Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 45 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2012

RELATO DE CASO
Print 

Page(s) 359 to 361



Linfoma ósseo primário simultâneo a osteocondroma simulando degeneração sarcomatosa: relato de caso*

Autho(rs): Laura de Moraes Gomes1; Felipe Augusto Rozales Lopes2; Décio Valente Renck3

PDF Português      

PDF English

Texto em Português English Text

Descritores: Linfoma ósseo primário; Osteocondroma; Degeneração sarcomatosa; Tumores ósseos.

Keywords: Primary bone lymphoma; Osteochondroma; Sarcomatous degeneration; Bone tumors.

Resumo:
Não há evidências relatadas na literatura de associação entre linfoma ósseo primário e osteocondroma ou da coexistência deles em uma mesma região óssea. Este relato de caso descreve um caso raro de linfoma ósseo primário ocorrendo juntamente com um osteocondroma no terço proximal de tíbia. Os sinais de imagem na ressonância magnética neste caso simulam uma degeneração sarcomatosa do osteocondroma.

Abstract:
In the literature, there is no evidence of relationship between primary bone lymphoma and osteochondroma or of coexistence of both of them in a single bone. The present report describes an uncommon case of primary bone lymphoma occurring simultaneously with osteochondroma in the proximal third of the tibia. In the present case, magnetic resonance imaging signs simulated the presence of sarcomatous degeneration.

INTRODUÇÃO

O linfoma ósseo primário e a degeneração sarcomatosa do osteocondroma são tumores raros, não tendo sido encontrada relação entre eles na literatura.

O linfoma ósseo primário representa 1% dos linfomas não Hodgkin de origem extraganglionar e atinge principalmente a sexta e sétima décadas de vida(1). Já o osteocondroma representa 20% dos tumores ósseos benignos e se apresenta usualmente entre a segunda e terceira décadas de vida. Em 1% dos osteocondromas solitários é observada transformação maligna(2).

Como não foram encontrados na literatura artigos com casos dos dois tumores presentes concomitantemente na mesma região do osso, o objetivo deste trabalho é apresentar um caso de linfoma ósseo primário simultâneo a um osteocondroma, que aos exames de imagem simulava uma degeneração sarcomatosa no terço proximal da tíbia.


RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 65 anos de idade, apresentava dor intensa e incapacitante há nove meses no terço proximal da tíbia, sem história de trauma. Ao exame físico havia pequeno tumor apresentando calor local.

A radiografia mostrou osteocondroma na região posterossuperior da tíbia com áreas radiolucentes e, no centro, áreas radiodensas que sugeriam calcificações no interior do osteocondroma (Figura 1). A ressonância magnética (RM) revelou uma lesão óssea com características infiltrativas, com realce heterogêneo pelo meio de contraste, marcada infiltração da medula óssea e estendendo-se para os tecidos moles adjacentes sem destruição evidente da cortical óssea. A RM também mostrou o acometimento intra-articular pela lesão e envolvimento da medula óssea do osteocondroma. O aspecto de imagem foi inicialmente interpretado como degeneração sarcomatosa do osteocondroma (Figuras 2, 3 e 4).


Figura 1. Alterações radiológicas condizentes com osteocondroma na margem posterossuperior da tíbia proximal. Observam-se áreas radiodensas (seta) que sugerem calcificações no interior do osteocondroma.


Figura 2. RM, plano sagital T1 fat sat mostrando envolvimento neoplásico do osteocondroma (seta preta), comprometimento intra-articular do tumor (seta branca menor) e sua extensão para partes moles (seta branca maior).


Figura 3. RM, plano coronal T1 mostrando lesão infiltrativa na epífise e na diáfise proximal da tíbia (seta maior). Observa-se lesão óssea focal bem definida na medula óssea da metáfise femoral (seta menor), com configuração lobular e calcificações em seu interior, sugerindo condroma.


Figura 4. RM, plano axial T1 fat sat pós-gadolínio demonstrando a lesão infiltrativa realçada pelo meio de contraste (seta), com relativa preservação da cortical.



Além da lesão infiltrativa identificada na tíbia, foi encontrada uma lesão focal bem definida na medula óssea da metáfise femoral, com hipossinal em T1, configuração lobular e calcificações em seu interior, sugerindo condroma.

A biópsia constatou linfoma não Hodgkin difuso de células B periféricas com marcadores CD20, CD3, CD5 positivos e a tomografia computadorizada (TC) de estadiamento não demonstrou linfonodomegalias, comprovando linfoma ósseo primário.

Cabe ressaltar que dentre as alterações descritas nos exames de imagem, existe relativa preservação da cortical mesmo com a infiltração das partes moles adjacentes, corroborando o diagnóstico histopatológico de linfoma.


DISCUSSÃO

Conforme referem Nava et al.(3), a RM tem sido utilizada para estadiamento, por sua alta sensibilidade em detectar tumores malignos, com bons resultados, sendo uma ótima opção ao método usado no presente trabalho, a TC.

