Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 44 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2011

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 360 to 362



Avaliação do tempo de trânsito esofágico pelo ultrassom: influência do gênero e índice de massa corpórea

Autho(rs): Makoto Sakate1; Seizo Yamashita2; Caroline Guedes Correia Toledo3; Patricia Sanches3; Carlos Roberto Padovani4; Maria Aparecida Coelho de Arruda Henry5

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Texto em Português English Text

Descritores: Ultrassonografia; Esôfago intra-abdominal; Índice de massa corpórea.

Keywords: Ultrasonography; Intra-abdominal esophagus; Body mass index.

Resumo:
Objetivo: Utilizar a ultrassonografia do esôfago intra-abdominal para avaliar o tempo de trânsito esofágico para água e iogurte, em posição ortostática, e avaliar a influência do gênero e índice de massa corpórea. Materiais e Métodos: Foram estudados 89 indivíduos adultos jovens, sem clínica de doenças do trato gastrintestinal superior, sendo 40 do gênero feminino (média de 20,13 ± 1,62 anos) e 49 do gênero masculino (média de 20,43 ± 2,17 anos). O tempo de trânsito esofágico foi cronometrado, com o paciente em posição ortostática, durante a deglutição de água e iogurte. Resultados: O tempo de trânsito esofágico para as mulheres e para os homens foi, respectivamente: para água, de 5,84 ± 1,60 segundos versus 6,66 ± 1,68 segundos, e para iogurte, de 9,12 ± 1,96 segundos versus 9,28 ± 1,70 segundos. Não se constatou diferença entre os gêneros masculino e feminino, apesar de o fator índice de massa corpórea ser menor nas mulheres. Conclusão: Os dados obtidos do tempo de trânsito esofágico para alimento líquido (água) e pastoso (iogurte), em posição ortostática, em adultos jovens não mostraram diferença entre os gêneros, mesmos nas mulheres com índice de massa corpórea menor em relação aos homens.

Abstract:
Objective: To utilize intra-abdominal esophagus ultrasonography to evaluate esophageal transit time for water and yogurt in orthostatic position, and to evaluate the influence of gender and body mass index. Materials and Methods: The present study included 89 young adults [40 women (mean age, 20.13 ± 1.62 years) and 49 men (mean age, 20.43 ± 2.17 years)] who did not show upper gastrointestinal tract disorder. Esophageal transit time was measured with the patient in orthostatic position during water and yogurt swallowing. Results: Esophageal transit time for women and men was, respectively, 5.84 ± 1.60 seconds versus 6.66 ± 1.68 seconds with water, and 9.12 ± 1.96 seconds versus 9.28 ± 1.70 seconds with yogurt. No difference between genders was observed in spite of the lower body mass index in women. Conclusion: Data regarding esophageal transit time for liquid (water) and pasty (yogurt) food swallowed by young adults in the orthostatic position did not demonstrate any difference between genders even in women with lower body mass index as compared with men.

INTRODUÇÃO

Queixas esofágicas são comuns em todas as faixas etárias, em ambos os sexos, e são características ou consequências de diversas doenças. Por isso, é importante que se tenha ferramenta simples, rápida e não invasiva de avaliação que possa sugerir e direcionar para exames mais complexos. Atualmente, já existem diversos métodos que possibilitam a pesquisa de transtornos esofágicos, como radiografias contrastadas com fluoroscopia, cintilografia, manometria, endoscopia digestiva alta e pH-metria esofágica prolongada (24 horas). Porém, são necessários exames simples, rápidos, de baixo custo e não invasivos e que não utilizem radiação ionizante(1—7). O ultrassom transabdominal para avaliar o esôfago intra-abdominal, dentro desse contexto, apresenta-se como um bom método e reúne as seguintes vantagens: caracterizar-se como um estudo inicial, direcionar melhor o exame complementar, melhorar a qualidade de vida, por ser exame mais inócuo, e possibilitar a avaliação do resultado do tratamento de pacientes com disfagias(6).

Objetivo

O presente estudo tem como objetivo utilizar a ultrassonografia do esôfago intra-abdominal durante a deglutição de alimentos não sólidos (água e iogurte), na posição ortostática, como parâmetro de referência das disfunções do trânsito esofágico, e avaliar a influência do gênero e do índice de massa corpórea (IMC) dos indivíduos.


