Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 48 nº 5 - Set. / Out.  of 2015

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 305 to 313



Otimização de parâmetros OSEM na reconstrução de cintilografias de perfusão do miocárdio em função do índice de massa corporal: uma escolha clínica

Autho(rs): Pietro Paolo de Barros1; Luis F. Metello2; Tatiane Sabriela Cagol Camozzato3; Domingos Manuel da Silva Vieira4

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Texto em Português English Text

Descritores: Cardiologia nuclear; Cintilografia de perfusão do miocárdio; Métodos iterativos; Reconstrução de imagens; Medicina nuclear.

Keywords: Nuclear cardiology; Myocardial perfusion imaging; Iterative methods; Image reconstruction; Nuclear medicine.

Resumo:
OBJETIVO: O presente trabalho visa contribuir para identificar quais os parâmetros OSEM que geram as reconstruções na cintilografia de perfusão do miocárdio com o maior valor clínico de diagnóstico, relacionando-os com as classificações de índice de massa corporal.
MATERIAIS E MÉTODOS: Foram selecionados 28 pacientes adultos que realizaram cintilografia de perfusão do miocárdio em um hospital público. Cada paciente teve seu exame processado com o método OSEM em seis combinações diferentes de número de iterações e subsets. As imagens foram analisadas por especialistas em cardiologia nuclear, que consideraram o valor clínico de diagnóstico delas e indicaram quais as imagens que mais se adequavam à qualidade diagnóstica.
RESULTADOS: Em análise global da pontuação conforme as avaliações médicas, o arranjo de quatro iterações e quatro subsets gerou as imagens com melhor qualidade diagnóstica em todas as classes de índice de massa corporal, porém o arranjo com seis iterações e quatro subsets se destacou nas classes de maiores índices de massa corporal.
CONCLUSÃO: A utilização de parâmetros otimizados parece ter papel importante em proporcionar reconstruções de melhor qualidade diagnóstica, garantindo-se assim que o paciente tenha o seu diagnóstico e consequente terapêutica encaminhados de forma mais adequada e eficaz.

Abstract:
OBJECTIVE: The present study is aimed at contributing to identify the most appropriate OSEM parameters to generate myocardial perfusion imaging reconstructions with the best diagnostic quality, correlating them with patients' body mass index.
MATERIALS AND METHODS: The present study included 28 adult patients submitted to myocardial perfusion imaging in a public hospital. The OSEM method was utilized in the images reconstruction with six different combinations of iterations and subsets numbers. The images were analyzed by nuclear cardiology specialists taking their diagnostic value into consideration and indicating the most appropriate images in terms of diagnostic quality.
RESULTS: An overall scoring analysis demonstrated that the combination of four iterations and four subsets has generated the most appropriate images in terms of diagnostic quality for all the classes of body mass index; however, the role played by the combination of six iterations and four subsets is highlighted in relation to the higher body mass index classes.
CONCLUSION: The use of optimized parameters seems to play a relevant role in the generation of images with better diagnostic quality, ensuring the diagnosis and consequential appropriate and effective treatment for the patient.

INTRODUÇÃO

Segundo estatísticas da Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de mortes causadas por problemas cardiovasculares em países desenvolvidos é muito maior que as causadas por doenças como as neoplasias malignas e doenças respiratórias. Aproximadamente 12 milhões de pessoas em todo o mundo morrem de ataques cardíacos ou infartos todos os anos, diretamente ou por complicações relacionadas. Atualmente, estima-se que o número de mortes por doenças cardiovasculares tenha aumentado para 17,5 milhões por ano. Tais mortes ocorrem em todas as classes sociais, sendo comumente associadas a homens a partir dos 40 anos. A verdade é que ambos os sexos podem sofrer ataques cardíacos, sendo que as mulheres correm mais riscos após a menopausa. As doenças cardiovasculares foram responsáveis por 30% das 58 milhões de mortes ocorridas em 2008. Países de baixa e média renda são os mais afetados, com cerca de 80% dessas mortes(1-5).

Em medicina nuclear, os estudos do sistema cardiovascular são empregados na detecção e caracterização de doenças, como a doença arterial coronária, por exemplo. Segundo Strauss et al.(6), embora os procedimentos nucleares possam ser utilizados para caracterizar doenças congênitas, tais estudos são, geralmente, realizados em combinação com a ecocardiografia e a ressonância magnética.

