EDITORIAIS
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Autho(rs): Ana Célia Baptista Koifman |
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Paciente portador de neoplasia de cabeça e pescoço (NCP), alojada em algum dos múltiplos espaços da região, com iminente invasão locorregional de estruturas nobres. A mutilação pode advir da própria doença e/ou tratamento, muitas vezes heroico e, porque não dizer, até misericordioso. A debilidade é grande e as expectativas, inglórias. A necessidade de diagnóstico é premente, na tentativa de resgate terapêutico, visando a reduzir as consequências esteticofuncionais devastadoras e o sofrimento do paciente e dos familiares.
Diante deste cenário sombrio, Amoedo et al.(1), em artigo publicado no número anterior da Radiologia Brasileira, trazem à tona uma casuística de 68 pacientes com NCP submetidos a biópsia percutânea por agulha (core-needle biopsy) guiada por tomografia computadorizada, em análise retrospectiva. A maioria dos tumores eram carcinomas epidermoides. O maior grupo de lesões foi situado no andar supra-hióideo, obtendo-se especificidade de 100% e acurácia diagnóstica de 96,6%. Poucas e autolimitadas complicações foram relatadas, corroborando a literatura. Os autores concluem que o procedimento se mostrou eficaz e seguro para a definição do diagnóstico histológico. O carcinoma epidermoide representa 90% dos tumores malignos da região(2), com sobrevida estimada de 40–50% em cinco anos e mais de 67% dos pacientes mostrando doença localmente avançada no momento do diagnóstico. As taxas de recorrência chegam a 60% dentro de dois anos de tratamento e cerca de 20–30% dos pacientes desenvolvem metástases a distância(3). Observe-se que lesões de linhagem histopatológica benigna podem ser tão desafiadoras quanto as de contraparte malignas, seja pelo espaço que ocupam e viabilidade de ressecção, seja pelas possíveis sequelas pós-cirúrgicas. Biópsias guiadas por tomografia computadorizada em geral são reservadas para lesões com profundidade maior que 3 cm da superfície cutânea, próximas à base do crânio, nos espaços parafaríngeo ou retrofaríngeo, no lobo profundo da parótida e na fossa pterigopalatina(4). São citados também outros dois tipos de procedimentos para obtenção de material para análise histológica – a aspiração por agulha fina e a biópsia cirúrgica, cada qual com suas vantagens e limitações – e outros métodos-guia radiológicos, exemplificando, a ultrassonografia e a tomografia por emissão de pósitrons/tomografia computadorizada(1). Infelizmente, nada é 100%. As biópsias também podem expressar falhas, incluindo material insuficiente, resultados inconclusivos ou discordantes do padrão morfológico lesional nos métodos de imagem, retardando o diagnóstico e com impacto desfavorável na sobrevida do paciente. Não menos importante torna-se evitar procedimentos repetidos que gerem estresse e ansiedade a esses pacientes, além de complicações. A possibilidade de disseminação de células malignas ao longo do trato da agulha pode não ser tão negligenciável(5). Compreende-se a paucidade de elementos científicos congruentes e definitivos na condução desses casos, devido à escassez de estudos, com amostras pequenas e heterogêneas, revelando grande variabilidade no tamanho e localização das lesões, vasto grupo de diagnósticos histológicos, assim como neoplasias virgens de tratamento, doenças residuais e recidivas. Impõe dificuldades adicionais o arsenal terapêutico diverso, com formas isoladas ou combinadas de tratamento, todas prejudicando a interpretação comparativa entre eles e a tentativa de padronização. Diante de tantas lacunas e visando a superar as limitações, as contribuições humana e tecnológica devem seguir unidas, prezando-se pela excelência na interação multidisciplinar e multiparamétrica por imagem, a fim de oferecer subsídios para a máxima otimização e individualização da conduta diagnóstico-terapêutica. A repercussão na qualidade de vida e o prognóstico desses pacientes após realização desses procedimentos permanecem pouco definidos, sendo fundamentais novos estudos prospectivos e de seguimento, com colaborações multicêntricas e análise de reprodutibilidade dos métodos. Outras abordagens mais recentes, como a biópsia líquida(6), rápida e não invasiva, sendo a saliva um recurso adicional em NCP, e os algoritmos de inteligência artificial(7), combinando dados radiológicos, histológicos e moleculares, vislumbram um somatório promissor de informações, num futuro que está sempre cada vez mais próximo. REFERÊNCIAS 1. Amoedo MK, Tyng CJ, Barbosa PNVP, et al. Computed tomography-guided percutaneous biopsy of head and neck masses: techniques, outcomes, and complications. Radiol Bras. 2021;54:295–302. 2. Fitzmaurice C, Allen C, Barber RM, et al. Global, regional, and national cancer incidence, mortality, years of life lost, years lived with disability, and disability-adjusted life-years for 32 cancer groups, 1990 to 2015: A systematic analysis for the global burden of disease study. JAMA Oncol. 2017;3:524–48. 3. World Health Organization. Head and neck cancer: review of cancer medicines on the WHO list of essential medicines. Geneva, Switzerland: WHO; 2014. 4. Aiken AH. Image-guided biopsies in the head and neck: practical value and approach. AJNR Am J Neuroradiol. 2020;41:2123–5. 5. You P, Haynes DA, Desai S, et al. Needle tract seeding following percutaneous biopsy of pediatric head and neck sarcoma: a case report. Clin Case Rep. 2021;9:e04074. 6. Kong L, Birkeland AC. Liquid biopsies in head and neck cancer: current state and future challenges. Cancers (Basel). 2021;13:1874. 7. Mahmood H, Shaban M, Rajpoot N, et al. Artificial intelligence-based methods in head and neck cancer diagnosis: an overview. Br J Cancer. 2021; 124:1934–40. Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mail: anaceliak@gmail.com https://orcid.org/0000-0003-4498-0250 |