Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 49 nº 3 - Maio / Jun.  of 2016

CARTA AO EDITOR
Print 

Page(s) 203 to 204



Diagnóstico diferencial de meningocele sacral anterior durante a avaliação de coleções pélvicas pós-histerectomia

Autho(rs): Ronaldo Garcia Rondina; Richard Volpato; Luiz Felipe Alves Guerra; Diego Lima Nava Martins; Laís Bastos Pessanha

PDF Português      

PDF English

Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Mulher de 34 anos de idade, submetida a histerectomia parcial via abdominal, que evoluiu com dor e febre no pós-operatório. A radiografia convencional da pelve mostrou curvatura unilateral do sacro (Figura 1A). A tomografia computadorizada (TC), realizada no segundo dia de pós-operatório, identificou coleção loculada, densa, na cavidade pélvica, com pequenas bolhas de ar de permeio, e uma formação de aspecto cístico de conteúdo líquido hipodenso de localização pré-sacral, comunicando-se com o canal vertebral, deslocando o reto para a direita (Figura 1B). Foi feito o diagnóstico de meningocele sacral anterior (MSA) e alertada a equipe cirúrgica da sua coexistência com as coleções pélvicas póscirúrgicas. Realizou-se nova intervenção para drenagem das coleções, com o cuidado de não seccionar a saculação proveniente da MSA, que era visível e palpável. Foi realizada ressonância magnética (RM) para controle pós-drenagem cirúrgica e melhor caracterização da malformação (Figura 1C).


Figura 1. A: Radiografia convencional mostrando curvatura unilateral do sacro (sacro em cimitarra). Detalhe: reconstrução tomográfica tridimensional caracterizando melhor esses achados. B: TC com reformatação no plano sagital identificando formação de aspecto cístico de conteúdo líquido hipodenso de localização pré-sacral, aparentemente se comunicando com o canal vertebral, deslocando o reto para a direita. C: RM com corte sagital em sequência ponderada em T2 mostrando alteração morfoestrutural com disrafia do sacro, por onde se insinua saco dural em direção ao espaço retrorretal, com conteúdo liquórico homogêneo. Destaca-se ainda medula ancorada com cone medular localizado na altura de L3.



Várias condições relacionadas a anomalias do desenvolvimento do sistema nervoso central têm sido observadas e relatadas no Brasil(1-3). A MSA é uma forma rara de disrafismo espinhal, caracterizada pela herniação do saco meningeal para o espaço pré-sacral(4,5). Representa cerca de 5% das massas retrorretais, sendo mais prevalentes em mulheres(6).

Essa lesão pode ocorrer de forma isolada ou associada a outras anormalidades congênitas, como anomalias urogenitais, malformações anorretais, lipomas, teratomas, tumor epidermoide e cistos dermoides(7,8). Devido à sua natureza oculta, geralmente é diagnosticada na segunda ou terceira décadas de vida. Pode ser assintomática ou apresentar sintomas inespecíficos, como constipação, sintomas urológicos ou raramente sintomas neurológicos(9). A investigação diagnóstica pode ser feita por radiografia convencional, ultrassonografia, TC e RM.

Na radiografia convencional observa-se, às vezes, o sinal do "sacro em cimitarra", caracterizado por curvatura unilateral do sacro, simulando a forma de um sabre árabe, considerado patognomônico de MSA(10). A ultrassonografia abdominal pode mostrar lesão cística retrovesical, inespecífica ao método(11). A TC é instrumento importante, pois fornece informações detalhadas sobre as alterações ósseas associadas e pode revelar a herniação do saco meníngeo. A RM é o exame de escolha para a avaliação da MSA, pois fornece alto contraste entre os tecidos moles, podendo detectar a comunicação entre a MSA e o espaço subaracnoide espinhal, e fornecer informações detalhadas sobre outras anormalidades eventualmente relacionadas(4). Todavia, nos casos em que a comunicação com o espaço subaracnoide é estreita, a RM pode falhar em demonstrá-la. Em tais situações, pode ser necessária a realização da mielografia com injeção intratecal de contraste(12).