A cintilografia de perfusão do miocárdio (CPM) é o principal procedimento em cardiologia nuclear, sendo o responsável por mais de 75% dos estudos cardíacos em muitos centros. Apresenta a vantagem de ser um procedimento robusto e, de certa forma, reprodutível.

Tendo em vista que o material radioativo é injetado no paciente e emitido por ele, deve-se considerar que nem todos os fótons conseguem sair do corpo humano ou ainda seguir em sua trajetória inicial por causa das interações que ocorrem com os próprios tecidos do paciente. Este fator é agravado nos pacientes que apresentam índice de massa corporal (IMC) mais elevado, pois há neles muito mais tecidos e estruturas atenuantes à radiação, que podem gerar artefatos que interferem na qualidade das imagens resultantes(7,8).

As imagens de perfusão do miocárdio fornecem informações funcionais relevantes à adequada caracterização de doenças e seu tratamento, e sua aparência final resulta da interação de vários processos. Embora existam vários métodos disponíveis para correção de movimentos, atenuação e espalhamento, os programas relacionados facilmente demonstram suas limitações. Por isso, o processamento depende muito da consistência dos dados brutos obtidos durante a aquisição das imagens. O propósito da reconstrução das imagens tomográficas é, a partir dos dados adquiridos pelos detectores da gama-câmara, chegar a uma imagem que retrate um verdadeiro corte seccional de um objeto(7,9,10).

A teoria da reconstrução matemática de imagens teve início em 1917, quando o matemático austríaco Johann Radon publicou seu estudo que mostrava como, a partir de um conjunto de projeções, se poderia determinar a função original. Desde então, muitos algoritmos de reconstrução das imagens tomográficas (single photon emission computed tomography - SPECT) têm sido desenvolvidos e propostos para o processamento das imagens em medicina nuclear(11). Entre eles, os mais comuns são os algoritmos analíticos de reconstrução das imagens e os métodos iterativos(8,12).

Os métodos analíticos em medicina nuclear constituem a técnica mais simples para reconstrução tomográfica. Entre esses métodos destaca-se a retroprojeção filtrada, que consiste, basicamente, na filtragem das projeções no espaço de frequências empregando um filtro rampa e, após realizar a transformação inversa, retroprojetar os dados para gerar a imagem final(13).

Os métodos iterativos, segundo Lalush et al.(14), foram propostos formalmente em 1977 como uma solução para problemas estatísticos envolvendo dados incompletos. O princípio básico de funcionamento dos algoritmos iterativos é minimizar, por meio de estimativas sucessivas, a diferença entre as projeções medidas e estimadas pelo algoritmo. Os algoritmos iterativos existentes se diferem, principalmente, na forma com que as projeções medidas e estimadas são comparadas, além do tipo de correções aplicadas à estimativa corrente. Tal processo pode ser iniciado por meio da criação de uma estimativa inicial com valor 0 ou 1, dependendo se a correção é realizada por meio de adição ou multiplicação, respectivamente(8,15).

A partir dos métodos iterativos mais simples surgiram outros métodos otimizados para encontrar, considerando um dado critério, a melhor estimativa para a solução do problema. O critério maximum-likelihood (ML) é um padrão utilizado em estatística que foi proposto por R. A. Fisher em 1921 e dá uma prescrição para decidir qual imagem, entre todas as imagens possíveis, é a melhor estimativa do verdadeiro objeto. Dentre os métodos desenvolvidos destaca-se o maximum-likelihood expectation maximization (MLEM).

O algoritmo MLEM visa encontrar uma solução geral como a melhor estimativa para o número médio de desintegrações radioativas na imagem que possa produzir um sinograma com a maior verossimilhança.

Essa solução é encontrada pelo uso de modelos estatísticos que permitem predizer a probabilidade de um número de contagens detectadas para um dado número médio de desintegrações. Com isso, cada iteração é dividida em duas partes, denominadas expectation (E) e maximization (M). Na parte E da iteração é formada a fórmula que expressa a verossimilhança de qualquer imagem reconstruída a partir dos dados medidos. Já na parte M obtém-se a imagem que possui a maior semelhança com os dados medidos.

