Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 50 nº 1 - Jan. / Fev.  of 2017

EDITORIAIS
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Page(s) VII to VIII



As poderosas "lentes" da ressonância magnética no diagnóstico de nódulos hepáticos em pacientes cirróticos: o diagnóstico de carcinoma hepatocelular sem necessidade de confirmação histopatológica – fato!

Autho(rs): Andrea Farias de Melo-Leite

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A inflamação crônica hepática determinando diversos estágios de fibrose do parênquima e sobretudo o dano final hepático – a cirrose – é o principal desencadeante da hepatocarcinogênese e, portanto, responsável pelo carcinoma hepatocelular (CHC), a neoplasia maligna primária mais comum do fígado. Não só as hepatites virais, mas também o etilismo crônico, a esteato-hepatite não alcoólica e várias outras condições menos frequentes podem causar inflamação crônica hepática(1–3).

É extraordinário perceber que com o avanço tecnológico dos aparelhos – principalmente os da tomografia computadorizada (TC) e, sobretudo, da ressonância magnética (RM) –, por meio das técnicas quantitativas e diversas sequências disponíveis, os radiologistas possuem uma ferramenta não invasiva e poderosa, como "lentes ampliadoras" para estudo indireto e diagnóstico preciso da avaliação citoarquitetural dos órgãos do corpo, aqui em especial atenção para o fígado. Como detalhado e demonstrado no artigo de Ramalho et al.(4) publicado neste número da Radiologia Brasileira, os achados de RM reproduzem indiretamente as mudanças histopatológicas e hemodinâmicas, incluindo a alteração da morfologia hepática, a fibrose e os nódulos, cujo spectrum varia desde nódulo de regeneração, nódulo displásico de baixo a alto grau e, por fim, o CHC(4). As vantagens da RM em relação à TC são várias e incluem a não utilização de radiação ionizante, maior resolução tecidual (incluindo o diagnóstico de componente de gordura intralesional), a possibilidade de utilização de agentes de contraste extracelular e hepatoespecífico, além da excelente avaliação adicional da árvore biliar pela colangiografia por RM. Há demonstração da superioridade da RM sobre a TC frente ao diagnóstico de pequenos CHCs, bem como na detecção de nódulos displásicos e no CHC difuso(4).

Apesar da importância das características acima citadas nas sequências de RM, na atualidade, a ferramenta chave para o diagnóstico do CHC e, portanto, para a avaliação de nódulos nas hepatopatias crônicas é, sem dúvida, o estudo do comportamento hemodinâmico frente ao background do parênquima, demonstrando a variação do suprimento sanguíneo, determinando o realce na fase arterial (wash-in) e se há ou não wash-out nas fases subsequentes (fases portal e de equilíbrio). Isoladamente, a característica mais crítica para o CHC, atribuída ao recrutamento de novas arteríolas intratumorais, é o wash-in – alta sensibilidade para CHC(5–8). Entretanto, o nódulo displásico de alto grau e até os shunts arteriovenosos apresentam essa característica. Assim, a combinação do realce hipervascular na fase arterial e o wash-out nas fases tardias é altamente específica para o diagnóstico de CHC. Entretanto, usando apenas o critério de realce, 30% a 40% dos pacientes cirróticos com CHC não seriam diagnosticados por apresentarem realce atípico, principalmente nas lesões menores que 2,0 cm(5). A diferenciação por imagem de um nódulo de regeneração displásico de baixo e alto grau e o CHC é fundamental para o manejo adequado do paciente, sendo essa diferenciação factível e reprodutível nos exames de RM, como detalhado no artigo de Ramalho et al.(4).

Shankar et al.(9), em estudo prospectivo recente com 20 pacientes, em aparelho de 3 T, demonstraram que a difusão pode ser uma alternativa não só para detecção e caracterização do CHC em pacientes com alteração da função renal e alergia ao meio de contraste paramagnético, mas ainda, que o valor do coeficiente de difusão aparente pode ser ferramenta útil não invasiva para predizer o grau de diferenciação do CHC(9). No entanto, tais resultados ainda precisam de confirmação por outros grupos.

