RELATO DE CASO
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Autho(rs): Edson Marchiori, Paulo Marcos Valiante, Ana Helena Pereira Correia, Leonardo Hoehl Carneiro, Carolina Rodrigues Caldas, Arthur Soares Souza Jr. |
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Descritores: Granulomas hialinizantes, Nódulos pulmonares, Tomografia computadorizada |
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Resumo: IIIMédicos Residentes do Serviço de Anatomia Patológica do HUCFF-UFRJ
INTRODUÇÃO Granulomas hialinizantes são lesões pulmonares fibrosantes raras, de etiologia ainda desconhecida(1). Mais da metade dos pacientes tem fenômenos auto-imunes associados ou exposição a antígenos micobacterianos ou fúngicos(2). A apresentação clínica é em geral de uma doença benigna, sendo os pacientes assintomáticos ou apresentando queixas torácicas vagas(1,3-5). Ela tem prognóstico excelente(1). Em geral se apresentam, nos exames radiológicos, sob a forma de múltiplos nódulos pulmonares, que podem simular várias condições, particularmente as metástases hematogênicas A doença se caracteriza, histopatologicamente, por deposição e amadurecimento de colágeno em forma de nódulos, acompanhada de reação inflamatória crônica, inespecífica, de intensidade variável. É condição pouco conhecida, não sendo mencionada na maioria dos livros-texto que abordam radiologia pulmonar, freqüentemente causando grandes dificuldades diagnósticas, tanto em termos radiológicos como anatomopatológicos.
RELATO DO CASO Paciente do sexo feminino, 28 anos de idade, queixando-se de dispnéia aos médios esforços, tosse e dor torácica, além de emagrecimento. Relatava ter tido tuberculose há 20 anos, sendo tratada por alguns meses. As radiografias de tórax evidenciaram múltiplos nódulos pulmonares, que a tomografia computadorizada (Figuras 1 e 2) mostrou estarem calcificados e escavados. A biópsia pulmonar a céu aberto revelou lesões de natureza inflamatória, constituídas por tecido fibroso maduro, com áreas de calcificação e ossificação infiltradas por pequeno número de linfócitos e plasmócitos, compatíveis com granulomas hialinizantes.
DISCUSSÃO A doença afeta adultos numa ampla faixa etária, com casos descritos dos 19 aos 77 anos, predominando na quinta década de vida. Parece não haver predileção por sexo(1,3,5,6), embora alguns autores(2) afirmem ser mais comum em homens. Cerca de 25% dos pacientes são assintomáticos(1,4,5), com as lesões em geral descobertas casualmente em radiografias de tórax de rotina(1). Alguns pacientes podem ter manifestações pulmonares, como tosse, dispnéia e dor torácica, ou manifestações sistêmicas, do tipo febre, fadiga, perda de peso, sinusite ou faringite(1,3,6). Raramente apresentam hemoptise(1,2,6). Embora o prognóstico seja, em geral, muito bom, com evolução bastante benigna(1,3), pode haver insuficiência respiratória, pelo crescimento e fibrose das lesões(3). O problema maior é a associação eventual com fibrose retroperitoneal ou mediastinite esclerosante, com envolvimento de vasos ou vias aéreas(3). Muitos pacientes apresentam, ainda, diversas alterações imunológicas, como tireoidite de Riedel(6), doença de Castleman(7), uveíte(2), e outras. A apresentação radiológica mais comum são os nódulos múltiplos, em geral bilaterais. Normalmente são maiores que os nódulos da tuberculose ou da histoplasmose, e podem ter limites bem ou mal definidos(3,4). Estas lesões podem se manter estáveis, ou crescer lentamente, durante anos(2,3,5,8). Lesões solitárias são menos freqüentes(5,6,8). Alguns autores afirmaram que as lesões não apresentam calcificações ou escavação(3,5), ou que estes achados só raramente são observados(6). Patel et al.(6) descreveram um caso muito semelhante ao nosso, com múltiplos nódulos calcificados e/ou escavados. O diagnóstico diferencial de nódulos escavados múltiplos inclui, obrigatoriamente, neoplasias metastáticas, linfomas, granulomas infecciosos, sarcoidose nodular, nódulos reumatóides, granulomatose de Wegener, amiloidose nodular e embolia séptica, entre outros(3,5,6). Em relação à patogenia, acredita-se que a doença seja o resultado de uma resposta hiperimune a antígenos exógenos e endógenos, derivados de processos infecciosos e de doenças auto-imunes, respectivamente. No primeiro grupo, é reconhecida a associação com tuberculose e histoplasmose. Com relação aos antígenos endógenos, as evidências de auto-imunidade podem variar desde alterações