Tendo em vista que o processo de convergência do algoritmo MLEM é bastante lento, sua utilização em contexto clínico não seria muito adequada. Assim, em 1994, Hudson e Larkin propuseram o algoritmo ordered-subset expectation maximization (OSEM), uma variação do método MLEM, cujo objetivo é acelerar o processo de reconstrução das imagens utilizando tal algoritmo.

O princípio básico do OSEM consiste em dividir o conjunto total de projeções em subconjuntos menores, chamados de subsets. Cada subset tem o mesmo número de projeções. Além disso, o número de subsets que podem ser criados é múltiplo do número total de projeções. Por exemplo, se durante um exame são adquiridas 64 projeções de um paciente (que representam 64 ângulos diferentes), elas podem ser divididas em subsets, cada um contendo 8 imagens. As 64 projeções podem, ainda, ser divididas em 16 subsets, sendo que cada um conteria 4 imagens neste caso. Após a distribuição das projeções em subsets, o algoritmo MLEM é aplicado a cada subconjunto de projeções, sendo uma fração da iteração. Quando todos os subsets forem processados, tem-se uma iteração completa. O uso do método OSEM permite acelerar significativamente a reconstrução das imagens. No caso de se utilizar 16 subsets, por exemplo, o processo de convergência da imagem seria acelerado por um fator de 16 se comparado com o MLEM, reduzindo consideravelmente o tempo computacional necessário para a reconstrução(8,16).

Devido ao grande esforço computacional exigido pelos métodos iterativos durante a reconstrução das imagens, visto que requerem a repetição de operações matemáticas de projeção e retroprojeção, correção e atualização das imagens, eles não eram considerados como uma solução útil para ao uso clínico no passado, já que costumavam levar vários minutos para a formação de uma simples imagem. Entretanto, considerando que a área da informática evoluiu muito nos últimos anos, os métodos iterativos de reconstrução tornaram-se clinicamente úteis, mostrando-se uma poderosa alternativa aos métodos convencionais de retroprojeção filtrada. Além disso, tais métodos vêm sendo aperfeiçoados com o desenvolvimento de modelos eficientes e algoritmos de reconstrução cada vez mais rápida.

Ainda, as imagens produzidas pelos métodos iterativos também se diferem das apresentadas pelos métodos analíticos, especialmente no que se refere à quantidade de ruído, razão alvo-fundo, resolução e ao detalhamento da imagem. Além do imenso ganho no tempo de convergência, os algoritmos iterativos apresentam a vantagem de permitirem a fácil incorporação de modelos dos processos físicos que influenciam na quantificação total, como a atenuação fotônica no tecido e o seu espalhamento, como, por exemplo, a compensação do borramento em função da distância do paciente e o detector e a redução das linhas geradas pelo efeito estrela nas áreas com alta contagem fotônica(7,12,14,16-18).

O valor dos métodos iterativos depende de cada situação e das necessidades de cada departamento, sendo melhor para algumas tarefas do que para outras. Outrossim, não existe um consenso acerca de quais parâmetros devem ser utilizados, como o número mais adequado de iterações ou de subsets. Embora apresente várias vantagens sobre os métodos analíticos, o método OSEM era, geralmente, a principal escolha de especialistas e não de "usuários comuns" que trabalham na rotina clínica. Atualmente, muitos equipamentos possuem este tipo de método como padrão(7).

Alguns autores defendem que a escolha dos parâmetros durante a reconstrução das imagens utilizando os métodos iterativos não depende das características físicas dos pacientes. Mas, após injetados no paciente, os fótons de radiação gama provindos do radiofármaco encontram uma barreira natural (o próprio paciente), a qual absorve muitos deles. Tal atenuação depende, e muito, das dimensões corporais dos indivíduos. Tanto é que, para pacientes com peso maior, tende-se a aumentar o valor da atividade injetada no paciente, como afirma Arrighi(19). Logo, quanto maior for a massa corporal de um paciente, maior será a atenuação dos fótons pelos tecidos e maior a dificuldade na captação de tais fótons pelos detectores. Isso provoca, ainda, alterações na forma com que as imagens devem ser processadas posteriormente.

