ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Renata Freire de Moraes1; José Cláudio Meneghetti2; Adelanir Antonio Barroso3 |
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Descritores: Disfunção ventricular esquerda; Dobutamina; Cintilografia. |
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Resumo: INTRODUÇÃO
O universo de portadores de cardiomiopatia isquêmica cresce progressivamente no mundo todo, principalmente em razão da queda da mortalidade consequente ao tratamento eficaz das síndromes coronarianas agudas. Dois terços dos pacientes com insuficiência cardíaca apresentam doença arterial coronariana como principal etiologia(1). Em longo prazo, o prognóstico da insuficiência cardíaca é bastante desfavorável, respondendo por 20% das admissões hospitalares de indivíduos maiores de 65 anos, apresentando mortalidade anual próxima a 45%(2). A disfunção ventricular isquêmica pode resultar da presença de cicatriz ou hibernação, atordoamento e précondicionamento isquêmico como respostas adaptativas dos miócitos à diminuição do fluxo sanguíneo, reduzindo seu metabolismo para se manterem vivos(2,3). O curso evolutivo da cardiomiopatia isquêmica pode ser modificado na recuperação da contratilidade miocárdica, restabelecido o fluxo sanguíneo coronariano(4). A identificação do miocárdio viável torna-se propedêutica fundamental, pois na presença de tecido vivo poderá ocorrer recuperação contrátil pós-revascularização, com melhora da qualidade de vida e diminuição da mortalidade(4–8). Allmann et al.(9), em meta-análise, verificaram significativa associação entre revascularização e melhora da sobrevida em coronariopatas com disfunção ventricular viável em testes de imagem e o resultado foi melhor quanto mais deteriorada se apresentou a função ventricular esquerda. Pacientes com viabilidade tratados cirurgicamente apresentaram taxa de mortalidade anual de 3,2%, comparada com a taxa de 16% naqueles submetidos a tratamento medicamentoso. Mais de 40% dos pacientes revascularizados apresentam melhora da fração de ejeção do ventrículo esquerdo. Verificou-se ainda maior mortalidade pósoperatória na ausência de viabilidade, refletindo o alto risco do procedimento na ausência de benefício clínico. A cintilografia com tálio-201 e a ecocardiografia de estresse são os métodos de imagem mais utilizados na busca do miocárdio viável, considerando-se a menor disponibilidade de métodos como a tomografia por emissão de pósitrons e a ressonância magnética(10). O tálio-201, análogo do potássio, identifica integridade celular e a ecocardiografia avalia reserva contrátil pelo estímulo inotrópico da dobutamina(11). Os dois métodos descritos avaliam parâmetros distintos de viabilidade miocárdica, acarretando diferenças na acurácia; o tálio- 201 tem alta sensibilidade e a ecocardiografia, alta especificidade(12,13). As imagens de gated SPECT permitem a avaliação da contratilidade miocárdica, possibilitando a pesquisa de reserva contrátil com avaliação simultânea da integridade celular, o que potencialmente acarretaria incremento na especificidade da cintilografia na busca do miocárdio viável(14). O objetivo deste estudo foi verificar se as informações de reserva contrátil miocárdica pelo gated SPECT sob baixas doses de dobutamina melhoram a especificidade da cintilografia de perfusão miocárdica duoisotópica na identificação do miocárdio viável. MATERIAIS E MÉTODOS Avaliaram-se, por meio de técnicas cintilográficas, a integridade celular e a reserva contrátil de 260 segmentos miocárdicos de 13 pacientes portadores de cardiomiopatia isquêmica, com infarto prévio, encaminhados ao serviço de medicina nuclear para pesquisa de viabilidade miocárdica. Os pacientes foram posteriormente revascularizados e submetidos a controle cintilográfico para avaliação do desempenho contrátil pós-revascularização. A