ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Paulo Martin Nowak, Luciano Marcondes Machado Nardozza, Edward Araujo Júnior, Liliam Cristine Rolo, Hélio Antonio Guimarães Filho, Antonio Fernandes Moron |
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Descritores: Gestação inicial, Primeiro trimestre de gestação, Idade gestacional, Volume de órgão, Imagem tridimensional |
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Resumo:
INTRODUÇÃO A placenta humana é um órgão viloso, hemocorial, essencial para a transferência de nutrientes e gases entre a mãe e o feto e, também, para a eliminação de produtos do metabolismo fetal. Há evidências que suportam uma associação entre placentação no primeiro trimestre com subsequente resultado gestacional(1). A ultrassonografia tridimensional mostra-se como um método capaz de avaliar o volume placentário (VP) no primeiro trimestre de gestação, porém, até o momento, apenas os métodos multiplanar(2,3) e Virtual Organ Computer-aided Analysis (VOCAL) foram aplicados in vivo(46). Recentemente, uma nova técnica volumétrica chamada eXtended Imaging Virtual Organ Computer-aided Analysis (XI VOCAL) tem estado disponível como parte do programa Three-dimensional eXtended Imaging (3D XI) (Medison; Seul, Coreia). Essa técnica consiste na delimitação de planos sequenciais adjacentes dispostos na tela do aparelho (multislice view), sendo que, ao final, o aparelho realiza o somatório das áreas e fornece automaticamente o volume(7). Há uma única publicação que avaliou in vivo o volume de fetos entre 11 e 14 semanas por esta técnica(8), não havendo descrições para o VP. O objetivo deste estudo é determinar valores de referência para o VP entre 7 e 10 semanas e 6 dias de gestação por meio da ultrassonografia tridimensional utilizando o novo método XI VOCAL.
MATERIAIS E MÉTODOS Realizou-se estudo do tipo corte transversal com 70 gestantes normais, entre outubro de 2006 e março de 2008. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sob o nº 1491/06, sendo que as pacientes que concordaram na participação voluntária assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. Os critérios de inclusão neste estudo foram: gestação única com embrião viável; idade gestacional determinada pela data da última menstruação, em mulheres com ciclos menstruais regulares, ou por meio de ultrassonografia realizada até a 10ª semana e 6 dias utilizando como parâmetro o comprimento cabeça-nádega (CCN); e ausência de sangramento vaginal na atual gestação. Os critérios de exclusão foram: gestantes portadoras de doenças crônicas; tabagistas ou usuárias de drogas na gestação atual, uso de medicamentos abortivos; malformações uterinas e gestações resultantes de tratamento para infertilidade. Os exames foram realizados no Setor de Ultrassonografia Tridimensional do Departamento de Obstetrícia da Unifesp em um aparelho da marca Accuvix XQ (Medison; Seul, Coreia) equipado com transdutor endocavitário volumétrico multifrequencial (4 a 9 MHz). Os exames foram realizados por apenas dois examinadores. Para se obter o volume tridimensional da placenta, foi acionada a tecla 3D do aparelho, aparecendo uma janela de escaneamento (BOX), sendo esta posicionada de modo a abranger toda a extensão placentária (região de interesse ROI). Utilizou-se ângulo de varredura de 75°, com a velocidade de varredura lenta, de maneira a se obter a melhor qualidade possível do volume. Para se obter nítida separação da camada basal da placenta da parede uterina, foi acionado o modo harmônico e o foco foi ajustado na profundidade da placenta. Após a realização da varredura automática, a imagem tridimensional foi mostrada na tela na forma de três planos ortogonais perpendiculares entre si (axial, sagital e coronal). Para a obtenção do volume da placenta pelo método XI VOCAL, utilizou-se como referencial o plano sagital, sendo os planos de início e fim dispostos nas bordas externa e interna da placenta, respectivamente. Optou-se pela delimitação manual de dez planos sequenciais, sendo que ao término da delimitação do último plano o aparelho fornecia automaticamente o volume da estrutura, bem como o intervalo entre os planos intermediários e a distância entre os planos de início e fim (Figura 1). As análises volumétricas foram realizadas off-line por um único examinador, com o uso do software SonoView Pro versão 1.03 (Medison; Seul, Coreia).