Nos diagnósticos diferenciais incluem-se as lesões císticas localizadas na região pré-sacral, como tumores dos tratos gastrintestinal e geniturinário, cisto dermoide e epidermoide, cisto ósseo aneurismático, hamartoma, cisto hidático, lipoma, linfangioma, cisto perineural, duplicação retal, tumores do trato reprodutivo, teratomas e teratocarcinoma(7,13). A constatação mais importante para estabelecer o diagnóstico definitivo é demonstrar a comunicação entre a lesão cística e o espaço subaracnoide(11).

No caso em questão, o diagnóstico de MSA foi especialmente importante, pois a paciente foi submetida a laparotomia para drenagem de coleções hemorrágicas pélvicas, e uma possível intervenção inadvertida na meningocele poderia ter consequências desastrosas.


REFERÊNCIAS

1. Simão MN, Helms CA, Richardson WJ. Magnetic resonance imaging findings of disc-related epidural cysts in nonsurgical and postoperative microdiscectomy patients. Radiol Bras. 2012;45:205-9.

2. Barros ML, Fernandes DA, Melo EV, et al. Central nervous system malformations and associated defects diagnosed by obstetric ultrasonography. Radiol Bras. 2013;45:309-14.

3. Holanda MMA, Rocha AB, Santos RHP, et al. Basal sphenoethmoidal encephalocele in association with midline cleft lip and palate: case report. Radiol Bras. 2011;44:399-400.

4. Villarejo F, Scavone C, Blazquez MG, et al. Anterior sacral meningocele: review of the literature. Surg Neurol. 1983;19:57-71.

5. Sharma V, Mohanty S, Singh DR. Uncommon craniospinal dysraphism. Ann Acad Med Singapore. 1996;25:602-8.

6. Beyazal M. An asymptomatic large anterior sacral meningocele in a patient with a history of gestation: a case report with radiological findings. Case Rep Radiol. 2013;2013:842620.

7. Shedid D, Roger EP, Benzel EC. Presacral meningocele: diagnosis and treatment. Semin Spine Surg. 2006;18:161-7.

8. McGregor C, Katz S, Harpham M. Management of a parturient with an anterior sacral meningocele. Int J Obstet Anesth. 2013;22:64-7.

9. Mohta A, Das S, Jindal R. Anterior sacral meningocele presenting as constipation. J Pediatr Neurosci. 2011;6:40-3.

10. Kovalcik PJ, Burke JB. Anterior sacral meningocele and the scimitar sign. Report of a case. Dis Colon Rectum. 1988;31:806-7.

11. Naidich TP, Fernbach SK, McLone DG, et al. John Caffey Award. Sonography of the caudal spine and back: congenital anomalies in children. AJR Am J Roentgenol. 1984;142:1229-42.

12. Manson F, Comalli-Dillon K, Moriaux A. Anterior sacral meningocele: management in gynecological practice. Ultrasound Obstet Gynecol. 2007;30:893-6.

13. Hemama M, Lasseini A, Rifi L, et al. A sacral hydatid cyst mimicking an anterior sacral meningocele. J Neurosurg Pediatr. 2011;8:526-9.










Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, ES, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Ronaldo Garcia Rondina
Rua Júlio César de Oliveira Serrano, 135, Bl. 3, ap. 302, Mata da Praia
Vitória, ES, Brasil, 29065-720
E-mail: r.rondina@gmail.com
 
RB RB RB
GN1© Copyright 2024 - All rights reserved to Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Av. Paulista, 37 - 7° andar - Conj. 71 - CEP 01311-902 - São Paulo - SP - Brazil - Phone: (11) 3372-4544 - Fax: (11) 3372-4554