ENSAIOS ICONOGRÁFICOS
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Autho(rs): Stephanie Yuka Matwijszyn Nagano1,a; Almir Galvão Vieira Bitencourt1,b; Ivone do Carmo Gonçalves Torres1,c; Gislaine Cristina Lopes Machado Porto1,d |
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Descritores: Adenoma/diagnóstico por imagem; Neoplasias das paratireoides/diagnóstico por imagem; Hiperparatireoidismo/cirurgia; Tomografia computadorizada quadridimensional/métodos. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
Hiperparatireoidismo é uma condição causada pelo aumento do paratormônio, hormônio responsável pela liberação de cálcio dos tecidos para o plasma, seja por meio de estímulo a atividade osteolítica dos osteoblastos ou pelo estímulo a reabsorção óssea de fósforo, que contribui para a desmineralização. Existem alguns tipos de hiperparatireoidismo, sendo o primário quando existe produção excessiva do paratormônio pelas paratireoides. O adenoma de paratireoide é a causa mais comum de hipertireoidismo primário e responsável por até 85% dos casos; a segunda causa, responsável por até 12% dos casos, é a hiperplasia dessas glândulas(1). As paratireoides são glândulas originadas do terceiro e quarto arcos branquiais. O local mais comum da sua localização é junto à face posterior da tireoide, duas junto ao polo superior e duas junto ao polo inferior da tireoide. Variações anatômicas são frequentes e elas podem estar localizadas tanto intratireoide quanto em qualquer local do desenvolvimento embrionário, até mesmo no mediastino, próximas ao timo, além de poderem ser supranumerárias, estas mais raramente(2). Inicialmente, quando as cirurgias para hiperparatireoidismo começaram a ser implementadas, era realizada a retirada de todas as glândulas, na maioria dos casos, por não se saber qual estava acometida por adenoma, além de a localização delas também ser imprecisa. Esse procedimento tinha alta morbidade, além de nem sempre ser efetivo, pois as taxas de recorrência eram altas em razão das variações anatômicas e eventuais localizações ectópicas das paratireoides(2,3). Com o avanço das técnicas de imagem, atualmente é possível realizar técnicas minimamente invasivas, em que o cirurgião retira apenas a paratireoide afetada, e aliado ao seguimento clínico e laboratorial por meio dos níveis de paratormônio, não é sempre necessária a retirada das outras94). Alguns métodos de imagem, como a ultrassonografia e a cintilografia com sestamibi, têm papel bem estabelecido para a localização pré-operatória das paratireoides. A tomografia computadorizada com protocolo quadridimensional (TC 4D) (Figura 1) é um método mais recente e ainda pouco conhecido(4). Figura 1. Protocolo 4D normal. A: Fase pré-contraste mostrando tecido tireoidiano hiperatenuante (retângulo) em relação a linfonodo adjacente (círculo). B: Fase arterial demonstrando ausência de realce significativo da imagem nodular (círculo) e tecido tireoidiano adjacente (retângulo). C: Fase venosa. O presente trabalho tem como objetivo realizar um ensaio iconográfico de adenomas caracterizados no protocolo TC 4D para facilitar o reconhecimento dessa condição, além de mostrar a correlação com outros métodos de imagem com papel mais bem conhecido. Nesse contexto, foi realizada revisão de imagens disponíveis no arquivo da instituição de adenomas e hiperplasia da paratireoide, avaliadas pelo protocolo TC 4D, bem como a correlação com outros métodos de imagem. DISCUSSÃO No protocolo TC 4D para avaliação de paratireoides, a quarta dimensão refere-se ao tempo e a terceira dimensão refere-se aos diferentes planos de reformatações. O protocolo 4D consiste na TC de pescoço com contraste intravenoso com avaliação nas fases pré-contraste, arterial e tardia. As aquisições são realizadas em tomógrafo multidetectores, sendo a fase arterial em cerca de 25 segundos e a tardia após 80 segundos da injeção do contraste iodado(5). Na fase pré-contraste, a paratireoide e os adenomas costumam ter atenuação reduzida em relação à glândula tireoide. Quando há adenomas, estes comumente apresentam realce ávido pelo meio de contraste na fase arterial e wash-out na fase venosa (Figuras 2 e 3). Deve-se concentrar o estudo primeiro na fase arterial, por ser a mais sensível para a identificação dos adenomas, e depois de caracterizadas lesões suspeitas, observar seu comportamento nas demais fases(6). Primeiramente, buscam-se as paratireoides eutópicas, as superiores geralmente localizadas posteriormente ao terço superior da tireoide e as inferiores localizadas laterais, inferiores ou posteriores ao terço inferior da tireoide. Depois, deve-se procurar as ectópicas, que podem ser encontradas desde a bifurcação carotídea até a região mediastinal, conforme seu desenvolvimento na embriologia (Figura 4)(4). Figura 2. Adenoma de paratireoide no protocolo 4D. A: Observa-se imagem hipoatenuante (círculo) adjacente ao terço inferior da tireoide (retângulo), esta hiperatenuante em relação às estruturas adjacentes. B: A imagem nodular (círculo) possui realce ávido pelo meio de contraste iodado na fase arterial. C: Observa-se wash-out do contraste na fase tardia (círculo). Figura 3. Adenoma de paratireoide no protocolo 4D e visualização nas diferentes reconstruções. A: Na fase arterial, imagem nodular hiperatenuante após realce ávido pelo meio de contraste (círculo). Em lesões maiores, como neste caso, nem sempre há realce homogêneo de toda a lesão. B: Visualização da imagem nodular (retângulo) no plano sagital. C: Visualização da imagem nodular (retângulo) no plano coronal. Figura 4. Exemplos de adenomas ectópicos de paratireoide. Adenoma mediastinal adjacente ao arco aórtico (círculo). A: Realizada apenas tomografia sem contraste, por história de alergia do paciente. B: Correlação do caso mostrado em A, com a cintilografia com sestamibi demonstrando persistência da captação do radiofármaco após duas horas da administração (círculo). C: Adenoma retrofaríngeo na fase pré-contraste, de difícil delimitação em razão de estruturas adjacentes. D: Fase pós-contraste do caso mostrado em C identificando imagem nodular com intenso realce pelo meio de contraste (circulo). Biópsia da lesão comprovou o diagnóstico de adenoma da paratireoide ectópico. Além de determinar a localização dos adenomas em até 93% dos casos pré-cirúrgicos e em até 72% dos casos após cirurgia e resultado cirúrgico desfavorável ou inconclusivo, a TC 4D também ajuda na determinação de diagnósticos diferenciais, tais como com os linfonodos e o tecido tireoidiano(7). Os linfonodos possuem realce progressivo pelo meio de contraste, sendo seu pico na fase tardia, e o tecido tireoidiano possui atenuação maior do que a paratireoide nas fases pré-contraste(7). Embora seja um método com boa sensibilidade, apresenta algumas limitações, como maior incidência de radiação do que a TC convencional e relativa contraindicação em casos de pacientes alérgicos ao contraste iodado(8). Outros métodos que exercem papel bem definido para a localização das paratireoides incluem a cintilografia com sestamibi e a ultrassonografia. A cintilografia planar e a TC de emissão de fóton único/TC (SPECT/CT) são realizadas com sestamibi, um derivado da isonitrila primeiramente utilizado para imagem do miocárdio e atualmente também para a paratireoide (Figura 5). As imagens da cintilografia planar são obtidas 15 a 30 minutos e 2 a 4 horas após a administração do composto(9). A identificação do adenoma é decorrente da alta atividade metabólica do tumor. A acurácia varia entre 80% e 95%(10). Figura 5. Correlação entre TC 4D, cintilografia de paratireoide com sestamibi e SPECT/CT. A: TC 4D na fase arterial demonstrando imagem (círculo) com realce ávido na fase arterial adjacente à carótida comum e ao polo inferior do lobo direito tireoidiano. B,C: Cintilografia com sestamibi realizada com aquisições com 15 minutos e 2 horas mostrando persistência de concentração do radiomarcador adjacente ao polo inferior do lobo direito tireoidiano (círculo). D: SPECT/ CT demonstrando captação do radiofármaco no sítio do adenoma (marcador). A ultrassonografia foi um dos primeiros métodos para avaliação das paratireoides. Apesar de muito utilizada, por ser um método de fácil disponibilidade e sem uso de radiação ou contraste, a ultrassonografia é operador dependente, e afecções da tireoide, como bócio multinodular, podem prejudicar a avaliação, além de ser um método insuficiente para a caracterização de paratireoides ectópicas, em especial as que acometem o mediastino. Quando aumentada, geralmente a paratireoide é vista adjacente à glândula tireoide, com aspecto hipoecoico em relação a ela. Nos casos de adenoma, pode ser observado vaso polar nutridor(10) (Figura 6). Figura 