Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 35 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2002

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 71 to 75



Análise de achados de imagem e alterações clínicas em pacientes com linfoma

Autho(rs): Flávio Augusto Ataliba Caldas, Caroline Tsumori Motomiya, Helena Cristina da Silva

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Texto em Português English Text

Descritores: Linfoma, Tomografia computadorizada, Ultra-sonografia

Keywords: Lymphoma, Computed tomography, Ultrasonography

Resumo:
A tomografia computadorizada é atualmente o estudo de imagem de escolha para a detecção e estadiamento de linfomas. A tomografia computadorizada é capaz de mensurar com acurácia significativa a extensão e o volume do tumor e prover informações que possam ser usadas para planejar uma estratégia terapêutica apropriada. O presente trabalho teve como objetivo descrever e analisar os achados de imagem obtidos por meio de tomografia computadorizada de tórax e abdome, acompanhada de ultra-sonografia de abdome total de pacientes com diagnóstico de linfoma e com sorologia negativa para o vírus HIV, alterações clínicas, como a queixa que levou o paciente a procurar o serviço de saúde, já revelando sinais de acometimento da doença linfocitária, neste momento ainda não diagnosticada, e alterações ao exame físico nesta primeira consulta. A amostra estudada foi composta por 30 pacientes, sendo que, destes, 40% teriam o diagnóstico de linfoma não-Hodgkin, 46,6% de linfoma Hodgkin, 10% de linfoma de Burkitt e 3,3% com o diagnóstico de linfoma linfoblástico.

Abstract:
Computed tomography is currently the method of choice for the diagnosis and staging of lymphomas. Computed tomography enables accurate measurement of both tumor extent and volume and provides information that can be used to plan an appropriate strategy for the treatment. The purpose of the present article is to describe and analyze the chest and abdomen computed tomography and ultrasound findings in HIV-negative patients with lymphoma. Clinical abnormalities, such as the reason the patient sought medical assistance already showing evidence of lymphocytic disease (not yet diagnosed at this point) and the physical examination abnormalities seen on the first consultation were also studied. This study comprised 30 patients: 40% with non-Hodgkin lymphoma, 46.6% with Hodgkin lymphoma, 10% with Burkitt's lymphoma and 3.3% with lymphoblastic lymphoma.

 

 

INTRODUÇÃO

Manter-se atualizado ao rápido avanço das tecnologias de imagem é um desafio para radiologistas e clínicos, que devem integrar a maioria destes progressos a fim de otimizar os cuidados ao paciente, resultando no menor custo possível(1).

A tomografia computadorizada (TC) se destaca por oferecer informação adicional aos resultados obtidos com outros métodos diagnósticos, fazendo possível a detecção de infiltração linfomatosa em diversos órgãos abdominais, incluindo os gânglios retroperitoneais, pélvicos, mesentéricos e outros(1,2). Além disso, a TC pode determinar a verdadeira extensão da enfermidade, de tal forma que se faz possível detectar o processo linfomatoso das diferentes cadeias ganglionares intra e retroperitoneais, assim como infiltração neoplásica ao fígado, baço, rins, pâncreas, tubo digestivo, entre outros(2,3).

A TC tem muitas utilidades na avaliação do linfoma de Hodgkin (LH) e do linfoma não-Hodgkin (LNH), definindo a extensão da doença para o estadiamento acurado, norteando o plano de tratamento, avaliando a resposta da terapia e monitorizando o progresso da doença e possíveis recidivas(4).

A ultra-sonografia (US) é um método de imagem útil para a avaliação de adenopatias paraaórticas e também pode detectar linfonodos aumentados isolados de cadeias linfocitárias. No entanto, segundo Redman et al.(5), o método mais acurado para a avaliação linfográfica superficial e profunda ainda é a TC.

A incidência de LH e LNH é de 8% de todas as doenças malignas, entretanto esses linfomas são potencialmente curáveis. A extensão da doença é o fator mais importante que influencia a remissão e a sobrevida dos pacientes(1).

Os linfomas representam a sétima causa mais comum de mortes nos Estados Unidos. Oitenta por cento dos pacientes se apresentam ao médico com linfadenopatia superficial, geralmente localizada no pescoço e com menor freqüência na axila e na região inguinal(2).

