ARTIGO ORIGINAL
|
|
|
|
Autho(rs): Cristiano Montandon, Lucimara Maeda, Susana Trigo Bianchessi, Fabiano Turi, Martin Torriani |
|
Descritores: Músculo iliopsoas. Músculo iliopsoas ¾ tomografia computadorizada. Músculo iliopsoas ¾ patologia. |
|
Resumo: INTRODUÇÃO O compartimento iliopsoas ou retrofascial é um espaço extraperitoneal que contém os músculos psoas maior, psoas menor e ilíaco, recobertos pela fáscia do iliopsoas. Estes músculos se estendem dos processos transversos de T12, vértebras lombares e asa do ilíaco até sua inserção no trocânter femoral menor pelo tendão iliopsoas. Atuam como flexores primários da coxa e do tronco(1). Muitos processos patológicos acometem o compartimento iliopsoas, incluindo condições inflamatórias, hemorrágicas e neoplásicas. Os métodos de imagem, mais comumente a tomografia computadorizada (TC), são de grande importância no reconhecimento e avaliação da extensão dessas patologias(2,3). O objetivo deste trabalho é a revisão das patologias que acometem o compartimento iliopsoas, descrevendo os principais achados tomográficos que auxiliam no diagnóstico diferencial e topográfico das lesões.
MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados, retrospectivamente, 46 casos com acometimento do compartimento iliopsoas estudados por TC e arquivados no Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, nos últimos dez anos. As imagens foram obtidas a partir de cortes axiais do abdome, com 10 mm de espessura e 10 mm de intervalo de corte no abdome superior e com 15 mm de espessura e 15 mm de intervalo de corte na pelve, antes e após injeção intravenosa de meio de contraste iodado. Todos os casos foram confirmados cirurgicamente, anatomopatologicamente e/ou citologicamente por aspirado da lesão.
RESULTADOS Dos 46 casos estudados, 12 (26%) tinham origem neoplásica (primária ou secundária); 21 (45%), infecciosa (inespecífica ou específica); e 13 (28%), por hematoma (traumático ou espontâneo). Radiologicamente, essas patologias apresentam comportamento muito similar. Os principais aspectos tomográficos a serem analisados e que auxiliam no diagnóstico diferencial entre os tipos de lesão incluem(1-4): ¾ Extensão do acometimento muscular (focal ou difuso); ¾ margem da lesão; ¾ densidade e padrão de captação do meio de contraste; ¾ presença de gordura ou calcificação; ¾ associação com linfadenopatia retroperitoneal; ¾ invasão da gordura adjacente; ¾ destruição óssea; ¾ acometimento de outros órgãos abdominais.
DISCUSSÃO Doenças infecciosas Existem várias causas de infecção do compartimento iliopsoas. Atualmente, a maioria dos abscessos tem origem piogênica inespecífica, por Staphylococcus aureus e microrganismos Gram-negativos, decorrentes da disseminação por contigüidade da doença inflamatória de estruturas adjacentes. A origem pode ser na coluna, em processos como discite e abscesso epidural (Figura 1), nos rins, secundários a pionefrose ou abscesso perinefrético (Figura 2), nas alças intestinais, secundários a apendicite, diverticulite ou doença de Crohn, e no pâncreas, nas pancreatites. Os abscessos primários ocorrem menos freqüentemente e em geral são idiopáticos (Figura 3)(2,4-6).
A tuberculose é causa específica de abscesso do compartimento iliopsoas, sendo hoje mais freqüentemente encontrada em pacientes imunodeprimidos (Figura 4), tendo como origem a coluna vertebral (mal de Pott)(2). Outros processos infecciosos específicos mais raros são a brucelose e a paracoccidioidomicose (Figura 5)(6).
Os dados clínicos que favorecem a etiologia inflamatória incluem história de febre e leucocitose. Os achados tomográficos encontrados nos processos inflamatório-infecciosos são de aumento do volume do psoas por lesões de baixa atenuação, com captação anelar após a administração de meio de contraste. A presença de áreas com densidade de ar, apesar de incomum, favorece o diagnóstico de processo infeccioso. Outros achados incluem obliteração da gordura adjacente e destruição óssea. Calcificações contornando o abscesso ou múltiplas cavidades abscedidas auxiliam no diagnóstico de tuberculose(2-5). A aspiração guiada por TC ou por ultra-sonografia (US) confirma o diagnóstico etiológico. Doença neoplásica Neoplasias envolvendo o músculo iliopsoas são comumente secundárias à extensão direta de tumores abdominais e pélvicos, tais como carcinomas ou sarcomas (de cólon, ovário, útero ou trato urinário), de linfonodos acometidos por linfoma (Figura 6), de tumores ósseos pélvicos (Figuras 7 e 8) ou ainda da disseminação hematogênica de neoplasias da mama, do pulmão e melanoma. Neoplasias primárias são mais raras e em geral de origem mesenquimatosa, como os lipossarcomas, os fibrossarcomas, os leiomiossarcomas e os hemangiopericitomas (Figura 9)(2,3,7,8).
