ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Aparecido Ferreira de Oliveira1; Henrique Manoel Lederman2; Nildo Alves Batista2 |
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Descritores: Educação médica; Residência médica; Administração de recursos humanos em saúde; Radiologia; Diagnóstico por imagem. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
A radiologia é uma especialidade de apoio diagnóstico e terapêutico que realiza procedimentos de alta complexidade com profissionais, equipamentos, instalações e insumos de elevado custo, só possível mediante a atuação integrada de equipes multiprofissionais, sob a liderança do médico radiologista. As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN)(1) para a formação médica preconizam o desenvolvimento de competências gerais como a atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação permanente: "os profissionais de saúde deverão estar aptos a assumirem posições de liderança, sempre tendo em vista o bem estar da comunidade. A liderança envolve compromisso, responsabilidade, empatia, habilidade para tomada de decisões, comunicação e gerenciamento de forma efetiva e eficaz." Na radiologia, as equipes multiprofissionais são formadas por profissionais com formações específicas e funções bem delineadas: médica, administrativa, de enfermagem, técnicos e tecnólogos em radiologia. Com o advento da radiologia digital, foram reorganizados os processos e fluxos, alterando as rotinas de trabalho, exigindo atualização e capacitação das equipes, com significativos benefícios aos pacientes, redução no tempo de espera dos exames e laudos, maior produtividade, melhoria da qualidade diagnóstica e possibilidade de decisões amparadas por sistemas integrados e tecnologias mais confiáveis. "A saúde é uma das áreas que mais se desenvolve no mundo de hoje, incorporando constantemente novos e complexos conhecimentos, demandando que seus profissionais conciliem, cada vez mais, alta tecnologia com uma visão ampla e multidisciplinar de seu cotidiano." (Romano(2)). Isto reforça a premissa da "necessidade de ações profissionais conjuntas para o atendimento em saúde, independente da categoria de trabalhador." (Oliveira et al.(3)). Silva et al.(4) esclarecem que as normas para a formação de radiologistas enfatizam mais os aspectos técnicos dando pouca abordagem aos comportamentais. Enfatizam que "Avanços tecnológicos e científicos da área de radiologia e diagnóstico por imagem permitem a qualificação profissional pela aquisição de novas competências e habilidades durante a residência médica e cursos de especialização, de acordo com as aptidões e expectativas dos alunos, desde que oportunidades sejam oferecidas para que estes possam adquiri-las." Ter autonomia, clareza de seu papel e o dos outros na equipe, bem como aprender a liderar e administrar pessoas dá ao radiologista um diferencial que o mercado de trabalho valoriza e que pode ser ensinado durante a residência, ambiente rico em experiências humanas e possibilidades de aprendizado. Pinho(5) reforça estes aspectos ao comentar que "juntamente com as habilidades e competências técnicas, as habilidades relacionais que capacitam o indivíduo a estabelecer relações interpessoais com base na cooperação, também têm sido requeridas." Assim, o preparo para liderar as equipes com autonomia e clareza de papeis de cada participante é um pilar fundamental para a gestão dos serviços de imagem, ponto de partida relevante para o desenvolvimento de competências relacionadas com a gestão de recursos humanos. Sousa et al.(6) comentam que "os preceptores devem rever os objetivos propostos para o programa, buscando incluir competências que complementem a formação dos residentes, além de auxiliá-los a encontrar mecanismos para adquiri-las." Frente a este panorama indagamos: A residência em radiologia da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) tem propiciado ao residente uma clareza de seu grau de autonomia e complexidade no desenvolvimento de suas funções? Os profissionais envolvidos no cotidiano de trabalho têm clareza de seus papéis no desenvolvimento das atividades propostas? A residência propícia o aprendizado sobre gestão do trabalho em equipe multiprofissional? O objetivo desta pesquisa foi investigar, a partir de residentes, docentes e preceptores de radiologia, a clareza do grau de autonomia do residente no desenvolvimento de suas funções e a aprendizagem sobre a gestão de recursos humanos na residência em radiologia da EPM/Unifesp, procurando subsídios para o aprimoramento da formação do médico radiologista. MATERIAIS