ENSAIO ICONOGRÁFICO
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Autho(rs): Tiago Tavares Vilela, Renato Tavares Daher, Mariana Domiciano Albuquerque Nóbrega, Carlos Alberto Ximenes Filho, Cristiano Montandon, Marcelo Eustáquio Montandon Júnior |
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Descritores: Cistos congênitos mediastinais, Neoplasias císticas, Cistos |
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Resumo: VMédicos Radiologistas das Clínicas da Imagem e Multimagem, Goiânia, GO, Brasil
INTRODUÇÃO Cistos congênitos mediastinais (CCMs) são lesões de comportamento benigno geralmente causadas por falhas no desenvolvimento embriológico do intestino anterior e/ou da cavidade celômica(1). Representam 10% das massas mediastinais e incluem, entre suas entidades, cistos broncogênico, pericárdico, entérico e tímico, linfangioma e cisto de duplicação esofágica. Em regra são assintomáticos, mas podem se manifestar como urgência médica, principalmente por compressão de órgãos adjacentes. Os exames de imagem, particularmente a tomografia computadorizada (TC), pela avaliação da densidade dessas estruturas, cumprem papel fundamental na elucidação diagnóstica e planejamento terapêutico dos casos necessários. Outros parâmetros, como localização e mudança do aspecto lesional em diferentes posições (p. ex.: decúbito e ortostase), também podem ser importantes para o diagnóstico diferencial, especialmente nas radiografias de tórax. Este tema possui grande importância para o médico radiologista, uma vez que seu relatório é, em grande parte dos casos, o ponto final da investigação diagnóstica. Foram selecionados dez casos de arquivos das instituições onde o trabalho foi desenvolvido, entre 1999 e 2006, dos quais seis foram confirmados por achados cirúrgicos e histopatológicos. Os quatro casos restantes foram diagnosticados com base nos achados de imagem e evolução nos exames de controle. Dos dez casos avaliados, evidenciaram-se três cistos pericárdicos, três cistos broncogênicos, um cisto de duplicação esofágica, um cisto entérico, um cisto tímico e um linfangioma. Não se observou predileção por sexo, e a média de idade no momento do diagnóstico foi de 40 anos, com variação de 5 a 70 anos.
DISCUSSÃO Os CCMs são caracterizados, no exame de TC, como formações expansivas bem delimitadas, com paredes finas, apresentando interior hipodenso e homogêneo. Em geral, são lesões não captantes do contraste intravenoso (Figura 1), podendo, todavia, existir realce capsular em uma minoria de casos, visíveis também na avaliação por ressonância magnética (RM)(2). A avaliação inicial por meio de radiografias de tórax evidencia lesão expansiva radiodensa, em localizações variáveis e que pode mudar de conformação em diferentes posições (p. ex.: decúbito dorsal e ortostase), auxiliando o diagnóstico. A ultrassonografia (US) apresenta maior importância no grupo pediátrico, evitando o uso de radiação ionizante nestes pacientes. Este procedimento, em regra, mostra lesão anecoica homogênea (cística), bem delimitada e geralmente confinada a um ou mais dos espaços mediastinais. As manifestações clínicas, quando presentes, ocorrem principalmente por compressão extrínseca de estruturas adjacentes, como a árvore traqueobrônquica (dispneia, estridor) e o esôfago (disfagia). Outras apresentações possíveis se dão por ruptura, infecção (ver Figura 4) e hemorragia(3,4). Nesta última, observa-se aumento das dimensões e densidade do cisto na TC, dificultando seu diagnóstico diferencial com lesões sólidas(2). Torna-se então fundamental a medida de densidade antes e após infusão do contraste intravenoso, pois captação acima de 10 UH é considerada significativa, indicando tratar-se de lesão sólida. A RM também pode ser útil nessa diferenciação, em virtude do alto sinal nas sequências ponderadas em T2 observado nas lesões císticas (ver Figura 7). Dos métodos comentados, destaca-se a TC, por sua alta sensibilidade e relativa disponibilidade.
