ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Adelaja Otolorin Osibote, Ana Cecília Pedrosa de Azevedo, Antonio Carlos Pires Carvalho, Helen Jamil Khoury, Sergio Ricardo de Oliveira, Marcos Otaviano da Silva, Carla Marchon |
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Descritores: Radiografia torácica, Controle de qualidade, Dosimetria |
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Resumo: VFísico, Doutorando, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
INTRODUÇÃO Com a publicação, em 1998, da Portaria 453/98 "Diretrizes de proteção radiológica em radiodiagnóstico médico e odontológico" da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde(1), os estabelecimentos médicos que fazem uso de radiação ionizante têm procurado se adequar às exigências de controle de qualidade e proteção radiológica preconizadas nesta Portaria. Nos Estados do Rio de Janeiro e de Pernambuco, vários hospitais e clínicas têm sido alvo de pesquisas acadêmicas na área de proteção radiológica e controle de qualidade em radiologia diagnóstica. Essas pesquisas são coordenadas pelo Grupo de Proteção Radiológica e Controle de Qualidade da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca-CESTEH da Fundação Oswaldo Cruz e pelo Grupo de Dosimetria e Instrumentação do Departamento de Energia Nuclear da Universidade Federal de Pernambuco. Este trabalho apresenta parte dos resultados dessa ação conjunta que vem sendo desenvolvida pelas duas instituições e apresenta uma avaliação de doses e qualidade da imagem de radiografias de tórax efetuadas em oito hospitais de sete municípios dos dois Estados citados.
MATERIAIS E MÉTODOS O estudo foi realizado em oito hospitais de sete municípios: Angra dos Reis, Cabo Frio, Campos dos Goytacazes, Itaperuna, Niterói, Recife e Rio de Janeiro. Os hospitais foram denominados pelas letras A, B, C, D, E, F, G e H, aleatoriamente. Foram avaliadas a dose de entrada na pele (DEP) e a dose efetiva (DE) de 520 radiografias de tórax na incidência póstero-anterior/ântero-posterior (PA/AP) e 215 radiografias de tórax na incidência perfil de pacientes adultos. Paralelamente à avaliação dessas doses, foi feita análise crítica da qualidade da imagem em 44 radiografias adotando como modelo os Critérios de Imagem da Comunidade Européia(2). 1. Avaliação das doses A fim de agilizar o processo de obtenção de doses em pacientes, foi utilizado um programa computacional sob plataforma Windows, chamado de DoseCal(3). Este programa, já descrito anteriormente(4), calcula a DEP, a dose nos órgãos (DO) e a DE a partir dos valores da técnica radiográfica empregada, do rendimento do tubo e dos dados antropométricos dos pacientes. O DoseCal foi construído no Radiological Protection Center do Hospital Saint Georges (Londres) e constitui uma ferramenta da maior importância para avaliação de doses de um grande número de pacientes. O programa foi generosamente cedido para este projeto de pesquisas no Brasil. Para que o programa funcione adequadamente, é necessário fornecer o rendimento do tubo de raios X em mGy/mAs, o qual pode ser facilmente obtido utilizando-se uma câmara de ionização devidamente calibrada. Neste trabalho utilizamos o Nero 8000-Inovision e a Radcheck Plus 06-526. Uma vez conhecidos os valores do rendimento, a corrente, a quilovoltagem, o tempo de exposição e a distância foco-pele (DFP), a equação (1) fornecerá a DEP. onde: Rendimento é o valor obtido em mGy/mAs, do tubo de raios X a 80 kV e na distância de 1 m normalizado para 10 mAs; kV é o potencial aplicado ao tubo (em quilovolts); mAs é o produto da corrente pelo tempo de exposição; a DFP está em cm; e FRE é o fator de retroespalhamento. O DoseCal utiliza os fatores de conversão das tabelas da NRPB-SR262(5), os quais são aplicados para o cálculo da DEP, DO e DE. 2. Critérios de imagem Baseada na afirmação que "a melhor imagem proporcionará um melhor diagnóstico", a Comunidade Européia organizou um comitê que elaborou critérios para imagens radiográficas com fins diagnósticos. Outros critérios também foram elaborados pela Comunidade Européia, tais como critérios de boas práticas e doses de referência para pacientes. A versão mais recente desse documento(2) foi publicada em 1996 (EUR 16260 EN-European Guidelines on Quality Criteria for Diagnostic Radiographic Images). Nessa publicação podem ser encontrados os critérios de imagem para radiografias de tórax, crânio, coluna lombar, pelve, trato urinário e mama. Esses critérios foram basicamente definidos considerando ou não a presença de estruturas anatômicas da região radiografada, assim como o grau de visualização delas. Os critérios são classificados em três graus: visualização as características anatômicas são detectadas, porém não são totalmente reproduzidas); reprodução os detalhes anatômicos são identificados, mas não estão necessariamente claramente definidos; reprodução nítida os detalhes anatômicos estão claramente definidos. Os critérios de imagem, de acordo com a Comunidade Européia, para tórax em incidências PA/AP e perfil estão apresentados na Tabela 1.
