Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 44 nº 3 - Maio / Jun.  of 2011

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 156 to 162



Comparação entre ultrassonografia transvaginal e histerossonografia na avaliação de pacientes com sangramento uterino anormal

Autho(rs): Iêda Maria Silveira Diógenes Feitosa1; Helvécio Neves Feitosa2; Francisco Herlânio Costa Carvalho3; Silvia Menescal Pereira1; Francisco das Chagas Medeiros4

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Texto em Português English Text

Descritores: Ultrassonografia transvaginal; Histerossonografia; Histeroscopia; Sangramento uterino anormal.

Keywords: Transvaginal ultrasonography; Sonohysterography; Hysteroscopy; Abnormal uterine bleeding.

Resumo:
Objetivo: Avaliar a eficácia da ultrassonografia transvaginal (USTV) e da histerossonografia (HSG) e compará-las na avaliação de alterações endometriais em portadoras de sangramento uterino anormal. Materiais e Métodos: Estudo transversal com 30 pacientes, idade entre 29 e 71 anos, 21 delas (70%) na pré-menopausa e 9 (30%) na pós-menopausa. Utilizou-se solução salina a 0,9% para contraste na HSG. Foi considerado o achado histeroscópico e/ou histopatológico como método padrão. Utilizou-se o teste de MacNemar para comparação dos testes diagnósticos. Resultados: A histeroscopia diagnosticou 18 casos (60%) de alterações intracavitárias, sendo 10 pólipos (33,3%). A USTV apresentou sensibilidade e especificidade de 83,3% e a HSG mostrou sensibilidade de 94,4% e especificidade de 91,6%. O teste de MacNemar evidenciou sensibilidade (p = 0,500) e especificidade (p = 1,000) semelhantes entre a USTV e a HSG para detecção de alterações endometriais. No diagnóstico de pólipo, a HSG apresentou maior sensibilidade (90,9% × 27,3%; p = 0,016), com especificidade semelhante (89,5% × 94,7%; p = 1,000). Conclusão: A HSG e a USTV apresentam boas taxas de predição para doenças endometriais em pacientes com sangramento uterino anormal. A HSG apresenta sensibilidade e especificidade semelhantes às da USTV na detecção dessas doenças, porém apresenta sensibilidade maior para pólipos.

Abstract:
Objective: To comparatively evaluate the effectiveness of transvaginal ultrasonography (TVUS) and sonohysterography (SHG) in the assessment of endometrial diseases in women with abnormal uterine bleeding. Materials and Methods: Cross-sectional study with 30 patients, aged from 29 to 71 years, 21 (70%) of them premenopausal and 9 (30%) postmenopausal. Saline solution (at 9%) was utilized as contrast agent for SHG. The MacNemar test was utilized for comparison of diagnostic studies. Results: Hysteroscopy diagnosed 18 cases (60%) of intracavitary alterations, and 10 polyps (33.3%). TVUS demonstrated 83.3% sensitivity and specificity, and SHG showed 94.4% sensitivity and 91.6% specificity. The MacNemar test showed similar sensitivity (p = 0.500) and specificity (p = 1.000) between TVUS and SHG in the detection of endometrial diseases. In the diagnosis of polyp, SHG showed the highest sensitivity (90.9% vs. 27.3%; p = 0.016) with similar specificity (89.5% vs. 94.7%; p = 1.000). Conclusion: SHG and TVUS present a good predictive value for endometrial diseases in patients with abnormal uterine bleeding. SHG and TVUS present similar sensitivity and specificity in the detection of such diseases, but SHG is more sensitive in the detection of polyps.