6. Adenoma paratireoidiano. A: Fase arterial mostrando imagem nodular com realce ávido na fase arterial (círculo), na loja tireoidiana esquerda. B: Fase arterial plano coronal identificando imagem nodular com realce ávido (asterisco) sendo nutrida por vaso polar (entre as linhas vermelhas). C: Correlação com ultrassonografia – imagem hipoecoica na loja tireoidiana esquerda (círculo), com vaso polar (asteriscos) associado. Outros métodos que vêm sendo discutidos na avaliação dos adenomas da paratireoide são a TC com dupla energia e a ressonância magnética com protocolo 4D. A TC com dupla energia é um método que quantifica a decomposição material por meio de algoritmos e que pode estimar a composição química de um objeto. É um método novo, que ajuda na localização dos adenomas de paratireoide, pela caracterização da diferença de atenuação entre os tecidos adjacentes. Por exemplo, em alguns casos é difícil a discriminação de adenomas do tecido tireoidiano, nas fases arterial e venosa, e a quantificação da atenuação na fase pré-contraste é diferente entre essas duas estruturas, o que pode ajudar a diferenciá-las, principalmente nos casos de adenomas intratireoidianos(6). A ressonância magnética com protocolo 4D é uma alternativa ao uso da TC 4D, por não utilizar radiação, porém, é um método novo e não tão disponível. Assim como na TC 4D, o objetivo é explorar a natureza hipervascular das lesões paratireoidianas, com sensibilidade alta tanto para a identificação quanto para a localização dos adenomas, chegando a 92% nas lesões únicas e 77% nas lesões múltiplas(8). CONCLUSÃO Na avaliação das paratireoides, a cintilografia e a ultrassonografia possuem papel bem estabelecido, ambas com boa sensibilidade. No entanto, a TC 4D é um método ainda pouco conhecido, apesar de alta sensibilidade, que além de estabelecer o diagnóstico e a avaliação com estruturas adjacentes é boa para avaliação do diagnóstico diferencial com outras afecções. Sendo assim, é importante o radiologista estar familiarizado com o método. REFERÊNCIAS 1.Gonçalves MDC, Rodrigues AS. Cirurgia do hiperparatireoidismo. Rev Col Bras Cir. 2002;29:166–76. 2.Toneto MG, Prill S, Debon LM, et al. A história da cirurgia das paratireoides. Rev Col Bras Cir. 2016;43:214–22. 3.Wojtczak B, Syrycka J, Kaliszewski K, et al. Surgical implications of recent modalities for parathyroid imaging. Gland Surg. 2020; 9(Suppl 2):S86–S94. 4.Hoang JK, Sung W, Bahl M, et al. How to perform parathyroid 4D CT: tips and traps for technique and interpretation. Radiology. 2014;270:15–24. 5.Bahl M, Sepahdari AR, Sosa JA, et al. Parathyroid adenomas and hyperplasia on four-dimensional CT scans: three patterns of enhancement relative to the thyroid gland justify a three-phase protocol. Radiology. 2015;277:454–62. 6.Woisetschläger M, Gimm O, Johansson K, et al. Dual energy 4D-CT of parathyroid adenomas not clearly localized by sestamibi scintigraphy and ultrasonography – a retrospective study. Eur J Radiol. 2020;124:108821. 7.Hunter GJ, Ginat DT, Kelly HR, et al. Discriminating parathyroid adenoma from local mimics by using inherent tissue attenuation and vascular information obtained with four-dimensional CT: formulation of a multinomial logistic regression model. Radiology. 2014;270:168–75. 8.Becker JL, Patel V, Johnson KJ, et al. 4D-dynamic contrast-enhanced MRI for preoperative localization in patients with primary hyperparathroidism. AJNR Am J Neuroradiol. 2020;41:522–8. 9.Eslamy HK, Ziessman HA. Parathyroid scintigraphy in patients with primary hyperparathyroidism: 99mTc sestamibi SPECT and SPECT/CT. Radiographics. 2008;28:1461–76. 10.Scattergood S, Marsden M, Kyrimi E, et al. Combined ultrasound and sestamibi scintigraphy provides accurate preoperative localisation for patients with primary hyperparathyroidism. Ann R Coll Surg Engl. 2019;101:97–102. 1. Departamento de Imagem – A.C.Camargo Cancer Center, São Paulo, SP, Brasil a. https://orcid.org/0000-0001-8918-4907 b. https://orcid.org/0000-0003-0192-9885 c. https://orcid.org/0000-0002-4712-5500 d. https://orcid.org/0000-0001-7892-1983 Correspondência: Dra. Stephanie Yuka Matwijszyn Nagano Departamento de Imagem – A.C.Camargo Cancer Center Rua Professor Antônio Prudente, 211, Liberdade. São Paulo, SP, Brasil, 09015-010 E-mail: ste1994@gmail.com Recebido para publicação em 9/5/2020 Aceito, após revisão, em 18/6/2020 |