ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Cristiano Montandon, Juliana da Cunha Costa, Lorena Andrade Dias, Fernando Henrique Abrão Alves da Costa, Ana Carolina Mendes da Costa, Renato Tavares Daher, Marcelo Eustáquio Montandon Jr |
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Descritores: Tumor glômico subungueal, Imagem por ressonância magnética, Ultrassonografia |
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Resumo:
INTRODUÇÃO Os corpos glômicos são anastomoses arteriovenosas altamente especializadas, responsáveis pela termorregulação mediante controle do fluxo sanguíneo para a pele. Estão localizados na camada reticular da derme, sendo mais numerosos nos dedos, nas palmas das mãos e plantas dos pés(1). Os tumores glômicos são lesões benignas raras(2,3), caracterizadas por proliferação hamartomatosa com origem nos corpos glômicos neuromioarteriais(2), tendo sido descritos pela primeira vez por Wood em 1812(3,4). São também denominados glomangiomas e representam, aproximadamente, 2% de todos os tumores primários de partes moles(5,6) e 1% a 4,5% das neoplasias da mão(3,5). Habitualmente, se apresentam como nódulos azul-avermelhados, de pequenas dimensões, medindo de 3 a 10 milímetros de diâmetro(2). A localização típica é a região subungueal das falanges distais, mas podem ser encontrados em qualquer parte do corpo(1,7). As lesões múltiplas são extremamente raras (2,3%), sendo mais comuns em crianças(1). Clinicamente, os tumores glômicos se caracterizam por dor pulsátil intensa e debilitante e sensibilidade à pressão e à temperatura(8,9). Alterações ungueais são frequentes nas lesões de dimensões maiores e raramente são palpáveis. No entanto, os sinais clínicos nem sempre são óbvios, e as reduzidas dimensões tumorais tornam necessária a realização de exames de imagem para a elucidação diagnóstica e, sobretudo, para auxiliar no planejamento terapêutico-cirúrgico(10,11). Este estudo tem como objetivo analisar os principais aspectos de imagem dos tumores glômicos subungueais.
MATERIAIS E MÉTODOS Foi feito estudo retrospectivo de oito casos de tumores glômicos subungueais, pertencentes aos arquivos da Clínica Multimagem Diagnósticos e da Clínica da Imagem, Goiânia, GO, Brasil (Tabela 1).
Radiografias em incidências ântero-posterior e perfil foram obtidas em cinco casos. Ultrassonografia (US) com Doppler foi realizada em seis pacientes, e ressonância magnética (RM), antes e após a administração de meio de contraste, foi realizada em cinco casos. O critério diagnóstico para tumor glômico subungueal foi a visualização direta do tumor pela US com Doppler ou pela RM. Nos exames de US com Doppler analisou-se a ecogenicidade do tumor e suas características de vascularização ao Doppler colorido. Nos exames de RM analisaram-se as características de sinal nas ponderações T1 e T2 e o padrão de captação pelo meio de contraste intravenoso (gadolínio). Além disso, utilizou-se o critério indireto na radiografia convencional, caracterizado pelo remodelamento ósseo na face dorsal da falange distal, como positivo para tumor glômico. Foi realizado, também, levantamento quanto à localização dos tumores subungueais, ao dedo acometido e à sua situação no plano axial, se mediano ou lateral no leito ungueal. Todos os pacientes eram virgens de tratamento, exceto o caso número 7, que já havia sido submetido a uma cirurgia há cinco anos para ressecção de tumor glômico no dedo médio. Porém, o paciente citado apresentava recidiva dos sintomas à época do exame. Todos os casos foram confirmados histopatologicamente após a ressecção cirúrgica. Não foi objeto de estudo a avaliação prognóstica e/ou o acompanhamento dos pacientes.
RESULTADOS A idade média de acometimento dos tumores glômicos no grupo avaliado foi de 39 anos (variação de 26 a 51 anos), com predomínio do sexo feminino na proporção de 7:1. Os tumores localizavam-se no dedo indicador (três casos - 37,5%), nos dedos mínimo e médio (dois casos cada - 25%) e no polegar (um caso - 12,5%). Quanto à localização no plano axial, a maioria encontrava-se na linha mediana (seis casos - 75%) e apenas dois casos (25%) eram de localização lateral no leito ungueal. A radiografia simples foi positiva em três dos cinco casos que haviam sido submetidos a este método (60%), mostrando remodelamento ósseo (erosão por pressão) na face dorsal da falange distal (Figura 1). A US com Doppler foi positiva em cinco dos seis pacientes avaliados (83%), sendo que todos apresentavam nódulo sólido, bem definido, hipoecoico e hipervascularizado de localização subungueal (Figuras 1 e 2). A RM foi positiva nos cinco casos estudados, demonstrando nódulo sólido, subungueal, com limites bem definidos, apresentando hipossinal nas sequências ponderadas em T1, hipersinal nas sequências ponderadas em T2 e captação homogênea do meio de contraste intravenoso (Figuras 3 e 4).