RESULTADOS A Tabela 2 apresenta os valores estatísticos (média, primeiro e segundo quartis) da DEP (em mGy) de radiografias de tórax nas incidências PA/AP e perfil. Observa-se que, na projeção PA/AP, os valores médios variaram de 0,07 mGy (hospitais E e H) a 0,64 mGy (hospital C), com valor médio de 0,24 mGy. Na projeção perfil, os valores oscilaram de 0,14 mGy a 1,02 mGy, com média de 0,47 mGy. No que se refere à DE, os valores oscilaram entre 0,01 mSv (hospitais B, D, E e H) e 0,06 mSv (hospital C), com valor médio de 0,03 mSv para a projeção PA/AP, e de 0,01 mSv a 0,7 mSv, com média de 0,2 mSv, na projeção perfil.
Na Tabela 3 e na Figura 1 são apresentados os valores das técnicas radiográficas e os dados antropométricos dos pacientes. Os valores médios da quilovoltagem variaram entre 70 kV (hospitais B e C) e 93 kV (hospital E), com valor médio de 78 kV na projeção PA/AP. Na projeção perfil os valores oscilaram entre 85 kV e 95 kV, com média de 90 kV. Com relação à miliamperagem, os valores oscilaram entre 3 mAs (hospital E) e 36 mAs (hospital C), com média de 12 mAs na projeção PA/AP. Na projeção perfil a variação foi de 7 mAs a 24 mAs, com média de 15 mAs. A DFP variou de 120 cm (hospital C) a 162 cm (hospital G), com valor médio de 139 cm na projeção PA/AP. Na projeção perfil essa variação ficou entre 109 cm e 157 cm. A idade média dos pacientes foi de 48 anos na projeção PA/AP e de 49 anos na projeção perfil. O peso médio foi de 67 kg em ambas as projeções.
No que se refere aos critérios de imagem, os resultados estão apresentados na Tabela 4 e na Figura 2. Os critérios que apresentaram os percentuais mais altos de conformidade foram o critério 8 com 97% de presença nos exames e o critério 9 com 94%, ambos na projeção PA/AP. Já os critérios que estavam ausentes em todas as imagens foram o critério 6 (para ambas as projeções) e o critério 7 na projeção perfil.
