CARTA AO EDITOR
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Autho(rs): Priscila Gava; Alessandro Severo Alves de Melo; Edson Marchiori; Márcia Henriques de Magalhães Costa; Eric Pereira; Raissa Dantas Batista Rangel |
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Sr. Editor,
Paciente masculino, 20 anos, há um ano com hematoquezia e enterorragia associadas a perda ponderal. Realizada colonoscopia, que demonstrou retite inespecífica, sendo o exame histopatológico compatível com doença de Crohn. Foi iniciado tratamento, havendo remissão dos sintomas. A medicação foi interrompida sem orientação médica após cinco meses, voltando o paciente a apresentar os mesmos sintomas iniciais após um mês, além de lesões papulares, algumas pustulosas, pelo corpo e couro cabeludo. Após cinco dias de terapia imunossupressora, houve progressão das lesões papulares e surgimento de lesões hemorrágicas na mucosa oral, intensamente dolorosas, e linfonodomegalias dolorosas em cadeias cervicais. Transferido para o nosso hospital, a avaliação do Serviço de Dermatologia levantou a suspeita de paracoccidioidomicose (PCM), confirmada por raspado da lesão oral, sendo realizada coloração pela prata e visualizadas células em roda de leme características. A retossigmoidoscopia mostrou proctossigmoidite granulomatosa e a biópsia realizada confirmou o diagnóstico. A tomografia computadorizada (TC) de abdome identificou massa ileocecal, espessamento apendicular com realce parietal pelo meio de contraste, infiltração da gordura peritoneal adjacente, linfonodomegalias mesentéricas e retroperitoneais, espessamento parietal do reto com focos gasosos pararretais à direita, causados por fístulas, além de borramento da gordura perirretal (Figura 1). Figura 1. Tomografia computadorizada de abdome demonstra, no plano axial (A,B), espessamento apendicular, distensão luminal com realce parietal e infiltração da gordura peritoneal adjacente (setas). Notam-se ainda linfonodomegalias mesentéricas e massa ileocecal (cabeças de setas). Reconstruções coronais (C,D) mostram massa ileocecal (setas brancas) e linfonodomegalias mesentéricas (setas pretas) associadas a espessamento apendicular com realce parietal (cabeças de setas). Iniciou-se tratamento com anfotericina B, que resultou, após quatro dias, na melhora dos quadros dermatológico e álgico. O acompanhamento tomográfico revelou involução dos acometimentos ileocecal, apendicular e retal. A literatura radiológica brasileira vem, recentemente, ressaltando muito a importância dos exames de imagem no diagnóstico das afecções do aparelho digestivo(1-12). A PCM é uma micose sistêmica, endêmica em países da América Latina, causada pelo fungo termodimórfico Paracoccidioides brasiliensis(13). Embora todos os segmentos do trato digestivo, da boca ao ânus, possam ser afetados pelo P. brasiliensis, as lesões são mais comuns nos locais mais ricos em tecido linfoide(14), como o íleo terminal, o apêndice e o hemicólon direito(15). Esta característica pode justificar o quadro de apendicite manifestado no presente relato. Inflamação granulomatosa do apêndice é rara e pode ser originada por uma variedade de condições, incluindo causas sistêmicas como doença de Crohn e sarcoidose, ou infecções como por Mycobacterium tuberculosis, Yersinia, parasitas e fungos(16-18). A apendicite ocorre principalmente pela obstrução da luz por apendicólitos, cálculos, processos infecciosos, tumores, e por hiperplasia linfoide. Quando a obstrução apendicular ocorre, a secreção mucosa continuada