Sendo assim, tendo em vista que a atenuação da radiação pelos tecidos varia de acordo com as características físicas do paciente, e considerando, ainda, a classificação da OMS quanto ao IMC, o presente trabalho tem o objetivo de verificar qual a influência do IMC dos pacientes na escolha dos parâmetros do algoritmo iterativo OSEM a serem utilizados na reconstrução das imagens de CPM. Para tanto, as imagens de CPM realizadas por um hospital público foram analisadas e processadas utilizando-se o método iterativo OSEM com diferentes combinações de número de iterações e de subsets, visando a determinação de uma combinação de parâmetros do método iterativo para as diferentes classes de IMC encontradas, conforme a avaliação de especialistas em cardiologia nuclear quanto à mais adequada qualidade clínica de diagnóstico.


MATERIAIS E MÉTODOS

A pesquisa foi realizada respeitando todos os princípios éticos que regem o uso de informações confidenciais dos pacientes. Por isso, durante todo o trabalho, nenhuma informação relacionada aos pacientes foi divulgada. O trabalho foi submetido à apreciação do Comitê de Ética da instituição pesquisada, que o aprovou, conforme documento de referência número 151/11 (104-DEFI/132-CES).

Os dados coletados foram os registrados pela equipe médica, a saber, o nome, a data de nascimento, o peso e a altura, sendo estes dois últimos utilizados para a determinação do IMC de cada paciente.

A coleta dos dados deu-se em três etapas. Na primeira etapa foram analisados e selecionados 43 pacientes que realizaram CPM entre os dias 31/1/2011 e 2/3/2011. A segunda coleta compreendeu 40 pacientes que realizaram CPM no hospital pesquisado no período entre 15/1/2011 e 31/1/2011, bem como no dia 27/4/2011. Já na terceira coleta foram selecionados 3 pacientes que realizaram exames nos dias 4/6/2011 e 5/6/2011. No total, a amostra inicial era composta por 86 pacientes, sendo 23 deles pertencentes à classe de IMC normal (B), 32 da classe de sobrepeso (C), 20 com obesidade nível I (DI) e 11 com obesidade nível II (DII).

O público alvo desta pesquisa engloba pacientes adultos, de ambos os sexos, que realizaram CPM-SPECT com ambas as fases - esforço e repouso -, utilizando o "protocolo de um dia", em um hospital geral público, estando distribuídos entre as classes B, C, DI e DII de IMC (Tabela 1).




As classes A (abaixo do peso) e DIII (obesidade nível III) não foram consideradas por falta de pacientes destas. Para o estudo também não foram consideradas as indicações clínicas para a realização dos exames, tampouco as alterações cintilográficas detectadas nos estudos.

Durante a análise e seleção dos pacientes, foram considerados os seguintes critérios de exclusão: pacientes pediátricos, pacientes cujos exames coletados não apresentavam as aquisições de repouso ou esforço, pacientes cujas imagens apresentavam artefatos de movimento, sobreposições de estruturas anatômicas em relação ao coração, baixa relação alvo-fundo, pacientes cujos exames apresentaram falhas durante a importação para a workstation de pesquisa, e, ainda, pacientes cujos protocolos de aquisição se diferenciaram do tido como "padrão" no hospital pesquisado.

O equipamento do qual os dados foram adquiridos é da marca Siemens, modelo E-Cam DSR dual head, com dois detectores e colimadores LEHR (baixa energia e alta resolução), de orifícios paralelos. O radiofármaco utilizado para a realização dos exames foi o 99mTc-sestamibi com atividades de 10 mCi na etapa de repouso e 30 mCi na etapa de esforço. A injeção do radiofármaco se deu por meio de punção na veia antecubital dos pacientes. Para o exame, todos os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal, com os braços estendidos sobre a cabeça, sendo que a captação das imagens foi sincronizada com o eletrocardiograma por meio do método forward backward by thirds, no modo auto-tracking, com 8 frames e uma janela de aceitação de 10 ciclos. O modo de aquisição SPECT utilizado foi o step-and-shoot, de órbita não circular, com um total de 64 projeções (32 para cada detector). O tempo de cada projeção foi, aproximadamente, 25 segundos, o que levou a uma duração de 30 minutos. O tamanho do pixel foi 6,59 mm e o zoom, 1,45.

Os dados coletados na instituição pesquisada foram salvos em CDs e importados para a workstation Hermes Medical SolutionsTM Compact Server para análise das imagens e realização dos processamentos. Para a visualização das imagens foram utilizados monitores Dell 1907FP.