pesquisa foi aprovada pelas comissões de normas éticas das instituições envolvidas e os pacientes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido para participação no protocolo de pesquisa. Os pacientes apresentaram média de idade de 58,9 anos, sendo 12 (92,3%) homens e uma (7,6%) mulher. O tempo médio de infarto do miocárdio variou entre 3 e 15 meses e todos os pacientes exibiram disfunção segmentar contrátil ao ecocardiograma. Deste grupo, 7 (54%) foram previamente revascularizados, 11 (84,6%) referiam angina, todos (100%) eram hipertensos, 9 (69,2%) eram dislipidêmicos e 5 (38,4%), diabéticos. Sete pacientes (53,8%) usavam regularmente beta-bloqueadores, sete (53,8%) usavam vasodilatadores e seis (46,1%), bloqueadores de canais de cálcio. Realizou-se a cintilografia de perfusão miocárdica duoisotópica com imagens de estresse (99mTc-sestamibi), repouso e redistribuição (cloreto de tálio-201) para pesquisa de viabilidade miocárdica. As imagens de estresse (99mTc-sestamibi) foram adquiridas em sincronismo com o eletrocardiograma (gated SPECT), permitindo a avaliação funcional contrátil através da análise da motilidade parietal e espessamento sistólico (contratilidade), fração de ejeção e volumes cardíacos. Adicionou- se uma segunda aquisição (gated SPECT) na vigência de baixas doses de dobutamina, para avaliação da reserva contrátil miocárdica. Considerou-se como parâmetro de viabilidade miocárdica a melhora da disfunção contrátil no estudo cintilográfico pósrevascularização (99mTc-sestamibi gated SPECT). Protocolo de aquisição das imagens O exame foi realizado em protocolo de dois dias, com etapas de repouso/redistribuição e estresse em dias diferentes. As imagens foram captadas na posição supina, com os membros superiores elevados, em câmara de cintilação modelo Vari- Cam® (Elscint; Haifa, Israel) com detectores em ângulo de 90° entre si, acoplada a estação de trabalho eNtegra® (General Electric; Milwaukee, WI, EUA). Utilizou-se colimador de alta resolução, em órbita circular de 180°, iniciando em projeção oblíqua anterior direita de 45° com passo angular de 6°, matriz de 64 × 64, zoom de 1,28 e janela de 10% no fotopico de 140 keV para aquisições com 99mTc-sestamibi e de 72 e 163 keV para imagens com tálio-201. Não foi realizada correção de atenuação. As etapas de repouso e redistribuição foram realizadas após jejum de quatro horas, na dose de 130 MBq de cloreto de tálio-201(IPEN-CNEN), administrada por via intravenosa, com imagens de repouso adquiridas após 20 minutos em 30 passos de 35 segundos, e de redistribuição, 4 a 6 horas após em 30 passos de 45 segundos. Para as etapas de estresse físico ou farmacológico permitiu-se o consumo de refeições leves até duas horas antes e os pacientes foram encorajados a suspender o uso de beta-bloqueadores, bloqueadores de canais de cálcio e vasodilatadores por período de 48 horas. O estresse físico foi realizado como exercício isotônico máximo com teste ergométrico em esteira rolante utilizando-se o protocolo de Bruce com monitoração hemodinâmica e eletrocardiográfica contínua. A dose do 99mTc-sestamibi, de 925 MBq, foi injetada no pico do esforço, atingida a frequência submáxima, 60 segundos antes do término do exercício, e as imagens foram adquiridas 60 minutos após. Para o estresse farmacológico empregou- se o dipiridamol com suspensão prévia de xantinas, cafeína e derivados. A dose (0,56 mg/kg) foi administrada por via intravenosa durante 5 minutos sob monitoração hemodinâmica e eletrocardiográfica contínua. O radiofármaco foi injetado 2 minutos após o término da infusão do vasodilatador coronariano e as imagens cintilográficas foram obtidas 90 minutos depois. Adquiriram-se dois grupos de imagens tomográficas (gated SPECT) na etapa de estresse, em condições basais e na vigência de baixas doses de dobutamina, com o ciclo cardíaco