Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 49 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2016

CARTA AO EDITOR
Print 

Page(s) 412 to 413



Melanose neurocutânea

Autho(rs): Bruno Lima Moreira; Thiago Grunewald; Auro Augusto Junqueira Côrtes; Victor Hugo Rocha Marussi; Lázaro Luís Faria do Amaral

PDF Português      

PDF English

Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Paciente masculino, 12 anos, apresenta atraso no desenvolvimento neuropsicomotor desde o primeiro ano de vida. Há dois anos foi submetido a derivação ventricular por hidrocefalia. Há seis meses vem apresentando crises convulsivas. O exame físico revelou múltiplos nevos cutâneos (Figura 1A). O estudo liquórico mostrou hiperproteinorraquia (proteínas: 1359,7 mg/dL; valores de referência: 15,00–45,00 mg/dL) e presença de células epitelioides. A ressonância magnética (RM) do encéfalo (Figuras 1B, 1C e 1D) mostrou espessamento leptomeníngeo extenso, bilateral e assimétrico, principalmente nos sulcos corticais do hemisfério cerebral direito, com hipersinal espontâneo em T1 (presumivelmente melanina) e realce difuso pós-gadolínio venoso. Também mostrou acometimento do parênquima cerebral, caracterizado por hipersinal espontâneo em T1 nos núcleos amigdaloides e no córtex, provavelmente por depósitos de melanina/melanócitos. Mesmo sem biópsia meníngea, o diagnóstico presuntivo de melanose neurocutânea (MNC) foi considerado.


Figura 1. A: Exame físico mostra múltiplos nevos cutâneos. B,C: RM axial T1 com supressão de gordura pré-gadolínio demonstra hipersinal junto aos sulcos corticais dos hemisférios cerebrais, presumivelmente por lesão leptomeníngea difusa com conteúdo de melanina, e ainda mostra áreas de alto sinal nos núcleos amigdaloides (setas) e no córtex cerebral, que devem corresponder a comprometimento parenquimatoso por depósitos de melanina/melanócitos no contexto de MNC. D: RM axial T1 com supressão de gordura pós-gadolínio revela realce leptomeníngeo difuso junto aos sulcos corticais de ambos os hemisférios cerebrais, principalmente no lado direito.



MNC é uma rara síndrome neuroectodérmica descrita primeiramente por Rokitansky em 1861, sendo caracterizada por um grande ou múltiplos nevos cutâneos congênitos associados a proliferação benigna ou maligna de melanócitos no sistema nervoso central (SNC)(1–4). Os critérios diagnósticos foram descritos por Fox e posteriormente revisados por Kadonaga e Frieden em 1991(1) e incluem a combinação de todos os descritos a seguir: – nevo congênito gigante (adultos: pelo menos 20 cm no maior diâmetro; neonatos/crianças: 9 cm na cabeça ou 6 cm no tronco) ou múltiplos (três ou mais) nevos congênitos em associação a melanose meníngea ou melanoma do SNC; – ausência de melanoma cutâneo, exceto em pacientes com lesão meníngea benigna comprovada histologicamente; – ausência de melanoma meníngeo, exceto em pacientes com lesões cutâneas histologicamente benignas.

Cerca de 60% a 70% dos indivíduos com MNC desenvolvem sintomas, que costumam se manifestar antes dos cinco anos de idade(2). Clinicamente, os pacientes podem apresentar convulsões, hidrocefalia, atraso do desenvolvimento, desordens psiquiátricas, paralisias de nervos cranianos, hemorragia intracraniana e mielopatia(1,2,5–7). Convulsões costumam ser a manifestação neurológica inicial(2). O comprometimento do SNC pode incluir lesões parenquimatosas ou leptomeníngeas, sendo elas melanose (agregado de células melanocíticas benignas) ou melanomas(5).

Os achados de RM na MNC podem incluir áreas com hipersinal em T1 nos lobos temporais, realce difuso das leptomeninges do encéfalo e da medula espinhal e massa de melanoma maligno(4). A melanose parenquimatosa costuma ocorrer nos lobos temporais (núcleos amigdaloides), cerebelo e ponte, usualmente exibe hipersinal em T1 e comumente não apresenta impregnação pelo contraste venoso(5,7,8). As lesões leptomeníngeas costumam apresentar sinal intermediário a alto em T1, sinal baixo a intermediário em T2, hipersinal em FLAIR e realce difuso pósgadolínio. Efeito de massa, edema, hemorragia e necrose favorecem a possibilidade de melanoma em detrimento de lesão melanocítica benigna(5). Anormalidades na coluna vertebral, em especial malformações císticas (principalmente cistos aracnoides), são relativamente comuns em pacientes com MNC(2).

Potenciais diagnósticos diferenciais em relação às imagens da RM do encéfalo incluem hemorragia subaracnoide, meningite, carcinomatose leptomeníngea, outras lesões contendo melanina e tumores hemorrágicos não melanocíticos. O contexto clínico e as características de imagem irão auxiliar nesta diferenciação(4,9).

Independentemente do tratamento, o prognóstico usualmente é ruim, principalmente nos casos com acometimento leptomeníngeo difuso(2,5,6).


REFERÊNCIAS

1. Kadonaga JN, Frieden IJ. Neurocutaneous melanosis: definition and review of the literature. J Am Acad Dermatol. 1991;24:747–55.

2. Ramaswamy V, Delaney H, Haque S, et al. Spectrum of central nervous system abnormalities in neurocutaneous melanocytosis. Dev Med Child Neurol. 2012;54:563–8.

3. Scattolin MA, Lin J, Peruchi MM, et al. Neurocutaneous melanosis: follow-up and literature review. J Neuroradiol. 2011;38:313–8.

4. Hayashi M, Maeda M, Maji T, et al. Diffuse leptomeningeal hyperintensity on fluid-attenuated inversion recovery MR images in neurocutaneous melanosis. AJNR Am J Neuroradiol. 2004;25:138–41.

5. Oliveira RS, Carvalho AP, Noro F, et al. Neurocutaneous melanosis. Arq Neuropsiquiatr. 2013;71:130–1.

6. Sabat SB. Teaching NeuroImages: neurocutaneous melanosis. Neurology. 2010;74:e82.

7. Demirci A, Kawamura Y, Sze G, et al. MR of parenchymal neurocutaneous melanosis. AJNR Am J Neuroradiol. 1995;16:603–6.

8. Fu YJ, Morota N, Nakagawa A, et al. Neurocutaneous melanosis: surgical pathological features of an apparently hamartomatous lesion in the amygdala. J Neurosurg Pediatr. 2010;6:82–6.

9. Pont MS, Elster AD. Lesions of skin and brain: modern imaging of the neurocutaneous syndromes. AJR Am J Roentgenol. 1992;158:1193–203.










Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Bruno Lima Moreira
Med Imagem – Unidade São Joaquim
Rua Maestro Cardim, 769, Bloco 3, 1º subsolo, Bela Vista
São Paulo, SP, Brasil, 01323-001
E-mail: limamoreiramed@gmail.com
 
RB RB RB
GN1© Copyright 2024 - All rights reserved to Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Av. Paulista, 37 - 7° andar - Conj. 71 - CEP 01311-902 - São Paulo - SP - Brazil - Phone: (11) 3372-4544 - Fax: (11) 3372-4554