Como os linfomas não são tratados cirurgicamente e nem todas as lesões podem ser submetidas à biópsia, do ponto de vista ético e prático, a verdadeira sensibilidade, especificidade e acurácia da modalidade das imagens usadas para o estadiamento não podem ser avaliadas. Dados da literatura geralmente comparam duas modalidades de imagens: sítios concordantes da doença, que são considerados doença real, e sítios discordantes, que são discriminados por biópsia, quando possível, ou por seguimento clínico e radiológico(1,3).

A característica mais comum do linfoma é a linfadenopatia clinicamente palpável. Pode haver envolvimento de qualquer cadeia linfática do corpo, e a linfadenomegalia é o achado mais comumente encontrado em TC(2,4).

Em relação aos achados histológicos dos linfomas Hodgkin e não-Hodgkin, a Tabela 1 mostra a classificação internacional e sua prevalência.

 


 

O presente trabalho teve como objetivo descrever e analisar achados de imagem em pacientes com diagnóstico confirmado de linfoma, a queixa principal que os levou a procurar o serviço de saúde, revelando já algum tipo de manifestação da doença linfocitária, ainda não diagnosticada neste momento, e alterações no exame físico destes pacientes nesta consulta inicial.

 

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Foi realizado estudo retrospectivo de 30 pacientes que tinham diagnóstico anatomopatológico de linfoma. A confirmação do diagnóstico se deu em 70% por biópsia de gânglios linfóides, em 23,3% por biópsia de massa linfóide encontrada por laparotomia exploratória, em 3,3% por biópsia de tonsila e em 3,3% por biópsia de pele.

A amostra estudada era formada por 53,3% pacientes do sexo masculino e 46,6% do sexo feminino, sendo a variação etária de dois a 75 anos, com a média de 27,7 anos, e todos com sorologia negativa para o vírus HIV.

Tais pacientes tinham exames de imagens (TC de tórax e abdome e US de abdome total) realizados com fins diagnósticos ou de estadiamento, e acompanhamento terapêutico, de janeiro de 1996 a janeiro de 2001, no Departamento de Hematologia do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília, SP.

As tomografias foram realizadas em aparelho General Electric modelo 9800, e os ultra-sons, em aparelho Toshiba Ecocee, no Serviço de Diagnóstico por Imagem do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília. Nas tomografias, a técnica empregada foi espessura de corte de 10 mm, tempo de aquisição de três segundos, com matriz 512 × 512, sendo todos os exames realizados com administração de meio de contraste iodado por via oral e por via endovenosa, para aqueles pacientes submetidos a TC de abdome.

A partir de uma revisão dos prontuários destes pacientes, levantou-se qual era a principal queixa que os fizeram procurar o serviço de saúde, nesta data já revelando acometimento do linfoma que seria ainda diagnosticado, quais as alterações do exame físico nesta primeira consulta e quais os achados nos exames de imagem.

 

RESULTADOS

Aspectos clínicos

Quanto ao diagnóstico, 46,6% dos pacientes eram portadores de LNH, 40% tinham LH, 10% tinham linfoma de Burkitt (LB) e 3,3% eram portadores de linfoma linfoblástico (LL).

A principal queixa que levou o paciente pela primeira vez a procurar o serviço de saúde, quando já se revelava algum acometimento causado pela doença, neste momento ainda não descoberta, foi: 53,3% com queixa de caroço pelo corpo, sendo metade deles diagnosticado LH e metade LNH; 6,6% dos pacientes eram incomodados por tosse, e seu diagnóstico, posteriormente descoberto, seria de LH; 23,3% do total de pacientes reclamavam de emagrecimento, dos quais 13,3% saberiam mais tarde serem portadores de LH, 6,6% de LNH e 3,3% de LB; a dispnéia levou 10% dos pacientes ao médico, dos quais 6,6% descobririam mais tarde serem portadores de LNH e 3,3% de LL; a dor também foi responsável por levar 10% dos pacientes ao médico, dos quais 6,6% teriam diagnóstico de LB e 3,3% teriam diagnóstico de LNH. Dos pacientes adiante com diagnóstico de LNH, 3,3% do total queixavam-se de tontura e 3,3% queixavam-se de prurido e manchas pelo corpo, odinofagia e hematêmese. Massa abdominal foi o que chamou a atenção em 10% dos pacientes, que mais tarde 3,3% saberiam do diagnóstico de LB e 6,6% de LH. O enfraquecimento preocupou 6,6% dos pacientes, levando ao diagnóstico, mais tarde, de LH. A febre foi responsável pela descoberta de 13,3% dos pacientes com linfoma, sendo metade deles com LH e metade com LNH.

