RELATO DE CASO
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Autho(rs): Fábio Abílio Gomes de Almeida, Carlos Leite de Macêdo Filho, Ernesto Lima Araújo Melo, Luciana Mendes de Oliveira Cerri, Giovanni Guido Cerri |
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Descritores: Rabdomiossarcoma, Próstata, Adultos |
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Resumo:
INTRODUÇÃO O rabdomiossarcoma prostático é um tumor maligno oriundo de células mesenquimais com diferenciação sarcomérica(1,2). Apresenta curso altamente agressivo, com evolução rápida, sendo predominantemente encontrado em crianças, nas quais é o principal tumor da próstata(3,4). No adulto é extremamente raro, tendo sido descritos menos de 30 casos na literatura de língua inglesa(4?6). A maior série descrita foi de apenas nove casos(1), o que demonstra falta de experiência acumulada sobre a doença na literatura mundial. O presente estudo tem como finalidade descrever os achados de imagem de um caso diagnosticado na nossa instituição, analisando-os em associação com outros estudos já existentes na literatura.
RELATO DO CASO Paciente de 27 anos de idade, sexo masculino, procedente de São Paulo, apresentou episódios recidivantes de dor no flanco esquerdo. Foi feita hipótese clínica de litíase urinária, sendo realizada tomografia computadorizada (TC). O exame tomográfico (Figura 1) evidenciou volumosa massa prostática sólida, heterogênea, com realce predominantemente periférico pós-contraste. A lesão estendia-se póstero-súpero-lateralmente para a esquerda, envolvendo o ureter esquerdo e causando dilatação do sistema coletor a montante. Após este exame, o paciente foi encaminhado para realização de ultra-sonografia (US) com biópsia transretal, seguida de ressonância magnética (RM) e estudo híbrido de tomografia por emissão de pósitrons/tomografia computadorizada (PET/CT) para estadiamento local e sistêmico.
No estudo ultra-sonográfico transretal (Figura 2) para orientar a punção, observou-se massa sólida, hipoecogênica, comprometendo globalmente a próstata, com distorção de sua arquitetura, descontinuidade da cápsula anatômica e infiltração dos planos adjacentes. A vesícula seminal esquerda apresentava-se de volume aumentado em decorrência da infiltração tumoral. O estudo anatomopatológico e imuno-histoquímico demonstrou tratar-se de rabdomiossarcoma embrionário.
Foi realizada, em seguida, RM com bobina endorretal (Figura 3) para avaliação e estadiamento local, na qual se constatou massa mal delimitada de aspecto infiltrativo com sinal intermediário em T1, hipersinal em T2, com realce intenso e heterogêneo pelo gadolínio, envolvendo o feixe vásculo-nervoso esquerdo, a vesícula seminal esquerda e a porção medial da vesícula seminal direita. A lesão apresentava superfície de contato com a parede vesical no nível do trígono, com provável envolvimento dela. O estudo com PET/CT (Figura 4) mostrou, ainda, lesões hipermetabólicas em linfonodos cervicais posteriores esquerdos, paratraqueais inferiores esquerdos, na fossa supraclavicular esquerda e retroperitoneais, estendendo-se dos hilos renais até a cavidade pélvica. As metástases linfonodais foram confirmadas por biópsia de linfonodo supraclavicular.
DISCUSSÃO Os tumores prostáticos malignos de origem mesenquimal são raros, sendo responsáveis por 0,3% a 1,0% de todos os tumores malignos da próstata. Destes, aproximadamente 30% são rabdomiossarcomas embrionários(1). A maioria dos casos ocorre em crianças, sendo difícil avaliar sua incidência em adultos. Supondo que cerca de 10% destes casos ocorram em adultos, o adenocarcinoma seria 3.000 a 9.000 vezes mais comum nessa faixa etária(1). Os demais tumores de origem sarcomatosa são em sua maioria leiomiossarcomas, que ocorrem principalmente em faixa etária mais avançada e apresentam prognóstico muito melhor(1,2,6,7). O rabdomiossarcoma costuma ser extremamente agressivo, já cursando com metástases a distância em 25% dos pacientes no momento do diagnóstico(4). O pulmão é o sítio mais freqüente, seguido de ossos, linfonodos, fígado e serosas(1,3,8). As metástases ósseas são predominantemente osteolíticas disseminadas, contrastando com o adenocarcinoma, que apresenta, normalmente, metástases osteoblásticas e de maior concentração no esqueleto axial(1). Localmente, costuma infiltrar os planos periuretrais, perivesicais e perirretais, com deslocamento da bexiga e do reto(1?3). Histologicamente, pode ser dividido nos subtipos embrionário, alveolar, bastante agressivo, ocorrendo predominantemente nas partes moles em crianças, e pleomórfico, padrão raro, agressivo, encontrado em adultos(2,9). O padrão embrionário é responsável por cerca de dois terços de todos os casos(2), podendo ser subdividido nas variantes botrióide, de crescimento vegetativo, mais comum na bexiga e cúpula vaginal; de células espinhosas; e convencional, sendo o prognóstico melhor nos dois primeiros casos(2,3). O diagnóstico diferencial no estudo anatomopatológico é realizado por meio da imuno-histoquímica e inclui, principalmente, o linfoma e o carcinoma de pequenas células(4). A