EDITORIAL
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Autho(rs): Jorge Elias Jr. |
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A preocupação com a dose de radiação nos exames de tomografia computadorizada (TC) tem sido motivo de vários artigos de revisão, bem como de pesquisas que visam à redução da radiação aos menores níveis possíveis. Isso pode ser exemplificado por pesquisa na base de dados PubMed (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed) utilizando-se os termos "computerized tomography radiation dose risk", com 247 artigos encontrados em 2012 em comparação com apenas 7 artigos em 1992. Como já considerado por vários autores, bem como em Editorial recente deste mesmo periódico(1), a TC é o principal método de imagem relacionado ao crescente aumento da radiação de origem médica de modo geral, principalmente em função da rapidez na realização, disponibilidade e aumento das indicações clínicas, bem como pelo aumento do número de fileiras de cortes nos equipamentos mais modernos.
Em última análise, pode-se listar três pontos principais que contribuem para a redução da radiação gerada pelos exames de TC(2,3): a) substituição do exame de TC por ultrassom (US) ou ressonância magnética (RM) quando indicado; b) realização de exames de TC somente com indicação bem estabelecida; c) otimização dos parâmetros do exame de TC objetivando a redução da dose de radiação sem perda no diagnóstico (princípio ALARA). Neste número da Radiologia Brasileira, Costa et al.(4) apresentam interessante trabalho de pesquisa cujos resultados demonstram que a fase sem contraste intravenoso da TC, realizada previamente à injeção dinâmica de contraste, não contribui significativamente para o diagnóstico final na maioria dos casos indicados para avaliação do abdome(4) e, portanto, poderia ser suprimida. Ainda em número anterior desse mesmo periódico, outro trabalho igualmente interessante do mesmo grupo de pesquisa mostrou que a fase de equilíbrio também acrescenta pouco e pode ser suprimida do exame de TC de abdome para certas indicações clínicas, como estadiamento tumoral, abdome agudo e pesquisa de coleção abdominal(5). Estes dois trabalhos exemplificam um aspecto importante para a redução de radiação nos exames de TC e podem ser classificados como otimização dos parâmetros do exame de TC. No entanto, é necessário lembrar que a criação de protocolos específicos em TC deve considerar as várias indicações possíveis do exame e, obviamente, quanto mais informações clínicas e laboratoriais tivermos, melhor poderemos direcionar o protocolo para responder à solicitação do exame. Nesse aspecto, ambos os trabalhos foram corretos na amostragem dos indivíduos estudados, pois consideraram o atendimento rotineiro das principais indicações no ambiente hospitalar, chegando a um resultado consistente quanto à utilidade das fases sem contraste e de equilíbrio. Considerando ainda os protocolos de exames de TC para avaliação do abdome, é importante salientar que existem evidências que sustentam a realização de TC somente sem contraste intravenoso em casos de abdome agudo, como na suspeita de apendicite aguda, cólica nefrética e diverticulite(6), bem como em algumas situações clínicas de pancreatite aguda(7). Ainda assim, a questão da dose de radiação pode ser um problema quando há abuso na realização de vários controles tomográficos, como pode ocorrer nos casos de litíase urinária(8). Em relação à realização de exames de TC somente com indicação bem estabelecida, é interessante notar que existe uma dificuldade inerente à prática radiológica no questionamento da indicação de exames. Trata-se de questão delicada que envolve a própria sobrevivência financeira dos serviços, bem como a relação profissional com os médicos solicitantes, sendo muito importante que quaisquer decisões e ações sigam os preceitos éticos que guiam a profissão médica e coloquem sempre o paciente em primeiro lugar. Ainda nessa questão, o Colégio Americano de Radiologia procura normatizar as melhores práticas na utilização dos diversos métodos de imagem através do "ACR Appropriateness Criteria", compondo lista das principais situações clínicas com os exames mais indicados conforme dados baseados em evidências(9). Trata-se de esforço contínuo com constantes revisões publicadas por painéis de