RELATO DE CASO
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Autho(rs): Simone Gonçalves Lopes, Edson Marchiori, Julieta Figueiredo Brick, Eduardo Curty Neto, Alexandre Scherman, Ana Carina Gamboa da Silva, Bruno Béber Machado |
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Descritores: Leiomiossarcoma, Intestino grosso, Tomografia computadorizada |
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Resumo:
INTRODUÇÃO O leiomiossarcoma é um tumor formado por células de músculo liso, sendo infreqüente originar-se do aparelho digestivo, ocorrendo, em ordem decrescente de freqüência, no estômago (47,3%), intestino delgado (35,5%), reto (12,5%), cólon e esôfago (2%). Este tipo de tumor dissemina-se por via hematogênica e por contigüidade(1-3). O exame mais sensível para o diagnóstico é o estudo contrastado do intestino, que geralmente mostra massa extraluminal escavada, sendo que os exames radiológicos podem se mostrar negativos em um terço dos casos(1,4). A tomografia computadorizada (TC) e a ultra-sonografia (US) do abdome são úteis para a detecção de grandes massas tumorais, mostrando habitualmente massas com zonas hipoecogênicas/hipodensas no seu interior e sem calcificações(1,5). A arteriografia digital seletiva é um método muito sensível, já que são neoplasias muito vascularizadas(1). Para a diferenciação anatomopatológica entre leiomioma e sarcoma são importantes o número de mitoses, a necrose tumoral, o tamanho, a celularidade e o grau de atipia celular(1). O tratamento é a ressecção cirúrgica, com sobrevida de cinco anos em 40% a 60% dos casos(1,2). Neste trabalho é apresentado um caso de leiomiossarcoma de cólon ascendente em um paciente do sexo masculino, de 49 anos de idade, cujo quadro clínico na apresentação foi de anemia crônica e massa abdominal. O clister opaco evidenciou coleção aérea no hipocôndrio direito, fora da topografia do cólon, deslocamento inferior da flexura hepática e divertículos. A US mostrou lesão expansiva heterogênea, com gás no seu interior, de localização sub-hepática e com volume de 212 ml. A TC do abdome revelou massa cavitada, de parede espessa e nível líquido, localizada em hipocôndrio e flanco direitos, rechaçando as estruturas adjacentes, e que não se impregnou pelo meio de contraste. Laparotomia com hemicolectomia direita e ileocoloanastomose permitiram o estudo histopatológico da lesão, cujo diagnóstico foi de leiomiossarcoma do cólon ascendente.
RELATO DO CASO Paciente do sexo masculino, 49 anos de idade, pardo, casado, natural do Rio de Janeiro, RJ, foi internado no Hospital Universitário Antônio Pedro, em maio de 1999, para investigação de presença de massa abdominal no hipocôndrio direito, associada a anemia ferropriva. Na história patológica pregressa o paciente relatou internação anterior há sete meses, para tratamento de abscesso na região sub-hepática, resolvido por intermédio de drenagem. Negou cirurgias prévias. Relatou, ainda, hipertensão arterial sistêmica, sem tratamento regular. Na história social, referiu etilismo leve (interrompido há sete meses). Dentre os exames realizados na internação, as radiografias simples do abdome mostraram opacidade no hipocôndrio direito, com gás e nível líquido (Figura 1). O clister opaco confirmou presença de coleção aérea localizada no hipocôndrio direito, fora da topografia do cólon, que deslocava inferiormente e para a esquerda a flexura hepática (Figura 2). O trânsito de delgado mostrou o mesmo efeito de massa sobre as alças intestinais (Figura 3). A US do abdome mostrou lesão expansiva heterogênea, com gás no seu interior, em localização sub-hepática, medindo aproximadamente 9 × 8 × 6 cm (volume = 212 cm3). A TC do abdome identificou massa de contornos internos lobulados, com parede espessa e nível líquido, localizada no hipocôndrio e flanco direitos, que não se impregnou de forma significativa pelo meio de contraste venoso. A referida lesão rechaçava as estruturas adjacentes, causando deslocamento inferior e compressão do ângulo hepático do cólon (Figura 4), sendo interpretada como um abscesso de parede abdominal, que foi drenado cirurgicamente, seguido por antibioticoterapia.
O estudo histopatológico da cápsula da lesão revelou tecido necrótico em meio a exsudação de fibrina e processo inflamatório agudo. A cultura do material mostrou crescimento de colônias de Klebsiella pneumoniae e Staphylococcus sciuri. Exames posteriores mostraram persistência da cavidade e drenagem média de 50 ml/dia de secreção castanho-escura fétida. Com o tratamento, obteve melhora e alta para acompanhamento ambulatorial. Em agosto, apresentou recidiva da massa, tendo sido então reinternado e submetido a laparotomia exploradora, com colecistectomia, drenagem de vias biliares, hemicolectomia direita e ileocolonanastomose. A peça de cólon ascendente foi mandada para estudo histopatológico, que revelou neoplasia de músculo liso, confirmada como leiomiossarcoma de intestino grosso. O paciente recebeu hemotransfusões, com melhora da anemia, e alta em setembro, com indicação de tratamento quimioterápico.
