Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 53 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2020

EDITORIAL
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Page(s) 9 to 10



Métodos de imagem na avaliação da doença hepática gordurosa não alcoólica

Autho(rs): Daniella Braz Parente

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A doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) é um problema de saúde pública e acomete um terço da população mundial. Junto com a epidemia de obesidade, a DHGNA tem incidência crescente no mundo todo, atingindo todas as faixas etárias, incluindo crianças, todas as etnias e condições socioeconômicas(1,2). A DHGNA já é a segunda indicação para transplante hepático nos Estados Unidos(2).

A DHGNA é um espectro que se inicia com a esteatose isolada, associada a aumento do risco cardiovascular e aumento na incidência de câncer colorretal(3). Cerca de 25% dos pacientes com esteatose isolada evoluem para esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), uma condição que apresenta maior risco de evolução para hepatopatia crônica. Quanto maior o grau de esteatose, maior o risco de desenvolvimento de EHNA. Dos pacientes com EHNA, cerca de 25% evoluem para hepatopatia crônica, com fibrose, cirrose e risco de complicações, incluindo hipertensão porta e carcinoma hepatocelular(2,4).

É importante ressaltar que a biópsia hepática ainda é o único método capaz de diagnosticar EHNA(5). No entanto, devido ao seu caráter invasivo, com risco de morbimortalidade, heterogeneidade de distribuição da fibrose no parênquima hepático, variabilidade de interpretação interobservador e intraobservador, custo e dificuldade de aceitação pelo paciente e médico assistente, a biópsia hepática não é adequada para seguimento dos pacientes com DHGNA, uma condição que acomete um terço da população(6,7). Dessa forma, métodos não invasivos estão sendo desenvolvidos com o objetivo de diagnosticar EHNA, incluindo biomarcadores sorológicos, que combinam características clínicas, medidas antropométricas e parâmetros laboratoriais e métodos de imagem(8–10).

Vários métodos de imagem têm sido usados para diagnóstico e acompanhamento da DHGNA, como a ultrassonografia (US), a tomografia computadorizada (TC), a ressonância magnética (RM) e, recentemente, o controlled attenuation parameter (CAP), obtido em conjunto com a elastografia transitória e a elastografia por RM. A US tem a vantagem de ser amplamente disponível, mas não tem alta reprodutibilidade interobservador e não é sensível para detecção de esteatose leve. A TC também não é sensível para detecção de esteatose leve e expõe o paciente a radiação, não sendo um bom método para seguimento. A RM é de acesso mais limitado, porém tem alta reprodutibilidade com as técnicas de quantificação de gordura multieco e pela espectroscopia de prótons(11–13).

O CAP é um método novo que avalia a esteatose hepática de forma quantitativa e tem sido amplamente utilizado pelos hepatologistas, por ser de fácil utilização à beira do leito, que inclui a vantagem de estar associado à elastografia transitória, que mede a dureza hepática. Assim, reúne as informações de esteatose e fibrose em um único método(11). No entanto, ainda se discute bastante os valores de ponto de corte do CAP, tanto para o diagnóstico de esteatose como para sua gradação, em leve, moderada e acentuada(14,15). Nos pacientes com DHGNA, os pontos de corte para fibrose, suas gradações e a relação com o escore METAVIR também não estão bem estabelecidos(15,16). Pacientes obesos e pacientes com ascite também são de difícil avaliação pela elastografia transitória. O uso da sonda XL para realização do exame tem melhorado o desempenho do método nos pacientes obesos(17).

A elastografia por RM tem a vantagem de avaliar uma área maior de parênquima hepático. Dado que a fibrose tem distribuição heterogênea, a medida da dureza hepática pode sofrer variações que seriam mais bem avaliadas pela elastografia por RM. Da mesma forma que o CAP com elastografia transitória, permite associar a medida da dureza hepática com a fração de gordura hepática. Adicionalmente, o uso de contraste venoso permite a avaliação de todo o fígado, com possível diagnóstico de lesões focais(11).

