ARTIGO DE REVISÃO
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Autho(rs): Ricardo Miguel Costa de Freitas, Luciana Costa Silva, Jovita Lane Soares Santos, Wilson Campos Tavares Júnior |
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Descritores: Dor lombar aguda, Radiografia simples do abdome, Tomografia computadorizada helicoidal, Ultra-sonografia do trato urinário, Urografia excretora, Urolitíase |
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Resumo:
INTRODUÇÃO A tomografia computadorizada (TC) helicoidal tem desempenhado papel importante no diagnóstico e tratamento da litíase renal, sendo nos últimos anos considerada, por alguns autores, como um "divisor de águasa", papel antes atribuído à urografia excretora (UE)(1). Outros autores têm sustentado que a radiografia simples do abdome associada à ultra-sonografia (US) são apropriadas na abordagem diagnóstica da dor lombar aguda e podem ser utilizadas como métodos alternativos quando recursos como a TC helicoidal são limitados(2). O objetivo deste trabalho é revisar a literatura sobre o tema, abordando as opções e as perspectivas diagnósticas. A literatura publicada nos últimos 30 anos comparando os métodos atualmente disponíveis para a avaliação de pacientes com dor lombar aguda foi revisada, com atenção aos seguintes métodos: a radiografia simples de abdome, a UE, a US e a TC helicoidal.
DISCUSSÃO Os cálculos do trato urinário podem ser originários de placas de Randall situadas no revestimento dos ductos coletores nas papilas renais(3), que podem se destacar e ser eliminadas ou formar cálculos, alojados freqüentemente na região das papilas e cálices. Os cálculos tendem a ser assintomáticos até causarem obstrução, com sintomas típicos de cólica renal ou ureteral(4). Nos ureteres, o local mais comum de seu depósito é a junção uretero-vesical, ou acima desta, na porção pélvica do ureter(3). As composições mais comuns dos cálculos renais são o fosfato de cálcio, o oxalato de cálcio e o fosfato amoníaco magnesiano (estruvita). Os cálculos de cistina, urato e xantina são de baixa densidade e raros. Noventa por cento dos cálculos do trato urinário superior contêm cálcio suficiente para serem visualizados na radiografia simples de abdome(3). No entanto, vários fatores seriam responsáveis pela baixa sensibilidade e especificidade da radiografia simples na detecção dos cálculos: estes podem ser obscurecidos por gases intestinais, sombras ósseas ou posicionamento incorreto do paciente, a magnificação geométrica pode distorcer o seu tamanho e a sua localização exata pode ser difícil de ser determinada. Além disso, a qualidade técnica da imagem também pode influenciar sua interpretação(5,6). Ao se correlacionar os achados de radiografias simples do abdome com os da TC helicoidal (padrão ouro), alguns autores chegaram a afirmar que a radiografia simples do abdome teria sensibilidade de apenas 59% para detectar cálculos urinários(4). A UE foi, por muito tempo, considerada o exame de imagem ideal na abordagem de pacientes com urolitíase. Porém, estudos atuais mostram que a sensibilidade, especificidade e acurácia diagnóstica da TC têm-se tornado superiores à UE na avaliação desses pacientes. A TC é mais sensível para a detecção do cálculo (94%), em relação à UE (52% a 69%), e permite a determinação de seu tamanho e localização de forma precisa, além de fornecer diagnósticos alternativos para dor lombar aguda(79). A UE permanece como o melhor método para a visualização do sistema coletor urinário e a TC como o melhor método para a detecção de cálculos urinários(10). A US vem sendo utilizada na detecção de cálculos renais desde 1961(11) e se tornou um método de boa sensibilidade, inclusive para a detecção de cálculos não opacos, como os de ácido úrico(12,13). Em pacientes submetidos a litotripsia extracorpórea por ondas de choque (LECO), a sensibilidade geral da US na detecção de cálculos foi de 96%, sendo considerada superior à radiografia abdominal e levemente inferior à associação desta última com a nefroplanigrafia. De acordo com Middleton et al.(14), ao randomizar pacientes pós-LECO e pacientes que se submeteram a urografias por razões não relacionadas à nefrolitíase, a sensibilidade da US foi de 91%. Os autores desse estudo afirmaram que a habilidade da US em detectar cálculos renais seria dependente do tamanho destes, mas independente da sua localização ou do tamanho do paciente(14). A US também permite a detecção de outras condições como litíase biliar, pancreatite aguda, apendicite aguda e massas abdômino-pélvicas, que podem cursar com quadros dolorosos semelhantes à cólica renal(8). Levine et al.