Paciente de 62 anos, sexo feminino, apresentando quadro de amnésia anterógrada súbita, com duração de 12 horas. Foi realizada ressonância magnética (RM) dois dias após o início do sintoma (Figura 1).
Figura 1. RM do encéfalo. Imagens coronal ponderada em T2 (
A), FLAIR (
B), difusão (
C) e mapa de ADC (
D).
Descrição das imagens
Figura 1. RM do encéfalo. Imagem coronal ponderada em T2 (
A) mostra foco hiperintenso na região lateral do hipocampo direito; FLAIR (
B) demonstra foco hiperintenso no hipocampo direito; difusão (
C) evidencia hipersinal; e mapa de ADC (
D) mostra hipossinal, caracterizando restrição à difusão.
Diagnóstico: Amnésia global transitória.
COMENTÁRIOS
Os primeiros relatos de quadro neurológico transitório com déficit de memória anterógrada foram descritos em 1956 por Guyotat e Courjon(1–5). A incidência varia de 3 a 8 casos por 100.000 pessoas e a taxa de recorrência anual varia entre 6% e 10%(3).
O quadro descrito, denominado amnésia global transitória (AGT), apresenta características transitórias de diminuição abrupta de memória com duração de 4 a 6 horas, em média, podendo durar dias, em pacientes com idade média de 60 anos, com fatores predisponentes como estados emocionais intensos e alterações fisiopatológicas vasculares como hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, migrânea e hipercolesterolemia/dislipidemia(1,2).
O quadro clínico que acompanha tal perda transitória de memória é caracterizado por cefaleia inespecífica de duração variável, náuseas, tonturas e desorientação têmporo-espacial. Há uma relação direta com alterações psiquiátricas, tais como depressão, ansiedade e transtorno de estresse pós-traumático. Admite-se que tal quadro tem como característica fisiopatológica a diminuição da perfusão em região hipocampal e diminuição do fluxo sanguíneo cortical(3). Congestão venosa, com consequente isquemia em estruturas hipocampais, também tem sido associada a quadros de AGT(6–8).
O diagnóstico deve ser feito com base nos dados clínicos e corroborado com exames de RM(4). As sequências ponderadas em difusão mostram pequenos focos de restrição à difusão, notadamente nas porções laterais dos hipocampos (corno de Ammon, região CA1), e que podem ser uni ou bilaterais(4). A sensibilidade da difusão para detectar a característica restrição à difusão depende do intervalo entre o início do quadro e a realização do exame(6,7). No presente caso, a RM foi realizada após 48 horas do início dos sintomas, período em que o método é bastante sensível para detectar as alterações(4). Esta restrição à difusão pode ser decorrente de diferentes mecanismos que levam à falência energética focal(8).
O quadro é autolimitado, com resolução espontânea após o período crítico de isquemia/ hipoperfusão hipocampal(2). A RM evolutiva, na maioria dos casos, não demonstra alterações residuais.
REFERÊNCIAS
1. Quinette P, Guillery-Girard B, Dayan J, et al. What does transient global amnesia really mean? Review of the literature and thorough study of 142 cases. Brain. 2006;129:1640–58.
2. Felix MM, Castro LH, Maia AC Jr, et al. Evidence of acute ischemic tissue change in transient global amnesia in magnetic resonance imaging: case report and literature review. J Neuroimaging. 2005;15:203–5.
3. Lewis SL. Aetiology of transient global amnesia. Lancet. 1998;352:397–9.
4. Winbeck K, Etgen T, von Einsiedel HG, et al. DWI in transient global amnesia and TIA: proposal for an ischaemic origin of TGA. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2005;76:438–41.
5. Guyotat J, Courjon J. Les ictus amnésiques. J Med Lyon. 1956;37:697–701.
6. Godeiro-Junior C, Miranda-Alves MA, Massaro AR. Diffusion magnetic resonance imaging in transient global amnesia. Arq Neuropsiquiatr. 2009;67:130–1.
7. Weon YC, Kim JH, Lee JS, et al. Optimal diffusionweighted imaging protocol for lesion detection in transient global amnesia. AJNR Am J Neuroradiol. 2008;29:1324–8.
8. Sander D, Winbeck K, Etgen T, et al. Disturbance of venous flow patterns in patients with transient global amnesia. Lancet. 2000;356:1982–4.
1. Doutor, Professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil.
2. Doutora, Professora Adjunta da Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.
3. Acadêmico do Curso de Medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil.
Endereço para correspondência:
Dr. Fabiano Reis
Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (HCUnicamp)
Rua Vital Brasil, 251, Cidade Universitária Zeferino Vaz
Campinas, SP, Brasil, 13083 888
E-mail: fabianoreis2@gmail.com
Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil.