RELATO DE CASO
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Autho(rs): Sydney Correia Leão1; Diego Marques Fernandes1; Bruno Garcia Dias1; Wlisses Ramon Oliveira1; Simone Maria de Oliveira2; Margareth Rose Uchoa Rangel3 |
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Descritores: Nefroma mesoblástico; Rim; Prematuridade. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
O nefroma mesoblástico congênito é uma rara neoplasia renal inicialmente descrita por Bolande em 1967(1,2). A despeito de sua pequena prevalência, representa a neoplasia renal mais comum em recém-nascidos(1,3). Este tipo de tumor geralmente é diagnosticado ao nascimento, ou entre três e seis meses de idade, sendo raro na infância e excepcional na idade adulta(1,4). O prognóstico geralmente é bom, especialmente quando é feita a ressecção cirúrgica total (nefrectomia ou nefroureterectomia radical)(3,4). No presente artigo é relatado um caso de nefroma mesoblástico congênito subtipo misto com má evolução, provavelmente decorrente da prematuridade e do quadro de choque séptico apresentado no pós-operatório. RELATO DO CASO Criança do gênero masculino, nascida com idade gestacional de 27 semanas, peso de 1.305 g e estatura de 36 cm. No exame físico detectou-se abdome globoso com tumor lateral à direita, além de insuficiência respiratória, sendo o paciente encaminhado à UTI neonatal. Foi realizada ultrassonografia (US) abdominal, que mostrou tumor sólido de 5,0 × 4,7 × 4,0 cm entre as regiões hepática e renal (Figura 1). Tomografia computadorizada (TC) abdominal revelou fígado com coeficiente de atenuação normal e presença de formação sólida com realce heterogêneo pós-contraste comprometendo o rim direito e medindo cerca de 4 cm no seu maior diâmetro (Figura 2). Foi realizada biópsia por punção para exame de anatomia patológica e de imuno-histoquímica. No exame histopatológico foi demonstrada neoplasia fusocelular com alto índice mitótico (10 mitoses/10 CGA). No painel imuno-histoquímico observou-se positividade para Ki-67 (10% das células), para CD99 e para actina de músculo liso. A conclusão foi nefroma mesoblástico congênito variantes clássica e celular (subtipo misto). Figura 1. Ultrassonografia de abdome total. A: Presença de tumor heterogêneo com dimensões aproximadas de 5 × 4,7 × 4 cm entre o figado e a loja renal direita (seta). B: Presença de lesão heterogênea, com áreas hipoecoicas predominantemente na região central (seta). Figura 2. Tomografia computadorizada de abdome. A: Corte transversal demonstrando a presença de formação sólida hipodensa com diâmetro aproximado de 4 cm na loja renal direita (seta). B: Corte transversal demonstrando a presença de realce heterogêneo pós-contraste na região do rim direito (seta). Em razão do tipo histológico do tumor, o recém-nascido foi submetido a nefroureterectomia total direita. No procedimento cirúrgico foi constatado tumor volumoso ocupando toda a loja renal direita, aderido ao fígado e com diafragma livre, sendo que durante o procedimento houve rompimento da cápsula do tumor. Na evolução do caso, o paciente faleceu no segundo dia de pós-operatório por choque séptico. DISCUSSÃO Os nefromas mesoblásticos congênitos (também conhecidos como tumores de Bolande) são mais comuns em indivíduos do sexo masculino, na proporção de 2:1(5). Originam-se provavelmente da proliferação do mesênquima nefrogênico e geralmente se apresentam como uma massa abdominal e geralmente se apresentam como uma massa abdominal assintomática descoberta incidentalmente em recém-nascidos (1,3). Em alguns casos pode haver ruptura do tumor, levando a um quadro de hemoperitônio(1,6). Eventualmente, o diagnóstico pode ser feito ainda no período pré-natal, com a utilização da amniocentese ou de US(5,6). Achados ultrassonográficos são, além da massa tumoral, a presença de polidramnia eventualmente associada a hidropisia de origem não imunológica, que geralmente é fatal(3). Os exames de imagem exercem um importante papel no diagnóstico pós-natal dos nefromas mesoblásticos(7). Eles são capazes de avaliar a invasão local pelo tumor antes do procedimento cirúrgico, além de possibilitarem o acompanhamento desses pacientes para a possibilidade de recidiva local(8). Usualmente, na US observa-se lesão sólida bem definida e homogênea com aspecto grosseiro(7,9). Eventualmente, em nefromas mesoblásticos típicos de pequenas dimensões pode-se observar um padrão concêntrico, com alternância de áreas hiperecoicas e hipoecoicas, sendo esta apresentação denominada como o sinal do anel(10). O uso do Doppler na US irá possibilitar a detecção de hipervascularização intratumoral(6). A TC possibilita a visualização de uma massa renal sólida com coeficiente de atenuação variável e eventuais áreas necróticas e hemorrágicas dando um aspecto heterogêneo à lesão, o que poderia indicar um prognóstico pior(11). O aparecimento de pequenas áreas císticas é raro, especialmente em nefromas mesoblásticos típicos(7,9,10). A ressonância magnética (RM) é útil para identificar a invasão de estruturas locais pelo tumor. Na RM, os nefromas mesoblásticos apresentam isossinal em