dividido em 8 quadros e imagens adquiridas em 30 passos de 30 segundos (Figura 1). Concluída a primeira aquisição, iniciava-se a infusão contínua de 5 µg/kg/min de dobutamina em veia periférica através de bomba de infusão por 5 minutos, aumentando para 10 a 15 µg/kg/ min, coincidindo com o início da aquisição das imagens até o final da aquisição (média de 15 minutos). Figura 1. Aquisição e processamento do gated SPECT. A: Representação eletrocardiográfica do ciclo cardíaco. B: Aquisição das imagens representativas do ciclo cardíaco dividido em oito quadros. C: Curva tempo-atividade do traçador durante o ciclo cardíaco. Processamento das imagens As imagens foram processadas por retroprojeção filtrada, filtro Butterworth, com frequência de corte 0,25 e ordem de 5 para o cloreto de tálio-201 e frequência de corte 0,5 e ordem de 5 para o 99mTc-sestamibi. Para a análise dos resultados utilizou-se o método Cedars Sinai Quantitative SPECT QGS/QPS, Berman, Germano (Elgems GE), com a divisão do coração em 20 segmentos e quantificação automática da perfusão, contratilidade e motilidade parietal nos diferentes momentos do estudo (Figuras 2 e 3). O método aumenta o número de parâmetros importantes que podem ser medidos objetivamente e com reprodutibilidade(15). Figura 2. Modelo de segmentação miocárdica. Segmentos miocárdicos: anterior distal (1), médio (7), basal (13); ântero-septal distal (2), médio (8), basal (14); ínfero-septal distal (3), médio (9), basal (15); inferior distal (4), médio (10), basal (16); ínfero-lateral (5), médio (11), basal (17); ântero-lateral (6), médio (12), basal (18); ântero-apical distal (19), ínfero-apical distal (20). Figura 3. Representação gráfica das imagens funcionais de gated SPECT. Da esquerda para a direita: imagens do coração no final da sístole e diástole para avaliação do espessamento sistólico; mapas polares da perfusão para análise da reversibilidade perfusional, representação tridimensional do coração com delimitação do epicárdio e endocárdio para visualização da motilidade parietal; valores de fração de ejeção, volumes diastólico e sistólico finais; representação esquemática da quantificação dos parâmetros funcionais dos 20 segmentos miocárdicos do ventrículo esquerdo. Controle evolutivo A partir do terceiro mês após a revascularização miocárdica foi realizado estudo cintilográfico (99mTc-sestamibi gated SPECT) pós-revascularização, com imagens tomográficas adquiridas 45 minutos após a administração intravenosa de 99mTc-sestamibi em condições basais. Análise dos resultados Para avaliar a viabilidade perfusional, analisou-se a diferença significativa entre os escores dos segmentos miocárdicos nas etapas de estresse e repouso e repouso e redistribuição. Para avaliar a reserva contrátil miocárdica, verificou-se a diferença entre os escores referentes ao espessamento sistólico e motilidade parietal em condições basais e sob estímulo inotrópico. Para análise da melhora da contratilidade pós-revascularização, comparou-se a diferença entre os escores referentes à contratilidade em condições basais e pós-revascularização. Analisaram-se, ainda, os valores de volumes diastólico e sistólico finais e a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) em condições basais, sob estímulo inotrópico e pós-revascularização. Para estimar a especificidade do método, avaliou-se a presença de reserva contrátil nos segmentos com disfunção contrátil e viabilidade miocárdica ao tálio-201, e a melhora da contratilidade no controle cintilográfico pós-revascularização. Análise estatística Realizou-se análise descritiva das variáveis estudadas. Para as variáveis categóricas foram construídas tabelas de distribuição de frequências e para as contínuas foram calculadas medidas de tendência central e de dispersão. Para comparação dos padrões de perfusão, contratilidade e