Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 268 to 278



Aneurisma assintomático do ventrículo esquerdo com trombo intracavitário: um diagnóstico não realizado pelo ecocardiograma

Autho(rs): Kamila Seidel Albuquerque1; João Maurício Canavezi Indiani1; Marcelo Fontalvo Martin1; Beatriz Morais e Rodrigues Cunha1; Marcelo Souto Nacif2

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Sr. Editor,

Homem, 63 anos, assintomático, com histórico de infarto agudo do miocárdio (IAM) e angioplastia há 10 anos. Negou acompanhamento clínico de rotina e por isso foi submetido a um ecocardiograma para avaliação funcional. Foram detectadas dilatação e disfunção moderada do ventrículo esquerdo (VE), porém, com limitação na avaliação do ápice, sem informações sobre presença de aneurisma ou trombo. No prosseguimento, realizou-se angiotomografia de coronárias, para avaliação de reestenose do stent, cujas imagens demonstraram aparente suboclusão distal ao stent na artéria descendente anterior (Figura 1A) e grande aneurisma com afilamento parietal acometendo os segmentos mediais anterior e anterosseptal, apicais septal e anterior e o ápex do VE. Não foi possível detectar importante balonamento sistólico, pois existia um grande trombo atapetando a porção intracavitária e que se confundia com a espessura normal da parede do VE. O trombo tinha aspecto organizado, porém, sem sinais de calcificação, e marcada hipodensidade, aspecto fixo e sem realce pelo meio de contraste, o que deve ter dificultado a avaliação pelo ecocardiograma inicialmente (Figuras 1B e 1C).


Figura 1. A: Angiotomografia de coronárias com reconstrução curva demonstrando provável suboclusão pós-stent (seta). B,C: Tomografia computadorizada cardíaca, no plano longo longitudinal, pseudo-duas câmaras, demonstrando a região do aneurisma do VE com importante afilamento da parede anterior medioapical (2 mm de espessura – linha laranja) e a espessura normal do segmento anterior basal. Grande trombo simulando a espessura normal da parede anterior do VE (verde).



O aneurisma ventricular é complicação grave do infarto transmural do miocárdio (5–38% dos casos), sendo a complicação mecânica mais comum, normalmente evoluindo com limitações físicas e impacto negativo na qualidade de vida(1–4). É definido como afilamento e dilatação ventricular miocárdica, com margens distintas, levando a acinesia ou discinesia de um ou mais segmentos miocárdicos durante a contração ventricular(1,2–5). Geralmente acomete a região anteroapical do VE, em razão do suprimento sanguíneo da parede anterior ser altamente dependente da artéria descendente anterior(2,3). O desenvolvimento ocorre no período de dois a dez dias após o IAM, sendo aparente no primeiro ano após o infarto, com incidência de 30–35% nos pacientes que sofreram IAM(4–6). Como achado secundário, o trombo intracavitário acomete cerca de 40–60% dos pacientes(4) e decorre do processo inflamatório na região endocárdica acometida pelo IAM, estando relacionado à hipocinesia e à hipercoagulabilidade existente no infarto, aumentando o risco de evento tromboembólico após o terceiro mês, nos aneurismas ventriculares.

Os sintomas do aneurisma de VE são amplos, variando desde casos assintomáticos, surgimento de dispneia, insuficiência cardíaca e angina, até manifestações mais graves, como edema agudo de pulmão, tromboembolismo e ruptura ventricular(5–7). No tratamento dos casos graves refratários, as técnicas cirúrgicas são indicadas, tais como a plicatura, excisão e sutura, imbricação e interposição de patch(8). No caso aqui apresentado, apesar da extensa área de discinesia do VE, com formação de aneurisma e trombo intracavitário aderido, o paciente evoluiu assintomático, apresentação pouco frequente em aneurismas exuberantes, sendo diagnosticado somente após realização de angiotomografia de coronárias, método não invasivo que não apenas permite o diagnóstico, mas também fornece medidas precisas e pode ser usado no seguimento pós-operatório(1,4–6,9–11). Exames de rastreamento usuais (ecocardiograma) frequentemente não conseguem avaliar o ápice, mesmo com uma boa janela de acesso(1,2,7). A angiotomografia das coronárias, além de realizar o diagnóstico, foi capaz de promover a adesão ao tratamento pelo paciente.


REFERÊNCIAS

1. Assunção FB, Oliveira DC, Souza VF, et al. Cardiac magnetic resonance imaging and computed tomography in ischemic cardiomyopathy: an update. Radiol Bras. 2016;49:26–34.

2. Cardoso MB, Azevedo CHNF, Teixeira CO, et al. Aneurisma do ventrículo esquerdo pós-infarto do miocárdio: correlação da semiotécnica complementar com os achados anatomopatológicos: relato de quatro casos com necropsia. Rev Ciênc Méd, Campinas. 2001;10: 31–5.

3. Debray M, Pautas E, Dulou L, et al. Aneurysm of the left ventricle: a two-decade silent history. J Am Geriatr Soc. 2001;49:337–8.

4. Strecker T, Baum U, Harig F, et al. Visualization of a large ventricular aneurysm in a young man by 16-slice multi-detector row spiral computed tomography before successful surgical treatment. Int J Cardiovasc Imaging. 2006;22:537–41.

5. Achenbach S, Ropers D, Daniel WG. Calcified left ventricular aneurysm. N Engl J Med. 2003;348:2469.

6. Evangelou D, Letsas KP, Gavrielatos G, et al. Giant left-ventricular pseudoaneurysm following silent myocardial infarction. Cardiology. 2006;105:137–8.

7. Makaryus AN, Manetta F, Goldner B, et al. Large left ventricular pseudoaneurysm presenting 25 years after penetrating chest trauma. J Interv Cardiol. 2005;18:193–200.

8. Loures DRR, Carvalho RG, Lima Jr JD, et al. Tratamento cirúrgico dos aneurismas de ventrículo esquerdo e isquemia coronária. Rev Bras Cir Cardiovasc. 1997;12:122–31.

9. Assunção FB, Oliveira DCL, Souza VF, et al. Cardiac magnetic resonance imaging and computed tomography in ischemic cardiomyopathy: an update. Radiol Bras. 2016;49:26–34.

10. Rochitte CE. Cardiac MRI and CT: the eyes to visualize coronary arterial disease and their effect on the prognosis explained by the Schrödinger’s cat paradox. Radiol Bras. 2016;49(1):vii–viii. 11. Neves PO, Andrade J, Monção H. Coronary artery calcium score: current status. Radiol Bras. 2017;50:182–9.










1. Unidade de Radiologia Clínica (URC), São José dos Campos, SP, Brasil
2. Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Kamila Seidel Albuquerque
Unidade de Radiologia Clínica
Rua Teopompo de Vasconcelos, 245, Vila Adyana
São José dos Campos, SP, Brasil, 12243-830
E-mail: kamilaseidel@hotmail.com
 
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