RELATO DE CASO
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Autho(rs): Marcio Ricardo Taveira Garcia, Maria Cristina Chammas, Ângela Hissae Motoyama Caiado, Adriana Gonçalves Juliano, Claudia da Costa Leite, Giovanni Guido Cerri |
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Descritores: Aneurisma, Artéria carótida interna extracraniana, Ultra-sonografia, Ultra-sonografia Doppler, Dúplex-Doppler colorido |
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Resumo: IVMédica Assistente do Departamento de Radiologia da FMUSP
INTRODUÇÃO A artéria carótida interna tem cerca de 8 cm de extensão em seu segmento cervical, prolonga-se desde a sua bifurcação até o forame crivoso, não se ramificando(1). Os aneurismas verdadeiros da artéria carótida interna extracraniana são extremamente raros(2), ao contrário dos supraclinóideos, correspondendo a menos de 4% dos aneurismas periféricos(3,4). Esta doença deve estar entre os diagnósticos diferenciais de massas cervicais. Habitualmente apresentam-se como massas palpáveis e pulsáteis, junto às margens inferiores dos ângulos da mandíbula(3,5,6). Outros sintomas incluem rouquidão, disfagia, dor por compressão nervosa e alterações neurológicas decorrentes de isquemias transitórias no território cerebral(5).
RELATO DO CASO Paciente do sexo feminino, 70 anos de idade, natural de São Paulo, SP, procurou o ambulatório do Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço, da Divisão de Cirurgia, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, para avaliação de massa cervical indolor. Ao exame físico caracterizou-se massa arredondada, endurecida, apresentando pouca mobilidade, sem sinais flogísticos, não pulsátil, situada na topografia do ângulo da mandíbula, junto à extremidade inferior da glândula parótida direita. A principal hipótese diagnóstica formulada foi de nódulo parotídeo, sendo, então, solicitada punção aspirativa por agulha fina guiada por ultra-sonografia no nosso serviço. Ao exame ultra-sonográfico modo-B observou-se formação arredondada, hipoecogênica, de limites bem definidos, apresentando paredes espessadas por material ecogênico de aspecto laminar, situada no espaço carotídeo, deslocando lateralmente as estruturas do espaço parotídeo, medindo 2,7×2,2×2,0 cm (CC×LL×AP). Ao mapeamento colorido identificou-se vascularização exuberante no interior da lesão, com padrão de fluxo turbilhonado, contígua ao terço proximal da artéria carótida interna. Tal formação correspondia a aneurisma verdadeiro e sacular, parcialmente trombosado, da artéria carótida interna direita extracraniana. O exame do lado oposto identificou outro aneurisma de dimensões menores, de padrão fusiforme, na topografia contralateral correspondente, medindo 1,1×0,8×0,8 cm (CC×LL×AP).
A ressonância magnética foi realizada para pesquisa de outros aneurismas intracranianos e melhor caracterização de suas relações anatômicas. Este método confirmou os achados ultra-sonográficos e não identificou outros territórios aneurismáticos das artérias carótidas internas.