O diagnóstico específico entre os diferentes tipos de CCM nem sempre é possível, sendo nestes casos denominados cistos do intestino anterior. A seguir, comentaremos as principais lesões císticas congênitas do mediastino. Cisto pericárdico Resulta de anomalia na formação da cavidade celômica. Está invariavelmente aderido ao folheto pericárdico, embora a comunicação com a cavidade pericárdica aconteça apenas na minoria dos casos(1). Localiza-se classicamente junto ao seio cardiofrênico anterior direito, sendo sua ocorrência em outros sítios, como nos recessos pericárdicos superiores, bem menos comum(5) (Figura 2). Ocasionalmente, podem apresentar contorno retilíneo e formatos atípicos (p. ex.: triangular), provavelmente devido a aderências parietais. Os cistos pericárdicos apresentados neste estudo incluíram dois com localização mediastinal média e um no mediastino anterior. A Figura 3 exemplifica o aspecto de imagem clássico desta entidade, observando-se lesão expansiva hipodensa no exame tomográfico junto ao seio cardiofrênico anterior direito. O borramento da silhueta cardíaca na radiografia de tórax póstero-anterior indica a posição anterior desta lesão (sinal da silhueta). Cisto broncogênico Origina-se de uma protrusão anormal do intestino anterior, entre o 26º e 40º dias de gestação(1). No domínio histopatológico, apresenta revestimento epitelial colunar ciliado com componentes de cartilagem e, menos comumente, glândulas brônquicas. Sua localização mais comum é no mediastino médio, adjacente à carina, mas pode ser visto em qualquer parte do mediastino e do tórax, como pulmões, pleura e diafragma(3,6). Calcificações parietais são ocasionalmente observadas (Figura 4). Nossa casuística (três casos) contrasta com a descrição clássica desta entidade, com um caso de localização intrapulmonar (Figura 5) e os outros dois na região mediastinal superior (paratraqueal direita e retrotraqueal - Figuras 5 e 6, respectivamente). Cisto de duplicação esofágica É classificado em três grupos, com base em características histopatológicas(1): no primeiro grupo observa-se lesão cística paralela e não comunicante com o esôfago; o segundo grupo compõe a forma mais rara, caracterizando-se como lesão extrínseca e comunicante com o corpo esofagiano; o terceiro grupo tem apresentação intramural e extramucosa. Sua localização mais comum encontra-se no mediastino posterior, próximo à transição toracoabdominal (Figura 7). Ocasionalmente, observa-se mucosa gástrica no interior dessas lesões, propiciando complicações pépticas como úlcera e perfuração(7,8). Cisto entérico Lesão rara, normalmente localizada no mediastino posterior, sem comunicação com o esôfago. A associação com anomalias vertebrais está bem documentada nesses casos, em especial a hemivértebra(1). Presença de mucosa gástrica com suas possíveis complicações também pode ocorrer. A Figura 8 representa a descrição clássica desta lesão, com localização mediastinal posterior e associação com hemivértebra. Cisto tímico Representa 3% das lesões do mediastino anterior, podendo ser de natureza congênita ou adquirida. O primeiro grupo possui características semelhantes aos demais CCMs, apresentando contorno regular, interior homogêneo e hipodenso. As lesões adquiridas estão comumente associadas a processos inflamatórios/infecciosos (entre eles o HIV, o lúpus e a doença de Sjögren) e neoplásicos (destacando-se o linfoma não-Hodgkin e, menos comumente, o timoma, o carcinoma tímico e o seminoma mediastinal), apresentando-se como formações multiloculadas de conteúdo heterogêneo, com várias septações de permeio. A diferenciação entre lesões congênitas e adquiridas é importante, já que na última há necessidade de estudo histopatológico para descartar associação neoplásica(9). O uso de contraste intravenoso, nestes casos, é fundamental, pois evidencia as septações intralesionais nos cistos tímicos adquiridos, as quais podem ser inaparentes no estudo sem contraste(10). Demonstramos lesão mediastinal anterior, bem delimitada, homogênea e hipodensa, compatível com cisto tímico congênito em paciente idoso assintomático (Figura 9).
Linfangioma Lesão benigna congênita, caracterizada por focos de tecido linfático em padrão multicístico. O linfangioma é dividido em três tipos, de acordo com o aspecto de seus vasos linfáticos: simples (capilar), cavernoso e cístico (higroma cístico), sendo este último a forma mais comum(1). São mais frequentes na região cervical e axilar. Lesões primárias do tórax correspondem a apenas 1% dos casos(2). Sua composição é predominantemente cística, podendo apresentar septos e, menos frequentemente, componente sólido. Calcificações são raras. Em regra, estas lesões tendem a moldar sem comprimir as estruturas adjacentes. O linfangioma aqui apresentado (Figura 10) caracteriza-se por volumosa lesão cística homogênea no mediastino posterior, que envolve a aorta descendente e o esôfago, sem sinais de compressão significativa destas estruturas. A avaliação evolutiva em um ano demonstrou acentuada involução desta lesão.
CONCLUSÃO O conhecimento da localização e achados clássicos de imagem dos CCMs é fundamental, pois o diagnóstico definitivo é feito em grande parte das vezes por meio destes métodos, evitando que procedimentos invasivos sejam realizados desnecessariamente.
REFERÊNCIAS 1. Gilbert-Barness E. Potter's Pathology of the fetus and infant. 4th ed. St. Louis: Mosby-Year Book; 1997. [ ] 2. Jeung MY, Gasser B, Gangi A, et al. Imaging of the cystic masses of the mediastinum. Radio-graphics. 2002;22:79-93. [ ] 3. McAdams HP, Kirejczyk WM, Rosado-de-Christenson ML, et al. Bronchogenic cyst: imaging features with clinical and histopathologic correlation. Radiology. 2000;217:441-6. [ ] 4. Berrocal T, Torres I, Gutiérrez J, et al. Congenital anomalies of the upper gastrointestinal tract. Radiographics. 1999;19:855-72. [ ] 5. Wang ZJ, Reddy GP, Gotway MB, et al. CT and MR imaging of pericardial disease. Radiographics. 2003;23 Spec No:S167-80. [ ] 6. Yoon YC, Lee KS, Kim TS, et al. Intrapulmonary bronchogenic cyst: CT and pathologic findings in five adult patients. AJR Am J Roentgenol. 2002; 179:167-70. [ ] 7. Franquet T, Erasmus JJ, Giménez A, et al. The retrotracheal space: normal anatomic and pathologic appearances. Radiographics. 2002;22 Spec No:S231-46. [ ] 8. Macpherson RI. Gastroinstestinal tract duplications: clinical, pathologic, etiologic, and radiologic considerations. Radiographics. 1993;13: 1063-80. [ ] 9. Choi YW, McAdams HP, Jeon SC, et al. Idiopathic multilocular thymic cyst: CT features with clinical and histopathologic correlation. AJR Am J Roentgenol. 2001;177:881-5. [ ] 10. Avila NA, Mueller BU, Carrasquillo JA, et al. Multilocular thymic cysts: imaging features in children with human immunodeficiency virus infection. Radiology. 1996;201:130-4. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 4/4/2008.
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG) e nas Clínicas da Imagem e Multimagem, Goiânia, GO, Brasil. |