EDITORIAL
|
|
|
|
Autho(rs): Bruno Niemeyer de Freitas Ribeiro |
|
O vírus Zika (ZIKV) é um arbovírus da família Flaviviridae, composto de ácido ribonucleico, identificado em 1947 na floresta Zika, em Uganda, a partir de macacos Rhesus que serviam de sentinelas para estudo de vigilância para febre amarela, com o primeiro caso descrito em humanos em 1952(1–5). Tipicamente, o ZIKV ocorre em áreas tropicais e subtropicais do mundo, sendo reconhecidas duas linhagens, a africana e a asiática, e três genótipos, o oeste africano, o leste africano e o asiático, sendo este último o responsável pelo surto ocorrido no Brasil(1–5). A transmissão, na maioria dos casos, ocorre pela picada de mosquitos do gênero Aedes, principalmente o Aedes aegypti, com mosquitos de outros gêneros sendo potenciais vetores para a disseminação da doença(1–5). Outras formas de transmissão são descritas na literatura, como transfusão sanguínea, sexual, transplacentária, perinatal e pela urina(1–5).
As infecções, em sua maioria, são assintomáticas (80%), e quando sintomáticas, são comumente caracterizadas por um quadro autolimitado de rash maculopapular, febre baixa, cefaleia, artralgias e conjuntivite não purulenta, com regressão dos sintomas geralmente em dois a sete dias(1–5). Apesar de raras, formas de acometimento do sistema nervoso central (SNC) associadas à infecção pelo ZIKV foram relatadas, como meningoencefalite, síndrome de Guillain-Barré e encefalomielite disseminada aguda(1–7). O diagnóstico de ZIKV pode ser confirmado por amplificação do genoma viral por meio da reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa coletado de sangue, saliva, urina, líquor e líquido amniótico, ou por testes sorológicos para detecção de IgM contra ZIKV(1–6). O tratamento é direcionado para os sintomas, não havendo, até o momento, vacinas ou terapia antiviral. O foco maior tem sido a prevenção centrada na erradicação do vetor e evitar viagens para áreas endêmicas caso seja possível. Apesar de surtos prévios de ZIKV terem ocorrido na Micronésia em 2007 e na Polinésia Francesa em 2013-2014, a associação de malformações do SNC e a infecção congênita pelo ZIKV somente foi reconhecida em outubro de 2015 no nordeste do Brasil, com um aumento dramático nos casos de microcefalia(1,3–5,8,9). Em fevereiro de 2016, a Organização Mundial da Saúde declarou a relação do ZIKV e malformações congênitas como uma emergência de saúde internacional(9). O Brasil foi o país da América Latina mais afetado pelo ZIKV, com aproximadamente 1.500.000 casos entre 2015 e 2016 e um aumento de cerca de 20 vezes nos casos de microcefalia quando comparado com os anos prévios(1,8,9). Atualmente, o número de casos relatados de ZIKV no Brasil diminuiu de 205.000 casos em 2016 para 13.000 casos em 2017, com a imunidade populacional sendo considerada o principal motivo desse declínio(9). Entretanto, a transmissão contínua no Brasil e nas Américas dos quatro sorotipos da dengue nas últimas décadas sugere que o ZIKV continuará a circular, tornando necessária a suspeição dos médicos diante de um quadro clínico compatível(9). As manifestações da infecção intrauterina pelo ZIKV são mais graves quando ocorrem no primeiro e segundo trimestres de gestação e variam desde morte fetal até várias anormalidades congênitas, que incluem pele redundante no escalpo e nuca (cutis gyrata), baixo peso ao nascimento, poli-hidrâmnio, anasarca, artrogripose, perda auditiva, assim como malformações oculares e no SNC(1,2,10–18). O artigo de Peixoto Filho et al.