E MÉTODOS O Programa de Residência Médica em Radiologia analisado ocorre em um hospital público, tem duração de três anos, com 12 vagas para o primeiro ano (R1), 12 para o segundo (R2) e 12 para o terceiro (R3), contando com um docente supervisor, uma coordenadora de ensino e pesquisa, dois preceptores chefes e 11 preceptores de setor distribuídos entre abdome, cabeça e pescoço, musculoesquelético, mama, pediatria, tórax, medicina fetal, pronto-socorro, intervenção e neurologia. Participa também da formação do residente todo o staff do Departamento, composto pelos docentes, cinco médicos colaboradores, técnicos administrativos em educação e participantes do programa de atualização profissional. Optou-se por uma pesquisa de caráter exploratório, com abordagens quantitativa e qualitativa, desenvolvida junto ao universo de residentes, preceptores e docentes atuantes no Programa durante o ano de 2011. Participaram da pesquisa 5 docentes (55,5% da categoria), 14 preceptores e 27 residentes (10 R1, 7 R2 e 10 R3). O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp. Esta pesquisa compôs uma dissertação de mestrado defendida e aprovada na EPM-Unifesp. Na primeira etapa de coleta de dados, 46 sujeitos (75,40% dos 61 que compunham o universo analisado) responderam a uma escala atitudinal no formato Likert, composto por 11 assertivas, das quais três referentes à temática deste artigo. Amaro et al.(7) comentam que a escala Likert apresenta uma série de cinco proposições, das quais o inquirido deve selecionar uma: "concorda totalmente, concorda, sem opinião, discorda, discorda totalmente" a respeito de assertivas relacionadas com o objeto pesquisado. Os dados obtidos, após tabulados e transformados em gráficos, compuseram uma primeira aproximação ao objeto de estudo. Na segunda etapa, foi feita uma abordagem qualitativa para o aprofundamento dos dados. A pesquisa qualitativa é descritiva, em que se observam, correlacionam e descrevem fatos de uma determinada realidade sem manipulá-los, sendo utilizada com a finalidade de conhecer as diversas situações que ocorrem no setor analisado. Optou-se por um estudo de caso que representa uma maneira de se investigar ou aplicar um assunto em uma organização individual. Conforme Yin(8), o estudo de caso investiga um fenômeno contemporâneo dentro do seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos. Foram, assim, realizadas entrevistas semiestruturadas com roteiro composto por três questões, com duração média de dez minutos, a um número de participantes conforme critérios de uma pesquisa qualitativa, ou seja, relevância e reincidência de informações e saturação dos dados coletados. Isso ocorreu após a 18ª entrevista. Após transcrição na íntegra, os dados foram submetidos a uma análise temática (núcleos de sentido), uma das técnicas de análise de conteúdo, conforme preconizada por Minayo(9): ordenação dos dados, identificação e estabelecimento das unidades de contexto (do qual faz parte a mensagem), identificação das unidades de registro (palavra, frase ou oração) referente ao objeto analisado e agrupamento destas unidades em categorias de análise. RESULTADOS Frente à assertiva "Na radiologia, o residente tem clareza sobre o seu grau de autonomia e complexidade na realização das suas funções", a maioria (71%) dos docentes, preceptores e residentes concordou (15% discordaram e 14% não tinham opinião formada a respeito) (Figura 1). Figura 1. Percentual de concordância/discordância acerca da clareza do residente sobre o seu grau de autonomia e complexidade na realização de suas funções. Na etapa de aprofundamento dos dados, os entrevistados ressaltam que os residentes "têm sim noção dessa importância, do seu papel e da sua autonomia no atendimento médico que realizam" - E18, enfatizando que a atuação na radiologia requer crescente grau de autonomia em razão das peculiaridades e complexidades das tarefas empreendidas. Correlacionam o desenvolvimento da autonomia com a responsabilidade ("eu concordo, ele sabe que é função dele, que não pode passar pro residente mais novo nem pro chefe e, ao longo da residência, adquire essa noção da complexidade" - E06) e cobrança na execução das tarefas ("ele é muito cobrado em cima disso. Sabe que no plantão de US, vai fazer e ter que responder pelo laudo que está dando e na Tomografia vai ter que passar pelo preceptor tudo direitinho. A responsabilidade é dele e vai ser julgado por isso, tendo nítida clareza do seu grau de responsabilidade" - E08). Alguns entrevistados ressaltam uma autonomia relativa ("se a gente for avaliar ele não tem