especialistas à luz de novas evidências. Obviamente, existe uma facilidade, ainda que aparente, no ambiente hospitalar para a discussão clínica de cada caso, bem como maior facilidade na instituição de mecanismos ligados aos sistemas de informação hospitalar e de radiologia (HIS e IRS) para orientar e educar os colegas solicitantes das diversas áreas médicas. Dentro desse tópico existem esforços consideráveis sendo realizados no desenvolvimento de sistemas de suporte de decisão clínica para exames de imagem (Computerized Decision Support (CDS) Systems), os quais analisam os dados clínicos do paciente frente a bancos de dados construídos baseados em evidências, permitindo ao médico recomendar as ações mais adequadas no caso, incluindo recomendação de exame específico ou mesmo a não realização de qualquer exame de imagem(10). Dentre os benefícios dessa estratégia estão a melhora da qualidade e da segurança do atendimento radiológico, bem como redução de custos. Nos casos em que não existe tal facilidade, é extremamente importante assumirmos o papel de pro-motor dos pacientes no que diz respeito a oferecer o melhor atendimento possível, ainda que isso signifique retardar ou mesmo reconsiderar a realização do exame de TC, rediscutindo com o colega solicitante a possibilidade de substituição por outro exame, quer seja US ou RM, a depender da melhor indicação(11). Isso é especialmente importante para crianças ou mulheres em período fértil, pois esses dois grupos de pacientes são mais suscetíveis aos efeitos da radiação ionizante(2,3). Em conclusão, existem várias formas de promover a redução da radiação nos exames de TC, tanto no momento da realização do exame como em discussões clínicas, as quais servem não só para o caso em questão, mas para outras situações clínicas semelhantes. É de extrema importância que os médicos radiologistas estejam sempre cientes do seu papel como orientadores das melhores práticas no diagnóstico por imagem, atuando no auxílio e atualização dos colegas solicitantes, sem perder o foco do que é o mais adequado para cada paciente. Para isso é fundamental que todos busquem se manter constantemente atualizados. REFERÊNCIAS 1. Parente DB. Radiation risk in the indiscriminate use of CT scan. Radiol Bras. 2013;46(2):v–vi. 2. Semelka RC, Armao DM, Elias J Jr, et al. Imaging strategies to reduce the risk of radiation in CT studies, including selective substitution with MRI. J Magn Reson Imaging. 2007;25:900–9. 3. Armao D, Semelka RC, Elias J Jr. Radiology's ethical responsibility for healthcare reform: tempering the overutilization of medical imaging and trimming down a heavyweight. J Magn Reson Imaging. 2012;35:512–7. 4. Costa DMC, Salvadori PS, Monjardim RF, et al. When the non-contrast-enhanced phase is unnecessary in abdominal computed tomography scans? A retrospective analysis of 244 cases. Radiol Bras. 2013;46:197–202. 5. Salvadori PS, Costa DMC, Romano RFT, et al. What is the real role of the equilibrium phase in abdominal computed tomography? Radiol Bras. 2013;46:65–70. 6. Freire Filho EO, Jesus PEM, D'Ippolito G, et al. When and why use unenhanced computed tomography in patients with acute abdomen. Radiol Bras. 2006;39:51–62. 7. Elias J Jr. Utilização da tomografia computadorizada sem contraste e da ressonância magnética no diagnóstico e na estratificação da gravidade da pancreatite aguda. [Tese de Doutorado]. Ribeirão Preto: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo; 2002. 8. Poletti PA, Platon A, Rutschmann OT, et al. Abdominal plain film in patients admitted with clinical suspicion of renal colic: should it be replaced by low-dose computed tomography? Urology. 2006;67:64–8. 9. American College of Radiology. ACR Appropriateness Criteria®. [cited 2013 July 11]. Available from: http://www.acr.org/Quality-Safety/Appropriateness-Criteria. 10. Khorasani R. Computerized physician order entry and decision support: improving the quality of care. Radiographics. 2001;21:1015–8. 11. Amis ES Jr, Butler PF, Applegate KE, et al. American College of Radiology white paper on radiation dose in medicine. J Am Coll Radiol. 2007;4:272–84. Livre-docente, Docente do Centro de Ciências das Imagens e Física Médica do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRPUSP), Ribeirão Preto, SP, Brasil. E-mail: jejunior@fmrp.usp.br |