RELATO DE CASO
|
|
|
|
Autho(rs): Rafael Lemos Nascif1; Ana Graziela Santana Antón2; Gabriel Lacerda Fernandes1; George Caldas Dantas1; Vinícius de Araújo Gomes3; Marcelo Ricardo Canuto Natal4 |
|
Descritores: Leiomiossarcoma; Veia cava inferior; Tomografia computadorizada. |
|
Resumo: INTRODUÇÃO
O leiomiossarcoma da veia cava inferior (VCI) é um tumor maligno que se desenvolve a partir dos constituintes musculares lisos da camada média. Tumor mais comum do sistema venoso, a VCI é o vaso mais afetado, representando, aproximadamente, 5% a 10% dos sarcomas de partes moles(1,2). No retroperitônio, juntamente com o lipossarcoma, constituem os dois sarcomas mais comuns(3). Dor abdominal leve não específica é o sintoma mais prevalente, antecedendo o diagnóstico em meses ou anos(4). O pico de incidência é na sexta década de vida, predominando no sexo feminino(4,5). A dimensão média do tumor no momento do diagnóstico é de 10,8 cm(4). Ressecção completa, com margens cirúrgicas negativas, é a única chance de sobrevida em longo prazo(1,6). Ensaios clínicos randomizados utilizando quimioterapia e radioterapia não mostraram benefícios na sobrevida(6). RELATO DO CASO Paciente do sexo feminino, 48 anos, hipertensa, transplantada renal, procurou atendimento queixando-se de dor abdominal de moderada intensidade, plenitude gástrica, distensão abdominal e abaulamento no andar superior do abdome. Ao exame físico encontrava-se com abdome distendido, doloroso à palpação e com massa abdominal palpável, arredondada, de consistência endurecida, localizada no epigástrio, sem edema de membros inferiores. A tomografia computadorizada (TC) demonstrou volumosa massa retroperitoneal, com captação heterogênea pelo meio de contraste, bem delimitada, de contornos levemente lobulados (Figura 1). A lesão estendia-se do hilo hepático até o nível da bifurcação aórtica e possuía intima relação com a VCI, por vezes distorcendo-a e tornando-a imperceptível, mais evidente na sua porção infrarrenal, deslocando a cabeça do pâncreas sem nítido plano de clivagem (Figuras 1, 2 e 3). A cavografia identificou VCI dilatada em segmento infrarrenal, apresentando imagens negativas de contraste de formato irregular, representando falhas de enchimento (Figura 4). Figura 1. TC de abdome com contraste, plano axial, mostrando volumosa massa retroperitoneal, com realce heterogêneo, levemente lobulada, em íntima relação com a VCI e com pequeno componente intraluminal. Figura 2. TC de abdome com contraste, plano axial, demonstrando que a lesão se estendia até o hilo hepático, deslocando a cabeça do pâncreas, mostrando o sinal da veia cava imperceptível. Figura 3. TC de abdome com contraste, plano sagital, demonstrando melhor o componente intraluminal na VCI e a relação entre a lesão e o hilo hepático. Figura 4. Cavografia demonstrando duas falhas de enchimento representando o componente intraluminal da lesão, com dilatação a montante. O diagnóstico diferencial incluiu linfoma, leiomiossarcoma primário do retroperitônio, leiomiossarcoma de VCI e metástase. Foi executada biópsia guiada por ultrassonografia, que, de acordo com os achados histológicos e imunohistoquímicos, revelou tratar-se de leiomiossarcoma. Na cirurgia foi realizada ressecção em bloco da massa tumoral e de 9 cm da VCI infra-hepática que estava invadida pela lesão tumoral. A VCI foi reconstruída com implante de prótese de Dacron. DISCUSSÃO De um total de 1.210 casos de tumores que envolveram a VCI reportados na literatura entre 1961 e 2008, com base nos bancos de dados do PubMed, apenas 85 eram leiomiossarcomas primários da VCI, e a maioria absoluta representava comprometimento secundário por neoplasias de outros órgãos(7). O leiomiossarcoma de VCI é um tumor incomum e com prognóstico ruim, entretanto, com abordagem cirúrgica agressiva associada a ausência de metástases pode-se obter sobrevida longa e eventualmente a cura(3,4,6). O tamanho do tumor é um dos principais fatores prognósticos, sendo que a sobrevida em cinco anos varia de 30% a 53% nos pacientes submetidos a ressecção com margens livres(6). Pode ser difícil a diferenciação entre um