provavelmente leva a um crescente aumento da pressão intraluminal, o que causa colapso da drenagem venosa. A lesão isquêmica, então, favorece a proliferação bacteriana(19). No caso ora relatado, o acometimento linfoide do órgão pelo fungo, levando a uma massa ileocecal, foi a provável causa da obstrução luminal. Os aspectos tomográficos da apendicite aguda incluem o espessamento parietal com diâmetro superior a 6 mm, a distensão luminal, o realce parietal pelo meio de contraste e a infiltração da gordura periapendicular. Pode haver perfuração e formação de abscesso(20). Na tomografia computadorizada de pacientes com PCM intestinal pode haver acentuado espessamento parietal ileocecal, por vezes configurando massa, associado a linfonodomegalias de aspecto conglomerado(21). REFERÊNCIAS 1. Monjardim RF, Costa DMC, Romano RFT, et al. Diagnosis of hepatic steatosis by contrast-enhanced abdominal computed tomography. Radiol Bras. 2013;46:134-8. 2. Hollanda ES, Torres US, Gual F, et al. Spontaneous perforation of gallbladder with intrahepatic biloma formation: sonographic signs and correlation with computed tomography. Radiol Bras. 2013;46:320-2. 3. Salvadori PS, Costa DMC, Romano RFT, et al. What is the real role of the equilibrium phase in abdominal computed tomography? Radiol Bras. 2013;46:65-70. 4. Costa DMC, Salvadori PS, Monjardim RF, et al. When the noncontrastenhanced phase is unnecessary in abdominal computed tomography scans? A retrospective analysis of 244 cases. Radiol Bras. 2013;46:197-202. 5. Teixeira ACV, Torres US, Westin CEG, et al. Multidetector-row computed tomography in the preoperative diagnosis of intestinal complications caused by clinically unsuspected ingested dietary foreign bodies: a case series emphasizing the use of volume rendering techniques. Radiol Bras. 2013;46:346-50. 6. Kierszenbaum ML, von Atzingen AC, Tiferes DA, et al. Colonografia por tomografia computadorizada na visão do médico encaminhador: qual o seu valor segundo a visão de especialistas? Radiol Bras. 2014;47:135-40. 7. Francisco FAF, Araújo ALE, Oliveira Neto JA, et al. Contraste hepatobiliar: diagnóstico diferencial das lesões hepáticas focais, armadilhas e outras indicações. Radiol Bras. 2014;47:301-9. 8. Terceiro MG, Faria IM, Alfenas R, et al. Hérnia de Amyand com apendicite perfurada. Radiol Bras. 2014;47(6):xi-xiii. 9. Cunha EFC, Rocha MS, Pereira FP, et al. Necrose pancreática delimitada e outros conceitos atuais na avaliação radiológica da pancreatite aguda. Radiol Bras. 2014;47:165-75. 10. Kadow JS, Fingerhut CJP, Fernandes VB, et al. Peritonite encapsulante: tomografia computadorizada e correlação cirúrgica. Radiol Bras. 2014;47:262-4. 11. Pedrassa BC, Rocha EL, Kierszenbaum ML, et al. Tumores hepáticos incomuns: ensaio iconográfico - Parte 1. Radiol Bras. 2014;47:310-6. 12. Pedrassa BC, Rocha EL, Kierszenbaum ML, et al. Tumores hepáticos incomuns: ensaio iconográfico - Parte 2. Radiol Bras. 2014;47:374-9. 13. Shinakai-Yasuda MA, Telles Filho FQ, Mendes RP, et al. Consenso em paracoccidioidomicose. Rev Soc Bras Med Trop. 2006;39:297-310. 14. Campos EP, Padovani CR, Cataneo AMJ. Paracoccidioidomicose: estudo radiológico e pulmonar de 58 casos. Rev Inst Med Trop São Paulo. 1991;33:267-76. 15. Costa MAB, Carvalho TN, Araújo Júnior CR, et al. Manifestações extrapulmonares da paracoccidioidomicose. Radiol Bras. 2005;38:45-52. 16. Tucker ON, Healy V, Jeffers M, et al. Granulomatous appendicitis. Surgeon. 2003;1:286-9. 17. AbdullGaffar B. 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