INTRODUÇÃO

A ultrassonografia pélvica, e especialmente pela via transvaginal (USTV), é um exame propedêutico extensivamente utilizado em ginecologia e obstetrícia. Na gravidez é amplamente utilizada para analisar anatomia embrionária e fetal no primeiro trimestre(1) e para avaliar a biometria e morfologia do colo uterino nas gestações mais avançadas(2), mostrando-se ótimo preditor de parto prematuro(3). Não deixa dúvidas quanto ao benefício em avaliar as massas anexiais(4), incluindo endometriose profunda e seu comprometimento intestinal — comparável à ressonância magnética(5). É o exame propedêutico de imagem mais frequentemente utilizado como primeira linha de investigação nas pacientes com sangramento uterino anormal(6).

O sangramento uterino anormal constitui-se em uma das principais queixas no consultório do ginecologista em qualquer faixa de idade, podendo ser decorrente de anovulação, distúrbios relacionados à gravidez, alterações hormonais ou lesões de natureza benigna ou maligna. Sua etiologia pode variar desde causas anatômicas locais, doenças endócrinas, até outras doenças orgânicas ou fatores iatrogênicos. O foco principal na investigação diagnóstica dessas pacientes é descartar a possibilidade de carcinoma endometrial e identificar corretamente causas anatômicas locais, como pólipos e miomas uterinos, que possam necessitar de tratamento cirúrgico ou distúrbios funcionais que requeiram tratamento clínico(6).

A histerossonografia (HSG) — instilação de solução salina estéril intrauterina por intermédio de cateter — foi inicialmente descrita por Nannini et al. em 1981(7). Outros autores também utilizaram líquidos como expansores da cavidade uterina, para permitir contraste ecográfico com as estruturas adjacentes, possibilitando melhor avaliação do endométrio(8—11). O uso da HSG possibilita a obtenção de melhores imagens em relação à USTV, fornecendo medida mais precisa da espessura endometrial, o que permite avaliar mais claramente a heterogeneidade ou a etiologia do espessamento, além de permitir a distinção entre anomalias focais e difusas(12).

Este estudo teve como objetivo determinar o valor da HSG e da USTV na detecção de alterações endometriais em pacientes portadoras de sangramento uterino anormal e comparar as sensibilidades e as especificidades dos exames na detecção dessas doenças.


MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de estudo de teste de diagnóstico, comparativo, transversal e observacional realizado no Setor de Ultrasssonografia da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand da Universidade Federal do Ceará (UFC). Foram recrutadas 30 pacientes com idade variando de 29 a 71 anos, portadoras de sangramento uterino anormal (menorragia, metrorragia ou sangramento pós-menopausa sem uso de terapia hormonal). Vinte e uma (70%) delas encontravam-se na pré-menopausa e nove (30%), na pós-menopausa. Foram excluídas todas as pacientes grávidas e usuárias de anticoncepcionais. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFC e desenvolvido no período de julho a dezembro de 2003.

Após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, todas as pacientes foram submetidas a anamnese e exame ginecológico como passos iniciais da propedêutica, bem como para diagnosticar e tratar processos infecciosos genitais. Realizou-se, a seguir, ultrassonografia pélvica e USTV, HSG e histeroscopia (HSC), nessa ordem.