autonomia, ele tem uma agenda a cumprir e com ou sem horário de almoço, precisa cumprir aqueles pacientes" - E14), atribuindo às especificidades profissionais ("a regulamentação da atividade de cada profissão em nosso país ainda é precária e essa divisão depende da composição de cada grupo em cada serviço" - E01) e à complexidade do próprio hospital ("estamos num hospital e ele não sabe as suas funções, acho que ele não tem noção da sua importância, do papel dele na estrutura de todo o sistema" - E14) como fatores limitantes para o desenvolvimento da autonomia no atendimento médico. Diante da assertiva "Na residência em radiologia, todos os profissionais envolvidos têm clareza dos seus papéis no desenvolvimento das atividades propostas", observa-se que apenas 37% dos entrevistados concordam (Figura 2). Figura 2. Percentual de concordância/discordância se todos os profissionais envolvidos têm clareza dos seus papéis no desenvolvimento das atividades propostas. Nas entrevistas de aprofundamento, alguns docentes, preceptores e residentes reforçam este achado: ("todos os profissionais não, discordo, tem alguns profissionais que não tem clareza de seus papéis" - E02) e ("nem os residentes, muito menos os profissionais têm uma noção clara das suas funções e o que cumprir bem a função ou não, acarreta no serviço" - E14). Nas falas dos entrevistados encontramos duas categorias que, mesmo reforçando os limites, apontam oportunidades para minimizar esta dificuldade: a carência de discussão e supervisão ("é uma questão de supervisão mesmo, teria que ter mais chefia em cada setor, cada profissional deveria ter mais fiscalização nos afazeres" - E03) e de treinamento específico para o trabalho em equipe ("nem todos têm essa clareza de seus papéis, porque não existe um treinamento profundo e elaborado sobre isso" - E16). Ainda quando colocados diante da assertiva: "Na radiologia, o residente tem a oportunidade de aprender a gerir o trabalho em equipe multiprofissional", 48% dos docentes, preceptores e residentes discordaram, mostrando uma carência desta aprendizagem durante a residência (13% dos entrevistados não opinaram e 39% concordaram) (Figura 3). Figura 3. Percentual de concordância/discordância sobre a oportunidade de aprender a gerir o trabalho em equipe multiprofissional. Na fase de aprofundamento da coleta de dados, os entrevistados reforçaram a discordância, expondo haver mais limitações que oportunidades para este aprendizado ("a gente não aprende isso, a lidar com a equipe multiprofissional" - E11). A análise temática das falas permitiu elencar quatro categorias: a rotina restrita à prática isolada nas salas de laudo ("aqui a gente trabalha muito sozinho, acaba trabalhando muito você, os seus colegas, os preceptores nas salas de laudos" - E03), a falta de ênfase no programa ("nem a oportunidade de aprender, nem de gerir o trabalho em equipe multiprofissional, a gente não tem o foco nisso, não aborda esse tema" - E17), o desenvolvimento de atividades diversificadas e pouco interativas entre as áreas ("os serviços dentro da residência são muito estanques" - E17) e a falta de cultura de interação multiprofissional prévia ("não temos a cultura da gestão da equipe multiprofissional" - E17). Apesar das limitações, há o reconhecimento de algumas oportunidades para este aprendizado ("tem chance de ser mais explorada, porque isso faz parte da vida do profissional nessa fase da residência" - E13), seja na interação cotidiana entre residentes e equipes ("a gente tem a oportunidade sim, de trabalhar com equipe multiprofissional, com técnicos e com pessoal de enfermagem" - E05) como no ambiente propício de hospital-escola ("aqui a gente aprende bem como gerir o trabalho em equipe multiprofissional por ser um hospital-escola" - E14). DISCUSSÃO A Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), na Resolução nº 4 de 12/07/2010(10), documenta que "a maneira apropriada de treinamento para o Médico Residente, tendo por objetivo formação adequada com ganho de autonomia e independência para enfrentar a vida profissional futura, é em serviço, sob supervisão de preceptor, em um Programa de Residência Médica devidamente credenciado pela CNRM". Fleury-Teixeira et al.(11) esclarecem que "a autonomia (auto= próprio, nomos= norma, regra, lei) conduz o pensamento imediatamente à ideia de liberdade e de capacidade de exercício ativo de si, da livre decisão dos indivíduos sobre suas próprias ações e às possibilidades e capacidades para construírem sua trajetória na vida". Machado et al.