Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 48 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2015

CARTA AO EDITOR
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Page(s) 269 to 270



Tumor glômico: revitalizando conceitos

Autho(rs): Maurício Fabro; Sara Raquel Madalosso Fabro; Bárbara Blaese Klitzke; Gustavo Lopes de Araújo; César Augusto Machado

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Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Paciente do sexo feminino, branca, 22 anos de idade, sem comorbidades, com queixa de crises álgicas subungueais incapacitantes no hálux esquerdo, que chegavam a acordá-la à noite, iniciada há quatro anos e com piora progressiva. O sintoma era desencadeado pelo frio e pressão local, sendo que até mesmo o vento causava crises, melhorando com imersão do pé em água morna. Procurou atendimento médico diversas vezes, recebendo múltiplos tratamentos diferentes, incluindo para micose, tendinite e neurite. Dos fármacos que fez uso, inclui-se o uso de analgésicos, anti-inflamatórios não esteroidais e corticosteroides, todos sem resposta.

Radiografia simples e ultrassonografia do primeiro dedo do pé esquerdo não caracterizaram achados patológicos. Foi realizada ressonância magnética do hálux esquerdo, que demonstrou nódulo sólido subungueal, bem delimitado, com hipossinal em T1, hipersinal em T2 e captação homogênea do contraste (Figura 1). Tais achados sugeriram o diagnóstico de tumor glômico, confirmado por estudo histopatológico da peça cirúrgica após a exérese da lesão (Figura 2). Posteriormente à intervenção cirúrgica, a paciente apresentou resolução completa dos sintomas.


Figura 1. Cortes coronais de ressonância magnética nas sequências em T2 (A) e T1 pós-contraste (B) mostrando área de hipersinal (seta), seguida de captação homogênea do fármaco (cabeça de seta).


Figura 2. Corte histológico corado com hematoxilina-eosina mostrando aspecto típico de tumor glômico.



Corpos glômicos são estruturas neuromioarteriais existentes em diversas partes do corpo, em maior concentração na camada reticular da derme, notadamente nos dedos, nas palmas das mãos e plantas dos pés(1). Atuam como responsáveis da termorregulação mediante o controle do fluxo sanguíneo da pele. São constituídos por uma arteríola aferente, um vaso anastomótico chamado de canal de Soucquet-Hoyer, envolto por fibras musculares lisas, uma veia eferente, fibras nervosas e cápsula periférica(1,2).

Os tumores glômicos são lesões benignas raras, caracterizadas por proliferação hamartomatosa com origem nos corpos glômicos. Correspondem a 2% dos tumores primários de partes moles e 1% a 5% de todos os tumores de partes moles da mão(1,3). Aproximadamente 75% dos tumores glômicos ocorrem na mão, sendo que 60% destes são subungueais, esta última sua localização típica(1,4). Sua primeira descrição foi realizada por William Wood, em 1812, descrevendo-o como um tumor subcutâneo doloroso, de crescimento lento e suscetível a variações de temperatura, sendo que somente em 1901 Grosser descreveu a lesão como anastomoses arteriovenosas e as relacionou com regulação da temperatura corporal(2).

Acometem adultos jovens, especialmente entre a quarta e quinta décadas de vida, sendo sete vezes mais frequentes na mulher(5), com média de idade de 39 anos(6). Clinicamente, o sintoma cardinal é a hiperalgia(1,4,5), e em 90% dos casos está presente a tríade de dor paroxística, hiperalgia local e hipersensibilidade ao frio(5,7). Os sintomas são desencadeados por traumas banais e variações na temperatura, havendo melhora com banho de água morna(2). O exame físico geralmente é frustro, podendo em alguns casos apresentar alterações ungueais(5) e nódulos azulados(1), estes últimos medindo cerca de 3 a 10 mm de diâmetro(1,5,8).

O diagnóstico tem base na história clínica e exame físico, este último buscando desencadear a dor, seguido de imersão em água morna para determinar a melhora. No entanto, os critérios clínicos apresentam sensibilidade de 50% a 90% e demoram de quatro a sete anos para serem determinados(5,6). Testes específicos foram desenvolvidos para facilitar o diagnóstico: a) teste de Love(1,5) - permite identificar a localização exata da lesão, por meio de aplicação de pressão localizada com a ponta de um instrumento reto (clipe), e tem sensibilidade de 100%; b) teste de Hildreth(1,5) - alívio da dor após insuflação de torniquete aplicado proximalmente ao braço, tem sensibilidade de 90,5%; c) ectoscopia com transluminação - visualização de nódulos azuis no leito subungueal, tem sensibilidade de 85,7%(2).

Como os critérios clínicos apresentam baixa sensibilidade, os exames de imagem são utilizados para complementação diagnóstica. A radiografia simples não mostra achados significativos, pode não demonstrar erosões em 14% a 60%(5,6) dos casos e aumento da distância entre a face dorsal da falange distal e a superfície ungueal inferior em 25% dos casos(6). A ultrassonografia pode demonstrar nódulo sólido, bem definido, hipoecoico e hipervascularizado em 83% dos casos(6). No entanto, pelo fato de a maioria dos tumores glômicos ter localização subungueal, o estudo ultrassonográfico é limitado. Já a ressonância apresenta sensibilidade de quase 100%, tendo como achados um nódulo sólido, com hipossinal em T1, hipersinal em T2 e captação homogênea do contraste(6). O tratamento definitivo é cirúrgico(1,2,5), com taxa de recidiva de 12% a 24%(5,6).


REFERÊNCIAS

1. Freitas F, Luís NM, Ramos A, et al. Tumor glómico subungueal. Rev Port Ortop Traumatol. 2012;20:249-54.

2. Puentes Buendia GP, Jimenez Uribe WA, Facciolli D, et al. Tumor glômico: um diagnóstico fácil ou difícil? Rev Bras Cir Plást. 2010;25:439-42.

3. Paganini F, Romero FA, Dumontier C, et al. Sexta recidiva de tumor glómico intraóseo. Reporte de um caso. Rev Asoc Argent Ortop Traumatol. 2012;77:268-73.

4. Nazerani S, Motamedi MH, Keramati MR. Diagnosis and management of glomus tumors of the hand. Tech Hand Up Extrem Surg. 2010;14:8-13.

5. Vanti AA, Cucé LC, Di Chiacchio N. Tumor glômico subungueal: estudo epidemiológico e retrospectivo, no período de 1991 a 2003. An Bras Dermatol. 2007;82:425-31.

6. Montandon C, Costa JC, Dias LA, et al. Subungueal glomus tumors: imaging findings. Radiol Bras. 2009;42:371-4.

7. Di Chiacchio N, Loureiro WR, Di Chiacchio NG, et al. Synchronous subungual glomus tumors in the same finger. An Bras Dermatol. 2012; 87:475-6.

8. Drapé JL, Idy-Peretti I, Goettmann S, et al. Subungual glomus tumors: evaluation with MR imaging. Radiology. 1995;195:507-15.








Hospital Santa Catarina de Blumenau, Blumenau, SC, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Maurício Fabro
Rua Tobias Barreto, 266, ap. 304, Bairro Vila Nova
Blumenau, SC, Brasil, 89035-070
E-mail: mauriciofabro@hotmail.com
 
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