motilidade parietal dos segmentos miocárdicos nas diferentes situações foi utilizado o teste de homogeneidade marginal. Para comparar a relação entre melhora pós-revascularização e reserva contrátil foi utilizado o teste de McNemar. Para comparar as medidas de volumes diastólico e sistólico finais e valores de fração de ejeção foi utilizado o teste não paramétrico de Wilcoxon (para amostras pareadas), dado o caráter assimétrico da distribuição em questão. Em todas as análises foi considerado o nível de 5% de significância. Foram utilizados, nas análises, os softwares SPSS 12.0 e StatXact 6.0. RESULTADOS No estudo cintilográfico proposto, os pacientes não relataram sintomas durante a infusão intravenosa de dobutamina. Sete (53,8%) pacientes realizaram estresse farmacológico e seis (46,2%), exercício isotônico. A angioplastia com implante de stent coronariano foi realizada em nove (69,2%) pacientes e a cirurgia de revascularização miocárdica, em quatro (30,7%). O controle cintilográfico pós-cirúrgico foi realizado em período médio de 8,8 meses após o procedimento. Parâmetros funcionais em condições basais e sob estímulo inotrópico As Tabelas 1 e 2 mostram diferenças estatisticamente significativas entre os dois momentos (valor-p < 0,001), verificando-se melhor contratilidade e motilidade parietal com estímulo de baixas doses de dobutamina em relação ao estudo basal. Em média, os volumes médios diastólico e sistólico finais foram menores com uso de dobutamina (143,7 e 87,8) e maior no estudo basal (151 e 100,6). O percentual médio da FEVE foi menor na condição basal (35%) que sob estímulo da dobutamina (41%). Parâmetros funcionais em condições basais e no controle pós-revascularização As Tabelas 3 e 4 apresentam comparações entre contratilidade e motilidade parietal dos segmentos na condição basal e na pós-revascularização. Percebem-se diferenças estatisticamente significativas entre os dois momentos (Tabela 3, valor-p < 0,001; Tabela 4, valor-p = 0,003), com maior contratilidade e motilidade parietal pós-revascularização, comparadas ao basal. Verificou-se que, em média, os volumes diastólico e sistólico finais foram menores pós-revascularização (136,6 e 85), comparados ao basal (151 e 100,6). O percentual médio da FEVE foi menor na condição basal (35%) e maior na pós-revascularização (41%). Análise do desempenho contrátil no controle cintilográfico pósrevascularização dos segmentos com disfunção contrátil viáveis ao tálio-201 Cinquenta e oito (22,4%) segmentos miocárdicos com disfunção contrátil apresentaram isquemia estresse-induzida e 63 (24,3%) apresentaram hipoperfusão persistente viáveis ao tálio-201. Ao todo, 98 segmentos (37,8%) se apresentaram viáveis, ou seja, apresentaram isquemia estresseinduzida, viabilidade ao tálio-201 ou ambos, simultaneamente. Ao comparar a contratilidade basal e pós-revascularização dos 98 segmentos, percebe-se que há diferenças estatisticamente significativas entre os dois momentos (valor-p = 0,008), com melhora da contratilidade pós-revascularização. A Tabela 5 mostra que 58 segmentos não melhoraram a contratilidade pós-revascularização, e desses, a grande maioria (84,5%) não tinha reserva contrátil. O valor- p do teste de McNemar mostrou-se limítrofe (0,061), evidenciando uma tendência a um resultado estatisticamente significativo. Na comparação entre a motilidade parietal basal e pós-revascularização dos 98 segmentos viáveis ao tálio-201, não se pode afirmar que houve diferenças estatisticamente significativas entre os dois momentos (valor-p > 0,05). Verificou-se, ainda, que 59 segmentos não melhoraram a motilidade pós-revascularização. Desses segmentos, a maioria (78%) não tinha reserva contrátil. Todavia, de acordo com o valor-p do teste de McNemar (> 0,05), esse resultado não é estatisticamente significativo. DISCUSSÃO Trata-se de protocolo de exame simples e de fácil execução. Os pacientes toleraram bem o procedimento cintilográfico proposto e não apresentaram sintomas durante a infusão intravenosa de dobutamina. Segundo Kasama et al.