Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 46 nº 6 - Nov. / Dez.  of 2013

EDITORIAL
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Page(s) V to VI



A radiografia de tórax e a DPOC

Autho(rs): Bruno Hochhegger1; Klaus L. Irion2

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O enfisema pulmonar e a bronquite crônica são referidos em conjunto sob o acrônimo DPOC(1-4). Estima-se que doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) afete aproximadamente de 6% a 15,8% da população com idade superior a 40 anos, generalizando-se para população brasileira os dados obtidos no estudo PLATINO, em São Paulo(5). A DPOC é a quinta maior causa de internamento no sistema público de saúde do Brasil, em maiores de 40 anos, com 196.698 internações por ano, e gastos aproximados de 72 milhões de reais(1-5).

O processo inflamatório crônico relacionado à DPOC pode produzir alterações que vão desde os brônquios (bronquite crônica), bronquíolos (bronquiolite obstrutiva) e parênquima pulmonar (enfisema pulmonar). Estas alterações anatomopatológicas, causadas principalmente pelo tabagismo, encontram-se em proporções variáveis em cada indivíduo afetado pela doença, tendo correlação com as manifestações clínicas apresentadas. Os extremos destas alterações são o enfisema pulmonar (dano predominante no parênquima pulmonar) e a bronquite crônica (dano principalmente bronco-bronquiolar)(1-5).

A correlação entre a anatomia patológica e a radiologia no estudo de enfisema deriva do conceito que "o excesso de radiotransparência na radiologia resulta de um aumento do volume de ar em relação à quantidade de tecidos pulmonares e sangue que os feixes de raios X encontram em seu trajeto"(1-4,6-9).

O rendimento da avaliação da DPOC pelo estudo radiológico simples é bastante limitado, não havendo anormalidade na radiografia se não existir aprisionamento de ar(1-4,10-12). Nestes casos, a principal alteração é a redução da vasculatura, o que somente é perceptível muito tardiamente na história natural da doença, além de ser um critério de extrema subjetividade.

Quando há aprisionamento de ar, os critérios mais seguros são: 1. diafragma rebaixado ou retificado, abaixo do sexto espaço intercostal, anterior, na inspiração máxima; 2. aumento do espaço claro retroesternal (maior que 3 cm), persistência do aumento do espaço claro retroesternal na expiração; 3. coração alongado e verticalizado, com o diâmetro transverso, na sua maior extensão, inferior a 11,5 cm, permanecendo afilado mesmo com aumento do ventrículo direito; 4. a presença de bolhas é inferida pela identificação de área de maior radiotransparência, avascular, podendo ou não estar delimitada por fina linha branca(1-4,10-12).

O grande problema clínico destes achados radiográficos é a inespecificidade deles. Dentro do diagnóstico diferencial dos achados de hiperinsuflação pulmonar, o aumento de câmaras direitas do coração, com redução da vasculatura intrassegmentar, pode também ser identificado em hipertensão arterial pulmonar sem enfisema. Outro importante cenário clínico são os pacientes com asma grave que apresentam todos estes achados radiográficos e não têm DPOC. Outrossim, estes critérios, além de inespecíficos, quando presentes, são pouco sensíveis, tendo como exemplo as bolhas que só estarão presentes em cerca de um terço dos casos avançados.(1-4,10-12)

Em relação à apresentação radiológica e ao prognóstico, há estudo de sobrevida realizado por Simon et al.(10,11), em que 53% dos pacientes com bronquite crônica e enfisema diagnosticáveis na radiografia de tórax estavam mortos em 5 anos, e 70% em 10 anos(10-12).

Com base nos dados apresentados, a tomografia computadorizada (TC) tomou importância na avaliação por imagem da DPOC. Vários estudos têm sido dedicados à detecção, à correlação com a anatomia patológica e à quantificação da DPOC(6-9,13-19). Apesar de a DPOC demonstrar uma variabilidade importante em relação à técnica, a TC ainda apresenta importante vantagem em relação aos testes funcionais e aos demais métodos de imagem(1-4,6-9,13-18).

Tendo em vista esses estudos, o último consenso brasileiro de DPOC relata que na DPOC deve-se solicitar, rotineiramente, uma radiografia simples de tórax nas posições posteroanterior e perfil, não para definição da doença, mas para afastar outras doenças pulmonares(20).