Os resultados do método ultrassonográfico foram expressos utilizando-se os seguintes critérios: cavidade normal, espessamento endometrial (> 14 mm para pacientes na pré-menopausa e > 5 mm para pacientes na pós-menopausa) e atrofia endometrial (espessura endometrial < 4 mm)(13). Foram considerados pólipos as lesões nodulares hiperecogênicas na cavidade endometrial e miomas submucosos as lesões de ecogenicidade mista ou hipoecoica, alterando o contorno da cavidade endometrial. Os achados suspeitos de neoplasia foram considerados quando o eco endometrial era irregular ou de ecotextura variável(10). Todas as pacientes realizaram a HSG, em seguida à USTV, mesmo quando o resultado desta foi normal. Utilizou-se aparelho ultrassonográfico modelo Sonoline Versa Pro (Siemens; Erlangen, Alemanha) com sonda vaginal de 6,5 MHz e sonda convexa de 3,5 MHz para o exame pélvico, ambas multifrequenciais. Todas as USTVs e as HSGs foram realizadas por um único examinador, que possui Título de Especialista em Ginecologia e Obstetrícia e Habilitação em Ultrassonografia em Ginecologia e Obstetrícia pela Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. Na execução da HSG, com a paciente em posição ginecológica, foi realizado exame especular a fim de visualizar o colo uterino e descartar a presença de muco purulento. Posteriormente, precedeu-se a antissepsia vaginal utilizando solução de iodopovidona tópica. Realizou-se a cateterização do canal cervical com sonda tipo uretral de Nelaton® número 8, já preenchida pelo líquido (solução salina estéril a 0,9%) e acoplada a seringa de 20 ml, para diminuir a produção de artefatos, a exemplo da presença de ar na cavidade uterina. A sonda foi fixada com uma pinça de Cherron, sendo em seguida introduzida até que atingisse o fundo da cavidade uterina. Utilizou-se pinça de Pozzi, quando necessário, para melhor fixação do colo uterino e para facilitar a introdução da sonda. Em seguida, o espéculo era cuidadosamente retirado e era introduzido o transdutor vaginal, procedendo-se a análise das imagens concomitante à infusão da solução. A espessura endometrial foi mensurada separadamente na sua camada anterior e posterior, no plano sagital, excluindo-se as zonas hipoecoicas adjacentes.

Os resultados do exame de HSG foram expressos utilizando-se os critérios preconizados por Bernard et al.(13): cavidade normal, espessamento endometrial (espessura endometrial de uma única camada > 6 mm para paciente na pré-menopausa e > 3 mm na pós-menopausa), atrofia endometrial (espessura endometrial de uma única camada < 2 mm). Os pólipos foram diagnosticados quando observado espessamento hiperecogênico focal bem delimitado.

Todas as pacientes foram submetidas a HSC, que foi considerado o método padrão. O achado histeroscópico foi definido como normal (endométrio normal ou atrófico) ou anormal (espessamento focal ou difuso, pólipo, mioma ou sinéquia). Todas as HSCs foram realizadas por um único examinador, que não teve acesso aos resultados obtidos pelos métodos ultrassonográfico ou histerossonográfico. Durante a realização da HSC foi realizada biópsia endometrial em todas as pacientes, mas o exame histopatológico foi conclusivo em apenas 24 casos, sendo considerado material insuficiente para análise em seis casos. Os exames histopatológicos foram realizados no Departamento de Patologia e Medicina Legal da Faculdade de Medicina da UFC. Os resultados foram considerados normais na presença de endométrio proliferativo, secretor, atrófico ou de maturação irregular; ou anormais, na presença de pólipos, hiperplasia simples ou complexa com ou sem atipias, mioma ou carcinoma endometrial.

Foi feito o cálculo do tamanho da amostra utilizando-se, no período considerado, o total de unidades de observação (mulheres) disponíveis igual a 200, ao nível de significância de 5% e considerando-se uma margem de erro de estimativa igual a 16%, sendo encontrado um n de 30. A análise estatística foi realizada com auxílio do programa SPSS 10.0 (SPSS Co.; Chicago, IL, EUA) e foi composta de: análise descritiva, cálculo de estimativas de sensibilidade, especificidade com seus respectivos erros padrões, valores preditivos positivos (VPP) e negativos (VPN), taxas de falso-positivos (FP) e falso-negativos (FN), valor de predição (acurácia), razão de verossimilhança positiva (RVP) e negativa (RVN) para alterações endometriais. Utilizou-se o teste de MacNemar para comparação das sensibilidades e especificidades dos exames diagnósticos. O nível de significância adotado foi de 0,05 (5%).


RESULTADOS

O estudo incluiu, inicialmente, 40 pacientes portadoras de sangramento uterino anormal. Entretanto, foram excluídas dez mulheres pelos seguintes motivos: quatro por apresentarem estenose cervical que impossibilitou a realização da HSG, cinco por não terem realizado HSC (método padrão) e uma por recusa à participação no estudo. Não houve complicações, sendo que apenas duas pacientes relataram leve desconforto.