Ao exame físico desta consulta foram encontradas as seguintes alterações: aumento de lifonodos em 63,3% dos pacientes, dos quais 33,3% mais tarde saberiam ser portadores de LH e 30% de LNH; em 23,3% dos pacientes foi encontrada massa abdominal palpável, e posteriormente 3,3% teriam diagnóstico de LNH, 10% de LH e 10% de LB; à hepatimetria encontrou-se aumento do tamanho do fígado em 30% dos pacientes, sendo 6,6% com LB, 10% com LH e 13,3% com LNH; o baço estava aumentado em número igual de pacientes com LH e LNH, totalizando 6,6%; 23,3% dos pacientes estavam descorados, sendo diagnosticado, mais tarde, que 3,3% teriam LL, 3,3% apresentariam LNH, 6,6% LB e 10% LH; a ausculta pulmonar estava diminuída em 10% dos pacientes, dos quais, posteriormente, 3,3% teriam o diagnóstico de LNH e 6,6% de LH; sibilos foram auscultados em um paciente (3,3%) com LL; a febre foi constatada em 6,6% dos pacientes, sendo todos com diagnóstico de LH. Apenas um paciente (3,3%) estava com lesões eritematosas com margens irregulares pelo corpo, com diagnóstico de LNH. Neste exame físico, 10% dos pacientes com diagnóstico futuro de LNH estavam sem alterações.

Aspectos de imagem

Em relação aos achados de imagem encontrados na TC de tórax e abdome e US de abdome total, realizadas em todos os 30 pacientes da amostra, eles foram os seguintes (Tabela 2): em 50% dos pacientes foi encontrada linfadenomegalia (Figura 1), sendo 16,6% com LNH, 30% com LH e 3,3% com LB. Em relação ao acometimento do baço, encontrou-se esplenomegalia em 33,3% dos pacientes (Figuras 4, 5 e 6), sendo 3,3% com LNH, 20% com LH e 10% com LB, e nódulo esplênico esteve presente em 6,6% dos pacientes, metade destes com LH e metade com LNH. Em número igual de pacientes com LH e LNH (6,6% de cada) foi encontrado derrame pleural (Figuras 4 e 7). Em nosso estudo, a hepatomegalia foi achado de imagem em 53,3% do total de pacientes, 23,3% com diagnóstico de LNH, 23,3% com LH e 6,6% com LB (Figuras 4, 5 e 6). Líquido livre na cavidade peritoneal foi encontrado em 6,6% dos pacientes com LNH. Um paciente com LNH (3,3%) estava com espessamento pleural ao exame tomográfico; nódulo pulmonar foi um dos achados em 10% dos pacientes, sendo um terço com LH e dois terços com LNH; também em 6,6% dos pacientes, porém com LH, observou-se infiltrado alveolar; em 10% dos pacientes foi detectada massa linfóide (Figura 8), sendo 3,3% com diagnóstico de LNH e 6,6% com LH. Em um paciente (3,3%) encontrou-se aumento homogêneo do timo, com diagnóstico de LH. Os exames de imagem abordados neste estudo mostraram que 13,3% dos pacientes — 10% com LNH e 3,3% com LH — não cursaram com nenhuma alteração.

 


 


 


 


 


 


 


 


 


 

DISCUSSÃO

Aspectos clínicos

O presente trabalho mostrou que o estudo de imagem foi mais sensível e de maior acurácia na detecção das alterações decorrentes de linfoma quando comparado ao exame clínico. Um motivo levantado que justifique essa parcial discrepância é o fato de o exame físico abordado neste estudo ter sido feito apenas no momento de admissão do paciente, e os exames tomográficos e ultra-sonográficos, ao revés, eram, além dos de admissão e diagnóstico, os de seguimento da doença.

Aspectos de imagem

O acometimento hepático foi o achado mais freqüente em nossa casuística. Dos 30 pacientes, 18 (60%) cursavam com hepatomegalia homogênea ou nódulo hepático — sete (23,3%) com LH e 11 (36,6%) com LNH —, porcentual compatível com o estudo de Levitan et al.(6), que revelou que o fígado é o lugar de envolvimento secundário em 60% dos pacientes com LH e 50% daqueles com LNH. Outro dado que foi compatível com a literatura foi a linfadenomegalia como achado de imagem em 50% dos pacientes estudados. Harris et al.(7) concluíram que o achado mais comum intratorácico do linfoma são os linfonodos mediastinais aumentados.

