ATUALIZAÇÃO
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Autho(rs): Beatriz Regina Alvares, Michael Michell |
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Descritores: Ressonância magnética mamária, Mamografia, Ultra-sonografia, Cintilografia, Câncer de mama |
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Resumo:
INTRODUÇÃO Em 1986, a ressonância magnética (RM) foi utilizada pela primeira vez no estudo da mama e, a partir de então, este método diagnóstico passou por significativos avanços, revelando-se promissor na investigação do câncer mamário(1). Recentemente, demonstrou-se o bom desempenho da RM com o uso do gadolínio (Gd-DTPA) para diferenciar lesões mamárias benignas de malignas, por causa da grande impregnação que ocorre nos cânceres mamários, na fase precoce, após a injeção do contraste paramagnético(2,3). A neovascularização pode explicar por que os tumores malignos se impregnam mais intensamente do que os tecidos mamários normais, nas imagens obtidas após a injeção da substância paramagnética. Estudos demonstram que a velocidade de impregnação nos tumores malignos apresenta correlação com o número de vasos presentes nessas lesões(4). Os dados de literatura também referem que a RM mamária mostra-se mais efetiva no diagnóstico diferencial entre lesões tumorais benignas e malignas por avaliar, com mais detalhes, o tamanho e as características morfológicas do tumor, assim como a relação entre a lesão tumoral e as estruturas anatômicas adjacentes(2,5-13). Outras vantagens da RM mamária são a localização anatômica precisa da lesão tumoral e a detecção de lesões multifocais que podem passar despercebidas na mamografia(5). Não obstante este bom desempenho, dados da literatura também referem baixa especificidade da RM mamária, descrevendo vários casos de diagnósticos falso-positivos, assim como a dificuldade em fazer o diagnóstico diferencial em alguns casos de doenças benignas e malignas. Outra limitação deste método diagnóstico é sua incapacidade em demonstrar microcalcificações mamárias(11,12,14-17). Apesar dessas limitações, a RM mamária com o uso do gadolínio tem sensibilidade de 88%-100% para detectar lesões mamárias, e pesquisas recentes, com a finalidade de melhorar a sua especificidade, têm-se mostrado promissoras. No entanto, a especificidade da RM mamária também pode ser melhorada realizando-se análise da velocidade de impregnação do Gd-DTPA, que pode fornecer significativas informações sobre a vascularização, a permeabilidade e a heterogeneidade das lesões(1,13,14).
CRITÉRIOS DE INTERPRETAÇÃO Na RM mamária é importante analisar as características morfológicas detalhadas da lesão, assim como a sua impregnação pelo contraste paramagnético. Após a injeção endovenosa do Gd-DTPA, a grande maioria dos carcinomas apresenta impregnação relacionada à vascularização e à permeabilidade vascular aumentada, fatores que estão presentes nos tumores malignos e que propiciam o seu crescimento. Além da impregnação pelo contraste paramagnético, os sinais mais importantes de lesão tumoral maligna são a impregnação precoce, nos primeiro e terceiro minutos após a injeção endovenosa do gadolínio, o "washout" precoce, a impregnação focal, seguindo a trajetória de um ducto mamário, e a impregnação periférica da lesão tumoral. Apesar dessas características específicas de impregnação do Gd-DTPA em tumores mamários malignos, é necessária uma análise cuidadosa em lesões que apresentem outras formas de impregnação, já que apenas lesões não-contrastadas podem ser consideradas benignas(6). Os sinais morfológicos mais significativos para lesões mamárias malignas, na RM, são a forma irregular e as margens mal definidas e espiculadas(7,9,17-19).
