ARTIGO DE REVISÃO
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Autho(rs): Márcio Martins Machado, Ana Cláudia Ferreira Rosa, Nestor de Barros, Giovanni Guido Cerri |
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Descritores: Ultra-sonografia, Ultra-sonografia endoscópica, Aparelho digestivo, Pâncreas |
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Resumo:
INTRODUÇÃO A ultra-sonografia endoscópica (USE) mostra-se como metodologia que pode ser usada complementarmente à ultra-sonografia abdominal no estudo das afecções digestivas. Ela associa a utilização de transdutores de alta freqüência com a proximidade destes transdutores com o setor a ser examinado. Dessa forma, a USE permite que se estude a extensão das lesões para as adjacências do seu local de origem, auxiliando também na identificação de invasões vasculares e linfonodomegalias(1-11). Nesse contexto, é importante conhecermos os aspectos sonográficos das doenças estudadas por esse exame, implementando-se o seu diagnóstico.
PÂNCREAS O pâncreas é uma glândula que pode dar origem a grande quantidade de processos patológicos. Apresenta posição retroperitoneal, o que dificulta a sua avaliação. Do ponto de vista técnico, o exame do pâncreas envolve o seu estudo pelo duodeno e pelo estômago, de modo que praticamente toda a glândula pode ser avaliada. Várias são as possibilidades de aplicabilidade da USE no pâncreas. Pode contribuir no estudo dos tumores pancreáticos, na diferenciação entre pancreatite e câncer de pâncreas (embora muitas vezes difícil), na avaliação da extensão da invasão de estruturas adjacentes no caso de tumores malignos, na identificação de tumores neuroendócrinos e no diagnóstico diferencial dos tumores pancreáticos císticos(10,11). Em alguns casos de pancreatite aguda, tidos como de etiologia idiopática, a USE pode demonstrar a presença de microcálculos, mudando a perspectiva terapêutica desses pacientes(7). Nas pancreatites crônicas, encontramos ecogenicidade heterogênea do parênquima pancreático, com zonas hipoecogênicas, separadas por bandas ecogênicas e hiperecogênicas. O aumento do calibre e a irregularidade do ducto de Wirsung também podem ser notados. Nos casos mais graves existe maior heterogeneidade parenquimatosa, com calcificações, que podem ser grosseiras, dificultando inclusive o estudo dos contornos pancreáticos(7). Os cálculos no interior do ducto de Wirsung sugerem o diagnóstico de pancreatite crônica. Como é sabido da história evolutiva das pancreatites crônicas, em alguns pacientes podemos ter lesões focais que se assemelham a tumores pancreáticos malignos (forma pseudotumoral da pancreatite crônica). Nos casos de tumores malignos, observa-se habitualmente a presença de uma área hipoecogênica, de delimitação variável do restante do parênquima pancreático, podendo ser demonstrada também invasão vascular e linfonodomegalia. O ducto de Wirsung também se apresenta usualmente dilatado. Na pancreatite crônica, forma "pseudotumoral", observamos uma área de padrão ecográfico sólido e heterogêneo, podendo estar associados outros achados sonográficos da pancreatite crônica (como descritos anteriormente). Essa dificuldade diagnóstica (pancreatite crônica pseudotumoral × adenocarcinoma de pâncreas) também é observada nos dados de história clínica e mesmo nas biópsias, uma vez que, com freqüência, observamos pancreatite crônica circundando o adenocarcinoma pancreático(10,11). Todos esses dados reiteram que nem sempre é possível o diagnóstico diferencial pré-operatório entre essas duas entidades. Nos casos de tumores pancreáticos (Figura 1), estuda-se também a extensão do tumor para os tecidos adjacentes, em especial os vasos. No planejamento terapêutico, é importante que se determine se há ou não invasão do eixo venoso esplênico-mesentérico-portal e das artérias mesentérica superior e hepática. A USE pode demonstrar a compressão desses vasos e irregularidades de suas paredes, sugerindo a invasão vascular (9-11).