Vários fatores influenciam a medida da dureza hepática pela elastografia realizada pela US e pela RM. A técnica do exame é fundamental: o paciente precisa suspender a respiração de forma neutra para as medições, uma vez que a inspiração e a expiração profundas alteram significativamente os valores obtidos. Outros fatores, como jejum inadequado, aminotransferases elevadas, congestão hepática, inflamação hepática e ingesta de álcool também aumentam a medida da dureza hepática. Assim, valores aumentados devem ser correlacionados clinicolaboratorialmente(11).

No número anterior da Radiologia Brasileira, Silva et al.(18) apresentam excelente revisão sobre a elastografia por US em pacientes com esteatose hepática, abordando de forma abrangente os diferentes métodos capazes de realizá-la, suas vantagens e desvantagens, concluindo de forma elegante com o que está estabelecido na literatura. Esse artigo chama a atenção para a DHGNA como importante problema de saúde pública e discute o espectro da doença, sua complexidade, dificuldades e possibilidades para diagnóstico.


REFERÊNCIAS

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2. Younossi Z, Anstee QM, Marietti M, et al. Global burden of NAFLD and NASH: trends, predictions, risk factors and prevention. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2018;15:11–20.

3. Ahn JS, Sinn DH, Min YW, et al. Non-alcoholic fatty liver diseases and risk of colorectal neoplasia. Aliment Pharmacol Ther. 2017;45:345–53.

4. Angulo P. Nonalcoholic fatty liver disease. N Engl J Med. 2002;346:1221–31.

5. Brunt EM, Tiniakos DG. Histopathology of nonalcoholic fatty liver disease. World J Gastroenterol. 2010;16:5286–96.

6. Tiniakos DG, Vos MB, Brunt EM. Nonalcoholic fatty liver disease: pathology and pathogenesis. Annu Rev Pathol. 2010;5:145–71.

7. Regev A, Berho M, Jeffers LJ, et al. Sampling error and intraobserver variation in liver biopsy in patients with chronic HCV infection. Am J Gastroenterol. 2002;97:2614–8.

8. Bedogni G, Bellentani S, Miglioli L, et al. The Fatty Liver Index: a simple and accurate predictor of hepatic steatosis in the general population. BMC Gastroenterol. 2006;6:33.

9. Lee JH, Kim D, Kim HJ, et al. Hepatic steatosis index: a simple screening tool reflecting nonalcoholic fatty liver disease. Dig Liver Dis. 2010;42:503–8.

10. Perazzo H, Benseñor I, Mill JG, et al. Prediction of liver steatosis applying a new score in subjects from the Brazilian longitudinal study of adult health. J Clin Gastroenterol. 2020;54:e1–e10.

11. Srinivasa Babu A, Wells ML, Teytelboym OM, et al. Elastography in chronic liver disease: modalities, techniques, limitations, and future directions. Radiographics. 2016;36:1987–2006.

12. Hamer OW, Aguirre DA, Casola G, et al. Fatty liver: imaging patterns and pitfalls. Radiographics. 2006;26:1637–53.

13. Parente DB, Oliveira Neto JA, Araújo ALE, et al. Fat-containing liver lesions: a pictorial essay. Radiol Bras. 2018;51:52–7.

14. de Lédinghen V, Vergniol J, Foucher J, et al. Non-invasive diagnosis of liver steatosis using controlled attenuation parameter (CAP) and transient elastography. Liver Int. 2012;32:911–8.

15. Karlas T, Petroff D, Sasso M, et al. Individual patient data meta-analysis of controlled attenuation parameter (CAP) technology for assessing steatosis. J Hepatol. 2017;66:1022–30.

16. Karlas T, Petroff D, Garnov N, et al. Non-invasive assessment of hepatic steatosis in patients with NAFLD using controlled attenuation parameter and 1H-MR spectroscopy. PLoS One. 2014;9:e91987.

17. de Lédinghen V, Wong VW, Vergniol J, et al. Diagnosis of liver fibrosis and cirrhosis using liver stiffness measurement: comparison between M and XL probe of FibroScan®. J Hepatol. 2012;56:833–9.

18. Silva LCM, Oliveira JT, Tochetto S, et al. Ultrasound elastography in patients with fatty liver disease. Radiol Bras. 2020;53:47–55.










Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: daniella.parente@gmail.com

https://orcid.org/0000-0003-0031-5785
 
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