Tendo em vista a necessidade de se manter os pacientes anônimos, para cada um deles foi criado um código único que os identificou sem expor seus respectivos dados. Cada código leva em conta a data da coleta (etapa na qual os dados foram recolhidos, podendo ser A, B ou C), a sua classe de IMC (B, C, DI ou DII), e a sequência em que o exame foi coletado (por ordem numérica).

Considerando que os métodos iterativos permitem várias combinações diferentes entre o número de iterações e o número de subsets, estipularam-se, inicialmente, 16 arranjos, formados pela combinação de 2, 4, 6 e 8 iterações com 2, 4, 8 e 16 subsets. A partir disso, selecionaram-se aleatoriamente três pacientes para que fossem processados com cada uma das opções possíveis, sendo um paciente da classe B, um representante da classe C, e outro pertencente à classe DII.

As imagens resultantes desses processamentos foram analisadas internamente por uma equipe restrita formada por três médicos especialistas em medicina nuclear, que escolheram os seis arranjos que apresentaram melhor qualidade de imagem. A escolha deu-se com base em uma análise global da qualidade das imagens, considerando essencialmente características técnicas, relação alvo-fundo, bem como alterações nas imagens (deformações), que geram perda da informação. Assim, pôde-se definir os conjuntos de parâmetros de reconstrução mais promissores.

Definidos os parâmetros OSEM a serem utilizados, conforme mostrados na Figura 1, e aplicados os critérios de exclusão, selecionaram-se 28 indivíduos da amostra inicial, sendo 7 de cada uma das classes de IMC encontradas. A idade mínima foi 37 anos e a máxima, 80 anos, sendo a média de 59 anos. A Tabela 2 apresenta informações quanto ao gênero, idade e IMC dos pacientes.


Figura 1. Arranjos de número de iterações e subsets definidos para a pesquisa.




Para cada um dos pacientes foram realizados seis processamentos diferentes, um para cada combinação escolhida de iteração/subset, tendo sido realizadas, no total, 168 reconstruções. Na reconstrução das imagens, os dados foram processados de forma tomográfica nos planos ortogonais transversal, sagital e coronal, utilizando a ferramenta Quick Cardiac 1.3.1TM disponível na workstation, e visualizados em modo de impressão (opção QPS_3, modo splash) com um zoom de quatro vezes e sem os contornos cardíacos gerados automaticamente pelo programa. Não foram utilizadas opções de correção da atenuação.

As imagens geradas pelo processamento foram salvas em formato portable network graphics (PNG), que tem a vantagem de não apresentar perdas de alto nível quando as imagens são manipuladas. Cada arquivo foi nomeado com o código do seu respectivo paciente e a combinação de iteração/subset utilizada na reconstrução. Foi criada, também, uma nova planilha para organização das imagens, tendo em vista que a workstation permite salvar cada imagem em uma pasta separada em seu disco rígido(20).

Com o objetivo de retirar toda e qualquer informação que pudesse identificar o paciente, as imagens resultantes do processamento foram manipuladas utilizando-se o programa Microsoft PaintTM. As características da imagem (como resolução, brilho e contraste) não foram alteradas.

Para cada paciente, os conjuntos de imagens resultantes dos seis processamentos foram inseridos em um único arquivo PNG e impressos com qualidade fotográfica em papel tamanho A3, modo paisagem, conforme apresentado na Figura 2.


Figura 2. Disposição das imagens reconstruídas na folha A3.



Cada conjunto foi identificado numericamente de 1 a 6 de acordo com sua posição na folha. As imagens foram dispostas de forma aleatória, evitando-se, dessa maneira, que os médicos, ao analisarem as imagens, fossem tendenciados a sempre escolher a mesma combinação de iteração/subset.

Para a avaliação médica das imagens, foi desenvolvido um instrumento no qual os médicos participantes indicaram o número correspondente aos três conjuntos de imagens que julgaram serem os que possuíam a melhor qualidade em termos de diagnóstico. As imagens foram analisadas por dez especialistas em medicina nuclear, sendo cinco avaliadores portugueses de diferentes departamentos de medicina nuclear distribuídos entre as cidades de Coimbra e Porto, e cinco brasileiros, nas cidades de Florianópolis e Porto Alegre.

A partir das escolhas dos especialistas, foi aplicada uma pontuação às combinações escolhidas como melhores. Para a primeira opção de cada avaliador foram aplicados cinco pontos, para a segunda, três pontos, e para a terceira opção, um ponto. A pontuação máxima que um arranjo pode obter é 315 pontos.