A intensidade de sinal nas sequências pesadas em T2, a detecção de gordura micro e macroscópica pelas técnicas de desvio químico, a avaliação hemodinâmica tumoral, a utilização de contraste extracelular e/ou hepatoespecífico e, ainda, as técnicas quantitativas – como a difusão e os valores quantitativos do coeficiente de difusão aparente – fazem parte de um verdadeiro arsenal de ferramentas e parâmetros que nos auxilia para resolvermos o quebra-cabeça que é o diagnóstico do CHC(2,4–10).

Nós, os radiologistas, somos hoje verdadeiros detetives com "lentes ampliadoras" excelentes. Lentes estas que continuam sendo aprimoradas, permitindo aumento da precisão diagnóstica, principalmente pela avaliação da hemodinâmica e da citoarquitetura tumoral, eliminando a necessidade da utilização de métodos invasivos para a confirmação diagnóstica. Nosso papel como radiologistas na avaliação de nódulos hepáticos sofreu grande transformação com os avanços das nossas "lentes", com impacto benéfico sobre o tratamento dos pacientes com hepatopatias crônicas. É preciso estarmos atentos para acompanharmos os passos largos desses avanços e abraçarmos o futuro.


REFERÊNCIAS

1. Singal AG, Conjeevaram HS, Volk ML, et al. Effectiveness of hepatocellular carcinoma surveillance in patients with cirrhosis. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 2012;21:793–9.

2. Chung YE, Park MS, Park YN, et al. Hepatocellular carcinoma variants: radiologic-pathologic correlation. AJR Am J Roentgenol. 2009;193:W7–13.

3. Elias J Jr, Altun E, Zacks S, et al. MRI findings in nonalcoholic steatohepatitis: correlation with histopathology and clinical staging. Magn Reson Imaging. 2009;27:976–87.

4. Ramalho M, Matos AP, AlObaidy M, et al. Magnetic resonance imaging of the cirrhotic liver: diagnosis of hepatocellular carcinoma and evaluation of response to treatment – Part 1. Radiol Bras. 2017;50:38–47.

5. Forner A, Vilana R, Ayuso C, et al. Diagnosis of hepatic nodules 20 mm or smaller in cirrhosis: prospective validation of the noninvasive diagnostic criteria for hepatocellular carcinoma. Hepatology. 2008;47:97–104.

6. Rimola J, Forner A, Tremosini S, et al. Non-invasive diagnosis of hepatocellular carcinoma ≤ 2 cm in cirrhosis. Diagnostic accuracy assessing fat, capsule and signal intensity at dynamic MRI. J Hepatol. 2012;56:1317–23.

7. Quaia E, De Paoli L, Pizzolato R, et al. Predictors of dysplastic nodule diagnosis in patients with liver cirrhosis on unenhanced and gadobenate dimeglumineenhanced MRI with dynamic and hepatobiliary phase. AJR Am J Roentgenol. 2013;200:553–62.

8. Kim TK, Lee KH, Jang HJ, et al. Analysis of gadobenate dimeglumine-enhanced MR findings for characterizing small (1-2-cm) hepatic nodules in patients at high risk for hepatocellular carcinoma. Radiology. 2011;259:730–8.

9. Shankar S, Kalra N, Bhatia A, et al. Role of diffusion weighted imaging (DWI) for hepatocellular carcinoma (HCC) detection and its grading on 3T MRI: a prospective study. J Clin Exp Hepatol. 2016;6:303–10.

10. Kim JH, Min YW, Gwak GY, et al. The utility of gadoxetic acid-enhanced magnetic resonance imaging in the surveillance for postoperative recurrence of hepatocellular carcinoma. Medicine (Baltimore). 2016;95:e5666.










Doutora, Médica Radiologista, Preceptora dos Residentes do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Radiologista do Centro Diagnóstico Lucilo Ávila Júnior (CLAJ), Maximagem e Safelaudos Diagnósticos, Recife, PE, Brasil. E-mail: andreafariasm@gmail.com
 
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