QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?
|
|
|
|
Autho(rs): Shri Krishna Jayanthi, Maria da Graça Morais Martin, Marcos Roberto de Menezes, Nestor de Barros, Giovanni Guido Cerri |
|
Nas imagens de tomografia computadorizada (Figuras 2 a 6), observa-se distensão líquida de alças delgadas, com passagem do contraste oral apenas pelos segmentos jejunais. Este aspecto de distensão delgada não apresenta correlação com a radiografia simples, pelo fato de a distensão ter componente predominantemente líquido, o qual tem densidade radiológica semelhante a outras estruturas abdominais, que se superpõem na radiografia. Esta distensão estende-se até o plano das alças ileais, onde se nota interrupção do trânsito por imagem de cálculo, arredondada e com centro de menor densidade, dentro da alça. O aspecto do cálculo, associado ao quadro clínico de abdome agudo obstrutivo, levantou a suspeita de obstrução intestinal por cálculo biliar (íleo biliar). Diante dos dados obtidos, o paciente foi submetido a cirurgia, sendo o achado intra-operatório um quadro de distensão intestinal, tendo-se localizado, por palpação do ponto obstrutivo, e extraído um cálculo de aproximadamente 2,0 cm (Figuras 7 e 8).
COMENTÁRIOS O íleo biliar é uma obstrução mecânica do trato gastrointestinal, decorrente da impactação de um ou mais cálculos biliares na luz intestinal. O quadro clínico é insidioso e muitas vezes não há sinais específicos de doença biliar (por exemplo, icterícia), o que dificulta o estabelecimento do diagnóstico(1,2). Manifesta-se com sintomas inespecíficos, com sinais de patologia intestinal, do espectro obstrutivo, sendo muitas vezes confundido com patologias inflamatórias intestinais (por exemplo, apendicite ou diverticulite) ou patologias isquêmicas intestinais. Como etiopatogenia, temos um quadro-base de colecistopatia calculosa, que evolui num quadro agudo com formação de fístula colecistoentérica. Este episódio de colecistopatia aguda é referido especificamente (dor no hipocôndrio direito) em 30% dos pacientes. Por esta fístula ocorre a passagem de um ou mais cálculos de grandes dimensões para os segmentos intestinais, que podem ser o duodeno (mais freqüente), jejuno, íleo, cólon ou estômago. Este cálculo segue o trajeto intestinal até encontrar um ponto a partir do qual ele não consegue mais progredir, provocando um quadro obstrutivo. A condição mais freqüente é a impactação junto ao íleo terminal, por cálculos maiores que 2,5 cm. Outro local em que pode ocorrer a interrupção é na saída gástrica, causando distensão estomacal obstrutiva (quadro também denominado de síndrome de Bouveret)(2). O grupo etário predominante no íleo biliar é de pacientes idosos entre 70-80 anos, porém pode ocorrer em pacientes mais jovens, como no caso apresentado. O tratamento consiste na remoção cirúrgica do cálculo biliar. Habitualmente não se atua na causa biliar na primeira etapa, para não se estender no tempo cirúrgico nos pacientes mais idosos, e, em geral, estes permanecem assintomáticos, podendo ocorrer até o fechamento espontâneo da fístula no pós-operatório(3). Alguns pacientes podem necessitar de uma segunda abordagem para a realização de colecistectomia, por causa de sintomas relacionados à calculose(1). A mortalidade desta doença está em torno de 15% a 20%, em função da demora do diagnóstico e do grupo etário dos pacientes. À imagenologia, o quadro radiológico clássico consiste na tríade de Rigler: obstrução de alças delgadas, pneumobilia e cálculo biliar ectópico(4). À ultra-sonografia, pode-se evidenciar a imagem calculosa dentro de um segmento de alça, associada a quadro de distensão de alças; a vesícula pode apresentar dimensões variáveis, bem como a presença ou não de cálculos. À tomografia computadorizada, podem-se demonstrar os mesmos sinais vistos à radiografia simples. O local da fístula, muitas vezes, não é caracterizado. Em resumo, o íleo biliar é uma doença que deve ser considerada em pacientes, particularmente os idosos, que apresentam quadro clínico-abdominal obstrutivo agudo(3), associado a alguns achados radiológicos característicos (sinais de distensão delgada, pneumobilia e cálculos ectópicos), cujo diagnóstico precoce permite pronta terapia e evolução mais favorável.
REFERÊNCIAS 1. Malet PF, Soloway RD. Diseases of the gallblader and bile ducts. In: Wyngaarden JB, Smith LS, Bennett JC, eds. Cecil Textbook of medicine. 19th ed. Philadelphia: Saunders, 1992:811. 2. Oikarinen H, Paivansalo M, Tikkakoski T, Saarela A. Radiological findings in biliary fistula and gallstone ileus. Acta Radiol 1996;37:917-22. 3. Lobo DN, Jobling JC, Balfour TW. Gallstone ileus: diagnostic pitfalls and therapeutic successes. J Clin Gastroenterol 2000;30:72-6. 4. Delabrousse E, Bartholomot B, Sohm O, Wallerand H, Kastler B. Gallstone ileus: CT findings. Eur Radiol 2000;10:938-40.
1. Médicos Preceptores de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), São Paulo, SP. 2. Médico Chefe do Serviço de Radiologia do Pronto-Socorro do HC-FMUSP. 3. Professor Doutor do Instituto de Radiologia (InRad) do HC-FMUSP. 4. Professor Titular de Radiologia da FMUSP. Endereço para correspondência: Dr. Shri Krishna Jayanthi. Rua Oscar Freire, 2121, apto. 105. São Paulo, SP, 05409-012. |