Ao exame de HSC, 12 pacientes (40%) apresentavam cavidade endometrial normal, sendo diagnosticadas 18 pacientes com alterações intracavitárias (60%). Os pólipos foram as lesões mais frequentes, tendo sido encontrados em 10 mulheres (33,3%), seguidos do espessamento endometrial difuso em 3 (10%), espessamento endometrial localizado em uma (3,3%), mioma submucoso em 2 (6,7%), espessamento endometrial difuso com sinéquia em uma (3,3%) paciente e mioma submucoso com pólipo em outro caso (3,3%) (Figuras 1 a 4; Tabela 1). Ao exame histopatológico verificou-se um achado de hiperplasia endometrial simples sem atipias e um carcinoma endometrial de células claras. No primeiro caso, a USTV e a HSG revelaram-se normais e a HSC revelou pólipo endometrial. No segundo caso, a USTV e a HSG revelaram espessamento endometrial e a HSC revelou espessamento endometrial com vascularização atípica.


Figura 1. USTV evidenciando espessamento endometrial de ecotextura variável.


Figura 2. HSG demonstrando claramente a presença de imagem hiperecogênica à esquerda (pólipo). Observa-se, à direita, sombra acústica produzida por presença de gás na cavidade (artefato). Mesma paciente da Figura 1.


Figura 3. HSG demonstrando imagem hiperecogênica única sugestiva de pólipo endometrial – corte sagital.


Figura 4. HSG demonstrando imagens hiperecogênicas multifocais sugestivas de pólipos endometriais. Mesma paciente da Figura 3, após mudança da posição do transdutor – corte parassagital.




Realizou-se análise dos resultados dos exames de USTV e HSG para o diagnóstico de todas as alterações (Tabela 2) e especificamente para o achado de pólipo endometrial (Tabela 3). Utilizou-se como método padrão a HSC e foram avaliadas as propriedades de cada exame. Foram consideradas as prevalências estimadas de alterações endometriais de 40% e de pólipos de 30% (Tabela 4).








A HSG permitiu a detecção de 17 das 18 mulheres com alterações intracavitárias (sensibilidade de 94,4%) e foi concordante com a HSC em 10 dos exames normais (especificidade de 83,3%). Houve dois diagnósticos falso-positivos e um falso-negativo. Para o diagnóstico específico de pólipo, o exame foi consistente na detecção de 10 dos 11 casos (sensibilidade de 90,9%) e foi compatível com ausência de pólipo em 17 dos 19 casos sem o referido achado (especificidade de 89,5%). Em duas oportunidades o exame forneceu resultado falso-positivo, sendo falso-negativo em um caso.

O exame de USTV permitiu a detecção de 15 das 18 mulheres com alterações intracavitárias (sensibilidade de 83,3%), sendo o resultado do exame compatível com a normalidade em 10 casos em que não havia alteração endometrial (especificidade de 83,3%). O diagnóstico foi falso-positivo em duas oportunidades e falso-negativo em três outras. Para o diagnóstico específico de pólipo, o exame permitiu a detecção de 3 dos 11 casos (sensibilidade de 27,3%) e foi compatível com a ausência de pólipo em 18 dos 19 casos sem esse achado (especificidade de 94,7%). O resultado do exame foi falso-positivo em um caso e falso-negativo em oito oportunidades.

O teste de MacNemar revelou semelhança estatística na sensibilidade (83,3% × 94,4%; p = 0,500) e na especificidade (83,3% × 83,3%; p = 1,000) para os exames de USTV e HSG no diagnóstico das lesões intracavitárias. Especificamente para o diagnóstico de pólipos, a especificidade foi estatisticamente semelhante (94,7% × 89,5%; p = 1,000) e a sensibilidade foi maior para a HSG (90,9% × 27,3%; p = 0,016) quando comparada à USTV (Tabela 5).