(4) questionaram a sensibilidade da US de 96% para detectar cálculos renais ao se comparar com a radiografia abdominal e a tomografia convencional(14), e sugeriram ser esta sensibilidade substancialmente menor, dada a evidência de que a radiografia seria menos sensível do que previamente pensado. A TC helicoidal teria sensibilidade de 97% e especificidade de 96% para a detecção de cálculos urinários(1). A radiografia abdominal foi considerada mais sensível do que o topograma da TC ao revelar cálculos ureterais. Porém, alguns cálculos revelados pela TC helicoidal podem não ser vistos por nenhum dos dois métodos anteriores(15). O primeiro estudo comparando a sensibilidade da US para o cálculo ureteral em relação à TC helicoidal não contrastada concluiu ser esta última a melhor modalidade para detectar cálculos ureterais, com sensibilidade de 94% e especificidade de 97%. Para a US estes valores foram de 19% e 97%, respectivamente(5,16). Uma comparação prospectiva da US com a TC helicoidal para detecção de urolitíase(17) concluiu que a TC não contrastada tem sensibilidade maior para a detecção de cálculos ureterais do que a US. Foram estudados 23 pacientes com nefrolitíase, e a TC helicoidal detectou 22 casos (sensibilidade de 96%), enquanto a US detectou 14 casos (sensibilidade de 61%) (p = 0,02). A especificidade de ambas as técnicas foi de 100%. Fowler et al.(18) realizaram o primeiro estudo comparando a US com a TC helicoidal para avaliar cálculos dentro da pelve renal ou parênquima renal e atribuíram à primeira uma sensibilidade de 24% e especificidade de 90%, concluindo ser a US de valor limitado para a detecção de cálculos renais. No entanto, esses autores admitiram ser o tamanho médio dos cálculos detectados à US de 7,1 mm e que 73% dos cálculos não visualizados à US apresentavam menos de 3 mm de diâmetro. O tamanho dos cálculos baseado nas medidas ultra-sonográficas e tomográficas foram concordantes em 79% dos casos. Naqueles discordantes, as dimensões diferiram em média 1,5 mm. A colimação do feixe da TC helicoidal a 3 mm é boa ao predizer o tamanho do cálculo e sua densidade: cálculos de ácido úrico apresentaram atenuação aproximada de 415 UH; de cistina, 668 UH; de estruvita, 919 UH; de oxalato de cálcio, 1.249 UH; de brucita, 1.383 UH; e de hidroxiapatita, 1.525 UH. Com o aumento da colimação, a capacidade de diferenciação dos cálculos é perdida(19). Os cálculos radiotransparentes têm densidade de mais de 80 UH, sendo detectados pela TC(20). No entanto, cálculos de indinavir, os quais são relativamente radiolucentes, não têm sido detectados(19). Os sinais secundários de obstrução também podem ser detectados, como o aumento do volume renal, a presença de estratificação da gordura perirrenal, coleções líquidas perirrenais, hidronefrose, espessamento da fáscia renal e o sinal da borda tecidual. Este último, definido como uma borda circunferencial de atenuação de partes moles ao redor do cálculo renal, é um achado altamente específico para a presença de cálculo renal e para a diferenciação de um flebólito(3,8,2123). À TC, a hidronefrose provavelmente reflete uma fase de obstrução subaguda à crônica, quando a pressão intraluminal normalizou e a peristalse diminuiu. Sabe-se que pacientes que se apresentam com duração de dor mais prolongada têm baixa taxa de passagem espontânea de cálculos(21). De acordo com estudos experimentais, o aumento da pressão no sistema coletor é considerado como a força propulsiva mais importante capaz de mover um cálculo a jusante do ureter, pelo menos durante a fase aguda da obstrução(24). Revendo esses sinais secundários à TC helicoidal, Takahashi et al.