Os dados foram armazenados em planilha do programa Excel 2003 (Microsoft; Redmond, WA, EUA) e analisados por meio do programa estatístico Statistical Package for Social Sciences (SPSS) for Windows versão 11.0 (SPSS Inc.; Chicago, IL, EUA). Para avaliar a correlação do VP com a idade gestacional, foi criado gráfico de dispersão, sendo o ajuste realizado pelo coeficiente de determinação (R2). Foram determinadas médias, medianas, desvios-padrão e valores máximo e mínimo para o VP em cada idade gestacional avaliada, além dos percentis 5, 25, 50, 75 e 95. Em todas as análises utilizou-se nível de significância de 0,05.
RESULTADOS A idade materna variou de 19 a 41 anos, com média de 29 ± 5,5 (desvio-padrão) anos. O número de gestações variou de 1 a 9, com média de 2,5 ± 1,5, enquanto o número de partos variou de 0 a 8, com média de 1 ± 1,6. A média do VP variou de 4,6 ± 1,8 cm3 (2,68,6 cm3) a 28,9 ± 14,1 cm3 (11,466,9 cm3) entre 7 e 10 semanas e 6 dias de gestação. A Tabela 1 apresenta as médias, medianas, desvios-padrão, valores máximo e mínimo para o VP nas idades gestacionais avaliadas. A Tabela 2 apresenta os percentis 5, 25, 50, 75 e 95 para o VP em função da idade gestacional.
Observou-se forte correlação entre o VP e a idade gestacional (IG), sendo o melhor modelo de ajuste uma regressão exponencial, dada pela seguinte fórmula: VP = exp(0,582 × IG + 0,063); R2 = 0,82 (Figura 2).
DISCUSSÃO A ultrassonografia tridimensional tem se mostrado uma técnica adequada para a avaliação do VP no primeiro trimestre de gestação(26), bem como de outras estruturas como a vesícula vitelínica, conforme recentemente comprovado por nosso grupo(9). As duas técnicas utilizadas até o momento para tal finalidade são o multiplanar(2,3) e o VOCAL(46). O multiplanar é uma técnica que consiste na delimitação de áreas, de um determinado objeto, em um plano de referência, enquanto em outro plano um cursor se desloca de uma extremidade a outra do objeto; ao final do deslocamento o aparelho realiza o somatório das áreas e fornece o volume. Esta técnica tem como limitação o tempo relativamente longo para a aferição volumétrica(3). O método VOCAL consiste na rotação de um objeto sobre um eixo, sendo que a cada rotação determina-se uma área; ao final do processo rotacional o aparelho reconstrói o objeto e fornece o seu volume. Apresenta como vantagens um tempo relativamente menor para a aferição volumétrica e a capacidade de modificação dos contornos das áreas delimitadas após o final do cálculo volumétrico(10). Em estudo prévio desenvolvido por nosso grupo, comprovamos que os métodos multiplanar (intervalo de 1,0 mm), VOCAL 30° (6 planos) e VOCAL 12° (15 planos) se mostraram concordantes na avaliação do VP entre 7 e 10 semanas e 6 dias de gestação(5). O método XI VOCAL é uma extensão do programa 3D XI(7). Esta técnica consiste em se delimitar áreas de planos sequenciais dispostos na tela do aparelho (multislice view), e ao término da delimitação da última área o aparelho fornece o volume do objeto, bem como o intervalo entre os planos intermediários e a distância entre os planos de início e fim. Este programa permite a delimitação de 5, 10 e 15 planos sequenciais. O único estudo que avaliou a aplicação in vivo desta técnica foi publicado recentemente(8). Nesse estudo observou-se que o método XI VOCAL (10, 15 e 20 planos) pode ser utilizado permutavelmente com o multiplanar (intervalos de 1,0 mm); da mesma forma, o XI VOCAL (10 planos) e o VOCAL 18°, além do XI VOCAL (15 planos) e o VOCAL 12°, também podem ser utilizados permutavelmente na avaliação do volume de fetos entre 11 e 14 semanas. Observamos forte correlação entre o VP pelo método XI VOCAL (10 planos) com a idade gestacional, sendo o melhor ajuste com a regressão exponencial. Em estudo prévio realizado por nosso grupo, evidenciamos forte correlação entre o VP pelo método VOCAL 30° e o CCN, sendo o melhor ajuste também com a regressão exponencial(6). A média do VP pelo XI VOCAL variou de 4,6 a 28,9 cm3 entre 7 e 10 semanas e 6 dias. Em estudo prévio(5), utilizando o método VOCAL 30° no mesmo intervalo gestacional, a média do VP variou de 3,4 a 36,3 cm3 entre 9 e 40 mm do CCN. Em outro estudo(2), usando o método multiplanar, os autores encontraram média do VP de 41,3 cm3 para um CCN entre 35 e 44 mm. Esses resultados mostram a grande concordância entre os métodos XI VOCAL (10 planos) e VOCAL 30° na avaliação do VP no início da gestação, entretanto, o método VOCAL 30° se mostra mais vantajoso por ser mais rápido e acessível.