DETECÇÃO DE CÂNCER MAMÁRIO PRIMÁRIO A RM pode ser útil no estágio pré-operatório do câncer mamário, por demonstrar de forma detalhada o tamanho do tumor e sua relação com as demais estruturas anatômicas, fornecendo ao mastologista mais subsídios para a ressecção tumoral com margens microscopicamente negativas(12). Na fase pré-operatória, a RM também desempenha papel importante no planejamento cirúrgico, especialmente quando a preservação parcial da mama está sendo considerada, podendo demonstrar a extensão da lesão, bem como afastar ou constatar a presença de lesão multifocal e/ou lesão multicêntrica(4,20). Em casos de pacientes com carcinoma oculto primário da mama, a RM permite a identificação do tumor, com alta sensibilidade, possibilitando realizar-se uma cirurgia conservadora da mama em vez de mastectomia(15). Existem evidências crescentes de que a RM representa o método diagnóstico mais sensível para a detecção precoce do câncer mamário em mulheres com alto risco para câncer de mama, o qual pode se apresentar mamograficamente oculto em razão da alta concentração de tecido mamário nestas pacientes(2,9). No entanto, levando em consideração a possibilidade de diagnósticos falso-positivos que podem ocorrer, quando da impregnação de tecidos mamários não-neoplásicos pelo contraste paramagnético, é preciso avaliar com precaução a possibilidade de mudanças na estratégia cirúrgica em pacientes com suspeita de câncer mamário multicêntrico, levantada exclusivamente por meio da RM(12). Alguns trabalhos consultados também demonstram que resultados falso-negativos podem ocorrer em casos de carcinoma ductal in situ e em carcinomas lobular, tubular e mucinoso(2,5,15).
DETECÇÃO DE CÂNCER MAMÁRIO RECIDIVANTE E RESIDUAL A mama operada e submetida a radioterapia costuma apresentar várias alterações que incluem espessamento de pele, edema, massas, cicatrizes e distorções arquiteturais. Estas modificações tornam mais difíceis a análise das mamografias e algumas pacientes nestas situações são, muitas vezes, encaminhadas para novas biópsias. Na maioria dos casos, essas alterações estão relacionadas a seqüelas pós-cirúrgicas, tais como fibroses, necroses gordurosas ou granulomas, tendo sido as pacientes submetidas a um procedimento cirúrgico desnecessário(4,21). Apesar de a RM permitir avaliação detalhada da lesão, o diagnóstico diferencial entre câncer mamário recidivante e lesão cicatricial não deve ser realizado levando-se em consideração apenas as características morfológicas da lesão, mas também a sua impregnação pelo Gd-DTPA. No entanto, nos primeiros meses após a cirurgia e a radioterapia, a confiabilidade da RM mamária para avaliar recidiva tumoral fica consideravelmente comprometida, pois, nessas situações, costuma ocorrer impregnação difusa do parênquima mamário pelo contraste paramagnético. Dezoito meses após a radioterapia, a avaliação pela RM costuma ser excelente, pois o tecido cicatricial mais antigo não apresenta impregnação significativa do Gd-DTPA, ao contrário de lesões recidivantes. Assim, a RM com contraste pode ser usada para detectar e excluir câncer mamário recorrente, com alta sensibilidade(2,4,10). A RM também pode ser utilizada para avaliar a presença, a localização e a extensão de tumor residual no pós-operatório imediato e após biópsias excisionais. Entretanto, a identificação de tumor residual ou multifocal mamograficamente oculto, por meio da RM, deve ser avaliada com cautela, já que achados falso-negativos causados por alterações pós-cirúrgicas no parênquima mamário e achados falso-positivos devidos à impregnação do contraste em tecido de granulação e em tecido mamário normal permanecem como limitações diagnósticas(17,22).