RESULTADOS

A Figura 3 apresenta uma comparação entre as imagens dos três planos usuais resultantes do processamento utilizando os seis arranjos de número de iterações e de subsets definidos. O número de vezes que cada parâmetro utilizado foi escolhido como sendo o que produziu as melhores imagens, distribuído entre as classes de IMC, é apresentado na Figura 4.


Figura 3. Eixos curto axial, longo vertical e longo horizontal resultantes do processamento.


Figura 4. Gráfico geral dos parâmetros escolhidos como a primeira opção, segundo os especialistas.



Em uma visão geral, o arranjo de quatro iterações com quatro subsets foi o mais escolhido como sendo o melhor. Considerando que cada arranjo poderia ser escolhido, no máximo, 280 vezes, essa combinação representa 44,64% das opções, mais que o dobro de vezes em relação à combinação de seis iterações com quatro subsets, segunda mais escolhida. As demais combinações não apresentam um grande destaque, sendo que a menos escolhida foi a de duas iterações com 16 subsets (5,71%).

Considerando as classes de IMC analisadas, o destaque do arranjo de quatro iterações com quatro subsets em relação às demais é mais expressivo na classe B, onde representa 52,86% das escolhas. Nas classes C, DI e DII, a combinação de quatro iterações com quatro subsets representa, em média, 42% das opções dos avaliadores. O destaque em relação às demais mantém-se em todas as classes avaliadas, conforme mostra a Tabela 3.




Ao ser aplicada a pontuação sobre as escolhas dos avaliadores, o arranjo de quatro iterações com quatro subsets mantém-se em maior destaque, sendo a combinação que gerou as melhores imagens. A Figura 5 apresenta o resultado do processamento com essa combinação de parâmetros. Além disso, ao ser aplicada a pontuação, percebe-se que a combinação de seis iterações com quatro subsets também se torna expressiva. Contudo, para a classe DII, o arranjo de oito iterações e quatro subsets teve uma pontuação elevada, quando comparado com as demais combinações.


Figura 5. Imagens resultantes do processamento utilizando-se quatro iterações e quatro subsets.



DISCUSSÃO

Por meio da análise da pontuação dos arranjos estudados é possível observar que, para classes de IMC maiores, o processamento das imagens utilizando o método OSEM e um número de iterações maior se destaca em relação aos demais. Além disso, pode-se verificar que, apesar das variações no número de iterações das combinações de parâmetros escolhidas (quatro e seis), o número de subsets das combinações em destaque se mantém constante em quatro.

O aumento do IMC implica no aumento do tecido corporal, o que, obviamente, leva a uma maior atenuação da radiação emitida pelo paciente. Conforme os resultados obtidos, entende-se que, para os pacientes das classes de IMC menores, tendo em conta que atenuam menos a radiação, o arranjo de quatro iterações com quatro subsets parece ser o suficiente para o processamento das imagens e para gerar resultados de qualidade. À medida que o IMC aumenta, mais o resultado final sofre alterações relacionadas com a atenuação tecidual, podendo levar a um aumento do número de iterações necessárias para a convergência da imagem.

Slomka et al.(21) afirmam que, com o aumento do número de atualizações da imagem (produto entre o número de iterações e o de subsets) ocorre o aumento da resolução espacial, mas com o surgimento de ruído. Assim, é importante que haja a otimização dos parâmetros para que se obtenha a melhor qualidade de imagem. Para eles, normalmente são utilizadas de duas a quatro projeções para cada subset (o que gera 16 a 32 subsets, respectivamente, considerando uma aquisição de 64 projeções).

Para Seret(22), é interessante que os usuários inexperientes utilizem sempre oito subsets e, no mínimo, duas iterações para a reconstrução das imagens em CPM. Porém, alerta que um número tão baixo de iterações resulta em imagens suavizadas, com baixo nível de ruído, mas com um contraste pobre, especialmente nas regiões pouco perfundidas. Além disso, afirma que os subsets devem ter, no mínimo, quatro projeções. Um número menor de projeções faria com que o algoritmo OSEM tendesse a divergir, não conseguindo chegar à solução ótima. Logo, 64 projeções podem ser divididas em, no máximo, 16 subsets.

Assim, de acordo com os resultados encontrados durante este estudo, o aumento do número de iterações realizadas no processamento das imagens garante que estas sejam reconstruídas de forma satisfatória.