DISCUSSÃO A artéria carótida interna tem cerca de 8 cm de extensão em seu segmento cervical, onde não apresenta ramos(1). Os aneurismas verdadeiros da artéria carótida interna extracraniana são extremamente raros(2), correspondendo a menos de 4% dos aneurismas periféricos(3,4). Esta doença deve estar entre os diagnósticos diferenciais das massas no território cervical. Habitualmente apresentam-se como massas palpáveis e pulsáteis, junto às margens inferiores dos ângulos da mandíbula(3,5,6). Outros sintomas incluem rouquidão, disfagia, dor por compressão nervosa e alterações neurológicas decorrentes de isquemias transitórias no território cerebral(5). Sua etiologia pode se dever a aterosclerose, displasia fibromuscular, síndrome de Marfan, trauma, cirurgia prévia no território carotídeo, infecção (aneurisma micótico), defeitos congênitos e dissecção(7,8). A principal delas é a aterosclerose, e por isso deve-se procurar a concomitância desses aneurismas com outros periféricos, que é achado freqüente(8), conforme pudemos observar no caso relatado. Além das características já expostas na descrição do exame ultra-sonográfico, os aneurismas da artéria carótida interna extracraniana podem apresentar calcificações periféricas, o que auxilia no seu diagnóstico ao modo-B. Contudo, esta doença é facilmente confirmada quando o estudo dúplex-Doppler colorido é realizado. Outros métodos diagnósticos desta doença são a tomografia computadorizada, a angiografia (que detém o padrão ouro de avaliação) e a ressonância magnética, que permite a construção de imagens tridimensionais, capazes de mostrar o tamanho do aneurisma, sua relação anatômica com as outras estruturas cervicais e a extensão do trombo mural, quando presente(7). Sua identificação e avaliação são importantes, uma vez que suas complicações são graves. Entre as principais complicações destacam-se a trombose com infartos maciços ou embólicos da área correspondente suprida no sistema nervoso central, a ruptura e a dissecção do aneurisma, sendo indicado na maioria das vezes o tratamento cirúrgico dessas lesões(7). A completa excisão do aneurisma não é indicada devido à alta incidência de lesão dos nervos cranianos que têm seus trajetos descendentes junto a esses vasos(7,9). Os aneurismas da artéria carótida interna são alterações incomuns na porção extracraniana desta artéria. Apesar disso, devem sempre ser incluídos nos diagnósticos diferenciais das massas cervicais. Como observamos no caso relatado, o nódulo, ao exame físico, era endurecido e não pulsátil, direcionando o diagnóstico do cirurgião para lesão de natureza parotídea. Contudo, foi de fundamental importância o pedido do cirurgião de punção aspirativa por agulha fina guiada por ultra-sonografia, que evitou o procedimento inadvertido da massa, realizou o diagnóstico e contra-indicou a punção da formação aneurismática. A evolução do aneurisma da artéria carótida extracraniana é desfavorável devido às suas inúmeras complicações, necessitando de estudo detalhado para a indicação da melhor conduta terapêutica. Este é normalmente feito utilizando-se a ultra-sonografia, aliada ao estudo Doppler (colorido e pulsado), por sua praticidade, disponibilidade, baixo custo e características inóquas para o paciente. O diagnóstico pode ser complementado com tomografia computadorizada ou ressonância magnética, para detalhamento da sua relação com as outras estruturas cervicais. A angiografia, no entanto, é o melhor método diagnóstico e o mais útil no planejamento cirúrgico, que pode ser aberto ou endovascular com a utilização de "stents".
REFERÊNCIAS 1. www.sosdoutor.com.br/sosvascular/doençascarotidas.asp [ ] 2. Akan H, Selçuk MB, Incesu L, Günes M, Tekat A. Aneurysm of extracranial internal carotid artery: radiologic evaluation. Turk A Otol 1997;35:1114. [ ] 3. Brito CJ, Merlo I, Fonseca Filho VL. Aneurismas dos troncos supra-aórticos. In: Brito CJ. Cirurgia vascular. 1ª ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2002: 52532. [ ] 4. Maffei FHA, Lastória S, Yoshida WB, Rollo HR. Doenças vasculares periféricas. 3ª ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2002:115760. [ ] 5. Mokri B, Piepgras DG, Sundt TM Jr, Pearson BW. Extracranial internal carotid artery aneurysms. Mayo Clin Proc 1982;57:31021. [ ] 6. Rittenhouse EA, Radke HM, Sumner DS. Carotid artery aneurysm. Review of the literature and report of a case with rupture into the oropharynx. Arch Surg 1972;105:7869. [ ] 7. Lau H, Cheng SWK, Lam KY. Carotid artery aneurysm secondary to cystic medial necrosis. J R Coll Surg Edinb 2001,46:1735. [ ] 8. Rutherford RB. Arterial aneurysms: etiologic considerations. In: Rutherford RB, ed. Vascular surgery. 3rd ed. Philadelphia: WB Saunders, 1989: 23845. [ ] 9. Liapis CD, Gugulakis A, Misiakos E, Verikokos C, Dousaitou B, Sechas M. Surgical treatment of extracranial carotid aneurysms. Int Angiol 1994;13: 2905. [ ]
Endereço para correspondência Recebido para publicação em 23/9/2003. Aceito, após revisão, em 20/10/2003.
* Trabalho realizado no Instituto de Radiologia (InRad) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), São Paulo, SP. |