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE RM MAMÁRIA, MAMOGRAFIA, ULTRA-SONOGRAFIA E CINTILOGRAFIA A mamografia e o ultra-som são exames fundamentais para o diagnóstico e acompanhamento pós-cirúrgico do câncer de mama. A cintilografia também vem sendo usada para confirmar a presença ou ausência de tumores mamários e a presença de linfonodos metastáticos(4,5,14,16,23) . Entre estes métodos de imagem, a mamografia é o mais freqüentemente utilizado, apresentando alta sensibilidade na detecção de câncer mamário em estágio precoce. No entanto, esta modalidade diagnóstica apresenta baixa especificidade e alguns fatores podem dificultar o diagnóstico correto do câncer mamário, incluindo mamas densas, implantes mamários e alterações mamárias pós-cirúrgicas. Além disso, o exame mamográfico também não possibilita o diagnóstico diferencial entre lesões císticas e sólidas. No seguimento pós-cirúrgico e radioterápico de câncer, as mamas apresentam alterações que incluem espessamento de pele, distorções arquiteturais, edema do tecido fibroglandular, cicatrizes e calcificações. Estas alterações podem dificultar e até simular o diagnóstico de câncer mamário recorrente, podendo levar a paciente a ser submetida a biópsias desnecessárias(2,4,6,10,11) . A sensibilidade da mamografia varia de 63% a 90% e depende de vários fatores, incluindo a qualidade da imagem e a experiência do radiologista leitor do exame. A baixa especificidade da mamografia freqüentemente leva à realização de biópsias desnecessárias, em alterações mamárias de natureza benigna. O valor preditivo positivo da mamografia é variável, mas valores compreendidos entre 10% e 50% são descritos. Estes baixos valores sugerem que, apesar de o exame mamográfico ser altamente efetivo como modalidade de "screening", existem pacientes em que ele não realiza o diagnóstico, sendo necessária, nessas situações específicas, a realização de outros exames complementares de imagem(14). O ultra-som mamário pode diagnosticar lesões císticas e sólidas e avalia mamas densas melhor do que a mamografia, mas pode apresentar dificuldades no diagnóstico diferencial entre massas sólidas de natureza benigna e maligna, em virtude da superposição de achados entre certos tipos de fibroadenomas e carcinomas(5).
Apesar de o ultra-som também apresentar baixa sensibilidade para detectar lesões menores que 1 cm e microcalcificações, com o uso de transdutores de 7,5 e 10 MHz é possível diagnosticar carcinomas mamários de pequenas dimensões e clinicamente ocultos, assim como transdutores de 13 MHz possibilitam a visualização de microcalcificações mamárias. Dessa forma, apesar de o ultra-som ser um método bastante útil no diagnóstico do câncer mamário, a especificidade deste exame vai depender de vários fatores, estando ainda incluídas, entre eles, a localização da lesão na glândula mamária, a qualidade do aparelho e a experiência do profissional que realiza o exame(14). A principal utilização da cintilografia no câncer de mama é detectar o nódulo sentinela, o qual representa o primeiro linfonodo a drenar a via linfática peritumoral, sendo, dessa maneira, o elemento mais importante para o estadiamento, proposta terapêutica e prognóstico desta afecção(13). A cintilografia também pode ser usada para confirmar a presença ou ausência de câncer mamário, mas não substitui a mamografia nem o ultra-som e, preferencialmente, deve ser usada como método diagnóstico complementar, sendo ainda necessárias mais pesquisas para que possam ser avaliados tanto os seus valores clínicos quanto a sua importância no diagnóstico do câncer mamário(14). Apesar de a RM apresentar baixa especificidade na detecção do câncer de mama, ela possui maior acurácia do que a mamografia e o ultra-som em avaliar o tamanho e as características morfológicas do tumor, bem como no diagnóstico de lesões multifocais e multicêntricas(5). Não obstante a alta acurácia da RM mamária, sugerindo inclusive a possibilidade de num futuro próximo poder substituir o exame mamográfico em grupos específicos de pacientes, o seu uso, atualmente, precisa ser ponderado em razão do alto custo deste método diagnóstico, que ultrapassa em até vinte vezes o preço de um exame mamográfico(5,16).
Agradecimentos Ao Dr. José Michel Kalaf, diretor da Radiologia Clínica de Campinas, pela leitura da versão final deste artigo. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), pelo suporte financeiro.
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Endereço para correspondência Recebido para publicação em 19/3/2003
* Trabalho realizado no Department of Radiology and Nuclear Medicine, King's College Hospital, Londres, Reino Unido. |