sarcoma de VCI e um outro sarcoma retroperitoneal de partes moles que a envolva(6). O verdadeiro sarcoma de VCI deriva das células musculares lisas do vaso e o seu padrão de crescimento pode ser intraluminal e/ou extraluminal, podendo envolver estruturas vizinhas(6). Quando o tumor tem crescimento intraluminal, existe dilatação da VCI e o tumor é identificado dilatando e preenchendo o lúmen(7). A cavidade abdominal possui grande capacidade, o que permite o crescimento do tumor sem exibir sintomas precoces ou sinais reconhecíveis ao exame físico(5). O lipossarcoma e o leiomiossarcoma são os sarcomas de partes moles retroperitoneais mais comuns(3). O leiomiossarcoma representa 0,5% a 1% de todos os tumores malignos de partes moles e cerca de 5% a 10% de todos os sarcomas de partes moles, seguido pelo lipossarcoma e pelo histiocitoma fibroso maligno. O padrão típico do leiomiossarcoma na TC é de massa lobulada, retroperitoneal, não calcificada, com ou sem áreas de baixa atenuação central de necrose ou degeneração cística, sem conteúdo de gordura e com realce heterogêneo pelo meio de contraste(3,7). Segundo Webb et al., o sinal da VCI imperceptível no ponto de maior contato da VCI com a massa retroperitoneal tem sensibilidade de 75% e especificidade de 100% para predizer a origem da massa como sendo da VCI(8) (Figura 2). A maioria das informações sobre tratamento do leiomiossarcoma da VCI é proveniente de relatos de casos e séries pequenas. Logo, as estratégias para o tratamento ideal permanecem incertas(6). A imaginologia desempenha papel importante na caracterização e estadiamento pré-operatório das massas retroperitoneais, mostrando a extensão das lesões e sua relação com órgãos e estruturas adjacentes(5). Ressecção completa com margens cirúrgicas negativas é a única chance de sobrevida em longo prazo(1,6). Ensaios clínicos randomizados utilizando quimioterapia e radioterapia não mostraram benefícios na sobrevida(6). O presente artigo relata um caso raro, o qual deve entrar no diagnóstico diferencial das massas retroperitoneais, haja vista que o seu planejamento cirúrgico tem impacto na sobrevida do paciente(1,2,5). REFERÊNCIAS 1. Imao T, Amano T, Takemae K. Leiomyosarcoma of the renal vein. Int J Clin Oncol. 2011;16:76-9. 2. Sokolich J, Mejia A, Cheng S, et al. Retroperitoneal leiomyosarcoma of the inferior vena cava mimicking a liver tumor. Am Surg. 2008;74:433-6. 3. Cantwell CP, Stack J. Abdominal aortic invasion by leiomyosarcoma. Abdom Imaging. 2006;31:120-2. 4. Drukker L, Alberton J, Reissman P. Leiomyosarcoma of the inferior vena cava: radical surgery without vascular reconstruction. Vasc Endovascular Surg. 2012;46:688-90. 5. Sessa B, Iannicelli E, Caterino S, et al. Imaging of leiomyosarcoma of the inferior vena cava: comparison of 2 cases and review of the literature. Cancer Imaging. 2010;10:80-4. 6. Dew J, Hansen K, Hammon J, et al. Leiomyosarcoma of the inferior vena cava: surgical management and clinical results. Am Surg. 2005;71:497-501. 7. Narata M, Okuhata Y, Abe K, et al. Primary leiomyosarcoma of the inferior vena cava: case report. Abdom Imaging. 2010;35:481-4. 8. Webb EM, Wang ZJ, Westphalen AC, et al. Can CT features differentiate between inferior vena cava leiomyosarcomas and primary retroperitoneal masses? AJR Am J Roentgenol. 2013;200:205-9. 1. Médicos Residentes de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), Brasília, DF, Brasil 2. Médica Radiologista do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), Brasília, DF, Brasil 3. Médico Radiologista, Preceptor da Residência Médica de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), Brasília, DF, Brasil 4. Médico Radiologista, Chefe da Residência Médica de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), Brasília, DF, Brasil Endereço para correspondência: Dr. Rafael Lemos Nascif SHN, Quadra 5, Bloco B, ap. 1108, Asa Norte Brasília, DF, Brasil, 70705-000 E-mail: rafaelnascif@gmail.com Recebido para publicação em 30/8/2013. Aceito, após revisão, em 6/1/2014. Trabalho realizado no Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), Brasília, DF, Brasil. |