(12) comentam que a formação do profissional de saúde deve propiciar "autonomia e emancipação, enquanto sujeito histórico e social capaz de propor decisões de saúde para cuidar de si, e sua família e coletividade". O desenvolvimento da autonomia do futuro radiologista mantém relação direta com a clareza na definição de papéis (própria e dos demais membros da equipe) e capacidade de gerenciar os recursos humanos que, com ele, irá trabalhar. Oliveira et al.(3) salientam que "as instituições de saúde, quando envolvidas com a qualificação dos profissionais, podem ser facilitadoras do processo, atuando de forma colaborativa e comprometida", momento ideal para o residente aprender a liderar equipes e a definir funções e tarefas. A importância da liderança no contexto da gestão de recursos humanos visa, ainda, a entender, contornar e superar a ausência da integração, o pouco entrosamento e o reduzido espírito coletivo entre os componentes das equipes, além do conflito de papéis e disputas pelo poder, afetando o desempenho individual e do grupo multidisciplinar. Feuerwerker et al.(13) comentam que "dentro do hospital, a atenção depende da conjugação do trabalho de vários profissionais...Assim, uma complexa trama de atos, procedimentos, fluxos, rotinas, saberes, num processo de complementação e disputa, compõem o cuidado em saúde". O aprendizado da liderança começa pelo domínio técnico complementado pelo relacional. Alguns pontos críticos na formação desta liderança são compreensíveis diante dos diferentes momentos da residência, iniciando com a apresentação, inserção e integração em equipes já formadas. A capacidade de liderança somente se desenvolve com o tempo, pela consolidação dos conhecimentos e o estabelecimento da autonomia ao término da residência, conforme a maturidade e interesse individual. Gunderman et al.(14), analisando o ensino da radiologia nas escolas médicas, afirmam que é importante desenvolver um plano curricular que inclua novas oportunidades de ensino específicas. O ensino da gestão dos recursos humanos deve aproveitar o ambiente multiprofissional e interdisciplinar, agregando a experiência dos docentes, preceptores, radiologistas, administradores, profissionais de enfermagem, técnicos e tecnólogos em radiologia. CONCLUSÕES Esta pesquisa mostrou que a maioria dos investigados concorda que a residência propicia clareza ao residente em relação ao seu grau de autonomia face às complexidades, apesar de haver espaços para melhorias no programa (discordância de 15% dos participantes da pesquisa). A carência no aprendizado sobre gestão de equipes compromete o desenvolvimento da capacidade de liderança, atributo importante a ser explorado nos currículos destes programas. Atividades estanques (setorizadas), isolamento nas salas de laudos e falta de cultura multiprofissional prévia dificultam este processo. A falta de clareza de alguns profissionais sobre papéis nas atividades desenvolvidas pode gerar conflitos e distanciamentos entre os membros das equipes, prejudicando ações coletivas e o entrosamento necessário para o melhor andamento do trabalho. Entendemos que os programas de residência deveriam promover a inclusão de palestras, reuniões e discussões conjuntas e supervisionadas sobre ações, papéis e funções dos membros de uma equipe, reforçando a relevância da atuação multiprofissional e, com isto, preparando melhor o futuro radiologista para sua prática. Assim, estariam envolvendo os residentes como "aprendizes que ensinam enquanto aprendem" num processo constante, evolutivo e formador de pessoas. REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº4, de 01/11/2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em medicina. [acessado em 11 de dezembro de 2012]. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES04.pdf. 2. Romano VF. Educação a distância na qualificação profissional em saúde. RECIIS. 2007;1:247-51. 3. Oliveira NA, Thofehrn MB, Cecagno D, et al. 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Mestre, Pós-graduando na Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil 2. Docentes, Professores Titulares da Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil Endereço para correspondência: Aparecido Ferreira de Oliveira Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde da Universidade Federal de São Paulo (Cedess-Unifesp) Rua Pedro de Toledo, 859, Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil, 04039-032 E-mail: aparecidoliveira@ig.com.br Recebido para publicação em 24/1/2013. Aceito, após revisão, em 4/10/2013. Trabalho realizado na Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp), São Paulo, SP, Brasil. |