O tempo que cada combinação estudada levava para o processamento das imagens não foi considerado relevante, tampouco mensurado, pois eram sempre pequenos. Todavia, não foram percebidas diferenças significativas que implicassem em desvantagens no seu uso em contexto clínico.

Também é interessante considerar que não foram utilizados métodos de correção da atenuação e espalhamento, cujo uso poderia influenciar significativamente na qualidade das imagens após sua reconstrução. A adoção de tais métodos de correção pode alterar os resultados encontrados e sugerir que outros arranjos resultem em imagens de melhor qualidade.

Sabe-se, também, que cada instituição utiliza protocolos adaptados à sua realidade, podendo haver variações nas rotinas de cada serviço. Tais diferenças, como a escala de cores utilizada no processamento, por exemplo, induzem a variações na escolha dos melhores parâmetros.

Embora a técnica SPECT seja baseada em uma forma simples de aquisição das imagens, todo o processo de reconstrução das imagens é bastante complexo. Em CPM, bem como outros tipos de estudos, existem vários fatores que influenciam no resultado final.

Assim, tais fatores tornam o serviço de medicina nuclear mais ágil e, além disso, reduzem os erros associados às variabilidades interoperadores, já que os procedimentos realizados por todos para o processamento (bem como a realização do exame) são semelhantes. A utilização de uma rotina adequada e controlada permite a redução da dosimetria do paciente, bem como dos profissionais atuantes no serviço, pois a repetição dos exames é reduzida com a aplicação de práticas otimizadas.

Com isso, o serviço atinge uma qualidade diagnóstica adequada, já que a interpretação das imagens não depende, apenas, dos conhecimentos clínicos do especialista que avalia, mas, sobretudo, de todo o processo de realização do exame, desde a preparação do paciente, a realização do exame em si e as manipulações dos dados para a reconstrução das imagens.


CONCLUSÃO

Em análise global da pontuação gerada a partir das avaliações médicas, este trabalho pode concluir que a utilização do método iterativo OSEM configurado para realizar quatro iterações em quatro subsets parece gerar as imagens com melhor qualidade diagnóstica para as classes de IMC normal, sobrepeso e obesidade níveis I e II, sendo seguido pelo arranjo de seis iterações e quatro subsets, que se destaca nas classes mais altas de obesidade.

A utilização de parâmetros otimizados parece ter um papel importante em proporcionar reconstruções de melhor qualidade diagnóstica, garantindo-se assim que o paciente tenha o seu diagnóstico e consequente terapêutica encaminhados de forma mais adequada e eficaz.

Agradecimentos

Os autores agradecem aos médicos nucleares brasileiros e portugueses que participaram voluntariamente da pesquisa, ao programa Propicie, do Instituto Federal de Santa Catarina, por propiciar o contato com a Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto (Instituto Politécnico do Porto), e às demais instituições envolvidas (Clínica Bionuclear, Florianópolis, SC, Brasil; Instituto de Cardiologia, Porto Alegre, RS, Brasil; Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto, Portugal; Hospital Geral de Santo António, Porto, Portugal; Hospitais da Universidade de Coimbra, Portugal; Diaton Centro de Tomografia Computadorizada, Coimbra, Portugal).


REFERÊNCIAS

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1. Tecnólogo em Radiologia na Clínica Imagem Centro de Diagnóstico, Graduado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), Florianópolis, SC, Brasil
2. Mestre, Tecnólogo Certificado em Medicina Nuclear, Docente na Escola Superior de Tecnologia em Saúde do Porto - Instituto Politécnico do Porto (ESTSP-IPP), Porto, Portugal
3. Doutora, Docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), Florianópolis, SC, Brasil
4. Mestrando em Informática Médica na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), Docente na Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto - Instituto Politécnico do Porto (ESTSP-IPP), Porto, Portugal

Endereço para correspondência:
Dra. Tatiane Sabriela Cagol Camozzato
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina, Campus Florianópolis - DASS
Avenida Mauro Ramos, 950, Centro
Florianópolis, SC, Brasil, 88020-300
E-mail: tatiane@ifsc.edu.br

Recebido para publicação em 4/9/2014.
Aceito, após revisão, em 10/1/2015.

Trabalho realizado no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), Campus Florianópolis - DASS, Florianópolis, SC, Brasil.
 
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