A USE auxilia, ainda, na identificação de tumores neuroendócrinos do pâncreas, como os gastrinomas, os insulinomas, os glucagonomas, os somatostatinomas e outros. Esses tumores podem se mostrar menores que 1,5 cm, o que representa alguma dificuldade de localização pelos exames pré-operatórios. Dentre esses tumores, os insulinomas têm importância de destaque, por causa da sua maior freqüência(9-11). Os tumores neuroendócrinos usualmente são identificados como lesões hipoecogênicas, bem delimitadas. Em alguns casos, em que as lesões são maiores, podemos observar áreas císticas, pequenas, no interior da lesão(10,11). Devemos observar, também, que os tumores pancreáticos podem ser císticos. Dentre estes, podemos ter os tumores císticos mucinosos e serosos. Mais precisamente, teríamos os cistoadenomas ou cistoadenocarcinomas. Segundo alguns autores, os tumores císticos serosos tendem a se apresentar como múltiplos diminutos cistos ("microcistos"), fato que pode ser prontamente demonstrado pela USE. A esse aspecto microcístico dá-se o nome de aspecto em "favo de mel"(10,11). Os tumores císticos mucinosos apresentam tendência estabelecida de se malignizar (cistoadenocarcinoma mucinoso). É referido que essas lesões possuem cistos maiores que aqueles dos tumores císticos serosos, podendo se apresentar como grandes neoplasias císticas. Entretanto, especialmente em lesões císticas mucinosas menores que 5 cm, o aspecto pode ser multicístico. A análise cuidadosa das características desses tumores císticos mucinosos mostra que, neles, os cistos são consistentemente maiores que 0,5 cm, o que favorece no diagnóstico diferencial com os tumores císticos serosos, nos quais os cistos são consistentemente menores(10,11).
REFERÊNCIAS 1. Jochem RJ, Reading CC, Dozois RR, Carpenter HA, Wolff BG, Charboneau JW. Endorectal ultrasonographic staging of rectal carcinoma. Mayo Clin Proc 1990;65:1571-7. [ ] 2. Roubein LD, David C, DuBrow R, et al. Endoscopic ultrasonography in staging rectal cancer. Am J Gastroenterol 1990;85:1391-4. [ ] 3. Corman ML. Carcinoma of the rectum. In: Corman ML, ed. Colon and rectal surgery. 3rd ed. Philadelphia, PA: JB Lippincott, 1993:596-720. [ ] 4. Torres GM. Endoscopic ultrasonography. In: Gore RM, Levine MS, Laufer I, eds. Textbook of gastrointestinal radiology. 1st ed. Philadelphia, PA. WB Saunders, 1994:127-39. [ ] 5. Yasuda K, Nakajima M, Kawai K. Technical aspects of endoscopic ultrasonography of the biliary system. Scand J Gastroenterol Suppl 1986;123:143-6. [ ] 6. Mitake M, Nakazawa S, Naitoh Y, et al. Endoscopic ultrasonography in diagnosis of the extent of gallbladder carcinoma. Gastrointest Endosc 1990;36:562-6. [ ] 7. Ganc AJ, Ardengh J. Ultra-sonografia endoscópica em gastroenterologia. In: Mincis M, ed. Gastroenterologia e hepatologia. Diagnóstico e tratamento. São Paulo, SP: Lemos Editorial, 1998:65-80. [ ] 8. Mukai H, Nakajima M, Yasuda K, Mizuno S, Kawai K. Evaluation of endoscopic ultrasonography in the pre-operative staging of carcinoma of the ampulla of Vater and common bile duct. Gastrointest Endosc 1992;38:676-83. [ ] 9. Maluf Filho F. Contribuição da ecoendoscopia à avaliação das neoplasias malignas do pâncreas e da papila duodenal maior. [Tese de Doutorado]. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2000. [ ] 10. Boyce GA, Sivak MV Jr. Endoscopic ultrasonography in the diagnosis of pancreatic tumors. Gastrointest Endosc 1990;36(2 Suppl):S28-32. [ ] 11. Fein J, Gerdes H. Localization of islet cell tumors by endoscopic ultrasonography. Gastroenterology 1992;103:711-5. [ ]
* Trabalho realizado no Instituto de Radiologia (InRad) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) e no Departamento de Radiologia do Hospital Sírio Libanês, São Paulo, SP. |