma situações clínicas específicas, se conseguir doses equivalentes inferiores a 2 mSv(23), o equivalente a uma radiografia simples de abdome em três posições ou a uma TC de crânio(25). Além das estratégias acima citadas, a supressão de uma ou mais fases do exame vem se mostrando uma opção viável e efetiva(7,11). No nosso estudo, por termos avaliado ampla gama de indicações clínicas, frequentemente com quatro fases de aquisição, obtivemos média de dose efetiva estimada de 41,2 mSv por exame, sendo 12,5 mSv por fase, em média. Portanto, suprimindo-se a fase de equilíbrio poderíamos reduzir a dose de exposição do paciente à radiação em 25-33% (25% se considerarmos quatro fases de aquisição, ou seja, sem contraste, arterial, portal e de equilíbrio; e 33% se considerarmos três fases de aquisição, ou seja, sem contraste, portal e de equilíbrio), com inegável benefício para o paciente. É importante observar que o resultado obtido a partir deste cálculo não é o valor exato da radiação estimada, mas pode ser utilizado como valor de referência em um determinado serviço de TC, uma vez que existe grande dificuldade prática em se medir a dose exata por paciente, decorrente de uma ampla quantidade de variáveis envolvidas no cálculo, inerentes ao paciente (ex.: índice de massa corpórea, circunferência abdominal, órgão irradiado), e aos fatores técnicos utilizados (ex.: kV, mAs, pitch, etc.), como demonstrado na literatura(23). No entanto, mesmo aplicando-se este método inexato de cálculo, é inegável a redução de dose de radiação ao se suprimir uma fase de aquisição. Alguns pesquisadores têm descrito que a acurácia diagnóstica dos exames de imagem para determinadas doenças não sofre prejuízos ao se suprimir a fase de equilíbrio(8-10). Em 2004, Imbriaco et al.(8), ao avaliarem pacientes com suspeita de neoplasia pancreática, demonstraram que o uso de uma única fase após a injeção do meio de contraste em TC multidetectores é uma técnica acurada para o diagnóstico e estadiamento desse tumor. Em 2006, Iezzi et al.(9) mostraram que a fase de equilíbrio não é necessária para a caracterização de endoleak de alto débito nos pós-operatórios de aneurisma de aorta abdominal, com sensibilidade de 93% e especificidade de 97%. Metser et al.(10), em 2012, comprovaram que a fase portal é mais eficiente que a fase de equilíbrio para a caracterização de tumores do trato urinário alto e baixo, sendo possível utilizar apenas a fase portal para a caracterização dessas lesões. Tendo em vista esse tema atual na literatura, procuramos contribuir com outro enfoque, desenvolvendo um estudo no qual, em vez de focarmos uma determinada doença ou situação clínica, contemplamos algumas das principais indicações da rotina, a fim de avaliar os principais protocolos utilizados. Em nosso serviço, a maioria dos exames contrastados de abdome e pelve é realizada para fins oncológicos, englobando desde o diagnóstico até o estadiamento e reestadiamento. Em razão da sua condição de base, esses pacientes realizam exames seriados no decorrer da vida, tornando ainda mais relevante a preocupação com o racionamento de dose de radiação a que eles são expostos. Como demonstrado no nosso estudo, a fase de equilíbrio apresentou valor agregado em apenas um dos 219 exames, correspondente a um paciente em reestadiamento de neoplasia de cólon, sem exames anteriores disponíveis e que apresentava um nódulo na adrenal com atenuação de 18 UH na fase sem contraste (Figura 1). Essa dúvida diagnóstica é relativamente comum em exames de TC de abdome para estadiamento tumoral. Nódulos adrenais correspondem a metástase em 45-73% dos pacientes oncológicos(26), e nesses casos a diferenciação entre lesões benignas e metástases é crucial para a conduta. O protocolo para a adequada caracterização de nódulos de adrenal consiste na realização da fase sem contraste, da fase portal e da fase tardia após 10 a 15 minutos da administração do meio de contraste(21), não sendo necessária a realização da fase de equilíbrio com 3 a 5 