DISCUSSÃO

A HSG melhora a detecção de doenças endometriais, tais como pólipos, miomas, hiperplasia, câncer e sinéquias. Em adição, ajuda a evitar procedimentos diagnósticos invasivos e melhorar a avaliação pré-operatória de mulheres que necessitam de intervenção terapêutica. É fácil e rapidamente realizado, com custo razoável e bem tolerado pelas pacientes, além de desprovido de complicações relevantes(10).

Neste estudo, que objetivou a comparação entre a HSG e a USTV no diagnóstico de alterações endometriais, utilizou-se a HSC como método padrão na maioria dos casos e não o exame anatomopatológico da peça cirúrgica completa, pois a indicação de histerectomia ficou restrita a poucos casos. Utilizou-se a HSC com essa finalidade, pelo fato de sua alta sensibilidade e especificidade na detecção das anormalidades intracavitárias já terem sido demonstradas(14).

Decidiu-se incluir pacientes com sangramento uterino anormal, independentemente do seu achado ultrassonográfico, para que alterações endometriais discretas e subdiagnosticadas pela USTV não fossem excluídas, o que poderia limitar a interpretação dos resultados, e para que a comparação entre os vários métodos pudesse ser realizada. Outro estudo nacional incluiu somente pacientes com anormalidades à USTV(15).

Um mesmo examinador realizou a USTV e a HSG, o que elimina as diferenças interobservadores. Um único examinador realizou todas as HSCs com biópsia dirigida, “cego” em relação aos resultados dos exames anteriores, para evitar indução de possíveis diagnósticos.

A HSC possibilitou o diagnóstico de 18 anormalidades intracavitárias (60% das pacientes com sangramento uterino anormal). Os pólipos foram as lesões mais prevalentes (33,3%). Dados semelhantes foram descritos por outros autores. Clevenger-Hoeft et al.(16) encontraram 32,5% (26 casos) em pacientes com sangramento uterino anormal e 10% (10 casos) em pacientes assintomáticas. Schwärzler et al.(17), em avaliação pré-operatória da cavidade uterina de 98 pacientes com sangramento uterino anormal, a despeito do tratamento clínico, encontraram anormalidades endometriais em 52 delas (53%). Dueholm et al.(18) observaram 35% de pólipos ou miomas em uma série de 470 pacientes com sangramento uterino anormal na pré-menopausa.

No presente estudo houve apenas um caso de hiperplasia endometrial, que tinha resultado da USTV e da HSG “normais”, achado semelhante ao verificado por Ceccato Jr. et al.(19). O carcinoma endometrial (de células claras) foi corretamente identificado pelo “espessamento endometrial” à USTV e “espessamento endometrial assimétrico” à HSG.

A HSG foi bastante eficaz no diagnóstico de alterações uterinas. Encontraram-se sensibilidade de 94,4% e especificidade de 83,3%, semelhantes ao verificado em outros estudos(13,17,20).

Na mesma comparação entre os exames, outros autores demonstraram maior sensibilidade para a HSG no diagnóstico de anomalias intracavitárias(12,17). Além disso, demonstrou-se alto VPN, o que implica baixo número de lesões não diagnosticadas. Schwärzler et al.(17), em estudo de 104 pacientes, mostraram que a HSG aumentou a taxa de detecção de pólipos de 56% para 84%, porém constataram que a detecção de lesões pré-neoplásicas e neoplásicas do endométrio não foi melhorada pela HSG. Talvez isto se deva ao fato de a HSG ter maior acurácia na identificação de lesões focais do que no diagnóstico de lesões difusas, particularmente mais associadas a lesões malignas. Na nossa casuística houve um número muito pequeno dessas lesões, inviabilizando a análise específica.