O nosso estudo foi discordante de outros autores quanto ao acometimento esplênico. Na casuística de Thomas et al.(8), grande massa solitária esplênica foi o achado mais comum em pacientes com LNH, e no nosso trabalho o achado mais relevante foi a esplenomegalia homogênea, na maioria em pacientes com LH. Além disso, 16,6% dos pacientes deste estudo que tinham diagnóstico de LNH estavam com esplenomegalia, porcentagem bem abaixo da relatada por Harris et al.(7), que foi de 30%. Outro achado que discordou de outros autores(9) foi a timomegalia, relatada em 30% dos pacientes com linfoma, enquanto o presente trabalho revelou este achado em apenas um paciente com LH (3,3%).

 

CONCLUSÕES

A TC não substitui nenhum dos procedimentos diagnósticos estabelecidos para o estadiamento do linfoma. No entanto, ela adiciona informações sobre a extensão da doença e pode alertar a equipe médica para possíveis outras anormalidades hepáticas e intra-abdominais que podem não ser avaliadas na laparotomia de rotina(5,10).

Com o considerável aumento da sofisticação de métodos diagnósticos por imagem e o aumento do conhecimento dos radiologistas, o exame de TC passa a ter, com o passar dos anos, importante papel e indispensável significância para pacientes com linfoma.

 

REFERÊNCIAS

1.Delbeke D. Oncological applications of FDG PET imaging: brain tumors, colorectal cancer, lymphoma and melanoma. J Nucl Med 1999;40:591¾603.         [  ]

2.Kimura KF, Ramos AP, Pérez CC, Kimura YF, Chávez LC, Beltrán MTJ. La tomografía computada de abdomen en la estradificación de los linfomas. Rev Mex Radiol 1985;39:99¾104.         [  ]

3.Glazer HS, Lee JKT, Balfe DM, Mauro MA, Griffith R, Sagel SS. Non-Hodgkin lymphoma: computed tomographic demonstration of unusual extranodal involvement. Radiology 1983;149: 211¾7.         [  ]

4.Fishman EK, Kuhlman JE, Jones RJ. CT of lymphoma: spectrum of disease. Radiographics 1991; 11:647¾69.         [  ]

5.Redman HC, Glatstein E, Castellino RA, Federal WA. Computed tomography as an adjunct in the staging of Hodgkin's disease and non-Hodgkin's lymphomas. Radiology 1977;124:381¾5.         [  ]

6.Levitan R, Diamond HD, Craver LF. The liver in Hodgkin's disease. Gut 1960;2:60¾71.         [  ]

7.Harris NL, Aisenberg AC, Meyer JE, Ellman L, Ellman A. Diffuse large cell (histiocytic) lymphoma of the spleen. Clinical and pathologic characteristics of ten cases. Cancer 1984;54:2460¾7.         [  ]

8.Thomas JL, Bernardino ME, Vermess M, et al. EOE-13 in the detection of hepatosplenic lymphoma. Radiology 1982;145:629¾34.         [  ]

9.Filly R, Blank N, Castellino RA. Radiographic distribution of intrathoracic disease in previously untilated patients with Hodgkin's disease and non-Hodgkin lymphoma. Radiology 1996;120: 277.         [  ]

10.Jenkins CNJ, Colquhoun IR. Characterization of primary intracranial lymphoma by computed tomography: an analysis of 36 cases and a review of the literature with particular reference to calcification haemorrhage and cyst formation. Clin Radiol 1998;53:428¾34.         [  ]

 

 

* Trabalho realizado no Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília, Marília, SP.
1. Acadêmicos de Medicina da Faculdade de Medicina de Marília.
2. Médica Radiologista, Docente Assistencial do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Marília, Pós-graduanda do Departamento de Diagnóstico por Imagem da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Endereço para correspondência: Flávio Augusto Ataliba Caldas. Rua Hosuke Uchida, 68, apto. 13, Fragata. Marília, SP, 17519-801. E-mail: flavio_caldas@hotmail.com
Recebido para publicação em 7/7/2001. Aceito, após revisão, em 19/10/2001.

 
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