EDITORIAIS
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Autho(rs): Clarissa Canella |
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A febre chikungunya é uma infecção que se manifesta clinicamente por febre aguda, rash cutâneo, artralgia, artrite e fadiga incapacitantes. A doença é causada por um vírus da família Togaviridae e transmitida aos seres humanos pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus. O diagnóstico da febre chikungunya é feito, primeiramente, com base no quadro clínico. A confirmação laboratorial é absolutamente necessária para diferenciar os sintomas e fazer o diagnóstico diferencial com outras doenças transmitidas pelos mosquitos Aedes, como a dengue, endêmicas nas mesmas áreas geográficas. Para o diagnóstico definitivo, a demonstração direta da presença do vírus no sangue por meio da determinação do RNA viral deve ser realizada no pico da viremia da doença, entre 5 e 10 dias do início dos sintomas(1,2). Os recursos terapêuticos atuais são escassos e o tratamento é sintomático, apresentando resposta lenta e moderada(1).
Embora a artralgia seja a manifestação articular mais típica, artrite com importante sinovite pode ser identificada em todas as fases da doença, demonstrada na ultrassonografia pela distensão dos recessos articulares por derrame articular e espessamento sinovial hipoecoico não compressível, determinando abaulamento da cápsula articular e estruturas tendíneas adjacentes. Em alguns casos, sinais de hipervascularização sinovial ao estudo com power Doppler podem ser encontrados. O acometimento é em geral distal, simétrico, poliarticular, predominando nas mãos, punhos e tornozelos. Mais raramente, a doença acomete cotovelos, joelhos, ombros, quadris e articulações temporomandibulares. A entesite do calcâneo e o acometimento condroesternal ocorrem menos frequentemente(2). A febre chikungunya apresenta alta incidência de recorrência e cronicidade do acometimento articular com persistência dos sintomas inflamatórios(1,2). A doença, na fase crônica, apresenta aspectos muito semelhantes aos da artrite reumatoide, uma vez que os pacientes cursam com poliartrite crônica bilateral e simétrica com padrão migratório, e a prevalência da positividade do fator reumatoide varia de 25% a 43%(1,2). Após as manifestações iniciais, a taxa de recorrência da artrite diminui ao longo do tempo, sendo de 88% a 100% nas primeiras seis semanas, chegando a 12% até cinco anos. Alguns autores defendem a necessidade do acompanhamento reumatológico dos pacientes com artralgia crônica, identificando casos que podem se manifestar a longo prazo como artrite reumatoide secundária(2). Ao contrário de algumas infecções fúngicas altamente incidentes no nosso meio, como a paracoccidioidomicose, que tem sido assunto de várias publicações recentes na literatura radiológica brasileira(3–6), muito pouco se tem escrito sobre os aspectos de imagem das viroses transmitidas pelo mosquito Aedes. Métodos de imagem como a ultrassonografia e a ressonância magnética teriam papel fundamental na documentação do acometimento articular na fase aguda de pacientes com a febre chikungunya, e principalmente nos pacientes que evoluem com artrite crônica(2). Outra importante manifestação descrita na febre chikungunya é a tenossinovite das mãos, punhos e tornozelos, que pode ser grave, contribuindo para o aparecimento de síndrome do túnel do carpo e tarso. Esta alteração pode ser identificada na ultrassonografia pela distensão líquida e espessamento da bainha sinovial dos tendões, às vezes com sinais de hipervascularização peritendínea ao estudo com power Doppler. O acometimento tendíneo tem sido descrito na literatura e visto na prática clínica, conforme relatado no artigo desenvolvido por Mogami et al.(7) e publicado neste número da Radiologia Brasileira, em que os autores demonstram os aspectos ultrassonográficos do acometimento do tornozelo na febre chikungunya. Segundo esta publicação, houve predomínio da doença no sexo feminino e as alterações ultrassonográficas mais comuns foram derrame articular e tenossinovite, principalmente dos fibulares e tibial posterior. A miosite do sóleo ou flexor longo do hálux e bursite retrocalcânea também foram demonstradas em alguns pacientes. O vírus da febre chikungunya foi isolado, inicialmente, na Tanzânia em 1952, mas a doença tornou-se estatisticamente importante apenas em 2004 após uma epidemia no Quênia. No entanto, deve-se ressaltar que as manifestações articulares, como artrite e sinovite, já haviam sido relatadas na literatura desde 1980, por Kennedy et al.(8), numa série de 20 pacientes, inclusive indicando cronicidade do quadro clínico, com persistência dos sintomas por mais de quatro meses. Recentemente, houve um importante aumento do número de casos da doença no Brasil em 2016, com predomínio na região Nordeste. Segundo Mogami et al., as expectativas das autoridades sanitárias é de um aumento ainda maior do número de casos da doença em 2017(7). REFERÊNCIAS 1. Horcada ML, Díaz-Calderón C, Garrido L. Chikungunya fever. Rheumatic manifestations of an emerging disease in Europe. Reumatol Clin. 2015;11:161–4. 2. Goupil BA, Mores CN. A review of chikungunya virus-induced arthralgia: clinical manifestations, therapeutics, and pathogenesis. Open Rheumatol J. 2016;10:129–40. 3. Vermelho MB, Correia AS, Michailowsky TC, et al. Abdominal alterations in disseminated paracoccidioidomycosis: computed tomography findings. Radiol Bras. 2015;48:81–5. 4. Gava P, Melo AS, Marchiori E, et al. Intestinal and appendiceal paracoccidioidomycosis. Radiol Bras. 2015;48:126–7. 5. Lima Júnior FV, Savarese LG, Monsignore LM, et al. Computed tomography findings of paracoccidioidomycosis in musculoskeletal system. Radiol Bras. 2015;48:1–6. 6. Queiroz RM, Gomes MP, Valentin MV. Pulmonary paracoccidioidomycosis showing reversed halo sign with nodular/coarse contour. Radiol Bras. 2016;49:59–60. 7. Mogami R, Vaz JLP, Chagas YFP, et al. Ultrassonografia do tornozelo no diagnóstico das complicações da febre chikungunya. Radiol Bras. 2017;50:71–5. 8. Kennedy AC, Fleming J, Solomon L. Chikungunya viral arthropathy: a clinical description. J Rheumatol. 1980;7:231–6. Professora Adjunta de Radiologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Médica Radiologista Especialista em Musculoesquelético da Clínica de Diagnóstico por Imagem (CDPI), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: clacanella@yahoo.com.br |