No que diz respeito à avaliação de pólipos, a HSG apresentou maior sensibilidade (90,9% × 27,3%; p < 0,016) e mesma especificidade (89,5% × 94,7%; p = 1,000) quando comparada à USTV. A HSG possibilitou a redução do número de achados falso-negativos para pólipo de oito para um, aumentando o número de falso-positivos de um para dois. Schwärzler et al.(17) verificaram que a HSG diminuiu os achados falso-negativos de 11 para 4 sem aumentar o número de falso-positivos. Jacques et al.(21) relataram acurácia de 91,3% e Kamel et al.(22), de 93,3% para diagnóstico de pólipo com a HSG em pacientes com sangramento uterino anormal. Gunes et al.(23), avaliando 83 pacientes com suspeita de anormalidade da cavidade endometrial, observaram 16 pólipos. No estudo desses autores, a HSG apresentou sensibilidade de 80%, especificidade de 87%, VPP de 25%, VPN de 93%, RVP de 6,1 e RVN de 0,23. Na nossa casuística esses valores foram, respectivamente, de 90,9%, 89,5%, 78,7%, 95,8%, 8,64 e 0,10. Ou seja, os valores encontrados para o exame de HSG foram aproximadamente iguais entre a nossa pesquisa e a de Gunes et al.(23), exceto a sensibilidade superior e o VPP muito superior na nossa população. Albuquerque et al.(24) encontraram maior capacidade da HSG em identificar pólipo quando comparada à USTV.

Considerou-se, na presente pesquisa, a avaliação de pacientes na pré e pós-menopausa, entendendo ser esse um grupo de apresentação muito frequente nos consultórios ginecológicos. Várias casuísticas avaliaram em separado essas pacientes.

Karageyim Karsidag et al.(25), avaliando 36 mulheres na pós-menopausa com sangramento uterino recorrente após dilatação e curetagem, analisaram a capacidade dos vários métodos em diagnosticar lesões intracavitárias focais. A curetagem não possibilitou o diagnóstico de 70% das lesões focais. Ao comparar a HSG com a USTV, encontraram sensibilidade maior (93% × 63%) e especificidade menor (56% × 78%) para a HSG e concluíram, assim, que em mãos experientes a HSG pode ser um método inicial de avaliação da cavidade uterina nessas pacientes.

Em estudo prospectivo, Erdem et al.(26) analisaram 122 mulheres com sangramento uterino anormal na pré e pós-menopausa. A HSG demonstrou sensibilidade de 97,7% e especificidade de 82,4%, enquanto a USTV mostrou sensibilidade de 83% e especificidade de 70,6%. Seus achados histológicos foram: 34 cavidades endometriais normais, 61 pólipos, 19 miomas submucosos, 4 miomas não relacionados com a cavidade e 4 hiperplasias endometriais. Aproximadamente um terço (38/122; 31,1%) das HSCs realizadas não apresentavam alterações da cavidade endometrial e poderiam ser consideradas “desnecessárias”. Eles concluíram que a HSG é melhor que a USTV isolada na avaliação da cavidade endometrial.

Moschos et al.(27) avaliaram, prospectivamente, 88 mulheres na peri e pós-menopausa (idade > 40 anos) com sangramento uterino anormal e USTV, identificando um “endométrio anormal”. Concluíram que a HSG foi superior à biópsia (sonda de Pipelle) em diagnosticar doenças endometriais (89% × 52%; p < 0,001), descrevendo nível de evidência II. Albuquerque et al.(24) compararam a USTV, a HSG e a HSC em pacientes com sangramento uterino anormal (53 pacientes na pré e pós-menopausa), considerando o achado histopatológico como método padrão. Encontraram, respectivamente, sensibilidades de 83, 94% e 94% (estatisticamente semelhantes) e especificidades de 69%, 77% e 91%. Houve diferença estatística entre as especificidades da USTV e da HSC (p = 0,008).

Elsayes et al.(10), em artigo de revisão, consideram a HSG tipicamente indicada no sangramento uterino anormal tanto na pré-menopausa, para distinguir sangramento anovulatório de lesões anatômicas, quanto na pós-menopausa, para diferenciar atrofia endometrial de anomalias intracavitárias que podem necessitar de biópsia e/ou ressecção cirúrgica. O principal objetivo do exame não é o resultado histopatológico, mas diferenciar casos normais de anormais, e quando anormais, se a doença é focal (< 25% da cavidade comprometida) ou difusa, o que permite o próximo passo no acompanhamento: HSC ou dilatação e curetagem. Esses dados também são consistentes com um editorial de 2007 que sugeria espaço para a HSG na avaliação de pacientes com sangramento uterino anormal (pré ou pós-menopausa) após USTV normal(6).

A ótima acurácia diagnóstica da HSG, aliada ao custo de algumas HSCs desnecessárias, podem motivar o uso combinado da USTV com a HSG na avaliação de pacientes portadoras de sangramento uterino anormal na pré e na pós-menopausa para avaliar doenças benignas — a principal causa de sangramento uterino anormal tanto na pré (pólipos, miomas) quanto na pós-menopausa (atrofia) —, pois não existe limite para a espessura endometrial aquém do qual se pode afastar doenças benignas em que investigação adicional da cavidade uterina poderia ser evitada(6,28). Skaznik-Wikiel et al.(28) encontraram aproximadamente 25% de doenças benignas com espessura endometrial < 5 mm.

Para outros autores, a maior aplicabilidade da HSG seria para avaliar risco de câncer endometrial, que diagnosticado precocemente tem chance de cura de praticamente 100%. Sua incidência na pós-menopausa com sangramento uterino anormal é de aproximadamente 10%, sendo o sangramento uterino anormal a principal forma de apresentação clínica dessa doença(29). No entanto, a HSG não vai substituir o papel da USTV como ferramenta inicial na avaliação do sangramento uterino anormal na pós-menopausa, em virtude da altíssima sensibilidade da USTV (maior que a das outras propedêuticas, como HSG, HSC e mesmo biópsia não focal), além da facilidade de acesso, tolerabilidade, custo, possibilidade de diagnóstico de outros problemas não cavitários, etc.(28,29).

A HSG vem ocupando seu lugar na avaliação de pacientes com sangramento uterino anormal, ou pacientes assintomáticas com endométrios anormais à USTV na pré e pós-menopausa, para avaliar doenças benignas e malignas. Em virtude da sua ótima correlação com a avaliação histeroscópica, torna-se uma alternativa quando a HSC não está disponível, principalmente em países em desenvolvimento, pois é de execução fácil, rápida, barata e bem tolerada(6,23,29). No entanto, algumas perguntas ainda carecem de respostas: é a HSG capaz de diminuir a incidência de HSCs negativas? Em qual população se aplicaria melhor? Seu benefício clínico é somente para alterações focais? Alguns estudos de custo-efetividade também são necessários antes de sua total inclusão em protocolos de avaliação de pacientes com sangramento uterino anormal e extrapolação para populações maiores.


CONCLUSÕES

A HSG e a USTV apresentam boas taxas de predição para doenças endometriais em pacientes com sangramento uterino anormal. A HSG apresenta sensibilidade e especificidade semelhantes às da USTV na detecção dessas anormalidades, porém apresenta sensibilidade maior na detecção de pólipos.


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1. Mestras em Tocoginecologia, Médicas Ginecologistas da Prefeitura Municipal de Fortaleza e da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil.
2. Doutor, Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Fortaleza (Unifor), Fortaleza, CE, Brasil.
3. Doutor, Vice-coordenador do Mestrado em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, CE, Brasil.
4. Doutor, Vice-coordenador do Departamento de Saúde Materno-Infantil da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, CE, Brasil.

Endereço para correspondência:
Dr. Francisco Herlânio Costa Carvalho
Departamento de Saúde Comunitária – UFC
Rua Professor Costa Mendes, 1608, 5º andar, Bairro Rodolfo Teófilo
Fortaleza, CE, Brasil, 60430-140
E-mail: herlaniocosta@uol.com.br

Recebido para publicação em 9/2/2011. Aceito, após revisão, em 27/4/2011.

Trabalho realizado na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand – Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, CE, Brasil.
 
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