DISCUSSÃO Os tumores glômicos são lesões benignas localizadas preferencialmente nas extremidades distais dos dedos, geralmente das mãos, particularmente subungueais, uma vez que os corpos glômicos são mais numerosos nestas áreas(8). São lesões raras, porém debilitantes, e representam de 1% a 4,5% de todos os tumores da mão(5). O presente trabalho mostrou maior prevalência no sexo feminino (7:1) e média de idade de 39 anos no momento do diagnóstico, assim como observado em outras séries(6,8,10). Habitualmente, o diagnóstico é clínico, sendo que este é feito corretamente em 50% a 78% dos casos(12), porém muitas vezes tardio, com os sintomas presentes, em média, de quatro a sete anos antes que o diagnóstico seja realizado(8,13,14). Não foi objeto de estudo o levantamento de dados clínicos dos pacientes. Os exames de imagem mais utilizados na suspeição desta entidade são a radiografia simples, a US e a RM. Estes exames contribuem para o diagnóstico precoce, reduzindo o intervalo entre o início do quadro e o tratamento. Também são úteis para o planejamento terapêutico, especialmente para a definição do acesso cirúrgico, reduzindo os índices da principal complicação pós-cirúrgica, ou seja, a distrofia ungueal(2). Na radiografia convencional observam-se sinais de remodelamento ósseo na face dorsal da falange distal (erosão por pressão). Entretanto, este achado está presente em apenas 14% a 60% dos casos(5,15-18) (60% em nosso estudo). O aumento da distância entre a face dorsal da falange distal e a superfície ungueal inferior também é descrito nesta entidade. Todavia, este aspecto é raramente encontrado (25%)(2) e foi observado em apenas um caso por nós avaliado. A baixa sensibilidade deste método está, provavelmente, relacionada com as pequenas dimensões da maioria destes tumores. A magnificação e o estudo comparativo com o lado contralateral auxiliam na avaliação destas lesões(2). No exame por US observa-se nódulo sólido, hipoecogênico, bem delimitado, com vascularização proeminente ao modo Doppler. As limitações do método residem no fato do método ser operador-dependente e na dificuldade em se avaliar ultrassonograficamente a região subungueal(6). Portanto, um estudo negativo não deve excluir a presença de um tumor de pequenas dimensões, devendo-se prosseguir a investigação com exploração cirúrgica quando a suspeita clínica for bem estabelecida(1). No presente estudo, a US foi positiva em 83,3% dos casos. No estudo por RM, geralmente, se observa lesão nodular sólida, de contornos bem definidos, com hipossinal em relação à derme do leito ungueal nas imagens ponderadas em T1 e hipersinal nas imagens ponderadas em T2, com realce homogêneo pelo contraste intravenoso(2,7,19), achados estes que foram observados em todos os nossos pacientes examinados com este método. Na RM também são descritas lesões com hipersinal em T1, provavelmente decorrente de componente hemorrágico, além de lesões com halo de hipossinal em todas as sequências de aspecto capsular, não observado no presente estudo(2). A RM tem ainda a vantagem de ser 3,5 vezes mais sensível do que a radiografia simples para a detecção de erosões ósseas(2). É o exame de imagem, atualmente disponível, mais sensível para a detecção destes tumores, não tendo sido observado nenhum caso de falso-negativo por este método na nossa série. Além disso, oferece informações satisfatórias quanto à localização do tumor, facilitando o planejamento cirúrgico(1). O tratamento de escolha é a remoção cirúrgica completa da lesão(1). A incidência de recorrência dos sintomas após a excisão varia entre 12% e 24% dos casos(2). Nas ocasiões em que os sintomas reaparecem com menos de um ano após a cirurgia, muitos autores atribuem a recidiva a ressecções incompletas ou à presença de uma segunda lesão que não havia sido diagnosticada e removida cirurgicamente. Em contrapartida, quando a recorrência dos sintomas ocorre mais de um ano após o procedimento, normalmente o fato é atribuído ao desenvolvimento de um novo tumor(2). Na recorrência dos sintomas, a RM permite, na maioria dos casos, a diferenciação entre lesões tumorais residuais/recidivadas e alterações fibrocicatriciais pós-cirúrgicas. Ao contrário das alterações pós-cirúrgicas, que se caracterizam por apresentarem limites mal definidos e hipossinal em todas as sequências, os tumores glômicos residuais/recidivados são bem definidos e apresentam características de sinal semelhantes aos tumores sem manipulações, como observado no caso de número 7 deste artigo(1). Quanto aos diagnósticos diferenciais, devem ser citados os cistos de inclusão epidérmicos e mucosos, que são lesões císticas avasculares, ou seja, não captantes de contraste e sem fluxo ao Doppler e que geralmente não apresentam remodelamento ósseo adjacente. Entidades mais raras nesta localização, como os neuromas e os angiomas, são de difícil diagnóstico diferencial pelos métodos de imagem. As artropatias inflamatórias e de depósito, especialmente a gota, mostram alterações predominantes na articulação interfalangiana distal(6).
CONCLUSÃO Considerando-se que o tratamento dos tumores glômicos consiste na excisão completa da lesão(1,2), os métodos de imagem, especialmente a US e a RM, demonstraram importante papel na confirmação diagnóstica desta entidade. Além disso, tais métodos oferecem a determinação precisa da localização tumoral, facilitando o planejamento cirúrgico, bem como afastando outros diagnósticos diferenciais. Devemos lembrar, ainda, que os achados de imagem não são específicos para estas lesões e que, portanto, o diagnóstico deve ser baseado na correlação com os dados clínicos(6).
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 30/5/2009.
* Trabalho realizado na Clínica da Imagem e Clínica Multimagem Diagnósticos, Goiânia, GO, Brasil. |