apresentação clínica mais comum está relacionada a sintomas obstrutivos urinários, resultantes do aumento significativo do volume prostático. Hematúria e incontinência também podem ocorrer. Dor pélvica é achado freqüente e geralmente necessita de analgesia rigorosa. A compressão ou infiltração dos planos perirretais pode resultar em obstipação intestinal importante(1,3,4,8). Os estudos de avaliação por imagem são bastante escassos e não há um padrão que defina o diagnóstico, sendo este confirmado por meio de punção guiada por US transretal(4,7). Entretanto, alguns achados podem sugerir o diagnóstico, tais como a presença de volumosa massa no leito prostático, infiltrando os planos adjacentes em paciente jovem, sem elevação de marcadores tumorais, nem do antígeno prostático específico (PSA)(1,7). Ao exame ultra-sonográfico, a lesão pode apresentar-se predominantemente hiper ou hipoecóica com áreas sonoluscentes, correspondendo a sítios de hemorragia ou necrose(3). Não há estudos, de nosso conhecimento, demonstrando um perfil dopplervelocimétrico característico da lesão. Relatos descrevem hiperemia e alto fluxo diastólico em rabdomiossarcomas paratesticulares em crianças(3). No caso descrito no presente trabalho, a US permitiu ainda o diagnóstico de extensão tumoral para a vesícula seminal esquerda, comprovado pelo estudo anatomopatológico. A TC mostra massa de atenuação heterogênea, infiltrativa, muitas vezes com limites imprecisos, podendo não ser possível distinguir o sítio de origem como prostático ou vesical(3,10). A apresentação do tumor na RM é inespecífica, revelando baixo sinal nas imagens ponderadas em T1 e alto sinal nas imagens ponderadas em T2. Sinal heterogêneo infere focos hemorrágicos de permeio(3). O exame de RM permite avaliar, com melhor precisão, em relação à US e à TC, a extensão local do tumor e o comprometimento dos planos adjacentes(3,5,11), o que pôde ser observado no nosso caso. O uso do PET/CT para o estadiamento do rabdomiossarcoma no adulto ainda não está consolidado, embora relatos em crianças têm revelado grande utilidade na detecção de foco primário em doença de apresentação metastática, metástases obscuras e em sítios não-usuais(12). No nosso caso ela foi de grande utilidade na detecção de metástases linfonodais a distância. O tratamento é realizado com quimioterapia associada ou não a ressecção cirúrgica e/ou radioterapia. O prognóstico é desfavorável, com sobrevida de 30% a 35% em cinco anos para todos os rabdomiossarcomas do adulto(6,13), e provavelmente menor quando primário da próstata(1).
CONCLUSÃO O rabdomiossarcoma prostático apresenta-se de forma muito mais agressiva e com prognóstico muito mais sombrio no adulto, quando comparado com sua apresentação infantil, sendo também muito mais raro. As novas tecnologias em diagnóstico por imagem podem tanto auxiliar no correto diagnóstico como também promover um estadiamento preciso da doença, favorecendo, assim, um melhor planejamento terapêutico.
REFERÊNCIAS 1. Waring PM, Newland RC. Prostatic embryonal rhabdomyosarcoma in adults. A clinicopathologic review. Cancer 1992;69:755?762. [ ] 2. Nigro KG, MacLennan GT. Rhabdomyosarcoma of the bladder and prostate. J Urol 2005;173:1365. [ ] 3. Agrons GA, Wagner BJ, Lonergan GJ, Dickey GE, Kaufman MS. From the archives of the AFIP. Genitourinary rhabdomyosarcoma in children: radiologic-pathologic correlation. RadioGraphics 1997;17:919?937. [ ] 4. Logani S, Cabrera RA, Amin MB. Embryonal rhabdomyosarcoma of the adult prostate: differential diagnostic considerations. Path Cas Rev 2003;8:82?87. [ ] 5. Hawkins WG, Hoos A, Antonescu CR, et al. Clinicopathologic analysis of patients with adult rhabdomyosarcoma. Cancer 2001;91:794?803. [ ] 6. Ferrari A, Dileo P, Casanova M, et al. Rhabdomyosarcoma in adults. A retrospective analysis of 171 patients treated at a single institution. Cancer 2003;98:571?580. [ ] 7. Sexton WJ, Lance RE, Reyes AO, Pisters PW, Tu SM, Pisters LL. Adult prostate sarcoma: the M.D. Anderson Cancer Center Experience. J Urol 2001;166:521?525. [ ] 8. Bos SD, Slaa ET. An adult man with a rhabdo myosarcoma of the prostate. A case report. Scand J Urol Nephrol 1991;25:329?330. [ ] 9. Miettinen M. Rhabdomyosarcoma in patients older than 40 years of age. Cancer 1988;62:2060?2065. [ ] 10. Baker ME, Silverman PM, Korobkin M. Computed tomography of prostatic and bladder rhabdomyosarcomas. J Comput Assist Tomogr 1985; 9:780?783. [ ] 11. Bartolozzi C, Selli C, Olmastroni M, Menchi I, Di Candio G. Rhabdomyosarcoma of the prostate: MR findings. AJR Am J Roentgenol 1988;150: 1333?1334. [ ] 12. McCarville MB, Christie R, Daw NC, Spunt SL, Kaste SC. PET/CT in the evaluation of childhood sarcomas. AJR Am J Roentgenol 2005;184: 1293?1304. [ ] 13. Little DJ, Ballo MT, Zagars GK, et al. Adult rhabdomyosarcoma: outcome following multimodality treatment. Cancer 2002;95:377?388. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 11/4/2006. Aceito, após revisão, em 17/5/2006.
* Trabalho realizado no Centro de Diagnóstico por Imagem do Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP, Brasil. |