RELATO DE CASO
|
|
|
|
Autho(rs): Lucas Rios Torres1; Luciana Sátiro Timbó2; Cristiane Maria de Freitas Ribeiro3; Mario Melo Galvão Filho4; Carlos Gustavo Yuji Verrastro5; Giuseppe D'Ippolito6 |
|
Descritores: Fígado; Neoplasias; Hemangioendotelioma epitelioide; Diagnóstico por imagem; Ressonância magnética. |
|
Resumo: INTRODUÇÃO
O hemangioendotelioma epitelioide é um tumor vascular raro, composto por células epitelioides e por um estroma fibroso hialinizado(1). É considerado um tumor maligno de agressividade baixa/intermediária, com apresentação clínica e prognóstico variados(2,3). Relatamos um caso de acometimento de múltiplos órgãos descoberto de forma incidental em uma paciente assintomática. RELATO DO CASO Paciente do sexo feminino, 28 anos, com nódulo hepático hipoecogênico descoberto em exame de ultrassonografia (US) de rotina. Complementação com ressonância magnética (RM) identificou outros nódulos hepáticos, de tamanhos variados, predominantemente periféricos, com baixo sinal em T1, sinal intermediário em T2 e padrão de realce hipovascular (Figura 1). Outros nódulos hepáticos (Figura 2) foram ainda caracterizados no estudo de tomografia computadorizada (TC), assim como nódulos pulmonares e lesões líticas na medular do osso ilíaco esquerdo (Figura 3). Os marcadores tumorais, a colonoscopia e a endoscopia foram negativos para lesões neoplásicas. O diagnóstico de hemangioendotelioma epitelioide foi firmado pela biópsia guiada por US, cuja lâmina está demonstrada na Figura 4. Figura 1. Ressonância magnética (T2 STIR, TIGRE pré-contraste, arterial, portal e equilíbrio). Nódulo circunscrito localizado na periferia da face visceral do segmento VI, com aspecto em alvo no T2, baixo sinal em T1 e realce hipovascular e progressivo. As margens da lesão são indistintas na fase tardia. Figura 2. Tomografia computadorizada. Outros nódulos periféricos, de tamanhos variados e de menores dimensões, são caracterizados no lobo direito do fígado. Não foram identificadas áreas de retração capsular hepática. Figura 3. Tomografia computadorizada. Nódulos pulmonares na periferia da face costal do lobo médio e no segmento lingular. Lesões ósseas líticas com esclerose marginal no osso ilíaco esquerdo. Figura 4. Células neoplásicas fusocelulares e epitelioides infiltrando os sinusoides, hepatócitos residuais em meio à neoplasia (seta). Aglomerados de células neoplásicas epitelioides (círculo). Imuno-histoquímica CD34 positiva nas células neoplásicas demonstrada no box inferior direito da figura. DISCUSSÃO O hemangioendotelioma epitelioide é um tumor de origem endotelial formado por células epitelioides eosinofílicas, dendríticas e inflamatórias, dispersas em um estroma mixomatoso ou fibroso(4). Imuno-histoquimicamente, são identificados pela positividade para o fator VIII (FVIII-RAg)(3,4). Macroscopicamente, apresenta-se como nódulos multifocais de 0,5 a 14 cm(2,4). Em até 18% dos casos apresentam-se como um nódulo único, com média de 5,6 cm(4). São mais frequentes no sexo feminino, na proporção de 1,6:1(4,5). Há associação com estrógenos e exposição ao cloreto de vinila, mas sem dados elucidando a natureza desta relação(4). O acometimento hepático pode ser nodular ou difuso(2,6,7). O padrão nodular é caracterizado pela presença de múltiplas lesões, de tamanhos variados, periféricas e subcapsulares, enquanto o difuso decorre da coalescência dos nódulos, formando uma lesão periférica infiltrativa lobar(1,2,6). A retração e a lobulação hepática são características(1,2). São lesões hipoecogênicas na US e hipodensas na TC sem contraste. Na RM têm baixo sinal em T1, sinal alto/intermediário em T2, em que um padrão em alvo com área central de alto sinal pode ser identificado. A porção central com baixo sinal pode ser decorrente de hemorragia, calcificação e necrose coagulativa. Tanto na TC quanto na RM os nódulos têm padrão de realce hipovascular e periférico. Halo perilesional hipocaptante circundando a lesão pode ser identificado, correspondendo à zona avascular interposta entre o nódulo e o parênquima