O linfoma ósseo primário caracteriza-se por dor local intermitente que pode persistir por meses(4). É localizado comumente em ossos longos, preferencialmente fêmur e ossos pélvicos. Originados no centro do osso, podem romper a cortical quando a cavidade medular já está tomada e há risco de envolvimento de partes moles(5).

Em relação ao aspecto radiológico do linfoma ósseo, há um padrão permeativo, "roído de traça", causando uma reação periosteal. O padrão mais comum é o lítico-destrutivo, com áreas radiolucentes em área mal delimitada. Pode haver padrão blástico-esclerótico, raro comparado a metástases ósseas de linfoma. Na RM as sequências T1 são as melhores para demonstrar alterações medulares e mostram áreas de hipossinal dentro da medula. Tanto na ponderação T2 como em sequências sensíveis a líquido com supressão de gordura, apresentam áreas de hipersinal. Em casos radiológicos de padrão permeativo é observado envolvimento de partes moles. Tanto a TC quanto a RM revelam erosão da cortical(6).

Assim como os linfomas ósseos, os osteocondromas são mais comuns em ossos longos, principalmente úmero e fêmur, e estão preferencialmente localizados nas regiões metafisárias. Os osteocondromas apresentam características radiológicas facilmente vistas em radiografias convencionais, que evidenciam uma continuidade de osso cortical e esponjoso com o osso adjacente. Tanto a RM quanto a TC confirmam tal característica.

O aspecto radiológico da degeneração sarcomatosa inclui características de crescimento do osteocondroma com superfície irregular, regiões focais de radiolucência no interior da lesão, erosão ou destruição do osso adjacente. A RM caracteriza os condrossarcomas de baixo grau com hipersinal em T2 e hipossinal nos septos do tumor, com realce após contraste(7).

O diagnóstico definitivo do linfoma ósseo se dá por estudo histológico da lesão. Para diagnóstico imuno-histoquímico, LCA, CD20 e CD3 devem ser pesquisados(8). O diagnóstico diferencial inclui osteossarcoma, tumor de Ewing e metástases neoplásicas(5).

Em conclusão, o achado ocasional de um osteocondroma junto a um linfoma ósseo na mesma região do osso gerou dúvidas quanto ao diagnóstico pelos exames de imagem, levando a crer inicialmente em degeneração sarcomatosa do osteocondroma. O diagnóstico também foi dificultado pela raridade da doença, dessa forma, deve ser enfatizada a relevância dos diagnósticos diferenciais.


REFERÊNCIAS

1. Krishnan A, Shirkhoda A, Tehranzadeh J, et al. Primary bone lymphoma: radiographic-MR imaging correlation. Radiographics. 2003;23:1371-83.

2. Kurimori CO, Bordalo-Rodrigues M, Cerri GG. Degeneração maligna para condrossarcoma de um osteocondroma pediculado da tíbia. Radiol Bras. 2010;43(1):xi-xii.

3. Nava D, Oliveira HC, Luisi FA, et al. Aplicação da ressonância magnética de corpo inteiro para o estadiamento e acompanhamento de pacientes com linfoma de Hodgkin na faixa etária infanto-juvenil: comparação entre diferentes sequências. Radiol Bras. 2011;44:29-34.

4. Pires de Camargo O, Machado TMS, Croci AT, et al. Primary bone lymphoma in 24 patients treated between 1955 and 1999. Clin Orthop Relat Res. 2002;(397):271-80.

5. Edeiken J. Diagnóstico radiológico de las enfermedades de los huesos. 3ª ed. Buenos Aires: Editorial Medica Panamericana; 1984; p. 66-73, 30314.

6. Gomes FSE, Lewin F, Mariotti GC, et al. Osteocondromas: avaliação por imagem das complicações. Rev Imagem. 2007;29:53-9.

7. Hicks DG, Gokan T, O'Keefe RJ, et al. Primary lymphoma of bone. Correlation of magnetic resonance imaging features with cytokine production by tumor cells. Cancer. 1995;75:973-80.

8. Neupatimagem-Unicamp. Linfoma não-Hodgkin de grandes células B de osso occipital, com extensão intra- e extracraniana. [acessado em 15 de dezembro de 2011]. Disponível em: http://anatpat. unicamp.br/xnptlinfoma3.html










1. Mestre, Médica Radiologista do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
2. Acadêmico do sexto ano de Medicina da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), Pelotas, RS, Brasil.
3. Mestre, Médico Radiologista, Chefe do Centro de Diagnóstico por Imagem do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

Endereço para correspondência:
Felipe Augusto Rozales Lopes
Rua Emílio Jorge dos Reis, 512, Três Vendas
Pelotas, RS, Brasil, 96020-440
E-mail: felipearlopes@gmail.com

Recebido para publicação em 24/2/2012.
Aceito, após revisão, em 5/7/2012.

* Trabalho realizado no Centro de Diagnóstico por Imagem do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
 
RB RB RB
GN1© Copyright 2024 - All rights reserved to Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Av. Paulista, 37 - 7° andar - Conj. 71 - CEP 01311-902 - São Paulo - SP - Brazil - Phone: (11) 3372-4544 - Fax: (11) 3372-4554