DISCUSSÃO Os leiomiossarcomas são tumores raros, formados por células de músculo liso(1). São infreqüentes no aparelho digestivo, ocorrendo, em ordem decrescente de freqüência, no estômago (47,3%), intestino delgado (35,5%), reto (12,5%), cólon e esôfago (2%). No cólon, os locais mais acometidos são o ascendente, o transverso e o sigmóide(1). No intestino delgado, correspondem de 8% a 22% dos tumores malignos, sendo mais comuns no íleo. Já no intestino grosso, os sarcomas correspondem a 0,1% das neoplasias malignas, sendo que o sarcoma mais comum é o leiomiossarcoma(3). É muito raro o leiomiossarcoma ser múltiplo, e não há predominância em relação ao sexo(1). O tamanho varia de 2 a 30 cm, e é difícil, apenas com a história clínica e o exame físico, distingui-lo dos leiomiomas(2,6). Os sintomas são vagos e inespecíficos, do tipo dor abdominal, anemia crônica, alterações do hábito intestinal, febre, calafrios e massa palpável(2,7). Podem manifestar-se hemorragia digestiva, causada por ulceração, sinais de obstrução subaguda, volvo, perfuração espontânea e intussuscepção. Em média, o tempo decorrido entre o início dos sintomas e o diagnóstico é de um ano(1,2,4,6,7). O tumor dissemina-se, principalmente, por via hematogênica, para fígado, pulmões e ossos, ou por invasão direta. Ascite não é freqüente(1-3). O exame mais sensível para o diagnóstico é o estudo contrastado do intestino, que comumente mostra massa extraluminal escavada(1). Os exames radiológicos podem mostrar-se negativos em até um terço dos casos, já que a forma intraluminal é mais rara(4). A TC abdominal é útil para detectar grandes massas tumorais, mas pode falhar em mostrar lesões menores. A US de abdome pode também mostrar as grandes lesões, mas geralmente o exame ecográfico é negativo, por causa da ocorrência de artefatos provocados pela presença de ar no intestino. Os achados na ecografia e na TC são, habitualmente, de massa de grandes dimensões, com zonas hipoecogênicas/hipodensas no seu interior e sem calcificações. Pode haver realce moderado do tumor com o uso de meio de contraste intravenoso. A zona de baixa intensidade no interior da massa corresponde a áreas de necrose ou liquefação(1,5). A arteriografia digital seletiva tem sido descrita como um método muito sensível para o diagnóstico, pois são neoplasias muito vascularizadas. Cintilografia com hemácias marcadas com tecnécio pode ser usada para detectar locais onde ocorreram sangramento de qualquer montante(1). A diferenciação anatomopatológica entre leiomioma e sarcoma não é totalmente clara, sendo baseada em vários critérios. O número de mitoses parece ser a característica mais marcante. Também deve ser considerada a necrose tumoral. Outros parâmetros menores são tamanho, celularidade e atipia celular. Geralmente, os sarcomas são maiores que os leiomiomas e têm celularidade maior(1). O único tratamento é a ressecção, com sobrevida de cinco anos em cerca de 40% a 60%. A cirurgia curativa ideal são as colectomias clássicas, e as paliativas podem ser as derivações internas ou ressecção transmural. Linfonodectomia é controvertida, pois as taxas de metástases linfonodais variam de 5% a 12%, sendo mais freqüentes nos tumores diferenciados. Não há benefício com radioterapia ou quimioterapia(1,2). Os fatores de mau prognóstico são metástases a distância, tumores maiores que 5 cm, perfuração, invasão de órgãos adjacentes e tumores com alto grau de malignidade(2).
REFERÊNCIAS 1. Dendale P, Devis G, Goossens A. Leiomyosarcoma of the small intestine presenting as fever of unknown origin. Gut 1992;33:4113. [ ] 2. Lopes A, Vieira RAC, Oyafuso MS, Rossi BM, Nagakawa WT. Leiomiossarcoma do cólon direito: relato de um caso e revisão da literatura. Rev Bras Cir 1996;86:911. [ ] 3. Meijer S, Peretz T, Gaynor JJ, Tan C, Hajdu SI, Brennan MF. Primary colorectal sarcoma a retrospective review and prognostic factor study of 50 consecutive patients. Arch Surg 1990;125:11638. [ ] 4. Silva RA, Silva MCGB, Farret Jr LC, Bergamo AC, Wawrzeniak AC. Leiomiossarcoma de jejuno revisão da literatura. JBM 1996;71:11720. [ ] 5. Villacastín BP, Robledo AG, Franco A, Miró C, Torres R, Arnal P. Hallazgos en tomografia computadorizada y ecografia de una masa peritoneal. Rev Clin Esp 1991;189:1335. [ ] 6. Arca MJ, Sondak VK, Chang AE. Diagnostic procedures and pretreatment evaluation of soft tissue sarcomas. Semin Surg Oncol 1994;10:32331. [ ] 7. Zilioto Jr A, Mendes JAM, Kunzle JE, Delphini Jr O. Tumores malignos do intestino delgado. Rev Bras Cancerol 1987;33:23540. [ ]
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ. |