(16), que realizaram gated SPECT sob baixas doses de dobutamina em 26 pacientes com miocardiopatia dilatada, a dobutamina em baixas doses apresenta potente efeito cronotrópico e mínimo efeito arritmogênico ou vascular. O tamanho da amostragem foi considerado fator limitante do estudo. A pesquisa do miocárdio viável através dos estudos de perfusão e metabolismo miocárdico pela medicina nuclear coincide com os relatos iniciais de viabilidade miocárdica. As técnicas radioisotópicas precisam de poucas células viáveis para demonstrar integridade celular, mas estas podem ser insuficientes para a recuperação contrátil pós-revascularização. Parece existir uma quantidade mínima de miocárdio viável para detecção de reserva contrátil(17). Na tentativa de melhorar a especificidade do tálio-201, método amplamente utilizado, alguns autores já relataram experiências com gated SPECT na vigência de dobutamina em baixas doses, à semelhança da ecocardiografia de estresse, para permitir a análise da perfusão e reserva contrátil miocárdica durante um único exame. Diferentes autores também demonstraram ser esta técnica bastante reprodutível em relação ao ecocardiograma de estresse e à ressonância magnética(18,19). Yoshinaga et al.(20), em estudo com 23 pacientes comparando gated SPECT Tc-sestamibi sob baixa dose de dobutamina com ecocardiografia de estresse e tomografia por emissão de pósitrons, evidenciaram boa correlação entre os resultados de reserva contrátil nos dois métodos. Leoncini et al.(21), em estudo com 63 pacientes com gated SPECT 99mTc-sestamibi sob baixa dose de dobutamina obtiveram 79% de sensibilidade e 78% de especificidade em predizer o aumento da FEVE após revascularização quando ocorrido o aumento da FEVE com estímulo inotrópico. Simões et al.(22) demonstraram aumento da acurácia do método de 0,69 para 0,84 com as informações de reserva contrátil através do gated-SPECT tálio-201 sob baixa dose de dobutamina. Duncan et al.(23) estudaram 16 pacientes com gated SPECT Tc-sestamibi e atestaram a efetividade do exame em predizer o aumento da fração de ejeção pós-revascularização, à semelhança de Leoncini et al.(21). Para os 13 pacientes da amostra do estudo considerou-se presença de viabilidade miocárdica ao tálio-201 a reversibilidade perfusional entre as etapas de perfusão, independente do grau de captação. Kitsiou et al.(24) demonstraram que defeitos reversíveis são mais acurados em predizer a recuperação contrátil após a revascularização que defeitos fixos com captação acima de 50%, pois frequentemente trata-se de fibrose subendocárdica que pode não melhorar a contração após revascularização. Para que ocorra a recuperação do desempenho contrátil após a revascularização é necessário que exista isquemia miocárdica, ou seja, a artéria responsável pelo suprimento sanguíneo do território deve apresentar-se estenótica, do contrário, na presença de dano estrutural celular não ocorrerá recuperação contrátil pós-revascularização(25). Candell-Riera et al.(26) realizaram pesquisa de reserva contrátil através de gated SPECT com baixa dose de dobutamina em coronariopatas crônicos e observaram que muitos segmentos miocárdicos normais ou viáveis do ponto de vista perfusional não apresentavam reserva contrátil, não recuperavam a contratilidade após a revascularização e eram irrigados por artérias patentes. A presença de reserva contrátil foi considerada quando ocorreu melhora da contratilidade nos segmentos miocárdicos investigados, independente do aumento da FEVE com o estímulo inotrópico. O aumento da FEVE variou entre os pacientes de acordo com os parâmetros de viabilidade. Quanto mais viável do ponto de