MATERIAIS E MÉTODOS

Foram selecionados 89 indivíduos adultos jovens, com idade entre 17 e 27 anos, sendo 40 do sexo feminino (média de 20,13 ± 1,62 anos) e 49 do sexo masculino (média de 20,43 ± 2,17 anos), sem clínica de doenças do trato gastrintestinal proximal. O IMC foi calculado para os indivíduos dos gêneros feminino e masculino.

Cada voluntário foi posicionado na posição ortostática e o tempo de trânsito esofágico (TTE) foi cronometrado para passagem de água (20 ml à temperatura ambiente), sendo o cronômetro acionado no momento do sentir a elevação da cartilagem da tireoide pelo pesquisador, na deglutição pelo pesquisado, e parado no momento da visualização do líquido deglutido passando no esôfago intra-abdominal. Após 30 minutos, a manobra foi repetida com o iogurte (20 ml a 5°C) (Figuras 1 e 2).


Figura 1. Imagem ultrassonográfica do abdome superior evidenciando lobo esquerdo do fígado e o esôfago intra-abdominal (seta).


Figura 2. Imagem ultrassonográfica do abdome superior evidenciando lobo esquerdo do fígado e o esôfago intra-abdominal durante a passagem do conteúdo deglutido (seta).



O aparelho de ultrassonografia utilizado foi o Toshiba Sonolyer série SSH 140 A/G (Toshiba; Tóquio, Japão), empregando-se transdutor semiconvexo de 3,5 MHz. O cronômetro utilizado foi o Seiko 3 BAR (Seiko; Tóquio, Japão).

Para analisar a homogeneidade do experimento em relação ao sexo, foi feita comparação das médias do TTE em relação à água e ao iogurte. Para o IMC, foi realizada análise estatística semelhante, utilizando-se o teste t bicaudal separadamente, uma vez que, a priori, não se tem qualquer sugestão da direção da diferença. A comparação entre TTE com ingestão de água ou iogurte foi feita por meio do teste t pareado monocaudal, diante da hipótese de que a ingestão de substâncias menos fluidas forneça TTE maior. As medidas de associações entre as variáveis foram feitas utilizando-se teste t de Student. Utilizou-se a técnica de análise de variância para modelo com dois fatores (sexo e percentil 50 do IMC)(8).


RESULTADOS

O TTE médio para a água foi de 5,84 ± 1,60 segundos no sexo feminino e de 6,66 ± 1,68 segundos no sexo masculino, não havendo, dentro do nível de significância, diferença entre os sexos. Para o iogurte, o TTE médio foi de 9,12 ± 1,96 segundos no sexo feminino e de 9,28 ± 1,70 segundos no sexo masculino (p > 0,05), também não se evidenciando diferença significativa entre os sexos.

O IMC das mulheres (21,53 ± 2,28 kg/m2) foi significativamente menor que o dos homens (23,65 ± 3,00 kg/m2)) (p < 0,001), no entanto, a associação entre o IMC e o TTE para água e iogurte não foi significativa (p > 0,05), mostrando que o fato de as mulheres terem IMC menor não foi fator determinante para o estudo das diferenças (Tabela 1).




DISCUSSÃO

No presente experimento os voluntários, na posição ortostática, não tiveram dificuldades em manter a água ou o iogurte na cavidade bucal e iniciar a deglutição somente após o comando do pesquisador. Foi possível realizar todos os passos da pesquisa, sem dificuldades, em posição confortável, em ambiente tranquilo, de maneira simples e rápida na sala de exames em todos os indivíduos. Em pacientes idosos e com dificuldade de deglutição, este exame deve ser evitado, optando-se por esofagograma, videofluoroscopia e mesmo a endoscopia, tendo em vista a maior incidência de neoplasias malignas neste grupo etário. O esôfago intra-abdominal foi acessível e de localização fácil ao ultrassom, possibilitando a sua visualização e a passagem da água e do iogurte no seu interior(9,10).

Foi possível determinar o TTE em ambos os sexos, com o auxílio do cronômetro, medido no momento em que foi acionado, no início da deglutição da água ou do iogurte, até a visualização destes ao passarem pelo esôfago intra-abdominal(10).

