RELATO DE CASO
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Autho(rs): Lucy Kerr1; Maria Edith Lutz Vidigal2; Deborah Rozenkwit3 |
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Descritores: Gestação; Câncer; Tireoide; Carcinoma; Papilífero. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
É descrito que o câncer tireoidiano agrava-se durante a gestação(1—3) e o pior prognóstico estaria relacionado ao fator de crescimento mediado pelo receptor estrogênico alfa, cuja expressão está aumentada nos tumores tireoidianos que cursam com a gestação(1). O caso ora relatado mostra um nódulo tireoidiano acompanhado antes, durante a gestação e na lactação, o qual reduziu 58% no seu volume em relação ao exame inicial, quando apresentava citopatologia e ultrassonografia (US) benignas(4). Os aspectos ultrassonográficos sugestivos de malignidade só surgiram durante a gestação e lactação, quando foi repetida a punção aspirativa com agulha fina (PAAF) e diagnosticado como carcinoma papilífero. Neste relato, o acompanhamento evolutivo do caso foi fundamental para a detecção da mudança do padrão morfotextural e do Doppler, sugerindo a malignidade da lesão e possibilitando a conduta adequada. RELATO DO CASO Paciente de 31 anos de idade descobriu, ocasionalmente, nódulo tireoidiano, cuja primeira PAAF, de 9/8/2005, diagnosticou lesão cística hemorrágica benigna. Exame ultrassonográfico de 3/11/2005 revelou nódulo misto do lobo esquerdo (Figura 1) de padrão benigno, medindo 1,2 × 0,8 × 0,6 cm nos diâmetros longitudinal, transversal e anteroposterior, cuja parte cística apresentava nível líquido-líquido, o que sugeria estratificação de densidades, como na mistura óleo-água, frequente na hemorragia intranodular. O estudo com Doppler mostrou um único vaso penetrando a vegetação (Figura 2). Nova US, em 6/10/2006, revelou diminuição de 33% no volume nodular por reabsorção líquida parcial, mas a parte sólida permaneceu inalterada. ![]() Figura 1. Primeiro exame ultrassonográfico (3/11/2005) mostra nódulo misto do lobo tireoidiano esquerdo de padrão morfológico benigno, com parte cística apresentando estratificação de densidades, como na mistura óleo-água, frequente na hemorragia intranodular. ![]() Figura 2. Estudo por Doppler do nódulo do lobo tireoidiano esquerdo mostra vaso penetrando a vegetação sólida (seta), caracterizando-a como tecido vivo (exclui coágulo sanguíneo). Exame ultrassonográfico de 4/11/2009, na 22ª semana gestacional (Figura 3), revelou diminuição nodular de 36% por reabsorção da parte cística, mas a vegetação triplicou de volume e hipervascularizou-se, sendo ambos estes sinais suspeitos de malignidade(1,4,5). Indicou-se segunda PAAF do nódulo tireoidiano direcionada por US, realizada em 23/4/2010, que sugeria duas hipóteses: hiperplasia pseudopapilífera em bócio adenomatoso ou carcinoma papilífero. Exame ultrassonográfico realizado em 10/5/2010, 40 dias após o parto, constatou que o nódulo tireoidiano havia aumentado 2,3 vezes em seis meses, estava totalmente sólido, mal delimitado, hipoecogênico e com microcalcificações, sugerindo malignidade(4) (Figura 4). Foi realizada cirurgia em 20/5/2010, que diagnosticou carcinoma papilífero de padrão clássico encapsulado, de 0,5 cm, estadiamento T1A. ![]() Figura 3. Vigésima segunda semana de gestação. Nódulo do lobo tireoidiano esquerdo em corte longitudinal, com hipervascularização da parte sólida (setas). ![]() Figura 4. Quarenta dias após o parto, o nódulo do lobo tireoidiano esquerdo (setas) está totalmente sólido, mal delimitado, hipoecogênico e com microcalcificações (calipers). DISCUSSÃO A PAAF e a US inicial classificaram o nódulo tireoidiano como benigno, mas era maligno quando operado após três anos, embora a presença de vaso único na região central da nodulação no estudo Doppler inicial seja considerada suspeita de malignidade por alguns autores(6,7). Entretanto, outros autores só consideram o padrão Doppler maligno se totalmente hipervascularizado(4,5,8), e o consenso de 2008 indica PAAF para investigar esses nódulos(5). Duas hipóteses se impõem neste caso: ou o nódulo era benigno e malignizou-se ou sempre foi maligno (falso-negativo da PAAF e US), acelerando seu crescimento durante a gestação. Observa-se que o nódulo reduziu 58% entre a primeira e a terceira US, reabsorveu o conteúdo líquido e surgiram sinais suspeitos: triplicação do tamanho e hipervascularização da parte sólida. É mais provável que já havia malignidade desde o princípio e que a gestação tenha contribuído para o crescimento acelerado do nódulo. A análise evolutiva à US permitiu suspeitar a malignidade, corroborada pela PAAF. Conclui-se que a gestação pode ter influenciado o crescimento de nódulo maligno preexistente e que o seguimento evolutivo foi fundamental para o diagnóstico correto deste caso. REFERÊNCIAS 1. Vannucchi G, Perrino M, Rossi S, et al. Clinical and molecular features of differentiated thyroid cancer diagnosed during pregnancy. Eur J Endocrinol. 2010;162:145—51. 2. Vini L, Hyer S, Pratt B, et al. Management of differentiated thyroid cancer diagnosed during pregnancy. Eur J Endocrinol. 1999;140:404—6. 3. Wémeau JL, Do Cao C. Thyroid nodule, cancer and pregnancy. Ann Endocrinol (Paris). 2002;63:438—42. 4. Kerr L. High-resolution thyroid ultrasound: the value of color Doppler. Ultrasound Q. 1994;12:21—43. 5. Cibas ES, Alexander EK, Benson CB, et al. Indications for thyroid FNA and pre-FNA requirements: a synopsis of the National Cancer Institute Thyroid Fine-Needle Aspiration State of the Science Conference. Diagn Cytopathol. 2008;36:390—9. 6. Chammas MC, Gerhard R, Oliveira IRS, et al. Thyroid nodules: evaluation with power Doppler and duplex Doppler ultrasound. Otolaryngol Head Neck Surg. 2005;132:874—82. 7. Lagalla R, Caruso G, Novara V, et al. Analisi flussimetrica nella patologia tiroidea: ipotesi di integrazione con lo studio qualitativo con color-Doppler. Radiol Med. 1993;85:606—10. 8. Faria MAS, Casulari LA. Comparação das classificações dos nódulos de tireoide ao Doppler colorido descritas por Lagalla e Chammas. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009;53:811—7. 1. Médica Ultrassonografista, Diretora do IKEP-Instituto Kerr de Ensino e Pesquisa e da Sonimage, São Paulo, SP, Brasil. 2. Médica Endocrinologista, Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia, São Paulo, SP, Brasil. 3. Médica Clínica Geral, Estagiária em Ultrassonografia no IKEP-Instituto Kerr de Ensino e Pesquisa, São Paulo, SP, Brasil. Endereço para correspondência: Dra. Lucy Kerr Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 2504, 2º andar, conjunto 21/22, Jardim Paulista São Paulo, SP, Brasil, 01402-000 E-mail: lucykerr@lucykerr.com.br Recebido para publicação em 12/12/2010. Aceito, após revisão, em 11/8/2011. Trabalho realizado no IKEP-Instituto Kerr de Ensino e Pesquisa, São Paulo, SP, Brasil. |