vista perfusional, mais acentuado era o aumento da FEVE com baixas doses de dobutamina. Para que ocorra aumento da FEVE após revascularização é preciso uma extensão de pelo menos 25% de tecido viável(27). Na avaliação dos parâmetros funcionais verificaram-se volumes diastólico e sistólico finais aumentados e valor médio de FEVE diminuído em condições basais, demonstrando a presença de cardiomiopatia isquêmica significativa entre os pacientes. Com o estímulo da dobutamina os volumes cardíacos diminuíram e os valores de FEVE aumentaram com significância estatística, e o mesmo ocorreu comparando-se os mesmos parâmetros em condições basais e pós-revascularização. Schinkel et al.(28) referem como objetivos principais da revascularização miocárdica a melhora da FEVE (função sistólica global), diminuição dos volumes diastólico e sistólico (remodelação reversa), além da melhora da contratilidade segmentar e consequente melhora dos sintomas da insuficiência cardíaca, melhora da qualidade de vida e queda da mortalidade (morte súbita). Para investigação da reserva contrátil avaliou-se isoladamente a melhora da motilidade parietal e espessamento sistólico nos segmentos com disfunção contrátil considerados viáveis ao tálio-201. A análise isolada do espessamento sistólico, como parâmetro funcional de reserva contrátil, mostrou resultados com significância estatística limítrofe, demonstrando tendência a alta especificidade da pesquisa de reserva contrátil, com valores próximos aos encontrados na literatura para o ecocardiograma de estresse(11). A análise do espessamento sistólico foi estatisticamente mais significativa que a análise da motilidade parietal, em conformidade com dados da literatura. Métodos de imagem tomográficos que permitem a avaliação do espessamento das paredes miocárdicas, como ecocardiograma, tomografia computadorizada, ressonância magnética e gated SPECT, permitem a análise do espessamento sistólico, que é considerado indicador de alterações isquêmicas mais sensível que a motilidade parietal(29). CONCLUSÕES A cintilografia de perfusão miocárdica (gated SPECT) com duplo isótopo, com informações adicionais sobre reserva contrátil através da avaliação do espessamento sistólico na vigência de baixa dose de dobutamina, tende a apresentar contribuições efetivas para a busca do miocárdio viável. Agradecimentos Ao professor doutor Alfonso Barbato, à médica nuclear Cristina Yamashiba e à equipe Nuclear Medcenter. REFERÊNCIAS 1. Gheorghiade M, Bonow RO. Chronic heart failure in the United States: a manifestation of coronary artery disease. Circulation. 1998;97:282–9. 2. Mesquita CT, Félix RCM. Viabilidade miocárdica: uma visão crítica. Programa de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Aterosclerose. 2004;2:27–32. 3. Canty JM, Fallavollita JA. Hibernating myocardium. J Nucl Cardiol. 2005;12:104–19. 4. Dellegrottaglie S, Perrone-Filardi P, Pace L, et al. 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Doutora, Médica Nuclear da Divisão de Medicina Nuclear do Departamento de Imagem e Diagnóstico Molecular do Instituto Hermes Pardini, Belo Horizonte, MG, Brasil. 2. Professor Doutor, Diretor do Serviço de Medicina Nuclear e Imagem Molecular do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil. 3, Mestre, Médico Nuclear, Diretor da Nuclear Medcenter, Belo Horizonte, MG, Brasil. Endereço para correspondência: Dra. Renata Freire de Moraes Instituto Hermes Pardini, Divisão de Medicina Nuclear Rua dos Aimorés, 66, Funcionários Belo Horizonte, MG, Brasil, 30140-070 E-mail: renatafreire@yahoo.com.br Recebido para publicação em 10/1/2010 Aceito, após revisão, em 11/8/2010 Trabalho realizado no Departamento de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), São Paulo, SP, e no Serviço de Medicina Nuclear do Hospital Socor/Nuclear Medcenter, Belo Horizonte, MG, Brasil |