minutos. Diversos autores têm demonstrado que é possível caracterizar um nódulo de adrenal como adenoma calculando-se o washout com elevadas sensibilidade e especificidade(27-29). No nosso caso, a análise das imagens obtidas na fase de equilíbrio permitiu sugerir que o nódulo na adrenal do nosso paciente fosse de provável origem benigna, com base no cálculo do washout absoluto superior a 50% e confirmado pela sua estabilidade em um controle de imagem realizado após 12 meses. Nos demais exames oncológicos e naqueles para pesquisa de abdome agudo e coleção intra-abdominal, não identificamos alterações nos diagnósticos primários. Em relação aos diagnósticos secundários, observamos algumas alterações que puderam ser mais bem caracterizadas na segunda análise. Em dois casos, cujas indicações eram pesquisa de abdome agudo e pesquisa de coleção, a primeira análise não foi capaz de demonstrar o retardo da excreção renal do meio de contraste (Figura 2), achado que normalmente é caracterizado apenas na fase de equilíbrio, inferindo uma redução da função renal. No entanto, é importante lembrar que a TC não é o exame de escolha para a verificação da função renal, mas sim a dosagem da ureia e da creatinina; ou seja, a importância clínica de não ter sido identificado este comprometimento da função renal nas imagens tomográficas, por conta da supressão da fase de equilíbrio, tem relevância menor, uma vez que o diagnóstico foi feito pelos exames laboratoriais supramencionados. Figura 2. Paciente com linfoma de delgado (asterisco). Como achado secundário há sinais de déficit da excreção renal, caracterizado por retardo na eliminação do meio de contraste intravenoso na fase de equilíbrio (B), que não foi suspeitado na fase portal (A). Em três casos, houve dúvida diagnóstica na diferenciação de caliectasia focal e cisto parapiélico quando a fase de equilíbrio não foi avaliada (Figura 3). A caliectasia focal corresponde a pequena dilatação de um ou mais cálices renais, normalmente de origem cicatricial/residual, enquanto os cistos parapiélicos são formações císticas simples, originadas da porção medial do parênquima renal, que se projetam para o seio renal(30). A conduta para ambas as situações, quando assintomáticas, é conservadora, e foram classificadas no nosso trabalho como de baixa relevância clínica, em concordância com dados da literatura(24). Dessa forma, embora tenha havido dificuldade nesse diferencial na primeira análise, a diferenciação entre caliectasia focal e cisto parapiélico não representaria um fato de impacto prático na condução do caso. Figura 3. Exame de estadiamento de paciente com melanoma metastático. Como diagnóstico secundário foi observada, na fase portal (A), imagem cística adjacente ao hilo renal (seta). Na fase de equilíbrio, esta não apresentou contrastação pelo meio de contraste, provando tratar-se de cisto parapiélico. Como ponderação adicional, nos seis casos em que houve acréscimo de informação diagnóstica após a segunda análise, seja referente aos diagnósticos principal (um caso) ou secundário (cinco casos), a avaliação da primeira análise isoladamente não teria determinado condutas terapêuticas danosas aos pacientes, uma vez que, nestes casos de primeira análise inconclusiva, haveria a possibilidade de se prosseguir a investigação, esclarecendo assim a indefinição diagnóstica. Além disso, a disponibilidade das ferramentas de manipulação da imagem na estação de trabalho permite alterar nível e largura da janela do estudo tomográfico, melhorando a capacidade diagnóstica de cada fase de aquisição de imagens isoladamente, ao contrário do que ocorre quando se faz a leitura do exame em filmes impressos(31). Um estudo com revisão de 200 tomografias de tórax e abdome encontrou mudança significativa no diagnóstico final em 18% dos exames, com um tempo de leitura adicional de 40 segundos, ao se lançar mão da manipulação dos parâmetros de janela de visualização(32). Mais recentemente, o uso da TC de dupla energia tem demonstrado a possibilidade de se reduzir a dose de radiação, suprimindo-se a fase sem contraste em diversas indicações clínicas(33), com resultados animadores, porém discutíveis em alguns casos, como, por exemplo, na caracterização de nódulos de adrenal, em que o método apresentou elevada especificidade, porém, baixa sensibilidade(34,35). Estudos ulteriores serão necessários para se estabelecer o real valor do método em cenários clínicos distintos, devendo-se considerar também a disponibilidade deste tipo de equipamento no nosso meio. A principal limitação deste estudo reside no fato de que, pelo perfil habitual dos pacientes que procuram o nosso serviço, a análise do impacto da supressão da fase de equilíbrio foi realizada em um universo de indicações clínicas que, apesar de abrangente, contou com pequeno número de casos em algumas situações, como trauma abdominal fechado e pesquisa de corpo estranho, entre outras, limitando o poder de análise do estudo nestas situações clínicas. Todavia, este espectro e distribuição de indicações clínicas encontradas representam não somente a realidade da nossa instituição, mas também a de muitos outros serviços, em que as indicações de TC na avaliação de pacientes oncológicos, no diagnóstico do abdome agudo e na pesquisa de coleção intracavitária correspondem a um número expressivo de casos. O impacto da supressão da fase de equilíbrio em situações clínicas menos frequentes poderá ser avaliado em estudos subsequentes. Outra limitação que poderia ser citada está relacionada ao fato de o estudo ter sido retrospectivo e muito abrangente. No entanto, se consideramos os objetivos do trabalho, entendemos que este modelo metodológico não afetou os resultados da pesquisa. A nossa proposta era procurar reproduzir o ambiente de indicações com as quais se deparam serviços de TC inseridos em hospitais gerais ou universitários, como o nosso, com número expressivo não somente de pacientes ambulatoriais, mas também de pacientes internados e provenientes do pronto-atendimento, estabelecendo o papel da fase de equilíbrio na avaliação diagnóstica em exames de TC do abdome. Neste aspecto, entendemos ter contribuído para suprimir, em determinadas situações clínicas, uma fase do exame aparentemente desnecessária. Estudos ulteriores poderão ser conduzidos, confirmando os nossos resultados. É também importante observar que, apesar de a fase de equilíbrio ainda ser utilizada de rotina no nosso meio, em outros países esta fase do exame tem sido indicada apenas algumas poucas situações clínicas. Concluindo, a análise dos resultados obtidos no nosso estudo permitiu estabelecer que a fase de equilíbrio pode ser suprimida nos exames de TC de abdome para as principais indicações oncológicas, de ab-dome agudo e pesquisa ou controle de coleção intracavitária, sem perda expressiva na capacidade diagnóstica do método. REFERÊNCIAS 1. Dalmazo J, Elias Jr J, Brocchi MAC, et al. Otimização da dose em exames de rotina de tomografia computadorizada: estudo de viabilidade em um hospital universitário. Radiol Bras. 2010;43:241-8. 2. Huda W. What ER radiologists need to know about radiation risks. Emerg Radiol. 2009;16:335-41. 3. Kalra MK, Maher MM, Toth TL, et al. Strategies for CT radiation dose optimization. Radiology. 2004;230:619-28. 4. Kalender WA, Buchenau S, Deak P, et al. 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Professor Adjunto do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. 5. Doutor, Médico Assistente do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. 6. Livre-docente, Professor Adjunto do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. Endereço para correspondência: Dr. Giuseppe D'Ippolito Departamento de Diagnóstico por Imagem - EPM-Unifesp Rua Napoleão de Barros, 800, Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil, 04024-002 E-mail: giuseppe_dr@uol.com.br Recebido para publicação em 24/10/2012. Aceito, após revisão, em 10/1/2013. * Trabalho realizado no Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. |