Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 50 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2017

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 408 to 409

Pulmonary involvement in Gaucher disease

Autho(rs): Lucas de Pádua Gomes de Farias1; Igor Gomes Padilha1; Carla Jotta Justo dos Santos2; Carol Pontes de Miranda Maranhão2, Christiana Maia Nobre Rocha de Miranda2

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Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Paciente do sexo feminino, 2 anos e 9 meses, com doença de Gaucher tipo II diagnosticada aos 7 meses de idade por meio da avaliação da atividade enzimática, filha de pais consanguíneos (primos de primeiro grau), foi encaminhada ao serviço de radiologia para avaliação de quadro de taquidispneia há duas semanas, sem febre ou comprometimento do estado geral. Iniciou-se a investigação com radiografia convencional de tórax (Figura 1), que mostrou padrão pulmonar intersticial bilateral reticulonodular. Realizou-se tomografia computadorizada de multidetectores (TCMD), que demonstrou acentuado espessamento dos septos interlobulares e intralobulares difusamente, alternando com áreas de menor acometimento, associado a opacidade em vidro fosco do parênquima pulmonar, caracterizando o padrão de pavimentação em mosaico (Figura 2).



Figura 1. Radiografia de tórax na incidência anteroposterior demonstra padrão pulmonar intersticial bilateral tipo reticulonodular, mais acentuado nos lobos inferiores.



Figura 2. Imagens de tomografia computadorizada multidetectores axial (A), coronal (B) e sagital do pulmão direito (C) demonstram acentuado espessamento dos septos interlobulares e dos septos intralobulares difusamente, associado a opacidade de vidro fosco do parênquima pulmonar, caracterizando o padrão de pavimentação em mosaico. Observar também a irregularidade com a superfície pleural e o espessamento das fissuras (cabeças de setas).



A doença de Gaucher, padrão autossômico recessivo, corresponde a deficiência da glucocerebrosidase, resultando no acúmulo de glucocerebrósidos nos macrófagos do sistema reticuloendotelial e alterando a aparências dessas células, então denominadas células de Gaucher(1–3). Este acúmulo repercute, principalmente, na hiperplasia de fígado, baço e linfonodos, perfazendo a principal característica da doença, a hepatoesplenomegalia. Raramente, os pulmões, a pele, os olhos, os rins e o coração estão envolvidos(1–6). É a doença do armazenamento lisossomal mais prevalente e, tradicionalmente, classificada em três grandes categorias fenotípicas: tipo I (crônica, não neuropática, tipo adulto), 99% dos casos, caracterizado por quadro com poucas evidências clínicas; tipo II (neuropática aguda, tipo infantil), usualmente resulta em óbito antes dos dois anos por pneumonia e anóxia; e tipo III (neuropática subaguda, tipo juvenil), que apresenta evolução heterogênea. Outros tipos menos prevalentes são as formas letal perinatal e cardiovascular(2–6).

O acometimento pulmonar na doença de Gaucher é considerado raro, porém, vem sendo identificado de forma frequente, apesar de não haver relatos de estatísticas epidemiológicas. Outra característica presente na literatura é a falta de padronização nas suas formas de apresentação radiológica, em razão do envolvimento multifatorial com múltiplos padrões de infiltração tecidual pelas células de Gaucher(4,6,7).

As características das imagens traduzem diversos mecanismos fisiopatológicos, e além do espessamento dos septos interlobulares e intralobulares, os pacientes podem apresentar opacidades alveolares, comprometimento intracapilar e opacidades intersticiais com predomínio de distribuição linfática e infecções respiratórias(4–8). Outras alterações incluem a fibrose pulmonar, o padrão miliar e o acometimento de linfonodos hilares e mediastinais, assim como redução volumétrica dos pulmões em consequência da hepatoesplenomegalia. Os exames radiográficos ainda podem demonstrar a presença de um padrão intersticial, além das alterações de estruturas ósseas que possam coexistir(3–7).

O envolvimento difuso dos pulmões evidencia um caráter sistêmico para esta doença. A TCMD é importante instrumento na avaliação inicial e no seguimento destes pacientes, podendo a biópsia pulmonar ser dispensada quando as alterações tomográficas demonstrarem opacidades intersticiais num contexto clinicoepidemiológico adequado(6,7).

Na ausência da suspeição clínica, o aspecto tomográfico de padrão de pavimentação em mosaico torna o diagnóstico radiológico difícil, tendo como principais diagnósticos diferenciais: proteinose alveolar, hemorragia pulmonar e vasculites, dano alveolar difuso (síndrome do desconforto respiratório agudo), edema pulmonar, carcinoma bronquioloalveolar, doença de Niemann-Pick, pneumonite por radiação e pneumonias (Pneumocistys, viral, lipoídica, micobactéria, intersticial e eosinofílica)(9).


REFERÊNCIAS

1. Beutler E. Gaucher's disease. N Engl J Med. 1991;325:1354–60.

2. Pastores GM, Hughes DA. Gaucher disease. 2000 Jul 27 [Updated 2015 Feb 26]. In: Adam MP, Ardinger HH, Pagon RA, et al. GeneReviews© [Internet]. Seattle (WA): University of Washington, Seattle; 1993-2017. [cited 2017 Oct 30]. Available from: www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK1269/.

3. Mendonça VF, Paula MTM, Fernandes C, et al. Manifestações esqueléticas da doença de Gaucher. Radiol Bras. 2001;34:151–4.

4. Wolson AH. Pulmonary findings in Gaucher's disease. Am J Roentgenol Radium Ther Nucl Med. 1975;123:712–5.

5. Kerem E, Elstein D, Abrahamov A, et al. Pulmonary function abnormalities in type I Gaucher disease. Eur Respir J. 1996;9:340–5.

6. Aydin K, Karabulut N, Demirkazik F, et al. Pulmonary involvement in adult Gaucher's disease: high resolution CT appearance. Br J Radiol. 1997;70:93–5.

7. Amir G, Ron N. Pulmonary pathology in Gaucher's disease. Hum Pathol. 1999;30:666–70.

8. Yassa NA, Wilcox AG. High-resolution CT pulmonary findings in adults with Gaucher's disease. Clin Imaging. 1998;22:339–42.

9. Müller CIS, D'Ippolito G, Rocha AJ. Tórax. Série Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem: Tórax. 1ª edição. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier; 2010.










1. Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Maceió, AL, Brasil
2. Clínica de Medicina Nuclear e Radiologia de Maceió (MedRadius), Maceió, AL, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Christiana Maia Nobre Rocha de Miranda
Clínica de Medicina Nuclear e Radiologia de Maceió (MedRadius)
Rua Hugo Corrêa Paes, 104, Farol
Maceió, AL, Brasil, 57050-730
E-mail: maia.christiana@gmail.com
 
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