DISCUSSÃO Os valores de DEP atestam que há grandes variações entre os hospitais avaliados. Uma diferença de mais de nove vezes foi encontrada na DEP e de seis vezes, nos valores da DE. Essas discrepâncias refletem a disparidade das técnicas radiográficas empregadas em cada um dos estabelecimentos. Pode-se observar que o hospital C, que apresentou o maior valor da DEP (0,64 mGy), foi o que utilizou quilovoltagem média mais baixa (70 kV) e miliamperagem mais alta (36 mAs). Além disso, emprega uma distância focofilme muito reduzida (120 cm). Esses fatores contribuem para o aumento na dose fornecida ao paciente. Além disso, vários fatores também contribuem para a variação das doses, sendo os mais importantes: o treinamento dos técnicos, o sistema de revelação dos filmes radiográficos, a luminância dos negatoscópios utilizados para a avaliação das imagens radiográficas e a filtração do feixe. No que se refere aos critérios de qualidade das imagens, o critério 6 na projeção PA/AP ("Reprodução nítida da traquéia e parte proximal dos brônquios") esteve ausente em todas as imagens, o que indica ser impossível obter uma reprodução nítida da traquéia e da parte proximal dos brônquios nessas incidências. O critério 6 na projeção perfil ("Reprodução nítida da borda posterior do coração, aorta e mediastino") também não foi detectado em nenhuma imagem. O critério 7 ("Reprodução nítida do diafragma, esterno e coluna torácica"), para a projeção perfil, também não esteve presente em nenhuma das imagens analisadas. O valor percentual médio de presença dos critérios foi de 55%, sendo de 63% para as projeções PA/AP e de 46% para a projeção perfil. Observa-se também, pelos dados, que na projeção PA/AP da radiografia de tórax os critérios 2 e 3 apresentaram o menor percentual de ocorrência. Estes critérios referem-se à reprodução simétrica do tórax e borda medial das escápulas fora dos campos pulmonares, e portanto, ao posicionamento do paciente. Este resultado mostra a importância da necessidade da capacitação dos técnicos.
CONCLUSÃO A padronização/redução das doses poderá ser atingida através de medidas (quase sempre muito simples) de fácil implementação nos serviços de radiologia. Essas medidas devem fazer parte de um programa de controle e garantia de qualidade a ser implementado em todo serviço de radiologia diagnóstica. O treinamento adequado dos técnicos, o desempenho dos equipamentos de raios X e das processadoras automáticas de filmes, assim como o emprego das técnicas de alta quilovoltagem, poderão ser de grande valia para a redução das doses nos pacientes e obtenção de imagens de qualidade superior. Em relação aos critérios de qualidade estabelecidos pela Comunidade Européia, certamente uma radiografia na qual todos os critérios estejam adequados servirá para o melhor diagnóstico. Uma boa radiografia depende, basicamente, do bom treinamento do técnico que a realizará, o qual, na ausência do radiologista, deverá ter capacidade de decidir se ficou ou não adequada, o que se torna mais fácil se os critérios de qualidade forem conhecidos. O valor médio de presença dos critérios da norma européia nas imagens avaliadas (55%) atesta que as imagens talvez não possuam a qualidade necessária para possibilitar o diagnóstico mais confiável e adequado. Agradecimentos Ao Centro de Vigilância Sanitária-SES/RJ, à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), à Universidade Federal de Pernambuco, à Third World Organization for Women in Science, e ao International Centre for Theoretical Physics-ICTP de Trieste, Itália.
REFERÊNCIAS 1. Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância Sanitária. Diretrizes de proteção radiológica em radiodiagnóstico médico e odontológico. Portaria 453/98, de 1/6/1998. Diário Oficial da União:Brasília 103, 2/6/1998. [ ] 2. Commission of European Communities. European guidelines on quality criteria for diagnostic radiographic images. Report EUR 16260EN. Bruxelas: European Communities/Union, 1996. [ ] 3. Kyriou JC, Newey V, Fitzgerald MC. Patient doses in diagnostic radiology at the touch of a button. London, UK: The Radiological Protection Center, St. George's Hospital, 2000. [ ] 4. Azevedo ACP, Mohamadain KEM, Osibote AO, Cunha ALL, Pires Filho A. Estudo comparativo das técnicas radiográficas e doses entre o Brasil e a Austrália. Radiol Bras 2005;38:343346. [ ] 5. Hart D, Jones DG, Wall BF. Normalized organ doses for medical x-ray examinations calculated using Monte Carlo techniques. NRPB-SR262. Chilton: NRPB, 1994. [ ]
Recebido para publicação em 18/4/2006.
* Trabalho realizado na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. |