EDITORIAIS
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Autho(rs): Fernanda Rueda-Lopes |
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Os 12 pares de nervos cranianos fazem parte do sistema nervoso periférico (SNP). No entanto, o I par (olfatório) e o II par (óptico) são considerados prolongamentos do sistema nervoso central (SNC), uma vez que sua mielina é proveniente dos oligodendrócitos, enquanto os nervos têm seus neurônios envoltos por células de Schwann(1). Os demais pares cranianos originam-se a partir de núcleos de substância cinzenta localizados no tronco cerebral, com exceção do XI par (acessório), cujo núcleo é medular(2). A partir do tronco cerebral eles têm um trajeto cisternal, ou seja, cruzam as cisternas da base, banhados por líquido cefalorraquiano (LCR), ainda dentro da membrana aracnoide, sendo considerados raízes, e quando ultrapassam essa barreira, recebem o perineurio e se tornam nervos(1).
Após suas saídas do crânio, através de forames na calota craniana, os nervos vão levar estímulos motores e trazer aferências sensitivas de estruturas da cabeça, face e pescoço, assim como informações autonômicas(2). Essas estruturas finas, de trajeto complexo e de difícil identificação nos exames de imagem, são cruciais no desenvolvimento de diversas doenças. Nesse contexto, a ressonância magnética e a tomografia computadorizada são cruciais na avaliação anatômica e patológica desses nervos. A ressonância magnética do crânio é considerada o padrão ouro para avaliação das doenças do SNC(3–5) e também dos nervos cranianos. O uso de sequências tridimensionais de precessão livre do estado estacionário (SSFP), que são sequências fortemente pesadas em T2, determina grande contraste entre as finas estruturas dos pares cranianos e o LCR ao redor, permitindo a identificação das suas porções cisternais(2). Entretanto, sequências adicionais são necessárias para avaliar o padrão de doença dos nervos, incluindo sequências T1 pós-contraste para avaliação de neurites, como vem sendo observado na pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-19(6), e também de alterações infecciosas e tumorais, conforme discutido e ilustrado no ensaio iconográfico de Dalaqua et al.(7) publicado neste número da Radiologia Brasileira. Sequências T1 podem avaliar o trofismo dos grupamentos musculares inervados por determinado nervo, assim como a sequência STIR pode mapear a extensão da denervação, permitindo assim a avaliação da função do nervo e não somente de sua anatomia(2,8). A tomografia computadorizada da base do crânio também é útil na avaliação do trajeto desses nervos. Os forames ósseos da base do crânio são a porta de saída dos nervos em direção às estruturas da face e pescoço. O conhecimento dessa anatomia e a possibilidade de comparação com o lado contralateral permitem a avaliação de remodelamento e irregularidades ósseas, que podem estar relacionadas a tumores de bainha nervosa, por exemplo(2). Algo que deve ser debatido e ainda mais bem esclarecido é a abordagem radiológica referente ao protocolo dos exames. Em razão de restrições burocráticas e financeiras, buscamos enquadrar os exames a serem realizados em segmentos corporais, como crânio, face e órbitas. Portanto, diante de uma solicitação de ressonância magnética de crânio para avaliação de paralisia do III par craniano, optamos por simplesmente incluir a sequência para avaliar a porção cisternal deste nervo (SSFP) ou partimos para uma análise completa de seu trajeto, incluindo sequências direcionadas ao estudo do seio cavernoso e órbita? Cabe a nossa reflexão se realmente devemos nos enquadrar aos limites do pedido de exame ou se devemos expandir nossa fronteira mental e seguir todo o trajeto do nervo em questão. Outra forma de avaliar o SNP é por meio do exame de neurografia(8,9). Usando diversas sequências tridimensionais, incluindo PSIF 3D e STIR 3D, juntamente com o uso do meio de contraste venoso, a neurografia permite avaliar o trajeto do nervo, sua espessura, composição fascicular, intensidade de sinal e padrão de realce pelo contraste. Recentemente, essa técnica tem sido descrita para investigação dos nervos da face e pescoço, que têm origem a partir dos nervos intracranianos, permitindo, por exemplo, a identificação das porções mandibular e maxilar do V par craniano(8). Conclui-se, então, que o estudo dos nervos cranianos é um tema árido, conforme demonstrado no ensaio iconográfico de Dalaqua et al.(7), uma vez que são múltiplas as causas de lesão, assim como as maneiras de avaliá-las. No entanto, os avanços da ressonância magnética usando sequências SSFP, assim como a neurografia, têm proporcionado grande contribuição da neuroimagem neste campo de investigação e diagnóstico. REFERÊNCIAS 1. Marques MJ, Queiroz LS. Atlas de neuroanatomia para patologistas. Cérebro do adulto. Nervos cranianos. [cited 2021 March 1]. Available from: http://anatpat.unicamp.br/bineucerebroext-nervos.html. 2. Romano N, Federici M, Castaldi A. Imaging of cranial nerves: a pictorial overview. Insights Imaging. 2019;10:33. 3. Muniz BC, Niemeyer B, Ventura N, et al. Isolated suprasellar involvement in tuberculosis: findings on magnetic resonance imaging. Radiol Bras. 2019;52:60–1. 4. Abreu Junior L, Godoy LL, Vaz LPS, et al. Optimization of magnetic resonance imaging protocol for the diagnosis of transient global amnesia. Radiol Bras. 2019;52:161–5. 5. Santana LM, Valadares EJA, Rosa-Júnior M. Differential diagnosis of temporal lobe lesions with hyperintense signal on T2-weighted and FLAIR sequences: pictorial essay. Radiol Bras. 2020;53:129–36. 6. Corrêa DG, Cruz Jr LCH, Rueda-Lopes FC, et al. Magnetic resonance imaging features of COVID-19-related cranial nerve lesions. J Neurovirol. 2021; 27:171–7. 7. Dalaqua M, Nascimento FBP, Miura LK, et al. Magnetic resonance imaging of the cranial nerves in congenital, traumatic, and vascular diseases: a pictorial essay. Radiol Bras.2021;54:185–92. 8. Chhabra A, Bajaj G, Wadhwa V, et al. MR neurography evaluation of facial and neck pain: normal and abnormal craniospinal nerves below the skull base. Radiographics. 2018;38:1498–513. 9. Rueda-Lopes F. Neurography – a new look at the peripheral nervous system. Radiol Bras. 2017;50(4):ix. Professora Adjunta da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil Médica radiologista do Grupo DASA, Rio de Janeiro, RJ, Brasil E-mail: frueda81@hotmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3782-8624 |