Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 52 nº 3 - Maio / Jun.  of 2019

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 200 to 201



Achados radiológicos no fígado de um paciente com síndrome de Rendu-Osler-Weber

Autho(rs): Rafael Amaral Rodrigues1; Rodrigo Amaral Rodrigues2; Vanessa Carvalho Freitas3; Antonio Luis Eiras de Araujo4; Daniella Braz Parente5

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Sr. Editor,

Paciente do sexo masculino, 57 anos, portador da síndrome de Rendu-Osler-Weber, procurou atendimento em serviço médico de emergência com relato de dor lombar iniciada há um dia. Foi realizada tomografia computadorizada do abdome, que mostrou alterações hepáticas típicas da síndrome (telangiectasias, shunts e malformações arteriovenosas), também conhecida como telangiectasia hemorrágica hereditária. O exame revelou opacificação precoce das veias hepáticas na fase arterial, consequência de shunts arteriovenosos (Figura 1A). Notou-se opacificação heterogênea da veia porta durante a fase portal, com realce mais acentuado em ramos portais intra-hepáticos, resultado de shunt portovenoso, além de vasos proeminentes e numerosos vistos junto ao hilo hepático, correspondendo à malformação arteriovenosa (Figura 1B). Observou-se massa vascular confluente, medindo 1,4 cm, localizada no segmento II (Figura 1C). Havia ainda extensa alteração perfusional do parênquima hepático, caracterizada como padrão em mosaico, além de artéria hepática de calibre aumentado, emergindo da artéria mesentérica superior, também ectasiada (Figura 1D).


Figura 1. Tomografia computadorizada do abdome. A: Corte axial mostrando opacificação precoce das veias hepáticas na fase arterial (setas). B: Corte coronal demonstrando opacificação heterogênea da veia porta durante a fase portal (seta), associada a estruturas vasculares ectasiadas numerosas junto ao hilo hepático, representando uma malformação arteriovenosa (cabeça de seta). C: Corte axial identificando massa vascular confluente, medindo 1,4 cm, localizada no segmento II (seta). D: Corte axial mostrando extensa alteração perfusional do parênquima hepático, caracterizada como padrão em mosaico (cabeças de setas), além de artéria hepática de calibre aumentado (seta).



Exames de imagem têm tido importante papel no estudo das doenças hepáticas(1-5). A telangiectasia hemorrágica hereditária é uma doença autossômica dominante que ocorre com frequência estimada em 10-20/100.000 pessoas(6). Conhecida como uma rara displasia fibrovascular sistêmica, torna as paredes dos vasos sanguíneos mais vulneráveis a traumatismos e rupturas espontâneas(7). Acomete múltiplos órgãos e sistemas e é caracterizada, principalmente, pela presença de telangiectasias e/ou shunts vasculares no fígado, pulmões, rins, sistema nervoso central e pele(8,9). A condição geralmente se manifesta em adultos na forma de epistaxes, telangiectasias cutaneomucosas, hemorragia do trato digestivo e hemoptise(9,10). As telangiectasias surgem progressivamente e os sítios mais comuns são lábios, língua, palato, dedos e face. Seu diagnóstico é baseado na presença de três dos quatro critérios diagnósticos: telangiectasias cutaneomucosas, epistaxe espontânea recorrente, malformações arteriovenosas viscerais e história familiar positiva(8).

O fígado é o órgão abdominal predominantemente acometido, tendo sido relatada alta prevalência de comprometimento hepático (74%) nos pacientes portadores da síndrome. O envolvimento do órgão é tipicamente diagnosticado 10 a 20 anos após o surgimento da primeira telangiectasia. Exibe realce tipicamente heterogêneo na fase arterial, com padrão definido como perfusão em mosaico, encontrado em 65% dos casos e caracterizado por áreas de alteração perfusional, indicativas de shunts arterioportais. As telangiectasias hepáticas, encontradas em 63% dos casos, podem ser focais ou difusas e são caracterizadas como lesões arredondadas, menores que 10 mm, hipervascularizadas na fase arterial, muitas vezes tornando-se isodensas com o parênquima hepático já na fase portal. Lesões desse tipo, a partir de 10 mm, são denominadas como massas vasculares confluentes e representam áreas de telangiectasias múltiplas agrupadas ou shunts visíveis, estando presentes em 25% dos pacientes(10,11).