relação ao córtex renal e à musculatura esquelética em T1 e hipersinal em relação a essas estruturas em T2(12). A urografia excretora também tem a sua utilidade no diagnóstico dos nefromas mesoblásticos congênitos, podendo-se com ela detectar a distorção do sistema pielocalicial, decorrente da presença da massa renal(10). O diagnóstico diferencial dos nefromas mesoblásticos congênitos deverá ser feito com outras neoplasias renais, como os adenomas metanéfricos, os carcinomas de células claras renais e o tumor de Wilms(8). Os tumores de Wilms e os nefromas mesoblásticos congênitos são indistinguíveis radiologicamente, por isso o diagnóstico diferencial entre estas duas condições somente é possível com a histopatologia(8). Geralmente, os nefromas mesoblásticos são tumores unilaterais, mas eventualmente podem ser encontrados bilateralmente(1). Macroscopicamente, o tumor geralmente possui coloração esbranquiçada e consistência firme, apresentando pesos e volumes variando de 0,01 kg a 2 kg e 150 a 200 cm3, respectivamente(3,4). Na microscopia, este tipo de tumor pode ter duas apresentações: a clássica e a variante celular. Na imuno-histoquímica, o nefroma mesoblástico congênito é positivo para vimentina e para actina de músculo liso, sendo negativo para desmina, CD34, antígeno de membrana epitelial e citoqueratinas(1). Usualmente, o tratamento deste tipo de tumor é cirúrgico, realizando-se nefrectomia ou nefroureterectomia total, que, além de reduzir a possibilidade de recorrência, servirá também como tratamento da hipertensão secundária ao hiperreninismo(3,6). Com a ressecção, geralmente o prognóstico será bom, especialmente se o tumor for do subtipo histológico clássico(5). Fatores de mau prognóstico são relacionados à idade, à presença de margens cirúrgicas positivas e ao tipo histológico misto(5). No presente caso observou-se indivíduo recém-nascido do sexo masculino, prematuro, portador de tumor sólido renal à direita de grandes dimensões. Exames de imagem demonstraram tumor com realce heterogêneo após uso do contraste. O exame histopatológico, associado ao painel imuno-histoquímico, foi sugestivo de nefroma mesoblástico congênito subtipo misto, sendo o paciente submetido a nefroureterectomia total. Basicamente, excetuando-se a prematuridade, todas as outras características deste caso estão de acordo com a literatura. Conclui-se que o nefroma mesoblástico é uma rara neoplasia renal, sendo importante o conhecimento de seus aspectos clínicos, radiológicos e histopatológicos, para facilitar o diagnóstico diferencial com outras neoplasias renais mais comuns da infância. REFERÊNCIAS 1. Bisceglia M, Carosi I, Vairo M, et al. Congenital mesoblastic nephroma: report of a case with review of the most significant literature. Pathol Res Pract. 2000;196:199-204. 2. Henno S, Loeuillet L, Henry C, et al. Cellular mesoblastic nephroma: morphologic, cytogenetic and molecular links with congenital fibrosarcoma. Pathol Res Pract. 2003;199:35-40. 3. Santos LG, Carvalho JSR, Reis MA, et al. Nefroma mesoblástico congênito subtipo celular: relato de caso. J Bras Nefrol. 2011;33:109-12. 4. Dal Cin P, Lipcsei G, Hermand G, et al. Congenital mesoblastic nephroma and trisomy 11. Cancer Genet Cytogenet. 1998;103:68-70. 5. Furtwaengler R, Reinhard H, Leuschner I, et al. Mesoblastic nephroma - a report from the Gesellschaft fur Pädiatrische Onkologie und Hämatologie (GPOH). Cancer. 2006;106:2275-83. 6. Kotani T, Sumigama S, Hayakawa H, et al. Elevated levels of aldosterone in the amniotic fluid in two cases of congenital mesoblastic nephroma. Ultrasound Obstet Gynecol. 2010;36:256-8. 7. Khashu M, Osiovich H, Sargent MA. Congenital mesoblastic nephroma presenting with neonatal hypertension. J Perinatol. 2005;25:433-5. 8. Ozturk A, Haliloglu M, Akpinar E, et al. Cellular congenital mesoblastic nephroma with contralateral medullary nephrocalcinosis. Br J Radiol. 2004;77:436-7. 9. Zeilinger G, Deeg KH, Beck JD. Ultrasound study of congenital mesoblastic nephroma. Klin Padiatr. 1988;200:321-3. 10. Chan HS, Cheng MY, Mancer K, et al. Congenital mesoblastic nephroma: a clinicoradiologic study of 17 cases representing the pathologic spectrum of the disease. J Pediatr. 1987;111:64-70. 11. Rieumont MJ, Whitman GJ. Mesoblastic nephroma. AJR Am J Roentgenol. 1994;162:76. 12. Gupta AK, Chowdhury V, Khandelwal N. Diagnostic radiology: paediatric imaging. New Delhi, India: Jaypee Brothers Medical Publishers; 2011. 1. Médicos do Departamento de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil 2. Doutora, Professora Adjunta do Departamento de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil 3. Doutora, Professora Adjunta do Departamento de Medicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil. (In memoriam) Endereço para correspondência: Dr. Sydney Correia Leão Departamento de Medicina da Universidade Federal de Sergipe Rua Claudio Batista, s/nº Aracaju, SE, Brasil, 49060-100 E-mail: sydneyleao@hotmail.com Recebido para publicação em 11/5/2013. Aceito, após revisão, em 14/3/2014. Trabalho realizado na Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil. |