A avaliação do esôfago torácico, por via externa, com ultrassonografia fica prejudicada por causa da dificuldade de acesso, tanto pelo mediastino anterior quanto pelo posterior, e isto se deve à presença de ar nos pulmões e de tecido ósseo na coluna vertebral dorsal, que são estruturas que impossibilitam a passagem adequada da onda sonora(11). O esôfago cervical, em virtude da sua situação lateralizada em relação à traqueia, é possível de ser avaliado com ultrassom, devido à proximidade com a superfície e a interposição de tecido mole, como o lobo tireoidiano esquerdo(12). O segmento intra-abdominal do esôfago, em indivíduos normais, é possível de ser localizado com facilidade, em razão da sua posição posterior ao lobo esquerdo do fígado, que atua como uma "janela" de acesso ao ultrassom (órgão relativamente homogêneo que afasta as alças intestinais com gases)(13—15).

O método revelou, no presente estudo, que não houve diferença estatisticamente significativa do TTE da água e iogurte entre os sexos, o que não foi observado na posição de decúbito dorsal(10), embora a causa possível pudesse ser o posicionamento dos indivíduos (ortostase). Em relação ao IMC, os valores observados nas mulheres foram significativamente menores que os dos homens, porém não foram fator determinante para evidenciar diferenças no TTE para água e iogurte.

Com o advento de novas tecnologias, surgiram aparelhos que possibilitam a avaliação do esôfago, tais como a medicina nuclear, a endoscopia com fibra ótica, a manometria, a pH-metria e a ultrassonografia endoscópica. Todos evidenciam a localização, os aspectos anatômicos e funcionais do esôfago(16—18), porém são invasivos ou utilizam radiação ionizante, com equipamentos de alto custo.

Este estudo possibilitou, ainda, uma avaliação menos invasiva, mais econômica e provavelmente mais disponível para os pacientes em relação aos exames radiográficos, manométricos ou cintilográficos do esôfago, uma vez que o método necessita apenas de um aparelho de ultrassom convencional e cronômetro para ser reproduzido. Outra vantagem é a possibilidade de realizar o exame fora de ambiente hospitalar.


CONCLUSÃO

O método experimental de avaliar o TTE pelo ultrassom, por abordagem externa, na posição ortostática, e realizar correlações entre os sexos e IMC foi possível, de maneira simples, não invasiva e sem radiação ionizante. No presente estudo, observamos que o TTE para água e iogurte não evidenciou diferenças significativas para ambos os gêneros, mesmo sendo o IMC significativamente menor nas mulheres do que nos homens.


REFERÊNCIAS

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3. Machado MM, Rosa ACF, Barros N, et al. Ultra-sonografia endoscópica (USE) do esôfago, estômago, cólons e reto. Radiol Bras. 2002;35:219—23.

4. Giannini EG, Zentilin P, Dulbecco P, et al. Management strategy for patients with gastroesophageal reflux disease: a comparison between empirical treatment with esomeprazole and endoscopy-oriented treatment. Am J Gastroenterol. 2008;103:267—75.

5. Henry MACA. Distúrbios motores do esôfago. In: Fraga GP, Sevá-Pereira G, Lopes LR. Atualidades em clínica cirúrgica. São Paulo, SP: Atheneu; 2011. p. 293—306.

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9. Sakate M, Silveira GL, Muzio BP, et al. Refluxo gastroesofágico: estudo comparativo da receptividade e sensibilidade entre seriografia e ultrassonografia. Radiol Bras. 2009;42:245—8.

10. Sakate M, Teixeira AS, Yamashita S, et al. Um novo método de avaliação do "tempo esofágico" com ultra-sonografia por abordagem externa. Radiol Bras. 2008;41:309—12.

11. Penas ME. Motilidade esofagiana: ensaio iconográfico sobre cintilografia dinâmica do esôfago. Radiol Bras. 2007;40:423—7.

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1. Doutor, Professor Assistente da Faculdade de Medicina de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (FMB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.
2. Professor Assistente da Faculdade de Medicina de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (FMB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.
3. Biomédicas, Aprimorandas do Curso de Aprimoramento em Fotobiologia e Radiobiologia do Departamento de Dermatologia e Radioterapia da Faculdade de Medicina de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (FMB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.
4. Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (IBB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.
5. Professora Titular do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (FMB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.

Endereço para correspondência:
Dr. Makoto Sakate
Rua Aleixo Varoli, 651, Jardim Paraíso
Botucatu, SP, Brasil, 18610-295
E-mail: msakate@fmb.unesp.br

Recebido para publicação em 20/7/2011.
Aceito, após revisão, em 28/10/2011.

* Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Botucatu – Universidade Estadual Paulista (FMB-Unesp), Botucatu, SP, Brasil.
 
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