(19), publicado neste número da Radiologia Brasileira, ilustra de forma clara os principais aspectos encontrados na tomografia computadorizada e na ressonância magnética de crânio de crianças com malformações do SNC provavelmente relacionadas ao ZIKV. Neste artigo foram analisados exames de nove crianças, e os principais aspectos de imagem encontrados foram: microcefalia, protuberância occipital com escalpo redundante, redução volumétrica do parênquima cerebral com simplificação do padrão giral, ventriculomegalia, calcificações parenquimatosas predominantemente localizadas na transição corticossubcortical, agenesia/disgenesia do corpo caloso, e alterações da fossa posterior, como hipoplasias cerebelares e pontina. Tais aspectos apresentam conformidade e corroboram os achados da literatura atual(1,10–18). Concluindo, conforme apresentado por Peixoto Filho et al.(19), cada vez mais ficam consolidados os aspectos de neuroimagem que compõem a síndrome congênita pelo ZIKV, que, embora não sejam patognomônicos, seu conhecimento é de fundamental importância para os radiologistas fazerem a suspeição diagnóstica. REFERÊNCIAS 1. Ribeiro BNF, Muniz BC, Gasparetto EL, et al. Congenital Zika syndrome and neuroimaging findings: what do we know so far? Radiol Bras. 2017;50:314–22. 2. Rafful P, Souza AS, Tovar-Moll F. The emerging radiological features of Zika virus infection. Radiol Bras. 2017;50(6):vii–viii. 3. Yadav S, Rawal G, Baxi M. Zika virus: an emergence of a new arbovirus. J Clin Diagn Res. 2016;10:1–3. 4. Aziz H, Zia A, Anwer A, et al. Zika virus: global health challenge, threat and current situation. J Med Virol. 2017;89:943–51. 5. Younger DS. Epidemiology of Zika virus. Neurol Clin. 2016;34:1049–56. 6. Niemeyer B, Niemeyer R, Borges R, et al. Acute disseminated encephalomyelitis following Zika virus infection. Eur Neurol. 2017;77:45–6. 7. Fontes CA, Dos Santos AA, Marchiori E. Magnetic resonance imaging findings in Guillain-Barré syndrome caused by Zika virus infection. Neuroradiology. 2016;58:837–8. 8. Souza WV, Albuquerque MFPM, Vazquez E, et al. Microcephaly epidemic related to the Zika virus and living conditions in Recife, Northeast Brazil. BMC Public Health. 2018;18:130. 9. Lowe R, Barcellos C, Brasil P, et al. The Zika virus epidemic in Brazil: from discovery to future implications. Int J Environ Res Public Health. 2018;15:96–113. 10. Hajra A, Bandyopadhyay D, Heise LR, et al. Zika and pregnancy: a comprehensive review. Am J Reprod Immunol. 2017;77(2). Epub 2016 Nov 25. 11. Mlakar J, Korva M, Tul N, et al. Zika virus associated with microcephaly. N Engl J Med. 2016;374:951–8. 12. Oliveira-Szejnfeld PS, Levine D, Melo ASO, et al. Congenital brain abnormalities and Zika virus: what the radiologist can expect to see prenatally and postnatally. Radiology. 2016;281:203–18. 13. Aragao MFV, van der Linden V, Brainer-Lima AM, et al. Clinical features and neuroimaging (CT and MRI) findings in presumed Zika virus related congenital infection and microcephaly: retrospective case series study. BMJ. 2016;353:i1901. 14. Hazin AN, Poretti A, Souza Cruz DDC, et al. Computed tomographic findings in microcephaly associated with Zika virus. N Engl J Med. 2016;374:2193–5. 15. Zare Mehrjardi M, Keshavarz E, Poretti A, et al. Neuroimaging findings of Zika virus infection: a review article. Jpn J Radiol. 2016;34:765–70. 16. Zare Mehrjardi M, Poretti A, Huisman TA, et al. Neuroimaging findings of congenital Zika virus infection: a pictorial essay. Jpn J Radiol. 2017;35:89–94. 17. Moore CA, Staples JE, Dobyns WB, et al. Characterizing the pattern of anomalies in congenital Zika syndrome for pediatric clinicians. JAMA Pediatr. 2017; 171:288–95. 18. Ribeiro BNF, Muniz BC, Gasparetto EL, et al. Congenital involvement of the central nervous system by the Zika virus in a child without microcephaly – spectrum of congenital syndrome by the Zika virus. J Neuroradiol. 2017 Dec 19. pii:S0150-9861(17)30347-4. 19. Peixoto Filho AAA, Freitas SB, Ciosaki MM, et al. Computed tomography and magnetic resonance imaging findings in infants with microcephaly potentially related to congenital Zika virus infection. Radiol Bras. 2018;51:119–22. Mestrando pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Médico Neurorradiologista do Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: bruno.niemeyer@hotmail.com |