(21) avaliaram 69 pacientes com cálculo ureteral único não localizado na junção uretero-pélvica. Trinta e cinco pacientes foram perdidos durante o seguimento; dos 34 pacientes restantes, 22 apresentaram eliminação espontânea do cálculo e 12 não responderam ao tratamento conservador. Comparando-se os dois últimos grupos, o diâmetro médio dos cálculos foi significativamente maior no segundo (p = 0,001), e apenas a estratificação da gordura perirrenal quanto à presença de coleções líquidas perirrenais foi significativamente maior no primeiro (p = 0,044 e p = 0,021, respectivamente). Cálculos com mais de 7 mm de diâmetro apresentaram 95% de especificidade para a predição de insucesso terapêutico clínico, concluindo-se que os achados tomográficos compatíveis com cálculos menores e um alto grau de estratificação da gordura perirrenal ou quantidade aumentada de líquido perirrenal estariam associados com a passagem espontânea dos cálculos urinários. Grandes séries prospectivas seriam necessárias para confirmar esta hipótese. Portanto, cálculos com dimensões menores teriam maior probabilidade de eliminação espontânea, o que, do ponto de vista prático, tornaria a avaliação imaginológica através de TC apropriada nos casos clinicamente significativos de obstrução do trato urinário. De fato, Catalano et al.(2) confirmaram os achados anteriores de que a TC helicoidal é uma ferramenta extremamente precisa na avaliação da dor lombar aguda. Comparando a TC com a US combinada com a radiografia convencional, evidenciou-se ser a TC significantemente superior no diagnóstico de ureterolitíase (sensibilidade de 92% versus 77% e valor preditivo negativo de 87% versus 68%) e com acurácia semelhante no diagnóstico de causas alternativas de dor. No entanto, em seus resultados, esses autores concluíram ser a US combinada com a radiografia convencional uma alternativa valiosa em relação à TC em casos selecionados. Embora menos precisa do que a TC, esta combinação permitiu a detecção de todos os casos clinicamente relevantes, com conseqüências semelhantes para o tratamento dos pacientes. Todos os pacientes que não foram diagnosticados à US/radiografia convencional recuperaram-se espontaneamente com o tratamento conservador, provavelmente por sofrerem cólica causada por cálculos de 1 a 3 mm. Assim, Catalano et al.(2) sugeriram duas alternativas: 1) realizar a TC helicoidal nos pacientes com achados negativos à US/radiografia convencional; e/ou 2) proceder à TC apenas quando o clínico solicitante tenha forte convicção de que o paciente possa ter cólica acentuada ou uma causa relevante de dor não-ureterolitiásica (por exemplo, pacientes sem hematúria). Foi considerado que a TC deve ser empregada principalmente quando a avaliação inicial é duvidosa, tanto para obstrução ureteral quanto para causas alternativas ou quando a intervenção urológica é considerada necessária.
OUTRAS MODALIDADES DIAGNÓSTICAS A TC por multidetectores ("multislice") tem sido recentemente apresentada como opção diagnóstica(25,26). Tack et al.(27) avaliaram 106 pacientes com suspeita de cólica renal por este método, sem a utilização de meio de contraste oral ou venoso. Destes, 38 (36%) pacientes portavam cálculos ureterais, e a TC "multislice" apresentou sensibilidade, especificidade e acurácia diagnóstica variando entre 89,5% e 94,7%, 94,1% e 100%, e 93,4% e 98,1%, respectivamente. Estudos mais aprofundados são necessários para estabelecer a sua aplicabilidade prática.
CONCLUSÃO A TC helicoidal tem sido considerada o método mais preciso no diagnóstico por imagem de cálculos do trato urinário, sendo defendida por alguns autores como o exame imaginológico de escolha na abordagem do paciente com dor lombar aguda em serviços de emergência(1). Por outro lado, outros autores têm proposto um algoritmo para a abordagem inicial destes pacientes, com a utilização da US associada à radiografia convencional inicialmente, devido à acurácia diagnóstica semelhante à da TC helicoidal nos casos clinicamente relevantes que não respondem ao tratamento conservador. Esta última seria recomendada em casos selecionados, reduzindo-se globalmente os gastos e a exposição à radiação, ao custo de um pequeno aumento no tempo necessário para se alcançar o diagnóstico(2). O método diagnóstico ideal pode ser considerado aquele de melhor custo-benefício, isto é, o de melhor resolutividade para o paciente e que alia o menor custo para o sistema de saúde. Considerando a associação da radiografia simples e US como métodos de boa sensibilidade na detecção dos casos de cálculos urinários clinicamente relevantes, o uso da TC helicoidal nesta situação pode ser reservado para aqueles em que o detalhamento anatômico será importante, como, por exemplo, na abordagem terapêutica invasiva.
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Endereço para correspondência Recebido para publicação em 3/9/2003. Aceito, após revisão, em 22/10/2003.
* Trabalho realizado no Serviço de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG), Belo Horizonte, MG. |