detectadas em exames laboratoriais, até a associação com doenças como fibrose retroperitoneal, mediastinite fibrosante, uveíte, tireoidite de Riedel, doença de Castleman, e outras(1,2, 5,6,8). Na série de Yousem e Hochholzer(2), anormalidades imunológicas clínicas ou laboratoriais foram encontradas em mais da metade dos pacientes. Nesse contexto, postula-se que tal entidade provavelmente represente uma resposta fibrogênica peculiar e exacerbada a um estímulo antigênico persistente. Ou ainda, o granuloma hialinizante pode não representar uma lesão específica, sendo simplesmente o estágio final ou uma resposta não usual a um processo inflamatório crônico granulomatoso, particularmente microbiano ou fúngico(1), ou de um pseudotumor inflamatório em processo de involução(2). Mediastinite esclerosante e granuloma hialinizante são doenças relacionadas que têm um quadro microscópico muito semelhante(8) e parecem representar reações imunológicas anormais a infecções granulomatosas prévias, principalmente tuberculose ou histoplasmose(3,8). Exposição prévia a doença fúngica ou micobacteriana foi documentada na maioria dos pacientes com granuloma hialinizante(3,8). O fato é que, embora a patogenia seja pouco clara, infecções por tuberculose ou por histoplasmose podem desencadear o aparecimento da doença(1). A morfologia caracteriza-se por nódulos com centro consistindo de colágeno lamelar denso. As fibras colágenas, eosinofílicas e acelulares se distribuem aleatoriamente pelos nódulos. Algumas células plasmáticas e linfócitos, associados a poucos plasmócitos e eosinófilos, podem aparecer nas margens do colágeno. Um anel de plasmócitos e linfócitos com ocasionais folículos linfóides freqüentemente situam-se na periferia do nódulo(3-5). Acúmulo perivascular de linfócitos e células plasmáticas também podem ser encontrados dentro dos nódulos(4). Embora células gigantes multinucleadas, plasmócitos e linfócitos tipicamente estejam presentes dentro das lesões nodulares, granulomas bem formados não são vistos(4). Os componentes celulares predominam nas lesões iniciais, enquanto as bandas amadurecidas de colágeno são mais proeminentes nas lesões mais antigas(5). Yousem e Hochholzer(2) constataram necrose isquêmica em 12 de seus 24 casos, com microcalcificações. Colágeno calcificado foi observado em três casos e ossificação metaplásica foi vista também em três casos. Pleurite crônica com aderências pleurais foi observada em quatro casos, nos quais os nódulos se localizavam junto à pleura visceral. Histopatologicamente, um dos diagnósticos mais difíceis é com a amiloidose. A coloração com o vermelho Congo em geral é positiva na amiloidose e negativa nos granulomas hialinizantes(8). Eventualmente, contudo, as lamelas hialinas podem se corar positivamente com o vermelho Congo(4). Na microscopia eletrônica, o diagnóstico diferencial dos casos duvidosos pode ser feito(4,8). Outros diagnósticos diferenciais comportam doenças infecciosas crônicas, como tuberculose e histoplasmose, metástases, pseudotumores inflamatórios, nódulos reumatóides, tumor fibroso solitário de pleura, doença de Hodgkin e granulomatose de Wegener(1).
REFERÊNCIAS 1. Russell AFR, Suggit RIC, Kazzi JC. Pulmonary hyalinising granuloma: a case report and literature review. Pathology 2000;32:290-3. [ ] 2. Yousem SA, Hochholzer L. Pulmonary hyalinizing granuloma. Am J Clin Pathol 1987;87:1-6. [ ] 3. Ikard RW. Pulmonary hyalinizing granuloma. Chest 1988;93:871-2. [ ] 4. Guccion JG, Rohatgi PK, Saini N. Pulmonary hyalinizing granuloma. Electron microscopic and immunologic studies. Chest 1984;85:571-3. [ ] 5. Chalaoui J, Grégoire P, Sylvestre J, Lefebvre R, Amyot R. Pulmonary hyalinizing granuloma: a cause of pulmonary nodules. Radiology 1984;152: 23-6. [ ] 6. Patel Y, Ishikawa S, MacDonnell KF. Pulmonary hyalinizing granuloma presenting as multiple cavitary calcified nodules. Chest 1991;100:1720-1. [ ] 7. Atagi S, Sakatani M, Akira M, Yamamoto S, Ueda E. Pulmonary hyalinizing granuloma with Castleman's disease. Intern Med 1994;33:689-91. [ ] 8. Katzenstein ALA, Askin FB, Katzenstein AL, Day L, Livolsi VA. Katzenstein and Askin's surgical pathology of non-neoplastic lung disease. 3rd ed. Philadelphia, PA: Saunders, 1997. [ ]
Endereço para correspondência Recebido para publicação em 20/2/2003
* Trabalho realizado nos Serviços de Radiologia e de Anatomia Patológica do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ. |