Nesta edição da Radiologia Brasileira os leitores encontrarão um interessante artigo de Marcos et al.(21). O estudo avalia quantitativamente as radiografias torácicas de indivíduos com e sem DPOC e verifica se dados obtidos da imagem radiográfica podem classificar o indivíduo como tendo ou não DPOC. A conclusão deste estudo é de que as variáveis que permitem uma maior discriminação entre estes dois grupos são relacionadas ao músculo diafragmático. Entretanto, apesar de estes sinais serem possivelmente úteis na diferenciação de pacientes com e sem DPOC, deve-se incluir no diagnóstico diferencial destes achados uma grande variedade de doenças, que vão desde asma até hipertensão pulmonar. Deve-se também se conscientizar a comunidade acadêmica da incapacidade de se diferenciar, pela radiografia de tórax, as mais diversas formas de hiperinsuflação pulmonar vistas na DPOC. Também deve ser ressaltado que os dados deste estudo têm a grande vantagem de tornar a avaliação dos achados de hiperinsuflação pulmonar quantitativos, o que ainda é pouco difundido na radiografia convencional, e deve ser usado para diminuir a variação na interpretação.


REFERÊNCIAS

1. Irion KL, Hochhegger B, Marchiori E, et al. Radiograma de tórax e tomografia computadorizada na avaliação do enfisema pulmonar. J Bras Pneumol. 2007;33:720-32.

2. Irion KL, Marchiori E, Hochhegger B. Tomographic diagnosis of pulmonary emphysema. J Bras Pneumol. 2009;35:821-3.

3. Hochhegger B, Alves GR, Irion KL, et al. Emphysema index in a cohort of patients with no recognizable lung disease: influence of age. J Bras Pneumol. 2012:38:494-502.

4. Hochhegger B, Meireles GP, Irion K, et al. The chest and aging: radiological findings. J Bras Pneumol. 2012;38:656-65.

5. Menezes AM, Perez-Padilla R, Jardim JR, et al. Chronic obstructive pulmonary disease in five Latin American cities (the PLATINO study): a prevalence study. Lancet. 2005;366:1875-81.

6. Hochhegger B, Marchiori E, Irion K, et al. Accuracy of measurement of pulmonary emphysema with computed tomography: relevant points. Radiol Bras. 2010:43:260-65.

7. Irion KL, Marchiori E, Hochhegger B, et al. CT quantification of emphysema in young subjects with no recognizable chest disease. AJR Am J Roentgenol. 2009;192:W90-6.

8. Hochhegger B, Irion KL, Marchiori E, et al. Reconstruction algorithms influence the follow-up variability in the longitudinal CT emphysema index measurements. Korean J Radiol. 2011;12:169-75.

9. Hochhegger B, Irion KL, Alves GR, et al. Normal variance in emphysema index measurements in 64 multidetector-row computed tomography. J Appl Clin Med Phys. 2013;14:4215.

10. Simon G, Medvei VC. Chronic bronchitis: radiological aspects of a five-year follow-up. Thorax. 1962;17:5-8.

11. Reid L, Simon G. III. Pathological findings and radiological changes in chronic bronchitis and emphysema. Br J Radiol. 1959;32:291-305.

12. Reid L. The pathology of emphysema. Chicago: Year Book Med Publ; 1967.

13. Hochhegger B, Irion KL, Marchiori E, et al. Reconstruction algorithms and their influence in emphysema CT measurements. Acad Radiol. 2010;17:674.

14. Hochhegger B, Marchiori E, Irion KL, et al. Are we measuring pulmonary emphysema? Respir Med. 2010;104:1073.

15. Hochhegger B, Marchiori E, Irion K, et al. Visual vs automated assessment of emphysema. Chest. 2011;140:1384.

16. Hochhegger B, Marchiori E, Irion KL, et al. Iodinated contrast media and its influence in emphysema CT measurements. Clin Imaging. 2012;36:160.

17. Hochhegger B, Irion KL, Marchiori E. Reconstruction algorithms and CT emphysema measurements. Radiology. 2012;263:935-6.

18. Hochhegger B, Irion KL, Andrade CF, et al. Congenital lobar emphysema: the role of multislice computed tomography with virtual bronchoscopy in the differential diagnosis with bronchial foreign bodies. Eur Arch Otorhinolaryngol. 2012;269:2015-6.

19. Koenigkam-Santos M, Paula WD, Gompelmann D, et al. Endobronchial valves in severe emphysematous patients: CT evaluation of lung fissures completeness, treatment radiological response and quantitative emphysema analysis. Radiol Bras. 2013;46:15-22.

20. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. II Consenso Brasileiro sobre Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica - DPOC - 2004. J Bras Pneumol. 2004;30:S1-S42.

21. Marcos L, Bichinho GL, Panizzi EA, et al. Classificação da doença pulmonar obstrutiva crônica pela radiografia do tórax. Radiol Bras. 2013;46:327-32.









1. Professor de Radiologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Médico Radiologista Torácico do Pavilhão Pereira Filho e do Centro de Imagem Molecular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), Porto Alegre, RS. Brasil. E-mail: brunohochhegger@gmail.com
2. Consultant Radiologist of Liverpool Heart and Chest Hospital, Liverpool, United Kingdom
 
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