Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 54 nº 3 - Maio / Jun.  of 2021

EDITORIAIS
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Terapias locorregionais para o tratamento do carcinoma hepatocelular localmente avançado

Autho(rs): Joaquim Maurício da Motta-Leal-Filho

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O câncer de fígado ocupa a terceira posição em causa de mortalidade relacionada a câncer no mundo. No Brasil, é responsável por 0,7% de todos os tumores, com incidência de 2,7 casos novos por 100.000 habitantes em cinco anos(1). O carcinoma hepatocelular (CHC) é o tipo mais comum, correspondendo a 85% a 90% dos casos(1). Está associado a baixas taxas de cura e sobrevida em longo prazo, pois apenas 20% a 25% dos pacientes, quando o diagnóstico é feito, são candidatos a tratamento curativo, como ressecção cirúrgica ou ablação do tumor e transplante hepático(1).

As terapias locorregionais que utilizam técnicas endovasculares (terapia intra-arterial transcateter) têm papel de destaque no tratamento do CHC se considerarmos que 80% dos pacientes possuem diagnóstico de doença localmente avançada ou avançada – Barcelona Clinic Liver Cancer (BCLC) B e C –, portanto, diagnóstico tardio, quando descobrem a doença.

Desde o estudo de Llovet et al., em 2002(2), ficou comprovada a eficácia da quimioembolização no aumento da sobrevida dos pacientes com CHC localmente avançado(2,3). Na verdade, existem várias modalidades de terapia intra-arterial transcateter responsáveis por aumentar a sobrevida desses pacientes: transarterial embolization (TAE) – embolização do tumor sem uso de quimioterápico; transarterial chemoembolization (TACE) ou conventional TACE (cTACE) ou quimioembolização – agente embolizante + quimioterápico (doxorrubicina ou cisplatina); drug-eluting beads (DEB-TACE) – agente embolizante carregado com quimioterápico; e transarterial radioembolization (TARE) ou selective internal radiation therapy (SIRT) – partículas carregadas com o radioisótopo ítrio-90 que emitem radiação beta. Todas elas se apoiam no princípio de induzir necrose tumoral, baseado no fato que o CHC possui vascularização predominantemente arterial (isquemia provocada pela oclusão dos vasos com os agentes embolizantes), diferente do restante do parênquima hepático, que possui vascularização predominantemente portal(4). O efeito dessa isquemia pode ser potencializado pela quimioterapia ou radioterapia intra-arterial.

O tratamento padrão ouro para CHC estágio intermediário (BCLC B) já estabelecido há décadas é a TACE, que pode ser realizada utilizando técnicas diversas: com partículas de tamanhos variados, calibradas ou não; com lipiodol (cTACE); com quimioterápicos variados (a droga mais utilizada é a doxorrubicina); números de sessões que podem variar de uma a múltiplas (duas a três, em média), a depender da resposta individual de cada paciente(5). Mais recente, a DEB-TACE foi desenvolvida com o intuito de melhorar os resultados da TACE para CHC. Ainda não foi possível provar isso, porém, a DEB-
TACE ampliou o espectro de doentes que podem se beneficiar do tratamento – pacientes com função hepática pior –, pois esta técnica conseguiu diminuir os efeitos colaterais da TACE mediante diminuição do pico plasmático da droga(6,7). Vale o registro que por intermédio da DEB-TACE foi possível padronizar a técnica de quimioembolização. Existe uma corrente de clínicos, porém, que acredita no efeito embólico do tratamento (TAE) mas não acredita na potencial associação com o quimioterápico(8).

A TACE também pode ser utilizada para resgatar um paciente que numa primeira avaliação não tenha critério para entrar numa lista de transplante hepático (esteja fora dos Critérios de Milão). Isto é o chamado downstaging, dando a esse paciente a possibilidade de cura. Ou, ainda, pode ser usada para manter o paciente em lista de transplante hepático por mais tempo (bridging), evitando a progressão da doença, nos países onde a lista de espera para transplante hepático é maior do que seis meses(9).

A TARE ou SIRT tem sido utilizada mais comumente para pacientes com CHC BCLC B e C (estágio avançado) que não são candidatos a TACE ou sorafenibe(5). É um tratamento de alto custo e pouco disponível. Apesar de ser considerado um tratamento paliativo, já existem relatos de pacientes que fizeram downstaging de CHC após TARE e foram submetidos a ressecção do tumor e/ou transplante hepático, dando a estes pacientes a possibilidade de cura(10).

As terapias locorregionais que utilizam técnicas endovasculares também podem ser combinadas a outras terapias locorregionais, como ablação e terapias medicamentosas. A radiologia intervencionista tem papel protagonista no tratamento do CHC. Para melhor compreensão dessas modalidades terapêuticas, é recomendada a leitura do artigo de Inchingolo et al.(5), publicado no número anterior da Radiologia Brasileira, que resume majestosamente as vantagens e desvantagens de cada um dos métodos aqui citados.


REFERÊNCIAS

1. Fernandes GS, Campos D, Ballalai A, et al. Epidemiological and clinical patterns of newly diagnosed hepatocellular carcinoma in Brazil: the need for liver disease screening programs based on real-world data. J Gastrointest Cancer. 2020. Online ahead of print.

2. Llovet JM, Real MI, Montaña X, et al. Arterial embolisation or chemoembolisation versus symptomatic treatment in patients with unresectable hepatocellular carcinoma: a randomised controlled trial. Lancet. 2002;359:1734–9.

3. Llovet JM, Bruix J. Systematic review of randomized trials for unresectable hepatocellular carcinoma: chemoembolization improves survival. Hepatology. 2003;37:429–42.

4. Schiavon LL, Ejima FH, Menezes MR, et al. Recommendations for invasive procedures in patients with diseases of the liver and biliary tract: report of a joint meeting of the Brazilian Society of Hepatology (SBH), Brazilian Society of Digestive Endoscopy (SOBED) and Brazilian Society of Interventional Radiology and Endovascular Surgery (SOBRICE). Arq Gastroenterol. 2019;56:213–31.

5. Inchingolo R, Spiliopoulos S, Posa A, et al. New frontiers in endovascular therapies for locally advanced hepatocellular carcinoma. Radiol Bras. 2021;54:130–5.

6. Lammer J, Malagari K, Vogl T, et al. Prospective randomized study of doxorubicin-eluting-bead embolization in the treatment of hepatocellular carcinoma: results of the PRECISION V study. Cardiovasc Intervent Radiol. 2010;33:41–52.

7. Galastri FL, Nasser F, Affonso BB, et al. Imaging response predictors following drug eluting beads chemoembolization in the neoadjuvant liver transplant treatment of hepatocellular carcinoma. World J Hepatol. 2020;12:21–33.

8. Brown KT, Do RK, Gonen M, et al. Randomized trial of hepatic artery embolization for hepatocellular carcinoma using doxorubicin-eluting microspheres compared with embolization with microspheres alone. J Clin Oncol. 2016;34:2046–53.

9. Affonso BB, Galastri FL, Motta-Leal-Filho JM, et al. Long-term outcomes of hepatocellular carcinoma that underwent chemoembolization for bridging or downstaging. World J Gastroenterol. 2019;25:5687–701.

10. Carvalho VO, Galastri FL, Affonso BB, et al. Transarterial radioembolization for liver tumors as neoadjuvant therapy: three case reports. Einstein (Sao Paulo). 2020;18:eRC4990.










Radiologista intervencionista, Departamento de Radiologia, Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) e Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil.
E-mail: jmaufi@gmail.com

ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9844-6833
 
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