Os shunts vasculares, presentes em 65% dos casos, podem se apresentar de três formas: arteriovenoso (artéria hepática para veia hepática), arterioportal (artéria hepática para veia porta) e portovenoso (veia porta para veia hepática)(11), estando associados a complicações como insuficiência cardíaca e hipertensão portal(12). Malformações vasculares hepáticas também são vistas e podem causar shunt direita-esquerda determinando graus variados de hipertensão pulmonar, insuficiência cardíaca e encefalopatia hepática(8).

O tratamento inclui medidas para controle da epistaxe, bem como remoção cirúrgica, radioterapia e embolização das malformações vasculares, com destaque para o tratamento endovascular(8).


REFERÊNCIAS

1. Staziaki PV, Teixeira BCA, Pedrazzani BM, et al. Hepatoblastoma with solid and multicystic aspect mimicking a mesenchymal hamartoma: imaging and anatomopathologic findings. Radiol Bras. 2017;50:68.

2. Zattar-Ramos LC, Bezerra RO, Siqueira LTB, et al. Hepatocyte-specific contrast agent-enhanced magnetic resonance cholangiography: perioperative evaluation of the biliary tree. Radiol Bras. 2017;50:389-94.

3. Ramalho M, Matos AP, AlObaidy M, et al. Magnetic resonance imaging of the cirrhotic liver: diagnosis of hepatocellular carcinoma and evaluation of response to treatment - Part 1. Radiol Bras. 2017;50:38-47.

4. Brasil IRC, Araujo IF, Lima AALA, et al. Computed tomography angiography study of variations of the celiac trunk and hepatic artery in 100 patients. Radiol Bras. 2018;51:32-6.

5. Parente DB, Oliveira Neto JA, Araújo ALE, et al. Fat-containing liver lesions: a pictorial essay. Radiol Bras. 2018;51:52-7.

6. Ianora AA, Memeo M, Sabba C, et al. Hereditary hemorrhagic telangiectasia: multi-detector row helical CT assessment of hepatic involvement. Radiology. 2004;230:250-9.

7. Juares AJ, Dell'Aringa AR, Nardi JC, et al. Rendu-Osler-Weber syndrome: case report and literature review. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74:452-7.

8. Agnollitto PM, Barreto ARF, Barbieri RFP, et al. Rendu-Osler-Weber syndrome: what radiologists should know. Literature review and three cases report. Radiol Bras. 2013;46:168-72.

9. Nozaki T, Nosaka S, Miyazaki O, et al. Syndromes associated with vascular tumors and malformations: a pictorial review. Radiographics. 2013;33:175-95.

10. Torabi M, Hosseinzadeh K, Federle MP. CT of nonneoplastic hepatic vascular and perfusion disorders. Radiographics. 2008;28:1967-82.

11. Siddiki H, Doherty MG, Fletcher JG, et al. Abdominal findings in hereditary hemorrhagic telangiectasia: pictorial essay on 2D and 3D findings with isotropic multiphase CT. Radiographics. 2008;28:171-84.

12. Wu JS, Saluja S, Garcia-Tsao G, et al. Liver involvement in hereditary hemorrhagic telangiectasia: CT and clinical findings do not correlate in symptomatic patients. AJR Am J Roentgenol. 2006;187:W399-405.










1. Hospital Barra D'Or, Rio de Janeiro, RJ, Brasil; https://orcid.org/0000-0003-4333-904X
2. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil; https://orcid.org/0000-0002-2304-2532
3. Hospital Barra D'Or, Rio de Janeiro, RJ, Brasil; https://orcid.org/0000-0003-1557-2346
4. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), Rio de Janeiro, RJ, Brasil; https://orcid.org/0000-0002-6272-4253
5. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), Rio de Janeiro, RJ, Brasil; https://orcid.org/0000-0003-0031-5785

Correspondência:
Dr. Rafael Amaral Rodrigues
Rua Hugo Panasco Alvim, 211, ap. 203, Recreio dos Bandeirantes
Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 22795-306
E-mail: rafaelr_amaral@hotmail.com

Recebido para publicação em 09/September/2017
Aceito, após revisão, em 03/November/2017
 
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