Esses processos transcorrem clinicamente silenciosos ou apresentam-se como massas palpáveis associadas a sintomas inespecíficos, como emagrecimento. A história prévia de neoplasia facilita o diagnóstico. Os principais achados tomográficos que favorecem o diagnóstico de neoplasia são lesão de margens irregulares, destruição óssea e associação com linfadenopatia retroperitoneal. A biópsia dirigida por TC ou por US pode ser necessária para o diagnóstico. Dentre as neoplasias, os neurofibromas plexiformes benignos se destacam, e os achados tomográficos são suficientes para o diagnóstico específico(9). A demonstração de massas alongadas, bem delimitadas, com baixa atenuação, bilaterais e simétricas, localizadas ao longo das porções mediais e posteriores do músculo iliopsoas caracterizam os neurofibromas plexiformes (Figura 10).
Doença hemorrágica Hematomas do músculo iliopsoas podem desenvolver-se espontaneamente, como em pacientes com hemofilia e em terapia com anticoagulantes orais (Figura 11), com aneurisma roto da aorta abdominal (Figura 12) ou secundários a tumores. Além disso, podem ser traumáticos, secundários a trauma abdominal fechado ou iatrogênicos (cirúrgico ou após biópsia) (Figura 13)(1,3,10).
Hematomas tendem a envolver o músculo iliopsoas difusamente, apresentando, no exame de TC, aumento difuso de volume e da densidade do músculo. A presença de nível líquido-líquido favorece o diagnóstico de hemorragia. Quando crônicos, podem se apresentar com densidade heterogênea, sendo confundidos com massa necrótica ou abscesso. Nestes casos, o estudo com ressonância magnética pode ser de grande auxílio para o diagnóstico(11). Miscelânea Existe ainda uma série de outras condições que também podem comprometer o músculo iliopsoas, tais como a fibrose retroperitoneal, a atrofia muscular e a calcificação secundária a trauma ou rabdomiólise(12).
CONCLUSÃO A TC é o método de escolha na avaliação do compartimento iliopsoas. Alguns achados isolados podem até auxiliar no diagnóstico etiológico, porém não são específicos para permitir a diferenciação entre as diversas patologias. A análise conjunta entre os dados clínicos e os achados de imagem favorecem o diagnóstico correto. O método é ainda importante na programação terapêutica do paciente (biópsia, aspiração ou drenagem das lesões).
REFERÊNCIAS 1. Torres GM, Cernigliaro JG, Abbitt PL, et al. Iliopsoas compartment: normal anatomy and pathologic processes. RadioGraphics 1995;15:1285-97. [ ] 2. Donovan PJ, Zerhouni EA, Siegelman SS. CT of the psoas compartment of the retroperitoneum. Semin Roentgenol 1981;16:241-50. [ ] 3. Lenchik L, Dovgan DJ, Kier R. CT of the iliopsoas compartment: value in differentiating tumor, abscess, and hematoma. AJR 1994;162:83-6. [ ] 4. Feldberg MAM, Koehler PR, van Waes PFGM. Psoas compartment disease studied by computed tomography. Analysis of 50 cases and subject review. Radiology 1983;148:505-12. [ ] 5. Ralls PW, Boswell W, Henderson R, Rogers W, Boger D, Halls J. CT of inflammatory disease of the psoas muscle. AJR 1980;134:767-70. [ ] 6. Paley M, Sidhu PS, Evans RA, Karani JB. Retroperitoneal collections - aetiology and radiological implications. Clin Radiol 1997;52:290-4. [ ] 7. Cotran RS, Kumar V, Robbins SL. Robbins pathologic basis of disease. 4th ed. Philadelphia: Saunders, 1989:374-80. [ ] 8. Kenny JB, Widdowson DJ, Carty AT, Williams CE. Malignant involvement of the iliopsoas muscle: CT appearances. Eur J Radiol 1990;10: 183-7. [ ] 9. Bass JC, Korobkin M, Francis IR, Ellis JH, Cohan RH. Retroperitoneal plexiform neurofibromas: CT findings. AJR 1994;163:617-20. [ ] 10. Lee JK, Sagel SS, Stanley RJ. Computed body tomography with MRI correlation. New York: Raven, 1989:746-50. [ ] 11. Lee JK, Glazer HS. Psoas muscle disorders: MR imaging. Radiology 1986;160:683-7. [ ] 12. Towers MJ, Downey DB, Poon PY. Psoas muscle calcification and acute renal failure associated with nontraumatic rhabdomyolysis: CT features. J Comput Assist Tomogr 1990;14:1027-9. [ ]
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP. |