CONCLUSÃO Em síntese, a importância do nosso estudo deve-se ao fato de apresentar uma nova aplicabilidade in vivo, além de determinar valores de referência para o VP pelo novo método XI VOCAL no primeiro trimestre de gestação. Novos estudos, em populações de risco para perdas gestacionais precoces, são necessários para se comprovar a real aplicabilidade desta curva de referência.
REFERÊNCIAS 1. Smith GC. First-trimester origins of fetal growth impairment. Semin Perinatol. 2004;28:4150. [ ] 2. Metzenbauer M, Hafner E, Hoefinger D, et al. Three-dimensional ultrasound measurement of the placental volume in early pregnancy: method and correlation with biochemical placenta parameters. Placenta. 2001;22:6025. [ ] 3. Chen M, Leung KY, Lee CP, et al. Placental volume measured by three-dimensional ultrasound in the prediction of fetal alpha-thalassemia: a preliminary report. Ultrasound Obstet Gynecol. 2006;28:16672. [ ] 4. Wegrzyn P, Faro C, Falcon O, et al. Placental volume measured by three-dimensional ultrasound at 11 to 13 + 6 weeks of gestation: relation to chromosomal defects. Ultrasound Obstet Gynecol. 2005;26:2832. [ ] 5. Nowak PM, Nardozza LM, Araujo Júnior E, et al. Comparison of placental volume in early pregnancy using multiplanar and VOCAL methods. Placenta. 2008;29:2415. [ ] 6. Nardozza LM, Nowak PM, Araujo Júnior E, et al. Evaluation of placental volume at 710+6 weeks of pregnancy by 3D-sonography. Placenta. 2009; 30:5859. [ ] 7. Guimarães Filho HA, da Costa LL, Araujo Júnior E, et al. XI VOCAL (eXtended Imaging VOCAL): a new modality for three-dimensional sonographic volume measurement. Arch Gynecol Obstet. 2007;276:957. [ ] 8. Cheong KB, Leung KY, Chan HY, et al. Comparison of inter- and intraobserver agreement between three types of fetal volume measurement technique (XI VOCAL, VOCAL and multiplanar). Ultrasound Obstet Gynecol. 2009;33:28794. [ ] 9. Rolo LC, Nardozza LMM, Araujo Júnior E, et al. Correlação do volume da vesícula vitelínica obtida por meio da ultrassonografia tridimensional com a idade gestacional entre a 7ª e a 10ª semanas usando o método multiplanar. Radiol Bras. 2009;42:35962. [ ] 10. Peralta CF, Cavoretto P, Csapo B, et al. Lung and heart volumes by three-dimensional ultrasound in normal fetuses at 12-32 weeks' gestation. Ultrasound Obstet Gynecol. 2006;27:12833. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 25/12/2009.
* Trabalho realizado no Setor de Ultrassonografia Tridimensional do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. |