hepático(1,2). Calcificações ocorrem em 23% das lesões(4). No nosso caso, os nódulos apresentaram realce em alvo, com homogeneização nas fases de contrastação tardia. O curso da doença é variado(4,5), havendo casos em que existe, inclusive, regressão tumoral sem nenhum tipo de tratamento(4). Pulmão (81%), linfonodos abdominais (39%), mesentério e omento (31%) são os sítios mais comuns de acometimento metastático(4,8). É consenso optar-se pelo tratamento cirúrgico quando possível, por meio de nodulectomia (padrão nodular) ou transplante hepático (acometimento difuso). O transplante é aceitável mesmo na doença metastática(3,8), exceto na população pediátrica(6). A sobrevida em cinco anos é de 43% nos pacientes submetidos a transplante, e a recorrência ocorre em 33% dos casos(5). A quimioterapia, o interferon e a quimioembolização arterial foram utilizados no tratamento do paciente em estudo(5). Pela história natural da doença, é difícil avaliar a real efetividade de cada uma das estratégias terapêuticas empregadas(4). Na vigência de nódulos hepáticos e extra-hepáticos, devemos inicialmente pensar em comprometimento sistêmico por doença neoplásica, mais comum do que o hemangioendotelioma epitelioide, uma neoplasia rara. No presente caso, a investigação dos principais sítios primários (mama, estômago, cólon) foi negativa. Neste contexto, o conhecimento dos achados radiológicos do hemangioendotelioma epitelioide foi útil em incluí-lo no diagnóstico diferencial. Lesões hepáticas periféricas associadas a retração capsular, sobretudo em mulheres jovens sem histórico oncológico, são sinais de suspeição para o hemangioendotelioma epitelioide. REFERÊNCIAS 1. Matsui O, Kobayashi S, Gabata T, et al. Fígado: massas hepáticas focais. In: Haaga JH, Dogra VS, Forsting M, et al., editores. TC e RM: uma abordagem do corpo humano completo. 5ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009. p. 1561-2. 2. Araújo ALE. Patologias neoplásicas malignas. In: Araújo ALE, editor. Ressonância magnética do fígado. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. p. 300-1. 3. Santos CER, Correia MM, Pereira RS, et al. Hemangioendotelioma epitelióide hepático: relato de caso com tratamento multimodal. Rev Bras Cancerol. 2007;53:217-22. 4. Makhlouf HR, Ishak KG, Goodman ZD. Epithelioid hemangioendothelioma of the liver: a clinicopathologic study of 137 cases. Cancer. 1999;85:562-82. 5. García-Botella A, Díez-Valladares L, Martín-Antona E, et al. Epithelioid hemangioendothelioma of the liver. J Hepatobiliary Pancreat Surg. 2006;13:167-71. 6. Da Ines DD, Petitcolin V, Joubert-Zakeyh J, et al. Epithelioid hemangioendothelioma of the liver with metastatic coeliac lymph nodes in an 11-year-old boy. Pediatr Radiol. 2010;40:1293-6. 7. Lyburn ID, Torreggiani WC, Harris AC, et al. Hepatic epithelioid hemangioendothelioma: sonographic, CT, and MR imaging appearances. AJR Am J Roentgenol. 2003;180:1359-64. 8. Kayler LK, Merion RM, Arenas JD, et al. Epithelioid hemangioendothelioma of the liver disseminated to the peritoneum treated with liver transplantation and interferon alpha-2B. Transplantation. 2002;74:128-30. 1. Mestre, Médico Radiologista do Hospital São Luiz, São Paulo, SP, Brasil 2. Médica Residente do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil 3. Médica Patologista do Laboratório Diagnóstica, São Paulo, SP, Brasil 4. Doutor, Médico Radiologista do Hospital São Luiz, São Paulo, SP, Brasil 5. Doutorando do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), Médico Radiologista do Hospital São Luiz, São Paulo, SP, Brasil 6. Livre-Docente, Professor do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil Endereço para correspondência: Dr. Giuseppe D'Ippolito Rua Napoleão de Barros, 800, Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil, 04024-002 E-mail: giuseppe_dr@uol.com.br Recebido para publicação em 10/12/2012. Aceito, após revisão, em 23/8/2013. Trabalho realizado no Hospital São Luiz e no Departamento de Diagnóstico por Imagem da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. |